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O galpão logístico e a financeirização urbana: da flexibilidade produtiva ao imobiliário

The logistics warehouse and urban financialization: from production flexibility to real estate

Resumo

Em meio às transformações na (re)produção da metrópole, em razão da reestruturação produtiva e imobiliária, o galpão logístico emerge como expressão de ambas, tanto é parte das alterações na organização da empresa capitalista como é um novo produto imobiliário alinhado à demanda de grandes varejistas e do comércio digital, envolvendo agentes financeiros e imobiliários em múltiplas escalas, do local ao global. Um fenômeno que invadiu a cidade de Cajamar e a transformou no principal polo logístico da RMSP. O nosso objetivo é, a partir do caso de Cajamar, explorar a gênese dessa nova mercadoria imobiliária, suas formas específicas de propriedade e de circulação, sua modelagem como produto e sua forma de inserção no espaço.

metrópole; financeirização; imobiliário; logística; indústria

Abstract

Amid transformations in the (re)production of the metropolis caused by production and real estate restructuring, the logistics warehouse emerges as an expression of both: it is part of the changes in the organization of the capitalist company and it is a new real estate product aligned with the demand for large retailers and digital commerce, involving financial and real estate agents on multiple scales, from local to global. This phenomenon has invaded the city of Cajamar and transformed it into the main logistics hub of the Metropolitan Region of São Paulo. Based on the case of Cajamar, our objective is to explore the genesis of this new real estate commodity, its specific forms of ownership and circulation, its modeling as a product and its form of insertion in space.

metropolis; financialization; real estate; logistics; industry

Introdução

A financeirização contemporânea da economia tem como uma de suas expressões a reestruturação imobiliária. A transformação do setor em aspectos produtivos, tecnológicos, pela sua maior conexão a agentes financeiros nacionais e globais (Rufino, 2017RUFINO, M. B. C. (2017). “A produção imobiliária como chave de interpretação da produção do espaço: considerações sobre a forma incorporação e o processo de metropolização”. In: PEREIRA, P. C. X. (org.). Produção imobiliária e reconfiguração da cidade contemporânea. São Paulo, FAU-USP.; Lencioni, 2011b; De Matos, 2010), que, ao ampliar e tornar complexas as formas de mercantilização do espaço, tem promovido profundas mudanças na (re)produção da metrópole. Financeirização entendida aqui como dominância da lógica, das métricas e da racionalidade financeira sobre o conjunto dos agentes. A primazia de formas de acumulação a partir da propriedade do capital dinheiro, ou seja, a busca de rendas, em detrimento de formas produtivas, na busca do lucro (Braga, 1997BRAGA, S. (1997). “Financeirização global: o padrão sistêmico de riqueza do capitalismo contemporâneo”. In: TAVARES, M. C.; FIORI, J. I. (eds.). Poder e dinheiro. Petrópolis, Vozes.).

O ambiente construído, nesse contexto, cumpre um papel particular e relevante, ao absorver excedentes de capital e deslocar, no tempo e no espaço, as crises capitalistas, através de ajustes espaciais (Harvey, 2013HARVEY, D. (2013). Os limites do capital. São Paulo, Boitempo.). Após a crise financeira global de 2008, originada nas hipotecas subprime, a financeirização do setor imobiliário, expressão desses ajustes, foi e continua a ser largamente explorada no campo dos estudos urbanos, nacional e internacional (Sanfelice, 2017SANFELICE, D. (2017). La industria financiera y los fondos inmobiliarios en Brasil: lógicas de inversión y dinámicas territoriales. Economía, Sociedad Y Territorio, v. XVII, n. 54, pp. 367-397.; Halbert e Rutherford, 2012; Royer, 2010ROYER, L. O. (2010). Financeirização da política habitacional: limites e perspectivas. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo.; Rufino, 2017RUFINO, M. B. C. (2017). “A produção imobiliária como chave de interpretação da produção do espaço: considerações sobre a forma incorporação e o processo de metropolização”. In: PEREIRA, P. C. X. (org.). Produção imobiliária e reconfiguração da cidade contemporânea. São Paulo, FAU-USP.). Entretanto, o foco majoritário dos estudos está na produção imobiliária residencial e corporativa, seus agentes e suas dinâmicas. Os novos produtos imobiliários ligados à indústria foram pouco explorados. Entendemos que isso ocorre por dois motivos: são produtos criados nas últimas décadas, com maior relevância nos últimos anos; e são produzidos em espaços isolados, fora das áreas intraurbanas, nas bordas da metrópole. Porém, com a pandemia, a explosão do e-commerce e a disseminação do home-office que tem esvaziado o mercado de lajes corporativas, os agentes financeiros ligados ao setor imobiliário têm direcionado suas apostas num desses novos produtos imobiliários do segmento industrial, os galpões logísticos, impulsionando o setor, que já vem há cerca de uma década em franca expansão por todo o País. Tornando-o um importante produto dentro da atividade imobiliária financeirizada. Um novo produto que amplia e traz novas formas de privatização e diferenciação do espaço, agravando as desigualdades e a segregação socioespacial. Desse modo, este trabalho pretende jogar luz sobre essa lacuna e explorar esse novo produto imobiliário para compreender suas peculiaridades e refletir sobre alguns de seus impactos sobre a (re)produção da metrópole.1 (1) Entendemos por (re)produção da metrópole os processos e as formas de produção e reprodução social do espaço metropolitano; concentramo-nos na atividade imobiliária como importante agente desse processo, com formas renovadas, devido a financeirização e reestruturação do setor.

