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Um passo além? O que a abordagem interseccional pode oferecer aos estudos urbanos

A step further? What an intersectional approach can offer urban studies

¿Un paso más allá? Lo que puede ofrecer el enfoque interseccional a los estudios urbanos

Resumo:

Este artigo discute as múltiplas utilizações do conceito de interseccionalidade no interior dos estudos voltados às desigualdades e às lutas urbanas. Por meio de uma revisão preliminar da literatura, busca-se compreender em que medida o conceito se apresenta como um plano de referência profícuo de problematização das desigualdades urbanas, para além da mera descrição ou diagnóstico da realidade. Conclui-se que, na discussão das cidades, a categoria interseccionalidade enfrenta dilemas semelhantes aos apontados nos estudos interseccionais. Enquanto práxis crítica depara-se com o risco da sobrevalorização das identidades sociais. Enquanto categoria analítica, com pretensões de orientar políticas públicas, enfrenta o desafio de fornecer elementos para sua realização. Por se tratar de tema ainda pouco explorado, o artigo levanta algumas questões que podem ser objeto de pesquisas futuras.

Palavras-chave:
Estudos Urbanos; Interseccionalidade; Políticas públicas; Práxis

Abstract:

This article discusses the multiple uses of the concept of intersectionality in studies focused on urban inequalities and struggles. By reviewing the literature, I intend to understand to what extent the concept of intersectionality is a useful reference point for problematizing urban inequalities, going beyond its description or diagnosis. I conclude that when applied to the analysis of cities, intersectionality faces dilemmas similar to the application of intersectional analysis in other areas of study. First, as a critical praxis, faces the risk of overvaluation of social identities. Second, as an analytical category, it is challenging to provide elements that can guide public policies. As this field is underexplored, this article raises questions that may guide future research.

Keywords:
Urban studies; Intersectionality; Public Policies; Praxis

Resumen:

Este artículo discute los múltiples usos del concepto de interseccionalidad en los estudios dirigidos a las desigualdades y luchas urbanas. A través de revisión de la literatura, buscamos comprender cómo el concepto se presenta como um plano de fondo proficuo para problematizar las desigualdades urbanas más allá de la mera descripción o del diagnóstico de la realidad. Concluimos que, en el debate de las ciudades, la categoría de interseccionalidad enfrenta dilemas similares a los señalados en los estudios interseccionales. El primero, como praxis crítica, se enfrenta al riesgo de sobrevalorar las identidades sociales. El segundo, como categoría analítica con intenciones de orientar las políticas públicas, se refiere al desafío de brindar elementos para su realización. Considerando que se trata de una temática aún poco estudiada, el artículo plantea cuestionamientos que pueden ser objeto de investigaciones futuras.

Palabras clave:
Estudios urbanos; Interseccionalidad; Políticas públicas; Práxis

Introdução

[…] qualquer análise que tenha a ambição de estabelecer relações entre os limites das democracias contemporâneas e as desigualdades sociais precisa incorporar como problema as hierarquias que se constituem na convergência entre os três eixos [gênero, raça, classe]. (Biroli e Miguel 2015Biroli, Flávia e Luis Felipe Miguel. 2015. Gênero, raça, classe: opressões cruzadas e convergências na reprodução das desigualdades. Mediações 20 (2): 97-128. https://doi.org/10.5433/2176-6665.2015v20n2p27.
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, 29).

Certa tradição dos estudos urbanos brasileiros, pelo menos desde os anos setenta, deteve-se fortemente na crítica das desigualdades sociais causadas pelos efeitos do capitalismo periférico na vida da classe trabalhadora (Kowarick 1992Kowarick, Lúcio. 1992. A espoliação urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra.; Paoli 1991Paoli, Maria Célia. 1991. Movimentos sociais, cidadania, espaço público: perspectivas brasileiras para os anos 90. Revista Crítica de Ciências Sociais 33: 115-133.). Mais recentemente, observamos a crescente preocupação em problematizar outras formas de opressão, para além daquelas descritas no registro da classe social. No bojo de problematizações sociais, políticas e acadêmicas crescentes, no que se refere às relações étnico-raciais e de gênero no país, os estudos urbanos passaram também a interpelar e serem interpelados por tais fenômenos, confrontando-se, assim, com outros eixos de opressão, para além daquele representado pelo capitalismo, e voltando-se, cada vez mais, para a problematização do caráter sexista e racista de (re)produção das cidades.

Em termos da problematização teórica voltada à discussão das desigualdades sociais, o conceito de interseccionalidade tem ganhado relevância acadêmica e política crescente nas discussões. Grosso modo, tal conceito propõe evidenciar que as desigualdades são produzidas em múltiplas esferas que se entrecruzam baseadas nos marcadores de classe, raça, gênero, sexualidade, dentre outros. Nesse sentido, mulheres, grupos sociais racializados e sexualidades não hegemônicas, por exemplo, vivem formas de opressão e desigualdades não descritas pela referência voltada à desigualdade econômica. O conceito possuiria, portanto, a capacidade de ampliar a compreensão e o entendimento das desigualdades sociais.

Nesse sentido, este artigo2 2 A pesquisa de pós-doutorado que origina esse texto contou com financiamento da Capes. A discussão realizada se beneficia do diálogo com o grupo de pesquisa Política, Políticas Públicas e Ação Coletiva (3PAC/UFABC), bem como do período como pesquisadora associada ao Afro-Latin American Research Institute (Alari/Harvard University). Registro meus agradecimentos, muito especialmente, aos supervisores da pesquisa, Prof. Dr. Sidney Jard da Silva (PCHS/UFABC) e Prof. Dr. Francisco de Assis Comaru (PPGPGT/UFABC). propõe discutir os usos e alcances do conceito de interseccionalidade no interior dos estudos urbanos. Partimos da seguinte questão: nos termos apresentados pelos estudos mais recentes, em que medida a interseccionalidade consiste em categoria de referência capaz não só de evidenciar e problematizar as desigualdades urbanas, mas de oferecer elementos profícuos que permitam compreender e interpelar os mecanismos e relações de poder presentes em sua base?

