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A crítica do mito da modernidade: da Escola de Frankfurt ao giro decolonial

The critique of the myth of modernity: the Frankfurt School and the Decolonial Turn

La crítica del mito de la modernidad: de la Escuela de Frankfurt hacia el giro decolonial

Resumo:

O texto discute as convergências e divergências entre duas caracterizações da modernidade que apontam para sua dimensão mítica: a crítica formulada por Adorno e Horkheimer na Dialética do esclarecimento e a concepção de Enrique Dussel, sobretudo conforme se apresenta em seu livro 1492: o encobrimento do outro. Essa proposta de interlocução teórica almeja enriquecer o projeto de descolonização da Teoria Crítica e melhor explorar seu potencial de crítica sociopolítica – sobretudo no que tange a estruturas, processos e relações sociais nas sociedades periféricas do capitalismo mundial. Para tal, o artigo é desenvolvido em três passos: inicia com a apresentação dos argumentos clássicos da Teoria Crítica quanto à narrativa mítica da modernidade; em seguida, discorre sobre as possibilidades de ampliação e revisão crítica dessa perspectiva com base nos trabalhos de Dussel; e, por fim, realiza um balanço da discussão e traça considerações sobre a pertinência e a necessidade desse diálogo.

Palavras-chave:
Teoria Crítica; Giro decolonial; Escola de Frankfurt; Pós-colonialismo

Abstract:

The paper discusses the convergences and divergences between two characterizations of modernity that point to its mythical dimension: the critique formulated by Adorno and Horkheimer in Dialectics of Enlightenment and the conception of Enrique Dussel as presented in his work 1492: El encubrimiento del otro. This theoretical interlocution proposal aims to enrich the Critical Theory's decolonization project in order to better explore its potential for sociopolitical criticism – especially regarding to social structures, processes and relations in peripheral societies of world capitalism. The article is organized in three steps: it starts with the presentation of the classic arguments of Critical Theory regarding the mythical narrative of modernity; then, it discusses the possibilities of expanding and critically reviewing this perspective based on Dussel works; and, finally, it makes an assessment of the discussion and outlines considerations about the pertinence and necessity of this dialogue.

Keywords:
Critical Theory; Decolonial Turn; Franfkurt School; Postcolonialism

Resumen:

El texto discute las convergencias y divergencias entre dos caracterizaciones de la modernidad que apuntan a su dimensión mítica: la crítica formulada por Adorno y Horkheimer en Dialéctica de la ilustración y la concepción de Enrique Dussel, sobre todo como se presenta en su libro 1492: El encubrimiento del otro. Esta propuesta de interlocución teórica tiene como objetivo enriquecer el proyecto de descolonización de la Teoría Crítica y explorar mejor su potencial para la crítica sociopolítica, especialmente en lo que respecta a las estructuras, procesos y relaciones sociales en las sociedades periféricas del capitalismo mundial. Para ello, el artículo se desarrolla en tres pasos: se inicia con la presentación de los argumentos clásicos de la Teoría Crítica sobre la narrativa mítica de la modernidad; luego, se analizan las posibilidades de ampliar y revisar críticamente esta perspectiva a partir de la obra de Dussel; y, finalmente, hace balance de la discusión y esboza consideraciones sobre la pertinencia y necesidad de este diálogo.

Palabras clave:
Teoría Crítica; Giro decolonial; Escuela de Frankfurt; Poscolonialism

O trabalho apresenta uma proposta de interlocução entre a Teoria Crítica de matriz frankfurtiana e o giro decolonial, que tem pautado importantes debates sociológicos na América Latina nas últimas décadas. Sua formulação se insere sob um projeto mais amplo, que visa construir pontes de diálogo entre os dois campos da investigação social, e tem como objeto particular a caracterização crítica da face mítica da “modernidade ocidental”, constituída pelo esclarecimento – compreendendo a ideia de mito tanto em caráter ideológico de ocultação/inversão da realidade quanto sua dimensão paradoxalmente irracional. Ao discutir as possibilidades de tal diálogo, o texto versará sobre a atualidade política do tema.

O projeto de uma “descolonização da Teoria Crítica” ganhou relevo na última década sob algumas motivações que podem ser (não exaustivamente) apontadas sumariamente. Primeiramente, com a difusão dos “estudos pós-coloniais”,2 1 Neste trabalho, a expressão “pós-colonial” – na qualificação de estudos, teorias ou perspectivas políticas – será utilizada de forma mais abrangente do que a usual referência aos chamados Estudos Subalternos, designando o vasto campo de teorias críticas ao colonialismo ou à colonialidade que foram desenvolvidos com referência às estruturas, processos e relações sociais subjacentes à periferização do “Sul Global” e suas implicações sobre o processo de produção e de circulação do conhecimento. O termo “decolonial” se refere, mais especificamente, à perspectiva teórica desenvolvida na América Latina pelo Grupo Modernidade/Colonialidade (Ballestrin 2013, 108) nas décadas recentes a partir de um longo acúmulo intelectual do pensamento crítico latino-americano. tem-se fomentado uma série de indagações a respeito do eurocentrismo subjacente às teorias sociais de maior circulação mundial: as explicações sociais de nível macro propostas tanto pela sociologia clássica quanto por autores contemporâneos (Anthony Giddens, Ulrich Beck, Jürgen Habermas dentre outros) vêm sendo desafiadas por intelectuais da periferia, que acusam a limitação espacial e os reducionismos ideológicos de pretensos universalismos.

Com efeito, o campo da Teoria Crítica, ancorada sobre o programa de Horkheimer (1991) para o Instituto de Pesquisa Social da Universidade de Frankfurt, aparece como alvo recorrente de objeções que apontam traços eurocêntricos subjacentes a seus modelos; objeções que advêm tanto de perspectivas externas ao campo (Amin 1989Amin, Samir. 1989. El eurocentrismo: crítica de una ideologia. México: Siglo XXI Editores.; Dussel 1993Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes.; Santos 2006Santos, Boaventura de S. 2006. A Gramática do tempo: por uma nova cultura política. São Paulo: Cortez.) quanto de estudos que buscam revisá-lo de modo autocrítico (Young 1990Young, Iris M. 1990. Justice and the politics of difference. New Jersey: Princeton University Press.; Fraser 2015Fraser, Nancy. 2015. Por trás do laboratório secreto de Marx: por uma concepção expandida do capitalismo. Direito & Práxis 6 (10): 704-728. https://doi.org/10.12957/dep.2015.15431.
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; 2016; Allen 2016Allen, Amy. 2016. The End of Progress: decolonizing the normative foundations of critical theory. New York: Columbia University Press.). Em ambos os casos, estão em jogo limites geopolíticos e epistemológicos de teorias derivadas do marxismo ocidental e a disputa sobre o melhor caminho para sua superação.