O galpão logístico é uma expressão da reestruturação produtiva e imobiliária, tanto é parte das alterações na organização da empresa capitalista, como é um novo produto imobiliário de grande vulto. Nas mudanças das atividades e nas estruturas dos grupos econômicos, o condomínio logístico é resultado, entre outros, de novas estratégias de aceleração do tempo de rotação da mercadoria e da fragmentação de sua produção. Dentro do setor imobiliário, esses empreendimentos “constituem uma forma de investimento que inovou o mercado imobiliário corporativo” (Zioni, 2009ZIONI, M. S. (2009). Espaços de Carga na Região Metropolitana de São Paulo. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo., p. 119).

Aqui temos interesse particular na sua dimensão de produto imobiliário emergente que, recentemente, invadiu diversas metrópoles brasileiras. Como um novo nicho do mercado imobiliário em franca expansão, pretendemos compreender de que modo este se desenvolve, apontar algumas de suas particularidades e similitudes em relação a outros produtos imobiliários e evidenciar alguns de seus impactos socioespaciais. O que é esse novo produto e como ele surge? Como ele se conecta aos agentes financeiros e quais as implicações dessas conexões? Quais os impactos socioespaciais desses empreendimentos? Apesar do objeto deste trabalho não ser a logística, mas sim a atividade imobiliária e seus impactos na metrópole, para tentar responder a essas questões, traremos um rápido panorama do setor.2 (2) Outros trabalhos aprofundaram-se nas atividades do setor de forma mais sistemática e sobre outros aspectos (Zioni, 2009; Finatti, 2011 e 2016). O nosso objetivo é explorar como ocorre a formatação dessa nova mercadoria imobiliária, as suas formas específicas de propriedade e de circulação, sua modelagem como produto e sua forma de inserção no espaço. Nesse sentido, nossa tarefa é parte do esforço de compreender as questões contemporâneas do processo de (re)produção do espaço, envolvendo agentes financeiros e imobiliários em múltiplas escalas, do local ao global. Faremos isso através do estudo empírico de Cajamar, na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), cidade que se tornou, nos últimos anos, o principal polo logístico da macrometrópole paulista, a “Faria Lima dos Galpões” como foi batizada por agentes do mercado financeiro, em alusão à avenida que concentra o centro financeiro da cidade de São Paulo. Cajamar apresentou-se como um caso bastante emblemático da ação de agentes financeiros do setor imobiliário, bem como explicitou conflitos sociais e ambientais decorrentes dessa nova atividade do setor imobiliário.

Para consecução de nossos objetivos, o artigo organiza-se em três partes. Na primeira, apresentaremos um breve panorama sobre a gênese do galpão logístico, partindo do processo de reestruturação produtiva; na segunda, falaremos da emergência desse novo produto imobiliário, trazendo algumas de suas características articuladas à apresentação do estudo sobre o desenvolvimento dos empreendimentos logísticos na cidade de Cajamar. Na conclusão, são realizados apontamentos para reflexão sobre esse novo produto e a (re)produção da metrópole.