Visando responder essa problematização, o artigo divide-se em três partes. Na primeira, busca-se problematizar as discussões consolidadas nos estudos urbanos nacionais, suas potencialidades críticas e suas insuficiências, em termos da discussão dos marcadores de gênero e raça. Na segunda, apresenta-se uma breve contextualização dos estudos interseccionais, a fim de recuperar alguns elementos centrais que possam guiar nossa discussão específica sobre o urbano. Na terceira, analisa-se as discussões das desigualdades urbanas em termos interseccionais.

Desigualdades urbanas: classe, raça e gênero

Em fins dos anos 1970, o estado autoritário brasileiro acompanhava com preocupação o crescimento dos enfrentamentos sociais contra o regime político vigente, contra a exploração do trabalho vivido nas fábricas, e a presença de movimentos de luta por moradia nos bairros populares (Sader 1988Sader, Eder. 1988. Quando novos personagens entraram em cena: experiências, falas e lutas dos trabalhadores da Grande São Paulo, 1970-1980. Rio de Janeiro: Paz e Terra.).

Uma tradição de estudos, situados especialmente na sociologia paulista, e voltados à discussão das desigualdades e dos movimentos sociais urbanos, ganhou relevância e destaque na leitura crítica do processo de urbanização do País. As interpretações das mais diversas obras problematizavam o processo de urbanização, abordando, a um só tempo, as condições de desenvolvimento do capitalismo periférico, das ausências do estado, da face autoritária das políticas públicas, e da sua incapacidade de produzir as mínimas condições de existência para as classes populares. Ao mesmo tempo, esses estudos articulavam questões, já durante os processos que levaram à redemocratização, sobre projeções de horizontes políticos e sociais possíveis para o País (Paoli 1991Paoli, Maria Célia. 1991. Movimentos sociais, cidadania, espaço público: perspectivas brasileiras para os anos 90. Revista Crítica de Ciências Sociais 33: 115-133.).

Ao fazer o balanço crítico desse debate, a socióloga Vera da Silva Telles (2006)Telles, Vera da S. 2006. Debates: a cidade como questão. In Nas tramas da cidade: trajetórias urbanas e seus territórios, organizado por Vera da Silva Telles e Robert Cabanes, 35-64. São Paulo: Associação Editorial Humanitas. apontou que estava em questão não somente a crítica do processo de urbanização, mas a interpelação do próprio estado como agente sobre o qual se projetavam demandas e expectativas, como a ampliação dos direitos e da cidadania. No entrecruzamento entre estado, economia, trabalho e urbanização plasmava-se, aponta a autora, uma “nova qualidade do conflito de classes”, que tinha nas cidades seu principal cenário (Telles 2006Telles, Vera da S. 2006. Debates: a cidade como questão. In Nas tramas da cidade: trajetórias urbanas e seus territórios, organizado por Vera da Silva Telles e Robert Cabanes, 35-64. São Paulo: Associação Editorial Humanitas., 35).

Nesse tensionamento, que se volta ao estado na exigência de garantia de direitos, se situam as discussões sobre movimentos sociais urbanos, voltados ao enfrentamento das condições espoliativas em que se desdobrava a urbanização do País, fazendo das lutas urbanas nas periferias a contraface dos enfrentamentos ocorridos nas relações de trabalho, sobretudo nas fábricas. Assim, a narrativa crítica do processo de urbanização figurava as classes como sujeitos políticos, interpelava o estado autoritário, e problematizava as condições em que se desenvolvia o capitalismo brasileiro.

Mais recentemente, no bojo das discussões crescentes sobre os mecanismos de estratificação social, tanto o campo dos estudos urbanos quanto aquele dedicado às formas de ação coletiva, são interpelados não somente em termos das exclusões e opressões que se operam sobre diferentes sujeitos sociais – para além do seu lugar de classe –, mas também em relação às questões de gênero e de identidade racial. Sob a categoria geral e homogeneizante de classe trabalhadora, estariam subsumidos conteúdos de gênero e de raça, produzindo apagamentos da história desses grupos, bem como desconsiderando experiências diversas, que apontariam para outras ordens de relações de poder e opressão.

Em relação à categoria “raça”, Stela Paterniani (2019)Paterniani, Stella Zagatto. 2019. São Paulo cidade negra: branquidade e afrofuturismo a partir de lutas por moradia. Tese em Antropologia Social, Universidade de Brasília (UnB), Brasília, Brasil. ajuda a montar a questão de forma provocadora. No seu trabalho, intitulado São Paulo: cidade negra, a autora tece críticas voltadas à tradição de estudos urbanos anteriormente mencionada, e problematiza o quanto a narrativa da urbanização, orientada pela leitura econômica de exclusão social da classe trabalhadora nas cidades, omite seu elemento racial e, principalmente, a lógica racista que opera a produção das cidades.

Para a autora, a ausência do léxico racial na narrativa da urbanização omitiu o que ela chama de processos de banimento (e disciplinamento) racial promovido pelas políticas públicas urbanas (Paterniani 2019Paterniani, Stella Zagatto. 2019. São Paulo cidade negra: branquidade e afrofuturismo a partir de lutas por moradia. Tese em Antropologia Social, Universidade de Brasília (UnB), Brasília, Brasil.). Práticas políticas, como as remoções de cortiços no início do século 20, espaços de moradia da classe trabalhadora e negra, buscaram excluir das áreas centrais não só a moradia negra, mas com ela, ou para além dela, seus modos de vida na cidade (samba, festas, práticas religiosas e culturais de matriz africana). Assim, a narrativa da urbanização, ao olhar apenas para a segregação das classes sociais, se apresentaria como construção ideológica de uma classe trabalhadora ideal, homogênea e ausente de marcadores raciais.