No bojo dessa discussão contemporânea, o trabalho de Amy Allen (2016)Allen, Amy. 2016. The End of Progress: decolonizing the normative foundations of critical theory. New York: Columbia University Press. se destaca ao propor caminhos pelos quais a teorização crítica herdada do marxismo seja aproveitada a despeito das limitações que derivam da ótica eurocêntrica presente em notáveis trabalhos do campo. O caminho defendido por Allen consiste em retornar à primeira geração da Teoria Crítica e ali identificar pistas para a superação da concepção eurocêntrica de progresso histórico que se encontraria no fundo de formulações de autores como Jürgen Habermas e Axel Honneth. A fonte mais rica para essa descolonização se encontraria na crítica do progresso de Theodor Adorno (Adorno 1992Adorno, Theodor. 1992. Progresso. Lua Nova 27: 217-236. https://doi.org/10.1590/S0102-64451992000300011.
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; Adorno e Horkheimer 1985Adorno, Theodor e Max Horkheimer. 1985. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar.), principalmente se tomada em interlocução com a obra de Michel Foucault (1978)Foucault, Michel. 1978. História da loucura na Idade Clássica. São Paulo: Perspectiva..

Almejando contribuir para um programa teórico tão ambicioso, este artigo é desenvolvido em três passos: inicia com a apresentação dos argumentos clássicos da Teoria Crítica em relação à narrativa mítica da modernidade; em seguida, discorre sobre as possibilidades de ampliação e revisão crítica dessa perspectiva, principalmente a partir dos trabalhos de Enrique Dussel, mas sem deixar de considerar interlocuções com outros autores de seu campo. Por fim, discute as convergências e as divergências identificadas entre as duas críticas, de modo a averiguar o potencial de interlocução entre elas e sua relevância para a análise e a prática política, sobretudo nas sociedades periféricas.

A Teoria Crítica e o mito do esclarecimento

Conforme formulada nos anos de 1930 por Horkheimer e os membros do Instituto de Pesquisa Social, a Teoria Crítica propunha conceber a ciência e a sociedade a partir dos diagnósticos sociais e perspectivas transformadoras apresentados por Marx no século anterior. Visando um materialismo interdisciplinar – que vinculava abordagens da Psicanálise à Economia Política – os frankfurtianos não dispensavam contribuições de autores considerados estranhos ao marxismo clássico, como Nietzsche, Freud e Weber, sendo que os paradoxos apontados por este quanto ao processo de racionalização da vida foram influentes sobre a crítica da modernidade apresentada por Horkheimer e Adorno.

Foi a partir dessa interlocução heterodoxa com Marx que construíram alguns princípios teóricos e éticos centrais para uma Teoria Crítica, tais como: a crítica imanente como método de análise, a orientação para a emancipação enquanto horizonte normativo da crítica, e o comportamento crítico em relação ao conhecimento produzido no interior da sociedade capitalista, sob determinadas condições estruturais; ou seja, a noção de que a crítica social deve ser autocrítica, uma vez que o pensamento científico e filosófico sob o capitalismo não está imune às contradições inerentes à totalidade abrigada por esse modo de produção (Antonio 1981Antonio, Robert J. 1981. Immanent critique as the core of Critical Theory. The British Journal of Sociology 32 (3):330-345. https://doi.org/10.2307/589281.
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; Nobre 2008Nobre, Marcos. 2008. A Teoria Crítica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.; Silva 2018Silva, Josué P. da. 2018. Epistemologia do sul como Teoria Crítica? Nota crítica sobre a teoria da emancipação de Boaventura de Sousa Santos. In Rumos do sul: periferia e pensamento social, organizado por Mariana Chaguri e Mário Medeiros, 89-108. São Paulo: Alameda.).

Seguindo uma abordagem que remonta a Marx e Hegel, Horkheimer inicia seu texto programático pela apresentação do que seria o trabalho teórico nas ciências. Recuperando Descartes e Husserl, define teoria como “uma sinopse de proposições de um campo especializado, ligadas de tal modo entre si que se poderiam deduzir de algumas dessas teorias todas as demais”, ou então como o “saber acumulado de tal forma que permita ser este utilizado na caracterização dos fatos tão minuciosamente quanto possível” (Horkheimer 1991, 117). Segue-se que o procedimento dedutivo prevalecente na matemática devia ser estendido à totalidade das ciências. Trata-se do que, grosso modo, o autor indica como concepção tradicional de teoria.

Entretanto, para Horkheimer, o trabalho científico não pode ser pensado como independente da totalidade que o envolve. Muito embora o conceito moderno de teoria surja com uma aparente independência, afirma o autor, ele é inseparável dos progressos técnicos da sociedade burguesa, de modo que a aparente autonomia da teoria faz dela uma categoria ideológica. O trabalho científico, portanto, deve ser tratado e criticado enquanto momento da conservação da ordem existente:

Dentro da atividade social do seu trabalho, o cientista tem que conceber e classificar os fatos em ordens conceituais e dispô-los de tal forma que ele mesmo e todos os que devem utilizá-los possam dominar os fatos o mais amplamente possível. […] Nessa representação surge, portanto, não a função real da ciência nem o que a teoria significa para a existência humana, mas apenas o que significa na esfera isolada em que é feita sob as condições históricas. (Horkheimer 1991, 123).