Os galpões logísticos: da flexibilidade produtiva ao negócio imobiliário

O setor de logística corporativa,3 (3) A logística como forma de gestão de suprimentos é mais antiga e tem origem na atividade militar, ainda no século XIX; ela passa a penetrar na atividade empresarial nos anos 1970 (Danyluk, 2018). considerado de maneira ampla, aparece no seio das transformações que o capitalismo mundial vem passando desde os anos 1970, promovidas pela financeirização da economia. Um processo que penetra e altera, principalmente, a grande corporação capitalista, numa reestruturação produtiva (Campolina Diniz e Campolina, 2007CAMPOLINA DINIZ, C.; CAMPOLINA, B. (2007). A região metropolitana de São Paulo: reestruturação, re-espacialização e novas funções. EURE. Santiago, v. 33, n. 98, pp. 27-43.; Lencioni, 2006LENCIONI, S. (2006). “Regiões Metropolitanas do Brasil. Radiografia da Dinâmica Recente do Emprego Industrial e da Remuneração do Trabalhador”. In: LEMOS, A. I. G. de; ARROYO, M.; SILVEIRA, M. L. (orgs.). América Latina: cidade, campo e turismo. Buenos Aires, Clacso.) que, também, altera a geografia do sistema e impacta diretamente a produção do espaço metropolitano.

A logística abarca um amplo leque de atividades que têm a finalidade de estruturar e organizar a produção, a circulação e o consumo no tempo e no espaço. Uma atividade que se realiza através da coordenação e do controle da movimentação de pessoas, informações, recursos e mercadorias. A reestruturação produtiva marcada pela flexibilização nas mais variadas dimensões dispersa-se no espaço em uma série de fixos e fluxos sob o controle da logística e da racionalidade financeira (Danyluk, 2018DANYLUK, M. (2018). Capital’s logistical fix: Accumulation, globalization, and the survival of capitalism. Environment and Planning D: Society and Space, v. 36, n. 4, pp. 630-647. DOI:10.1177/0263775817703663.
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). O setor logístico, de forma mais abstrata, busca acelerar o tempo de giro do capital, essencial à atividade capitalista, mas que, na crise do fordismo, vai à procura de novos caminhos para se efetivar, principalmente através da circulação.

A reestruturação produtiva, de maneira sintética e recortada à estrutura corporativa, ocorre em um movimento ambíguo, de centralização de capitais dispersos geograficamente e setorialmente por grandes grupos em estratégias monopolistas; e o de redução de custos e de fracionamento de atividades por meio de processos de terceirização e complementaridade produtiva. Articulado a isto, ocorre a desconcentração espacial da indústria, que abandona as áreas industriais intraurbanas. Movimento caracterizado, também, por alguns autores como reflexo de deseconomias de aglomeração (custos de terreno, deficiências da infraestrutura de transporte e até mesmo legislação) (Zioni, 2009ZIONI, M. S. (2009). Espaços de Carga na Região Metropolitana de São Paulo. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo.). Assim, parte da atividade corporativa sai em busca de incentivos fiscais em municípios menores, num contexto de maior integração regional dos mercados, viabilizada pelas redes de infraestrutura de transporte e comunicação. Um ciclo acelerado de divisão social e técnica do trabalho, que reflete a busca do capital em ampliar sua dominação sobre o trabalho e sobre os recursos naturais, constituindo longas cadeias produtivas globais.

A concentração industrial na região metropolitana de São Paulo, que foi o principal polo industrial do País, no início do século XX se localizava junto aos eixos ferroviários e, a partir de 1940, passa a acompanhar a rede rodoviária, traço característico do processo de metropolização paulistana. Após os anos de 1970, quando atinge o pico da concentração, principalmente no ABC paulista, vetor sudeste da RMSP, estimulada por políticas de incentivo fiscal e políticas macroeconômicas, verifica-se uma desconcentração industrial (Campolina Diniz e Campolina, 2007CAMPOLINA DINIZ, C.; CAMPOLINA, B. (2007). A região metropolitana de São Paulo: reestruturação, re-espacialização e novas funções. EURE. Santiago, v. 33, n. 98, pp. 27-43.; Lencioni, 2006LENCIONI, S. (2006). “Regiões Metropolitanas do Brasil. Radiografia da Dinâmica Recente do Emprego Industrial e da Remuneração do Trabalhador”. In: LEMOS, A. I. G. de; ARROYO, M.; SILVEIRA, M. L. (orgs.). América Latina: cidade, campo e turismo. Buenos Aires, Clacso., 2011bLENCIONI, S. (2011b). A metamorfose de São Paulo: Anúncio de um novo mundo de aglomerações difusas. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, n. 120, pp. 133-148.; Araujo, 2001ARAUJO, M. F. I. (2001). Reestruturação produtiva e transformações econômicas: Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 15, n. 1, pp. 20-30.), um deslocamento das atividades industriais rumo ao interior paulista, próximo à RMSP, como Campinas, Jundiaí, Sorocaba e São José dos Campos (Mapa 1). Ao longo dos anos 1980 e 1990, ocorrem novos processos de dispersão em escala nacional.