É importante enfatizar que o campo dos estudos urbanos, atualmente, dedica-se em indicar o tratamento insuficiente da questão racial.3 3 Cumpre mencionar a importância de estudos mais antigos que chamaram a atenção para a questão racial nas cidades, como Bastide e Fernandes (1959) e Telles (1992). O que se afirma aqui, seguindo Paterniani (2019) é que a partir dos anos 1970 estabelece-se uma tradição hegemônica de discussão das desigualdades urbanas, com foco na classe social. A crítica subjacente aponta que o referencial utilizado para ler e interpretar as desigualdades ainda reside, fundamentalmente, na discussão de classes sociais. Como afirma Oliveira (2013Oliveira, Reinaldo José de, org. 2013. A cidade e o negro no Brasil: cidadania e território. São Paulo: Alameda., 45), “é preciso problematizar que a questão das desigualdades e da marginalização da população negra no decorrer do século 20 e no momento atual não se resume à pobreza”, o que implica problematizar os processos múltiplos de produção de desigualdades, interpelando diretamente o racismo estrutural brasileiro (Almeida 2019Almeida, Silvio Luiz de. 2019. Racismo estrutural. São Paulo: Pólen.).

Barone e Rios (2018Barone, Ana e Flavia Rios, orgs. 2018. Negros nas cidades brasileiras (1890-1950). São Paulo: Intermeios.) recolocam o debate sobre a questão racial e a cidade, identificando nesta um desafio para o pensamento social. Devido aos limites das formulações epistemológicas sobre a cidade, centradas no recorte de classes, o pensamento social teria um duplo desafio, afirmam as autoras: por um lado, o campo de estudos étnico-raciais precisa considerar a dimensão do território e do urbano em sua problematização das desigualdades raciais e, por outro, a problematização crítica das cidades requer a incorporação de outros eixos de produção de desigualdades, tal como o racismo. Ampliando o campo de preocupação das autoras, poderíamos estender tais reflexões igualmente para as questões relativas ao gênero.

Boa parte da literatura nacional que combina a discussão de gênero (mais propriamente o estudo das mulheres) e a cidade situa-se no interior da discussão sobre movimentos sociais urbanos, desde o período da redemocratização. Parte dos estudos discute o protagonismo das mulheres nas lutas que se organizam em torno de demandas como moradia e serviços públicos de saúde e educação (Gohn 2007Gohn, Maria da Glória. 2007. Mulheres: atrizes dos movimentos sociais. Relações político-culturais e debate teórico no processo democrático. Política e Sociedade 6 (11): 41-70. https://doi.org/10.5007/%25x.
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). De certa forma, tais lutas foram compreendidas como correlatas daquelas que ocorriam na esfera da produção (greves e organizações sindicais), como formas de enfrentamento dos mecanismos de exploração da classe trabalhadora.

Mais recentemente, uma série de estudos recoloca a discussão das desigualdades e das lutas urbanas a partir da ótica de gênero, incluindo a questão das políticas públicas (Ferreira 2008Ferreira, Regina Fátima C. F. 2008. Plataforma feminista da reforma urbana: do que estamos falando? In Ser, fazer e acontecer: mulheres e o direito à cidade, organizado por Taciana Gouveia, 113-139. Recife: SOS Corpo - Instituto Feminista para a Democracia.). Um dos campos de problematização teórica referente à questão situa-se no feminismo marxista, que aponta para o lugar vivido pelas mulheres na divisão sexual do trabalho (sobre as quais recaem os serviços de cuidados) e a centralidade da esfera da reprodução (realizada na esfera doméstica, de forma não remunerada, pelas mulheres) no capitalismo. A partir dessas duas dimensões, evidencia-se a especificidade das opressões de gênero no sistema capitalista e a importância das lutas urbanas por serviços e equipamentos públicos como uma dimensão da luta feminista, uma vez que, na divisão sexual do trabalho, recaem mais fortemente sobre as mulheres as ausências e a precariedade desses serviços (Ferreira 2008Ferreira, Regina Fátima C. F. 2008. Plataforma feminista da reforma urbana: do que estamos falando? In Ser, fazer e acontecer: mulheres e o direito à cidade, organizado por Taciana Gouveia, 113-139. Recife: SOS Corpo - Instituto Feminista para a Democracia.).

Podemos assinalar que uma dimensão fundamental do debate aponta para as conexões inextrincáveis entre as dimensões do privado (lugar atribuído às mulheres na divisão sexual do trabalho) e do público, onde a questão urbana ganha destaque. Assim, por exemplo, é que a questão da violência doméstica pode ser problematizada em termos de políticas públicas urbanas, como a oferta de políticas habitacionais para as mulheres que vivem essa situação.4 4 Gago, Verónica e Luci Cavallero. 2020. Dívida, moradia e trabalho: uma agenda feminista para o pós-pandemia. Elefante Editora, 25 maio 2020. Acessado em 22 fev. 2021, https://elefanteeditora.com.br/divida-moradia-e-trabalho-uma-agenda-feminista-para-o-pos-pandemia.

Diante disso, podemos destacar que certo campo hegemônico da problematização das desigualdades urbanas se constituiu referido às classes sociais e às iniquidades geradas pelo capitalismo. Mais recentemente, aponta-se para as limitações dessa abordagem, trazendo para o debate questões referentes a gênero e raça, e aos processos sociais que ocasionam exclusões e injustiças referidas a esses sujeitos em suas condições específicas e concretas, não subsumidas em uma classe trabalhadora entendida de forma universal e abstrata. A partir dos desafios que essa discussão recente apresenta, e que certamente só podem ser respondidos em muitas camadas de reflexão (exigindo pesquisas de maior amplitude), proponho um exercício preliminar de análise. O referencial teórico da interseccionalidade, ao combinar as múltiplas dimensões produtoras de desigualdades, notadamente aquelas referentes à classe, à raça e a gênero, oferece um referencial profícuo para a problematização das desigualdades urbanas.