Pautando-se pela herança da dialética marxiana, Horkheimer entende que os momentos particulares da totalidade social não podem ser compreendidos como independentes em relação ao todo; no caso, uma totalidade social cuja centralidade determinativa é dada pelo Capital. Pelo contrário, o momento singular e parcial exprime o todo em sua singularidade. Desse modo, apesar da ilusão de autonomia que o cientista carrega em relação ao seu próprio trabalho, este não deixa de ser um momento da reprodução da racionalidade instrumental inerente ao modo de produção capitalista. Assim, a aparência transcendental e plenamente racional da atividade científica estaria envolvida, na verdade, por uma irracionalidade própria do modo burguês de economia, que não é orientado conscientemente para um objetivo geral racional – apesar da racionalidade expressa na perspicácia dos indivíduos que concorrem entre si. É diante desse diagnóstico que Horkheimer procurou estabelecer uma forma de teorização que realizasse uma crítica racional da razão submetida a tais imperativos. Pode-se dizer, seguindo Antonio (1981)Antonio, Robert J. 1981. Immanent critique as the core of Critical Theory. The British Journal of Sociology 32 (3):330-345. https://doi.org/10.2307/589281.
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, que sua proposta inicial para uma teoria social crítica estende a crítica marxiana à economia política para a epistemologia moderna.

A ruptura epistemológica fulcral que abre passagem para o desenvolvimento original de Horkheimer é a revisão do modelo cartesiano, “tradicional”, de separação entre “ser” e “pensar”. Nas Ciências Sociais, por exemplo, isso se reflete na separação entre o cientista, que trata a realidade social e seus produtos como algo exterior, e o cidadão, que mostra interesse pela realidade através da intervenção sociopolítica. Embora um mesmo indivíduo seja ambos a um só tempo, a teoria tradicional postula que os dois papéis devem ser rigorosamente separados, posto que a inserção do sujeito corporificado em uma dada realidade social não se concatena necessariamente à sua atividade intelectual e, portanto, não carrega determinações sobre sua abordagem do objeto. Para o autor, o pensamento crítico deve superar essa oposição entre “consciência dos objetivos, espontaneidade e racionalidade”, de um lado, e “relações do processo de trabalho, básicas para a sociedade”, de outro (Horkheimer 1991, 132). Uma teoria que se proponha crítica do capitalismo e da própria atividade científica, de modo a impulsionar “a transformação do todo social”, deve superar o dualismo cartesiano. Este seria adequado à sociedade burguesa, igualando-se a um mecanismo natural; em contraste, “a teoria que se torna poder real, a autoconsciência dos sujeitos que promovem uma grande revolução histórica, supera a mentalidade característica deste dualismo” (Horkheimer 1991, 147).

Culmina-se, assim, em uma conclusão que revela a contradição das abordagens hegemônicas para as ciências da sociedade: a impossibilidade da autonomia do pensar está edificada precisamente sobre aquilo que a teoria tradicional concebe como fundamento da autonomia científica – a separação entre ser e pensar, práxis e teoria, corpo e alma. Entretanto, desde a perspectiva da Teoria Crítica, não bastaria uma revolução epistemológica para se alcançar o pensar autônomo; pelo contrário, a transformação da ciência e da filosofia envolveria a superação do modo de produção capitalista que se totaliza na sociedade burguesa: a libertação da ciência, e sua possibilidade de autonomia, demanda a libertação humana do Capital. Precisamente por isso a emancipação deve ser colocada como pressuposto normativo da crítica imanente no fazer teórico.

Nos anos que se seguiram, o modelo de “Teoria Tradicional e Teoria Crítica” foi desenvolvido e discutido entre os frankfurtianos e aderentes à formulação. Contudo, tal projeto não passou incólume pelo recrudescimento da barbárie nazifascista, pela fuga de muitos intelectuais judeus para os Estados Unidos (como o próprio Horkheimer e outros filósofos do Instituto de Pesquisa Social) e pelas transformações que ocorriam nos mecanismos reprodutivos do capitalismo ocidental. Com efeito, um diagnóstico alarmante foi apresentado por Horkheimer e Adorno na Dialética do esclarecimento, de 1944.

Em linhas gerais, a obra discute como o processo de racionalização da vida na modernidade dialeticamente culmina na irracionalidade da barbárie, cujo maior emblema teria sido o Holocausto. O processo histórico de esclarecimento parecia conduzir a uma libertação da humanidade em relação ao mito, mas acabou ele próprio a se mitificar: “o programa do esclarecimento era o desencantamento do mundo. Sua meta era dissolver os mitos e substituir a imaginação pelo saber” (Adorno e Horkheimer 1985Adorno, Theodor e Max Horkheimer. 1985. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar., 17); entretanto, “com o abandono do pensamento – que, em sua figura coisificada como matemática, máquina, organização, se vinga dos homens dele esquecidos – o esclarecimento abdicou de sua própria realização” (Adorno e Horkheimer 1985Adorno, Theodor e Max Horkheimer. 1985. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar., 45).

O caráter central desse novo mito é a aparente racionalidade na condução da vida humana, quando, apontam os autores, o que se verifica na modernidade é o predomínio de uma racionalidade que se reduz à adequação dos melhores meios para a realização de fins dados, potencialmente cegos e irracionais; isto é, a razão – que historicamente efetiva uma dialética entre emancipação e regressão – se encontra estruturalmente reduzida à sua função calculadora sob o capitalismo tardio, e não desdobrada em toda potencialidade libertadora que lhe é imanente. O perfil totalitário de sociedade, ao qual parecia tender o capitalismo tardio, é expresso por diversas vezes ao longo da obra através de formulações como: “não é o malogro do progresso, mas exatamente o progresso bem-sucedido que é culpado de seu próprio oposto”; “a maldição do progresso irrefreável é a irrefreável regressão” (Adorno e Horkheimer 1985Adorno, Theodor e Max Horkheimer. 1985. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar., 47). Nesse sentido, adquire centralidade para o diagnóstico a noção de reificação, enquanto processo consolidado pelas relações sociais próprias do Capital e que avança sobre as consciências individuais; processo fundado no mundo do trabalho e reproduzido, dentre outros fatores, pela chamada indústria cultural. Não são poucos os excertos do texto em que esse conceito vem à tona, explícita ou implicitamente vinculado à caracterização mítica da modernidade capitalista.

O preço da dominação não é meramente a alienação dos homens com relação aos objetos dominados; com a coisificação do espírito, as próprias relações dos homens foram enfeitiçadas, inclusive as relações de cada indivíduo consigo mesmo. Ele se reduz a um ponto nodal das reações e funções convencionais que se esperam dele como algo objetivo. O animismo havia dotado a coisa de uma alma, o industrialismo coisifica as almas. O aparelho econômico, antes mesmo do planejamento total, já provê espontaneamente as mercadorias dos valores que decidem sobre o comportamento dos homens. A partir do momento em que as mercadorias, com o fim do livre intercâmbio, perderam todas suas qualidades econômicas salvo seu carácter de fetiche, este se espalhou como uma paralisia sobre a vida da sociedade em todos os seus aspectos. (Adorno e Horkheimer 1985Adorno, Theodor e Max Horkheimer. 1985. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar., 35; grifos meus).

Em suma, Adorno e Horkheimer se dedicam a deslindar, enquanto contradição central do conhecimento esclarecido, a concomitância da pretensa substituição do mito pela racionalidade com a conversão da própria racionalidade em mito. Conduzindo um argumento dialético, os autores postulam que o esclarecimento tem origem no seio da mitologia antiga – no interior da qual podem se encontrar traços germinais da racionalidade moderna – e se desenvolve historicamente pelo seu desencantamento, sua libertação da “magia”, dos “poderes ocultos” como explicação da condição humana no mundo. Entretanto, esse saber supostamente esclarecido se faz mitologia na modernidade, da qual toma parte através da ciência positiva. O processo histórico das sociedades humanas não se submete a qualquer tipo de racionalidade última, sendo orientado por “poderes ocultos” e irracionais. Suas relações são enfeitiçadas mediante a coisificação das almas. O que conduz à outra contradição identificada na obra: precisamente no momento em que o homem se descobre autor da História, ele abdica de sua realização libertadora ao reduzir a razão à sua função calculadora, sua dimensão subjetiva, sua instrumentalidade.

Pela descrição dessa contradição fundamental, a Dialética do esclarecimento aponta que o conhecimento pela e para a dominação humana da natureza, característico do “homem civilizado”, encaminha a barbarização da própria humanidade. Ou ainda, que a irracionalidade social, sintetizada pelo Holocausto, resultou de um processo histórico que se constituiu pela racionalização da vida – uma racionalização, contudo, que sob o capitalismo tardio se unilateralizou de forma instrumental e subjetiva, que abdica da reflexão acerca dos fins últimos do agir do ponto de vista social ou objetivo (Horkheimer 2015Horkheimer, Max. 2015. Eclipse da razão. São Paulo: Editora Unesp.).

Assim, a despeito das descontinuidades que carrega em relação ao programático de Horkheimer, a Dialética do esclarecimento ratifica a crítica de que a ideologia legitimadora da teoria tradicional – que se anuncia como neutra, rigorosa e imparcial – oculta o papel sóciorreprodutivo da ciência no seio de uma divisão social do trabalho capitalista e, sobretudo, as potenciais consequências violentas e irracionais da absolutização da racionalidade instrumental e reificante. Na medida em que essa narrativa do saber moderno sobre si próprio mantém veladas suas determinações político-econômicas – seu caráter burguês derivado da aparente dissociação da produção teórica em relação à totalidade social –, e ignora sua própria tendência imanente à irracionalidade, ela é entendida pelos autores enquanto mítica.

Revisitando o “mito da modernidade”

A contundente crítica frankfurtiana ecoou de modo bastante significativo entre os modelos críticos de teoria social, ressoando ainda hoje em variados tipos de análise sociopolítica. Entretanto, não é implausível apontar traços eurocêntricos no trabalho de Adorno e Horkheimer.3 2 Quanto a isso, Edward Said (2011, 426) afirma que a Escola de Frankfurt “apesar de seus vislumbres fundamentais das relações entre a dominação, a sociedade moderna e as possibilidades de redenção por intermédio da arte enquanto crítica, silencia de maneira assombrosa no que diz respeito à teoria racista, à resistência anti-imperialista e à práxis oposicionista no império”. Por exemplo, a abordagem dos autores não deixa de corroborar uma narrativa hermética sobre o desenvolvimento da modernidade e a constituição histórica do modo de produção capitalista: o encontro colonial, as vitórias bélicas sobre o “mundo muçulmano” e as relações estabelecidas com os Outros da “moderna civilização europeia” não lhes parecem decisivos nem para a explicação do “progresso” técnico e material promovido pelo capitalismo, nem para a constituição da subjetividade moderna, nem para o aprofundamento da dominação sobre a natureza, nem para a contínua reprodução da ideologia do progresso e da civilização.

Para revisar e expandir essa crítica, de modo a torná-la mais bem capacitada para uma explicação social que transcenda um referencial europeu autopoiético, o trabalho de Enrique Dussel parece bastante valioso. Em consonância com a Teoria Crítica, o filósofo argentino acredita ser plausível a subsunção de seu “conceito emancipador racional” enquanto desenvolve uma crítica de seu “mito irracional, de justificação da violência” (Dussel 1993Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes., 7). Não se trata de defender um antimodernismo ou anti-intelectualismo que recuse, de saída, os alcances epistemológicos, científicos e técnicos da modernidade em nome de uma defesa romântica do pré-moderno. Trata-se, antes, de reconhecer o outro lado, mítico, desse desenvolvimento ambivalente da razão esclarecida e explorar suas implicações barbarizantes para além dos horizontes internos do “ocidente”.