Estudos interseccionais: usos e possibilidades

A produção teórica sobre interseccionalidade é abundante, não apenas na literatura estrangeira, mas também envolvendo a literatura nacional. Importante mencionar que o conceito se incorporou gradualmente ao universo acadêmico estadunidense a partir do texto clássico de Kimberlé Crenshaw no início dos anos 1990. A publicação da obra Mapping the margins: intersectionality, identity politics and violence against woman of color (Crenshaw 1991Crenshaw, Kimberlé W. 1991. Mapping the margins: intersectionality, identity politics, and violence against women of color. Stanford Law Review 43 (6): 1241-1299. https://doi.org/10.2307/1229039
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) apontava para os limites da luta feminista, ao desconsiderar as questões raciais, e da luta antirracista, ao ignorar questões de gênero. Vale a pena lembrar que o conceito de interseccionalidade tem raízes no ativismo das feministas negras dos EUA, com forte atuação nos anos 1960 e 1970 (Collins 2017Collins, Patrícia H. 2017. Se perdeu na tradução? Feminismo negro, interseccionalidade e política emancipatória. Parágrafo 5 (1): 6-17.), tornando, assim, o conceito indissociável do campo de luta política.

Em meio à vasta produção dedicada à discussão sobre interseccionalidade, destaca-se a obra da filósofa norte-americana Patricia Hill Collins. De acordo com Collins (2015)Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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, a larga propagação do conceito, e seus diversos usos em campos distintos (tanto acadêmicos, por diferentes disciplinas, quanto práticos, por diferentes sujeitos e coletivos sociais), tornam hoje difícil uma definição categórica, percebendo-se os riscos de ambiguidade, sua forte polissemia, e, mais importante, os riscos de perda de sua potência crítica. A autora defende, contudo, que existe um consenso mínimo em torno do conceito, que poderia se expressar da seguinte forma:

O termo interseccionalidade se refere ao entendimento crítico de que raça, classe, gênero, sexualidade, etnicidade, nação, habilidade e idade operam não como unidades, entidades mutuamente exclusivas, mas como fenômeno reciprocamente construído que, em contrapartida, molda desigualdades sociais complexas. (Collins 2015Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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, 7, tradução nossa).

A despeito da polissemia do conceito, afirma a autora, um caminho para fazer avançar a discussão seria menos sua definição conclusiva e mais a possibilidade de pensá-la como um ponto de partida para a investigação (Collins 2015Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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). Desse modo, a autora identifica três campos de preocupação interdependentes, dentro daquilo que ela apresenta como um projeto de conhecimento interseccional, são eles: a interseccionalidade entendida como um campo de estudos, como uma estratégia analítica ou como uma práxis crítica.

Para Collins (2015)Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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, a interseccionalidade entendida como campo de estudos, com sua história, seus temas, debates e fronteiras, se caracteriza pela passagem que o conceito faz dos movimentos sociais para o universo acadêmico, em meados dos anos 2000, nos Estados Unidos. Tomado nesse sentido, “examinar o conteúdo e os temas que caracterizam o campo constitui a principal tarefa” (Collins 2015Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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, 5) do projeto de conhecimento interseccional. Paradoxalmente, lembra a autora, a reconhecida aceitação dentro do universo acadêmico consiste também em risco de perda da potência crítica que caracterizou seu surgimento no seio do movimento feminista negro.

Em relação à estratégia analítica, capaz de oferecer novos ângulos de visão sobre os fenômenos sociais relacionados à desigualdade, implica reconhecer alguns pressupostos básicos na realização da análise. Trata-se de assumir que os diferentes marcadores de desigualdades (raça, classe, gênero, sexualidade etc) são mais bem compreendidos se analisados em termos relacionais, mais do que tomados isoladamente. Isso significa, igualmente, perceber que os diferentes sistemas de poder que moldam tais categorias (como o racismo e o sexismo, por exemplo) estão inter-relacionados. Sob essa lente analítica, entende-se que os lugares ocupados por indivíduos e grupos no interior de sistemas de poder que se entrecruzam moldam experiências distintas para tais sujeitos, as quais variam no tempo e no espaço (Collins 2015Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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).

Por fim, Collins (2015)Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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percebe a interseccionalidade como uma praxis crítica, mobilizada por sujeitos que estão diretamente confrontados (enquanto ativistas ou profissionais de áreas diversas) com as desigualdades e seu enfrentamento. Para esses, mais do que uma ferramenta para ampliar a compreensão dos problemas sociais, a interseccionalidade ilumina o trabalho de promoção da justiça social. O conhecimento produzido pela atuação ou pela vivência dos múltiplos eixos de opressão é mobilizado estrategicamente como prática de enfrentamento, por organizações populares e comunitárias. Uma das implicações desse entendimento alargado de interseccionalidade incide na interconexão entre teoria e ação, podendo estar dentro e fora da academia e, inclusive, envolvendo ambas (Collins e Bilge 2021Collins, Patrícia H. e Sirma Bilge. 2021. Interseccionalidade. São Paulo: Boitempo.).

No que concerne às discussões realizadas no Brasil, o texto seminal de Lélia Gonzales, Racismo e sexismo na cultura brasileira (Gonzales 2020Gonzales, Lélia. 2020. Racismo e sexismo na cultura brasileira. In Por um feminismo afro-latino americano: ensaios, intervenções e diálogos Lélia Gonzales, organizado por Flavia Rios e Márcia Lima, 75-93. Rio de Janeiro: Zahar. [1983]), já apontava, no início dos anos 1980, a impossibilidade de compreender a estruturação das desigualdades no país sem que se considerasse o entrecruzamento entre gênero, raça e classe. Mais recentemente, crescem os estudos que lançam mão da categoria da interseccionalidade para abordar tal questão. São estudos que levam em consideração a conceitualização e os usos acadêmicos (Biroli e Miguel 2015Biroli, Flávia e Luis Felipe Miguel. 2015. Gênero, raça, classe: opressões cruzadas e convergências na reprodução das desigualdades. Mediações 20 (2): 97-128. https://doi.org/10.5433/2176-6665.2015v20n2p27.
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; Moutinho 2014Moutinho, Laura. 2014. Diferenças e desigualdades negociadas: raça, sexualidade e gênero em produções acadêmicas recentes. Cadernos Pagu 42: 201-248. https://doi.org/10.1590/0104-8333201400420201.
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) e extra-acadêmicos da interseccionalidade. Além disso, apontam os limites e os fatores críticos do uso da categoria (Henning 2015Henning, Carlos Eduardo. 2015. Interseccionalidade e pensamento feminista: as contribuições históricas e os debates contemporâneos acerca do entrelaçamento de marcadores sociais da diferença. Mediações 20 (2): 97-128. https://doi.org/10.5433/2176-6665.2015v20n2p97.
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), chegando a criticar sua imprecisão e polissemia, que poderia levar a generalizações que esvaziam o seu sentido.