Nessa nova leitura da dialética do esclarecimento, o elemento mítico da modernidade estaria também implicado em uma culpabilização do novo Outro que se apresenta ao sujeito “ocidental” e é por ele constituído como bárbaro ou selvagem. Assim, concebe-se uma justificação “razoável” que lhe atribui responsabilidade pela própria condição de vítima – em função daquilo que Kant (1985)Kant, Immanuel. 1985. Resposta à pergunta: que é ‘esclarecimento’? In Textos Seletos, organizado por Raimundo Vier e Emmanuel Leão, 100-117. Petrópolis: Vozes. entenderia como menoridade culpabilizável, ou que Hegel (1995)Hegel, Georg W. F. 1995. Filosofia da História. Brasília: UnB. atribuiria aos estágios infantis do desenvolvimento do Espírito. Para Dussel, os traços de uma barbárie racionalmente operacionalizada e justificada em nome de um projeto modernizador, autodeclarado como univocamente emancipador, podem ser encontrados no processo de Conquista exercido sobre as Américas no século 16. Por isso, o ano de 1492 é considerado emblema de uma inflexão histórica e filosófica.4 3 O ano de 1492, como lembra Dussel (1993), é também marcado pelo fim da Guerra de Granada, que sela a vitória da Espanha cristã sobre os nacéridas e conclui o longo processo ideologicamente denominado de Reconquista pelas nações cristãs ibéricas. Expandindo-se a crítica da modernidade para além da Europa – e lançando o olhar para o embotamento da intersubjetividade nas relações entre um ego europeu, “moderno e civilizado”, e seu alter, bárbaro, “imaturo”, “inferior” –, o autor entende o encontro colonial, mais que o advento da forma mercadoria ou do capitalismo de estado, como o locus por excelência de desencadeamento da barbárie moderna.

Ao longo de vários de seus trabalhos, Dussel (1993Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes., 2000aDussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis., 2000bDussel, Enrique. 2000b. Europa, modernidad y eurocentrismo. In La colonialidad del saber: eurocentrismo y ciencias sociales. Perspectivas latino-americanas, organizado por Edgardo Lander, 24-32. Buenos Aires: Clacso., 2010Dussel, Enrique. 2010. Meditações anticartesianas sobre a origem do antidiscurso filosófico da modernidade. In Epistemologias do sul, organizado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, 283-336. São Paulo: Cortez.) abre diálogo com expoentes da filosofia política moderna, pensadores pós-coloniais, teóricos da dependência e do Sistema-Mundo para defender uma de suas teses fulcrais: que modernidade é consequência, não causa originária, da centralização da Europa no sistema mundial. De acordo com sua explicação, tal centralização teria se constituído por fatores contingenciais que impulsionaram a expansão ultramarina em um momento em que uma Europa ainda medieval aparecia como marginal em relação às sociedades muçulmanas e chinesa; fatores estes mais ligados a circunstâncias geográficas e necessidades econômicas das nações ibéricas de então do que questões de superioridade técnica ou cultural:

A centralidade da Europa no ‘sistema-mundo’ não é fruto só da superioridade interna acumulada na Idade Média europeia sobre as outras culturas, mas também o efeito do simples fato do descobrimento, conquista, colonização e integração (subsunção) da Ameríndia (fundamentalmente), que dará à Europa a vantagem comparativa determinante sobre o mundo otomano-muçulmano, a Índia ou a China. A modernidade é fruto deste acontecimento e não a sua causa. Posteriormente, a ‘gestão’ da centralidade do ‘sistema-mundo’ permitirá que a Europa se transforme em algo como a ‘consciência reflexiva’ (a filosofia moderna) da história mundial; e muitos valores, invenções, descobertas, tecnologias, instituições políticas etc., que atribui a si mesma como sua produção exclusiva são, na realidade, efeito do deslocamento do antigo centro do estágio III do sistema inter-regional para a Europa […]. Até o capitalismo é fruto, e não causa, desta conjuntura de mundialização e centralidade europeia no ‘sistema-mundo’. (Dussel 2000aDussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis., 52-53, grifos do autor).

Neste importante passo, Dussel recupera uma tese que já havia sido defendida por Aimé Césaire (1978Césaire, Aimé. 1978. Discurso sobre o colonialismo. Lisboa: Sá da Costa., 15): de que o gesto decisivo que desencadeou o empreendimento colonial – de aventureiros, piratas, comerciantes, caçadores de tesouros – ocorre sobre um pano de fundo de “uma forma de civilização que a dado momento de sua história se vê obrigada, internamente, a alargar à escala mundial a concorrência das suas economias antagônicas”. Em princípio, segundo a perspectiva convergente entre os dois autores, a colonização não é “nem evangelização, nem empresa filantrópica, nem vontade de recuar as fronteiras da ignorância, da doença, da tirania, nem propagação de Deus, nem extensão do Direito” (Césaire 1978Césaire, Aimé. 1978. Discurso sobre o colonialismo. Lisboa: Sá da Costa., 14). Não seriam esses traços, em suma, que explicariam o suposto “pioneirismo europeu” na conquista das Américas.

A relação de causalidade que Dussel (1993Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes.; 2010Dussel, Enrique. 2010. Meditações anticartesianas sobre a origem do antidiscurso filosófico da modernidade. In Epistemologias do sul, organizado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, 283-336. São Paulo: Cortez.) constrói entre a conquista do “novo mundo” e a emergência do modo de vida e pensamento modernos é, sem dúvida, polêmica e carece de sustentação mais consistente. Ainda assim, permanece de difícil objeção o argumento de que muitas narrativas históricas e filosóficas minimizam ou invisibilizam a relevância da conquista e colonização das Américas para a emergência do moderno sistema capitalista mundial. Mais do que discutir sobre como a teoria e as análises de Wallerstein (2004)Wallerstein, Immanuel. 2004. World-systems analysis: an introduction. London: Duke University Press. podem sustentar essa primeira tese, é necessário aqui discorrer sobre a segunda tese central do autor, decorrente da outra: a de que a subjetividade e a epistemologia modernas têm na Conquista e nas relações com o Outro ameríndio e africano um momento genético fundamental.

Para desenvolver esse argumento, Dussel (1993Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes.; 2000aDussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis.; 2010Dussel, Enrique. 2010. Meditações anticartesianas sobre a origem do antidiscurso filosófico da modernidade. In Epistemologias do sul, organizado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, 283-336. São Paulo: Cortez.) diferencia duas formas de conceber a modernidade, já insinuadas até aqui. Uma primeira, eurocentrada, entenderia a modernidade como fenômeno exclusivamente europeu, resultante das peculiaridades de uma dada civilização que alcançou, através de desenvolvimentos internos, uma superioridade técnica, cultural e moral em relação às demais. Ilustrando com análises de Toulmin, Habermas e Hegel, o autor sintetiza essa concepção ao discorrer sobre como cada uma delas reconstrói os “passos” de constituição da vida moderna: em geral, começa com o Renascimento italiano, passa pela Reforma luterana, a Revolução científica no século 17 e culmina nas revoluções políticas burguesas.

Um segundo modo de compreensão recusa a ideia da modernidade como desenvolvimento autorreferente da “civilização europeia”, concebendo esta como parte de um sistema mundial; parte essa que, ao longo dos séculos 15 e 16 vai se constituindo (e se autoconcebendo) como centro. Disso decorre que tal desenvolvimento só pode ser devidamente compreendido enquanto processo relacional para com uma alteridade constituída como periferia. Ainda segundo essa análise, a história da emergência da modernidade precisaria ser recontada, discernindo-se dois momentos: um primeiro (hispânico, humanista, renascentista) em que se encontra imbricada ao sistema inter-regional centrado no Mediterrâneo, no qual a Espanha se coloca como gestora da centralidade e constrói sua hegemonia de uma cultura integral sobre seus vastos domínios; e um segundo momento (centro-europeu), em que aquela gestão do sistema mundial – antes espanhola, agora holandesa e britânica – é aprimorada conforme o conhecimento (moderno) produzido logra uma “simplificação da complexidade” capaz de expandir sua eficácia.

A confusão ideológica, de acordo com Dussel (2000a)Dussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis., consistira na redução desse segundo momento – no qual se desenvolve o paradigma filosófico moderno – a toda história da modernidade, minimizando a imprescindibilidade dos processos sociais e os saberes acumulados no momento anterior, ou seja, o fato de que a modernidade não é resultado de uma peculiaridade europeia, mas de um contínuo encontro violento com aquele construído como Outro da europeidade:

A modernidade tem origem mais de um século antes (1492) do momento em que se formaliza o paradigma – para nos exprimir como Thomas Kuhn – adequado à nova experiência […] Este novo paradigma, de acordo com as exigências de eficácia, ‘factibilidade’ tecnológica e rendimento econômico, de ‘gestão’ de um sistema-mundo enorme e em expansão, é a expressão de um necessário processo de simplificação por ‘racionalização’ do mundo da vida. (Dussel 2000aDussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis., 61).

E é aqui que se chega no mais incisivo argumento do autor, que concatena a subjetividade forjada sobre o encontro colonial com a ideia moderna de sujeito desenvolvida pelo novo paradigma filosófico; ou, nos termos de Dussel (2010)Dussel, Enrique. 2010. Meditações anticartesianas sobre a origem do antidiscurso filosófico da modernidade. In Epistemologias do sul, organizado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, 283-336. São Paulo: Cortez., a passagem do ego conquiro ao ego cogito – da subjetividade conquistadora ao sujeito cognoscente da ciência cartesiana. Após diferenciar conceitual e historicamente os momentos da “descoberta” (a constatação da existência de uma nova natureza, abrindo o horizonte ontológico europeu a uma nova realidade mundial) e da “conquista” (o estabelecimento de uma relação violenta de dominação sobre uma nova humanidade que se apresenta), Dussel (2010)Dussel, Enrique. 2010. Meditações anticartesianas sobre a origem do antidiscurso filosófico da modernidade. In Epistemologias do sul, organizado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, 283-336. São Paulo: Cortez. se dedica a descrever o tipo de subjetividade que se engendra a partir desse defrontamento da Europa com seu inteiramente Outro que se revela. Esse Outro, negado em sua alteridade, violentado, assassinado ou forçosamente subsumido à totalidade dominadora, é coisificado e instrumentalizado. Encontra-se aqui, no entendimento do autor, um momento importante da constituição do ego moderno, para o qual é imprescindível uma ideia apriorista de separação entre sujeito e objeto; ou ainda: entre o Eu e o Outro, entre o Homem dominador e a Natureza dominada.

Embora nem todos os pensadores do giro decolonial partilhem dessa genealogia da subjetividade moderna, há outros autores relevantes do campo cujos estudos ajudam a ampliar e enriquecer os estudos de Dussel. Aníbal Quijano (2005)Quijano, Aníbal. 2005. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In Pensamento crítico e movimentos sociais: diálogos para uma nova práxis, organizado por Roberto Leher e Mariana Setúbal, 9-44. São Paulo: Cortez., por exemplo, entende que a essencialidade da Conquista para a consolidação de um novo padrão mundial de poder, capitalista/moderno/eurocentrado, transcende o engendramento de uma nova subjetividade. Para além de forjar os alicerces da moderna relação sujeito-objeto, as transformações decorrentes de 1492 teriam constituído: uma nova percepção sobre o tempo e a História, cada vez mais compreendida como “algo que pode ser produzido pela ação das pessoas, por seus cálculos, suas intenções, suas decisões, sendo portanto algo passível de ser projetado e, consequentemente, de ter sentido” (Quijano 2005Quijano, Aníbal. 2005. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In Pensamento crítico e movimentos sociais: diálogos para uma nova práxis, organizado por Roberto Leher e Mariana Setúbal, 9-44. São Paulo: Cortez., 56); e uma nova intersubjetividade, ao desencadear alterações radicais na dimensão material das relações sociais, ou seja, ao impulsionar um processo de reconfiguração radical, nos três séculos seguintes, também dos âmbitos da autoridade coletiva (estado-nação), da vida sexual (família nuclear burguesa) e do trabalho (empresa capitalista). E isso se passa não apenas em uma Europa que começa a se conceber enquanto tal, mas também, e violentamente, nos povos e regiões que ela passa a subjugar.