Não obstante a polissemia do conceito, pode-se afirmar que a interseccionalidade já se estabeleceu no debate que envolve as questões das desigualdades sociais no Brasil. Entendendo, pois, o potencial analítico e crítico da interseccionalidade, propõe-se discutir as formas como a categoria vem sendo mobilizada no campo específico dos estudos urbanos, ou aqueles detidos sobre as ações coletivas nas cidades. Interessa entender como a discussão ocorre nesse campo e, assim, perceber quais direções se apresentam nos estudos urbanos atualmente, ao serem confrontados com a exigência de responder aos mais diferentes eixos de opressão social.

Cidade interseccional?

A partir de um levantamento preliminar da bibliografia referente ao tema, nota-se que a discussão articulada entre cidade e intersecionalidade aparece na literatura nacional ainda de forma incipiente. A pesquisa não foi realizada a partir do método da revisão sistemática e exaustiva em bancos de dados, o que, certamente, pode ser um exercício interessante para investigações futuras. De todo modo, a consulta bibliográfica aprofundada sobre o tema, realizada em fontes de dados com o Scielo e o banco de teses da CAPES, apontou para algumas evidências importantes no que diz respeito ao tratamento das desigualdades urbanas a partir da ótica interseccional.

Em um artigo conciso para o site Observatório das Metrópoles, Correia, Coelho e Salles5 5 Correia, Alice, Carolina Coelho e Lívia Salles. 2018. Cidade interseccional: o direito à cidade nas perspectivas de gênero e raça. Observatório das metrópoles, 11 de outubro de 2018. Acessado em 22 fev. 2021, https://www.observatoriodasmetropoles.net.br/o-direito-cidade-nas-perspectivas-de-genero-e-raca. utilizam o termo em forma de pergunta, “cidade interseccional?”, e apontam para o fato de que “numa sociedade que além de desigual é profundamente machista, racista e homofóbica”, os diferentes grupos sociais, como mulheres e homens negros e brancos, homossexuais, jovens etc. “têm diferentes possibilidades de apropriação dos espaços públicos, dos aparatos públicos e das cidades”.

No entanto, o mais comum nos estudos sobre cidades tem sido tratar dos diferentes eixos de opressão social separadamente, chamando atenção para a necessidade de se pensar cidade e raça, cidade e gênero, tal qual discutido anteriormente.

Em função da incipiente presença na literatura nacional, e visando preencher essa lacuna, proponho mobilizar o conceito de interseccionalidade em conjunto com a literatura estrangeira, não como representantes de discussões distintas, mas como reveladoras de abordagens possíveis de compreensão da vida nas cidades brasileiras. A proposta reside em entender, ao articular cidade e interseccionalidade, do que estamos tratando, em que termos se coloca a questão das desigualdades, e quais potencialidades emergem desse tipo de abordagem. Veremos que dois elementos se destacam nessa literatura: o primeiro diz respeito à interseccionalidade como uma ferramenta analítica, com ênfase na diversidade de experiências que caracterizam os diferentes grupos sociais subalternizados, em função de seu lugar no entrecruzamento de relações de poder. Dessa abordagem, decorre a cobrança frequente da necessidade de políticas públicas com ênfase em tais experiências. O segundo elemento se refere à interseccionalidade mobilizada enquanto práxis crítica, por diferentes grupos sociais subalternizados, que constroem enfrentamentos e resistências por meio da afirmação de identidades sociais.

Angeles e Roberton (2020Angeles, Leonora C. e Jennifer Roberton. 2020. Empathy and inclusive public safety in the city: examining LGBTQ2+ voices and experiences of intersectional discrimination. Women's Studies International Forum 78: 1-12. https://doi.org/10.1016/j.wsif.2019.102313.
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), em pesquisa empírica realizada com membros da população LGBTQIA+ na cidade de Toronto (Canadá), chamam atenção para aquilo que nomeiam como “experiência interseccional da discriminação” que atinge esses grupos. Afirmam como certos grupos sociais marginalizados, grupos racializados ou sexualidades desviantes, experimentam a sensação de insegurança de viver e de circular na cidade, diferentemente dos grupos sociais hegemônicos. A população LGBTQIA+ está mais exposta a riscos de agressão e de morte na cidade, inclusive pelo preconceito de agentes públicos, expresso na omissão de socorro de agentes policiais, por exemplo.

Argumento semelhante é apresentado por Irazábal e Huerta (2016Irazábal, Clara e Claudia Huerta. 2016. Intersectionality and planning at the margins: LGBTQ youth of color in New York. Gender, Place & Culture 23 (5): 714-732. https://doi.org/10.1080/0966369X.2015.1058755.
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), ao tratarem da juventude negra LGBTQIA+ em Nova Iorque (EUA). A situação de desabrigo, causada pela não aceitação pela família e a consequente saída de suas casas, expõe esses sujeitos a uma representação desproporcional entre pessoas sem teto, condição muitas vezes invisibilizada na menção simples aos números. A experiência da cidade é atravessada, ainda, pelo racismo e preconceito nos espaços públicos, uma vez que a sexualidade dissidente tende a ser mais tolerada na classe média branca, observando-se uma racialização da sexualidade no caso dos jovens negros, relacionada a maior intolerância.