Indo para além desse conjunto de autores, a fortuna crítica de Dussel pode prover análises ainda mais sofisticadas se tomada em diálogo com estudos que discutem as vinculações entre o encontro colonial e os processos de opressão pautados pela racialização e generificação (Goldberg 1992Goldberg, David Theo. 1992. The semantics of race. Ethnic and Racial Studies 15 (4): 543-569. https://doi.org/10.1080/01419870.1992.9993763.
https://doi.org/10.1080/01419870.1992.99...
; Hesse 2004Hesse, Barnor. 2004. Discourse on institutional racism: the genealogy of a concept. In Institutional racism in higher education, organizado por Deborah Phillips, Ian Law e Laura Turney, 131-147. Staffordshire: Trentham Books.; Lugones 2014Lugones, María. 2014. Rumo a um feminismo descolonial. Estudos Feministas 22 (3): 935-952. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2014000300013.
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; Federici 2017Federici, Silvia. 2017. Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva. São Paulo: Editora Elefante.). Em todos esses casos, não se trata de simplesmente discutir processos históricos encerrados e relações de poder já superadas; antes, uma abertura adequada da Teoria Crítica às contribuições de tais explicações sociais e perspectivas teórico-metodológicas pode significar sua maior capacitação para explicar as estruturas, os processos e as relações sociopolíticas que sustentam atualmente a sociedade existente, suas instituições de dominação, suas práticas de opressão e seus mecanismos reprodutores.

Assim, ainda que divirjam em certos pontos de suas concepções, uma crítica da modernidade fundamentada pela teorização de Dussel aponta, como Adorno e Horkheimer, que a “civilização moderna” engendra potencialidades de emancipação pelas mesmas realizações que as obstaculizam violentamente; mas também, e para além dos filósofos de Frankfurt, que uma dimensão ideológica central à reprodução desse “mito da modernidade”, e da barbárie infligida sobre os povos não europeus em nome da razão esclarecida, é a ocultação de sua origem trans-europeia, globalmente dialética, relacional. A “violência sacrificial” imposta sobre os corpos encontrados na exterioridade europeia, a barbárie colonial justificada racionalmente (“a guerra justa”), não é um problema abrangido pela crítica da Dialética do esclarecimento – obra que teria passado ao largo desse processo de dominação do Outro colonizado tanto para a construção da “Europa moderna” enquanto entidade geopolítica (e sua correspondente narrativa histórica ideológica), quanto para o processo histórico de dominação humana sobre a natureza, subjacente à “evolução” da razão esclarecida que culminou na técnica e na ciência modernas. Exprimindo a tese de modo mais simples e direto: a barbárie colonial já é a barbárie moderna, resultante da ambivalente razão esclarecida; é um passo inerente à consolidação das ideias de “modernidade”, “Ocidente” e “pensamento moderno” tal como hoje se entende esses termos.

Conclusões

A crítica do evolucionismo social e suas implicações colonialistas não é original e tampouco nova. Pode ser encontrada tanto na vasta produção antropológica desde o século 20 até os pensadores anticoloniais mais clássicos, como Césaire, Fanon e Gandhi. O próprio Dussel (2010)Dussel, Enrique. 2010. Meditações anticartesianas sobre a origem do antidiscurso filosófico da modernidade. In Epistemologias do sul, organizado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, 283-336. São Paulo: Cortez. – assim como Wallerstein (2007)Wallerstein, Immanuel. 2007. O Universalismo europeu: a retórica do poder. São Paulo: Boitempo. – enxerga esse debate já na disputa entre Sepúlveda e Las Casas a respeito da escravidão indígena e a “guerra justa”. A relevância de sua obra ao debate pós-colonial, em sentido amplo, talvez possa ser encontrada na pretensão de descolonização da crítica social moderna sem com ela romper; de denunciar as implicações do mito da modernidade esclarecida sobre as sociedades periféricas sem renunciar a um projeto, bastante frankfurtiano, de uma emancipação pela razão. Sua insistência em tomar Hegel como protótipo do pensamento eurocentrado e evolucionista – e não Condorcet ou Comte – pode ser reveladora de uma intenção em alguma medida convergente a este texto: repensar os fundamentos eurocêntricos da Teoria Crítica de modo a contribuir para sua superação, sem com isso abandonar sua proposta emancipadora ou recusar prontamente, como um “mais do mesmo” eurocêntrico, sua crítica epistemológica à ciência moderna.

Assim, pode-se sintetizar as convergências entre a crítica de Dussel ao mito da modernidade e aquela realizada na Dialética do esclarecimento pelos seguintes aspectos: (a) ambas as abordagens compreendem que a autocompreensão normativa da epistemologia moderna, assentada sobre o dualismo cartesiano, é um momento fundamental na sua subsunção aos mecanismos modernos de dominação; (b) ambas concordam também que, mediante contradições imanentes ao processo civilizador, os mesmos processos sociais que constituem novas possibilidades emancipatórias também ampliam e fortalecem mecanismos, técnicas e ideologias capazes de liberar potenciais para a barbárie; (c) a história da dominação racional da natureza é também compreendida, pelas duas teorizações, como elemento fundamental desse movimento. Assim, a crítica da dimensão mítica da modernidade tem nas duas abordagens uma argumentação que vincula uma crítica da epistemologia moderna, uma análise de processos sociopolíticos subjacentes à reificação moderna e um dissecamento da contradição entre uma ideologia civilizatória e suas implicações violentas. Essa convergência não é casual, visto que Dussel (1993Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes.; 2000aDussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis.) demonstra, em diversos momentos de sua obra, um bom domínio intelectual acerca da Escola de Frankfurt.

Ao mesmo tempo, as duas concepções carregam divergências importantes. Por um lado, Dussel não vincula profundamente sua crítica da reificação à forma-mercadoria e aos mecanismos específicos do modo de produção capitalista, sobretudo em sua política tardia;5 4 Quanto a isso, é importante ressalvar que, para Dussel, aquilo que a Escola de Frankfurt chama de “capitalismo tardio” nunca se realizou de fato nas sociedades periféricas. Mais precisamente, afirma que “ações possíveis no capitalismo tardio-central são ainda impossíveis no capitalismo periférico, não só pelo grau inferior de desenvolvimento tecnológico, mas também pelo grau de exploração (transferência estrutural de valor)” (Dussel 2000a, 265-266). ademais, não se empenha na construção de um argumento dialético em sua forma, embora proponha elevar as concepções de totalidade, mediação e contradição ao âmbito histórico-geopolítico, com auxílio da perspectiva marxista do sistema-mundo. Por outro, Adorno e Horkheimer, embora explanem a “pré-história” da reificação moderna recorrendo à Antiguidade Clássica e à compreensão weberiana de racionalização, passam ao largo da contribuição específica do encontro colonial tanto para a construção da modernidade capitalista quanto para o aprofundamento de suas contradições, dentre as quais se destaca o retorno ao mito por mediação da razão. Descuram, com isso, das implicações da barbárie especificamente moderna para além das sociedades centrais do capitalismo mundial.