Os estudos de Angeles e Roberton (2020Angeles, Leonora C. e Jennifer Roberton. 2020. Empathy and inclusive public safety in the city: examining LGBTQ2+ voices and experiences of intersectional discrimination. Women's Studies International Forum 78: 1-12. https://doi.org/10.1016/j.wsif.2019.102313.
https://doi.org/10.1016/j.wsif.2019.1023...
) e Irazábal e Huerta (2016Irazábal, Clara e Claudia Huerta. 2016. Intersectionality and planning at the margins: LGBTQ youth of color in New York. Gender, Place & Culture 23 (5): 714-732. https://doi.org/10.1080/0966369X.2015.1058755.
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) chegam a conclusões semelhantes: a necessidade de as políticas públicas atentarem para as “condições e necessidades únicas” (Irazábal e Huerta 2016Irazábal, Clara e Claudia Huerta. 2016. Intersectionality and planning at the margins: LGBTQ youth of color in New York. Gender, Place & Culture 23 (5): 714-732. https://doi.org/10.1080/0966369X.2015.1058755.
https://doi.org/10.1080/0966369X.2015.10...
, 714) desses segmentos sociais e a “incorporação de uma perspectiva interseccional na elaboração das políticas” (Angeles e Roberton 2020Angeles, Leonora C. e Jennifer Roberton. 2020. Empathy and inclusive public safety in the city: examining LGBTQ2+ voices and experiences of intersectional discrimination. Women's Studies International Forum 78: 1-12. https://doi.org/10.1016/j.wsif.2019.102313.
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, 10). No cerne da elaboração de tais políticas estaria a atenção voltada para as experiências concretas dos sujeitos nas cidades.

A interseccionalidade coloca a experiência vivida por sujeitos concretos como elemento central da análise, em contraste com os entendimentos que discutem os direitos em função de um sujeito universal, o cidadão. Análises como a de Tankel (2011)Tankel, Yardena. 2011. Reframing ‘safe cities for women’: feminist articulations in Recife. Development 54 (3): 352-357. https://doi.org/10.1057/dev.2011.61.
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e de Lacey et al. (2013)Lacey, Anita, Rebecca Miller, Dory Reeves e Yardena Tankel. 2013. From gender mainstreaming to intersectionality: advances in achieving inclusive and safe cities. In Building inclusive cities: women's safety and the right to the city, organizado por Carolyn Whitzman, Crystal Legacy, Caroline Andrew, Fran Klodawsky, Margaret Shaw e Kalpana Viswanath, 143-161. Nova Yorque: Routledge. abrangem, por exemplo, a diversidade de experiências que homens e mulheres têm da cidade, em termos das condições de segurança e de preservação da vida. Ainda que geralmente discutida em referência aos homens, a violência vivida no espaço público também atinge as mulheres (Tankel 2011Tankel, Yardena. 2011. Reframing ‘safe cities for women’: feminist articulations in Recife. Development 54 (3): 352-357. https://doi.org/10.1057/dev.2011.61.
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), elemento menos tratado. A potencialidade da abordagem interseccional estaria tanto em mostrar essa vulnerabilidade quanto em atentar para as relações de poder que a produzem: no caso, o sexismo e a opressão de gênero, o que levaria ao entendimento da relação entre a violência vivida dentro e fora de casa pelas mulheres, em uma sociedade patriarcal e machista.

O argumento das relações patriarcais para entender a experiência que as mulheres têm da cidade é mobilizado por Tovi Fenster (2005)Fenster, Tovi. 2005. The right to the gendered city: different formations of belonging in everyday life. Journal of Gender Studies 14 (3): 217-231. https://doi.org/10.1080/09589230500264109.
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. A autora afirma que tais relações moldam os espaços urbanos, tornando, por exemplo, certos espaços públicos perigosos ou interditos para as mulheres e produzindo exclusões genderizadas, cujo enfrentamento passa por maior participação e representação institucional para as mulheres. Tal abordagem permitiria alargar o próprio sentido da cidadania e do direito à cidade, que não poderiam prescindir da consideração da diversidade. No lugar do sujeito entendido de forma universalista, emergiria o entendimento de sujeitos concretos e suas experiências. No caso, o sujeito genderizado.

Em síntese, essas discussões apontam para a importância de considerar as experiências reais dos sujeitos de direitos e sua potencialidade para informar políticas públicas. Ao mesmo tempo, colocam em questão as relações de poder que moldam tais experiências, de forma complexa e multifacetada.

Pode-se afirmar que, embora a interseccionalidade esteja consolidada como uma categoria importante na discussão das desigualdades sociais, seu uso no interior dos estudos urbanos parece ser ainda incipiente. Tal como aparece no plano internacional, a discussão no Brasil também enfatiza a diversidade de experiências urbanas pelos diferentes grupos sociais, e suas implicações no usufruto dos direitos sócio-territoriais.

Parte dos estudos que envolvem a questão da interseccionalidade olha para o uso que os coletivos feministas periféricos fazem dessa ferramenta (Medeiros 2019Medeiros, Jonas. 2019. Do “feminismo popular” ao “feminismo periférico”: mudanças estruturais em contrapúblicos da zona leste de São Paulo. Revista Novos Rumos sociológicos 7 (11): 300-335. https://doi.org/10.15210/norus.v7i11.17052.
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; Rios e Maciel 2018Barone, Ana e Flavia Rios, orgs. 2018. Negros nas cidades brasileiras (1890-1950). São Paulo: Intermeios.; Rios, Perez, Ricoldi 2018Barone, Ana e Flavia Rios, orgs. 2018. Negros nas cidades brasileiras (1890-1950). São Paulo: Intermeios.), em uma tentativa de aproximação daquilo que Collins (2021Collins, Patrícia H. e Sirma Bilge. 2021. Interseccionalidade. São Paulo: Boitempo.) chama de “interseccionalidade como uma práxis crítica”, mobilizada por grupos sociais fora da academia, para fazer frente às desigualdades vividas. Ao analisar essa literatura três elementos se destacam e inter-relacionam: experiência, territorialidade e identidade.