Decerto, pode ser apontada em Dussel alguma precariedade em termos de fundamentação: o movimento do ego conquiro ao ego cogito é convincente, mas de difícil demonstração. A inspiração heideggeriana – que leva o autor a associar a constituição do pensamento filosófico à vida cotidiana de sua época – e sua aplicação à biografia de Descartes parecem por vezes bastante imediatas e um tanto forçadas, com o enxerto de algumas especulações para a sustentação do argumento. Ainda assim, a proposta de Dussel (1993Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes.; 2000aDussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis.; 2010Dussel, Enrique. 2010. Meditações anticartesianas sobre a origem do antidiscurso filosófico da modernidade. In Epistemologias do sul, organizado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, 283-336. São Paulo: Cortez.) para a expansão da crítica ao “mito da modernidade” – e do tipo de ciência que ela engendra – não perde totalmente sua força. Por exemplo, a análise que realiza da disputa entre Sepúlveda e Las Casas, demonstrando a presença ali de posições filosóficas bastante modernas, ajuda a sustentar sua tese de que a colonização foi o primeiro grande empreendimento da modernidade europeia (enquanto se apresenta como momento central de sua própria constituição), e que a irracionalidade da violência infligida sobre os povos ameríndios e africanos já pode ser concebida como resultante de uma contradição própria de uma razão em fase avançada de “esclarecimento”.

Em suma, tal movimento de revisão crítica do legado analítico e normativo da Escola de Frankfurt também ajuda a desvelar sua atualidade política, politológica e sociológica. Por um lado, os trabalhos mais notáveis do campo – não apenas os estudos de Horkheimer, Adorno e a Dialética do esclarecimento, como também as contribuições de Pollock (1982)Pollock, Friedrich. 1982. State capitalism: Its possibilities and limitations. In The essential Frankfurt School reader, organizado por Andrew Arato e Eike Gephardt, 71-94. New York: Continuum., Marcuse (2006)Marcuse, Herbert. 2006. Filosofia e Teoria Crítica. In Cultura e Sociedade, vol. 1, 137-160. São Paulo: Paz e Terra. e Neumann (2009)Neumann, Franz. 2009. Behemoth: structure and practice of National Socialism, 1933–1944. Chicago: Ivan R. Dee. – ainda têm muito a dizer a respeito das mediações e implicações propriamente políticas entranhadas aos mecanismos de reprodução da sociedade existente. Por outro, uma revisão desses estudos sob a ótica periférica aponta para a necessidade de sua concatenação a considerações históricas e geopolíticas ignoradas por aqueles autores, a fim de se construir uma crítica mais apurada da barbárie moderna e da reificação capitalista tendo em vista sua dimensão mundial.

Se a Teoria Crítica ajudou a demonstrar o caráter prescritivo e a normatividade reprodutiva imanente à própria teoria tradicional – argumentando que seus conceitos operam no sentido de inibir a liberdade, subsumir a contradição e reduzir a racionalidade – sua descolonização pode possibilitar uma extensão de seu potencial crítico para abarcar estruturas e processos sociais lateralizados por seus mais notáveis autores. É por esse caminho que a Teoria Crítica poderá revelar toda sua atualidade política: identificando como os mecanismos que obstaculizam a autodeterminação do gênero humano não apenas se estenderam no tempo, como também se complexificaram e foram desenvolvendo traços qualitativamente novos ao longo dos séculos que sucederam à primeira viagem de Colombo.

  • 1
    Neste trabalho, a expressão “pós-colonial” – na qualificação de estudos, teorias ou perspectivas políticas – será utilizada de forma mais abrangente do que a usual referência aos chamados Estudos Subalternos, designando o vasto campo de teorias críticas ao colonialismo ou à colonialidade que foram desenvolvidos com referência às estruturas, processos e relações sociais subjacentes à periferização do “Sul Global” e suas implicações sobre o processo de produção e de circulação do conhecimento. O termo “decolonial” se refere, mais especificamente, à perspectiva teórica desenvolvida na América Latina pelo Grupo Modernidade/Colonialidade (Ballestrin 2013Ballestrin, Luciana. 2013. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política 11: 89-117. https://doi.org/10.1590/S0103-33522013000200004.
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    , 108) nas décadas recentes a partir de um longo acúmulo intelectual do pensamento crítico latino-americano.
  • 2
    Quanto a isso, Edward Said (2011Said, Edward. 2011. Cultura e imperialismo. São Paulo: Companhia das Letras., 426) afirma que a Escola de Frankfurt “apesar de seus vislumbres fundamentais das relações entre a dominação, a sociedade moderna e as possibilidades de redenção por intermédio da arte enquanto crítica, silencia de maneira assombrosa no que diz respeito à teoria racista, à resistência anti-imperialista e à práxis oposicionista no império”.
  • 3
    O ano de 1492, como lembra Dussel (1993)Dussel, Enrique. 1993. 1492, o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade). Conferências de Frankfurt. Petrópolis: Vozes., é também marcado pelo fim da Guerra de Granada, que sela a vitória da Espanha cristã sobre os nacéridas e conclui o longo processo ideologicamente denominado de Reconquista pelas nações cristãs ibéricas.
  • 4
    Quanto a isso, é importante ressalvar que, para Dussel, aquilo que a Escola de Frankfurt chama de “capitalismo tardio” nunca se realizou de fato nas sociedades periféricas. Mais precisamente, afirma que “ações possíveis no capitalismo tardio-central são ainda impossíveis no capitalismo periférico, não só pelo grau inferior de desenvolvimento tecnológico, mas também pelo grau de exploração (transferência estrutural de valor)” (Dussel 2000aDussel, Enrique. 2000a. Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. Vozes: Petrópolis., 265-266).
  • Os textos deste artigo foram revisados pela Poá Comunicação e submetidos para validação do autor antes da publicação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    31 Jul 2021
  • Revisado
    21 Nov 2021
  • Aceito
    22 Fev 2022
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