Medeiros (2019)Medeiros, Jonas. 2019. Do “feminismo popular” ao “feminismo periférico”: mudanças estruturais em contrapúblicos da zona leste de São Paulo. Revista Novos Rumos sociológicos 7 (11): 300-335. https://doi.org/10.15210/norus.v7i11.17052.
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, ao comparar o ativismo das mulheres na periferia de São Paulo no período da redemocratização com o momento atual, identifica a interseccionalidade no repertório discursivo dessas últimas, muitas delas se reivindicando feministas interseccionais. Nesse caso, as mulheres reclamam maior reconhecimento em espaços de produção cultural periférica, tidos como masculinizados e sexistas, como os coletivos de hip hop. A afirmação do lugar das mulheres caminha junto à afirmação de uma identidade racial negra, que se apresenta como uma referência discursiva também importante (Medeiros 2019Medeiros, Jonas. 2019. Do “feminismo popular” ao “feminismo periférico”: mudanças estruturais em contrapúblicos da zona leste de São Paulo. Revista Novos Rumos sociológicos 7 (11): 300-335. https://doi.org/10.15210/norus.v7i11.17052.
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).

Na composição desse lugar social, a territorialidade consiste em outro elemento que ganha relevo, figurado na identidade periférica (Rios e Maciel 2018Barone, Ana e Flavia Rios, orgs. 2018. Negros nas cidades brasileiras (1890-1950). São Paulo: Intermeios.), que diz respeito também ao papel da classe social (Rios, Perez e Ricoldi 2018Barone, Ana e Flavia Rios, orgs. 2018. Negros nas cidades brasileiras (1890-1950). São Paulo: Intermeios.). A periferia (território) e a condição periférica (simbólica) são mobilizados como marcadores de identidade, espaço de enunciação das desigualdades e das opressões vividas no cotidiano, ao mesmo tempo que embasamento de resistências, fortemente ancoradas em movimentos ligados à cultura (Ramos 2016Ramos, Izabela N. 2016. Entre “perifeminas” e “minas de artilharia”: participação e identidades de mulheres no hip hop e no funk. Dissertação em Antropologia Social, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, Brasil.; Medeiros 2019Medeiros, Jonas. 2019. Do “feminismo popular” ao “feminismo periférico”: mudanças estruturais em contrapúblicos da zona leste de São Paulo. Revista Novos Rumos sociológicos 7 (11): 300-335. https://doi.org/10.15210/norus.v7i11.17052.
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).

Rios e Maciel (2018Barone, Ana e Flavia Rios, orgs. 2018. Negros nas cidades brasileiras (1890-1950). São Paulo: Intermeios.), em texto voltado à revisão das sucessivas gerações do feminismo negro no Brasil, igualmente apontam que a geração atual, composta pelas autodenominadas feministas interseccionais, apresenta uma ênfase maior nas questões da identidade coletiva, se comparada às gerações anteriores, a qual passa, dentre outros fatores, por um “maior enraizamento nas comunidades e espaços de periferia” (Rios e Maciel 2018Barone, Ana e Flavia Rios, orgs. 2018. Negros nas cidades brasileiras (1890-1950). São Paulo: Intermeios., 12).

A mobilização de uma “identidade periférica”, como notado por Ramos (2016)Ramos, Izabela N. 2016. Entre “perifeminas” e “minas de artilharia”: participação e identidades de mulheres no hip hop e no funk. Dissertação em Antropologia Social, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, Brasil., ao estudar os coletivos de mulheres jovens ligadas ao hip hop em São Paulo, transpassa por uma leitura crítica das carências materiais do território periférico, mas também pela experiência do racismo, evidenciado na violência institucional que ocorre contra os jovens negros.

Assim, por meio dos coletivos de jovens negras e periféricas, racialidade, classe e gênero têm no território (periférico) sua base de enunciação, o que faz desse um elemento importante para o entendimento e a problematização do que poderíamos chamar de “experiência interseccional” da cidade. A experiência vivida é mobilizada para afirmar um lugar de pertencimento e constituição de identidade, que orienta as resistências cotidianas, passando pela formação de coletivos e a demanda de reconhecimento.

Desse breve balanço feito sobre os estudos urbanos e interseccionalidade, vemos, pois, desenharem-se alguns elementos importantes. Por um lado, a mobilização da experiência cotidiana vivida por grupos subalternizados, como elemento acionado para cobrar e informar políticas públicas sensíveis às condições concretas do vivido, antes orientadas pela categoria genérica de “cidadão”. Por outro, a mobilização dessa mesma experiência por parte de coletivos ativistas, como espaço de constituição de uma identidade a ser afirmada e reconhecida.

A partir desse percurso, não exaustivo, podemos voltar à questão inicial que orienta esse artigo: em que medida a interseccionalidade se apresenta como uma categoria de referência profícua capaz não só de evidenciar e problematizar as desigualdades urbanas, mas oferecer elementos que permitam compreender e interpelar os mecanismos e as relações de poder que estão em sua base? Respostas a essa questão certamente ainda demandam maiores esforços de pesquisa, mas é possível articular algumas hipóteses.

Considerações finais

Os dois eixos de discussão sobre interseccionalidade e cidade que apresentamos nesse artigo, tomando a categoria como estratégia analítica e práxis crítica, revelam elementos importantes para o entendimento das desigualdades urbanas, o que indica para a potencialidade do uso da categoria nos estudos desse campo. Por um lado, a importância de se considerar a diversidade dos sujeitos sociais e a forma como as diferentes relações e sistemas de poder incidem sobre esses. Mulheres, pessoas negras, sexualidades não hegemônicas, em uma sociedade cujas desigualdades são complexas, e vão muito além da desigualdade material, vivem experiências diversas das desigualdades, apenas parcialmente compreendidas pela análise crítica referida unicamente às classes sociais e às desigualdades geradas pelo capitalismo. Por outro lado, a consideração de relações patriarcais de poder e do racismo estrutural tornam-se, pois, elementos fundamentais para a reflexão crítica das desigualdades urbanas.

Nesse sentido, podemos afirmar que a interseccionalidade, ao atentar para o entrecruzamento de múltiplas relações de poder, se apresenta como uma referência promissora para a reflexão sobre as desigualdades e os movimentos sociais urbanos. No mínimo, um ponto de partida, como afirma Collins (2015)Collins, Patrícia H. 2015. Intersectionality's definitional dilemmas. Annual Review of Sociology 41: 1-20. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073014-112142.
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, que permite perceber a complexidade do mundo social, seus sujeitos e relações de poder. Tal complexidade certamente impacta no tratamento de categorias múltiplas, como são aquelas hoje passíveis de serem tratadas pela lente analítica interseccional. O entrecruzamento das categorias de gênero, raça e classe parece ainda se sobrepor ao tratamento de outros eixos de subordinação social. Porém, antes que demonstrar os limites da interseccionalidade, esse fato parece apontar para sua capacidade de crescimento como ferramenta ou lente de investigação em suas múltiplas e combinadas expressões.

Da breve discussão realizada nesse texto, algumas questões podem ser apontadas para orientar reflexões futuras.

Vimos que a pesquisa interseccional demanda e oferece elementos para a proposição de políticas públicas. Mas é certo que essa chave encontra desafios importantes, já apontados pela literatura especializada. Um deles diz respeito à clareza dos caminhos propostos para a efetivação das políticas, e o quanto as próprias pesquisas são capazes de apresentá-los. Outro desafio diz respeito à relação entre conhecimento acadêmico e gestão pública, que ainda carece de estreitamento.

Uma segunda ordem de questões se relaciona à valorização das experiências concretas e à afirmação de identidades sociais, como vimos, especialmente, na mobilização da interseccionalidade como práxis crítica. Nesse ponto tem-se dois desafios. Por um lado, os enfrentamentos realizados pelos coletivos periféricos se dão em condições muito concretas de experiências, e problematizam o racismo e as relações patriarcais de poder no cotidiano. É certo que a ampliação de horizontes políticos, que digam respeito à superação de certas relações de poder, e a imaginação de outros mundos possíveis, não pode prescindir desses conhecimentos, mas implica, igualmente, em mobilizar repertórios teóricos dentro da própria universidade, por exemplo, entendendo um e outro como conhecimentos complementares. Trata-se do desafio de aproximação entre o conhecimento teórico ou acadêmico e a vida concreta dos sujeitos sociais periféricos, como possibilidade de apontar para a problematização de horizontes políticos mais amplos.

Adicionalmente, tem-se ainda o desafio que Nancy Fraser (2002)Fraser, Nancy. 2002. A justiça social na globalização: redistribuição, reconhecimento e participação. Revista Crítica de Ciências Sociais 63: 7-20. https://doi.org/10.4000/rccs.1250.
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aponta como o risco da reificação das identidades sociais, em detrimento de uma agenda de justiça social que combine a reivindicação do reconhecimento das diferenças (no campo da identidade) e da distribuição (no campo das desigualdades de classe). Questão controversa no interior dos movimentos sociais e dos grupos historicamente subalternizados, mas que certamente exige esforços de reflexão acadêmica e amadurecimento político.

Por fim, podemos afirmar que o referencial da interseccionalidade oferece ferramentas importantes para pensar as desigualdades urbanas de modo mais ampliado, ao considerar a multiplicidade de sujeitos e de relações de poder, além de lugares de enunciação das narrativas válidas, dentro e fora da academia. Contudo, trata-se ainda de um campo em construção cujo avanço dependerá não somente da realização de mais pesquisas que utilizem tais enfoques, mas também do deslocamento e da aproximação de campos hoje ainda muito separados: o lugar da produção de conhecimento, da experiência social dos sujeitos e da efetivação de políticas públicas.

  • 2
    A pesquisa de pós-doutorado que origina esse texto contou com financiamento da Capes. A discussão realizada se beneficia do diálogo com o grupo de pesquisa Política, Políticas Públicas e Ação Coletiva (3PAC/UFABC), bem como do período como pesquisadora associada ao Afro-Latin American Research Institute (Alari/Harvard University). Registro meus agradecimentos, muito especialmente, aos supervisores da pesquisa, Prof. Dr. Sidney Jard da Silva (PCHS/UFABC) e Prof. Dr. Francisco de Assis Comaru (PPGPGT/UFABC).
  • 3
    Cumpre mencionar a importância de estudos mais antigos que chamaram a atenção para a questão racial nas cidades, como Bastide e Fernandes (1959Bastide, Roger e Florestan Fernandes. 1959. Brancos e negros em São Paulo: ensaio sociológico sobre aspectos da formação, manifestações atuais e efeitos do preconceito de côr na sociedade paulistana. São Paulo: Cia Editora Nacional.) e Telles (1992)Telles, Edward. 1992. Residential segregation by skin color in Brazil. American Sociological Review 57 (2): 186-197. https://doi.org/10.2307/2096204.
    https://doi.org/10.2307/2096204...
    . O que se afirma aqui, seguindo Paterniani (2019)Paterniani, Stella Zagatto. 2019. São Paulo cidade negra: branquidade e afrofuturismo a partir de lutas por moradia. Tese em Antropologia Social, Universidade de Brasília (UnB), Brasília, Brasil. é que a partir dos anos 1970 estabelece-se uma tradição hegemônica de discussão das desigualdades urbanas, com foco na classe social.
  • 4
    Gago, Verónica e Luci Cavallero. 2020. Dívida, moradia e trabalho: uma agenda feminista para o pós-pandemia. Elefante Editora, 25 maio 2020. Acessado em 22 fev. 2021, https://elefanteeditora.com.br/divida-moradia-e-trabalho-uma-agenda-feminista-para-o-pos-pandemia.
  • 5
    Correia, Alice, Carolina Coelho e Lívia Salles. 2018. Cidade interseccional: o direito à cidade nas perspectivas de gênero e raça. Observatório das metrópoles, 11 de outubro de 2018. Acessado em 22 fev. 2021, https://www.observatoriodasmetropoles.net.br/o-direito-cidade-nas-perspectivas-de-genero-e-raca.
  • Os textos deste artigo foram revisados pela Poá Comunicação e submetidos para validação da autora antes da publicação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2021
  • Aceito
    18 Jul 2021
  • Publicado
    08 Nov 2021
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