Mapa 1
– Mapa da macrometrópole paulista, em destaque, o município de Cajamar – 2018

Cajamar, no vetor noroeste da RMSP, recebe algumas indústrias nesse processo, mas é irrelevante nesse movimento de dispersão da indústria. O município ganha destaque a partir de 2007, com a chegada do primeiro grande galpão logístico, da Marabraz, grande grupo varejista, que implanta esse galpão com vistas a coordenar e suprir todas as suas lojas num raio de mais de 200 km, englobando toda a macrometrópole paulista, o que contempla mais de 100 lojas. Após esse passo inicial, no distrito de Jordanésia, vizinho a esse primeiro galpão, foram implantados, na última década, monstruosos galpões, visando atender à demanda de espaços para operação logística de grandes grupos varejistas, principalmente os que atuam por e-commerce.

Nesse contexto, as atividades industriais, dispersas, passam a ser coordenadas a partir de um centro de comando, que, através de redes materiais e imateriais, vai orientar os ritmos, os procedimentos e as decisões de um conjunto de agentes dispersos espacialmente, na busca da ampliação de seus mercados e efetivação de suas estratégias de aceleração do giro do capital. Uma estrutura, em rede, dispersa espacialmente e de controle concentrado para manejar recursos financeiros de um mercado a outro, de uma atividade a outra, buscando maximizar seus rendimentos. Portanto, os grupos econômicos como agentes fundamentais dessas alterações na forma de organização empresarial, como apontado por Rocha (2013)ROCHA, M. A. M. (2013). Grupos econômicos e capital financeiro: uma história recente do grande capital brasileiro. Tese de doutorado. Campinas, Universidade Estadual de Campinas., caracterizam-se pelo “controle e poder centralizado, atuação produtiva e financeira de grande porte e complexidade e estruturação produtiva diversificada e descentralizada”. Neste novo momento, o gerenciamento do fluxo de bens, pessoas e informações ganha força na organização das cadeias produtivas, ou seja, a logística destaca-se como atividade essencial na coordenação do funcionamento desses grupos (Danyluk, 2018DANYLUK, M. (2018). Capital’s logistical fix: Accumulation, globalization, and the survival of capitalism. Environment and Planning D: Society and Space, v. 36, n. 4, pp. 630-647. DOI:10.1177/0263775817703663.
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).

A possibilidade de, no nível mundial e partindo das economias centrais, controlar a circulação de capitais em tempo real e o deslocamento das atividades de produção conforme vantagens locacionais de recursos naturais, técnicos e humanos, implicaram o aumento exponencial da circulação de insumos e produtos no mercado global, viabilizada por sistemas de transportes mais eficientes. (Zioni, 2009ZIONI, M. S. (2009). Espaços de Carga na Região Metropolitana de São Paulo. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo., p. 9)

Entrelaçada a essas mudanças, a forma de produção do espaço metropolitano, também, transforma-se, estabelecendo novas relações entre municípios e territórios, numa escala ampliada. Com uma nova divisão social e técnica do trabalho, articulada através da intensificação dos fluxos e da comutação de atividades, ocorre uma dilatação do espaço cotidiano, constituindo uma forma urbana mais complexa. A partir disso, a logística configura-se como um dos elementos estruturadores dessa forma urbana, ao mesmo tempo que a produz.

Operações de armazenagem, consolidação e fracionamento, transferência e distribuição de cargas, também cada vez mais terceirizadas, acabam gerando novos fluxos, novas atividades e serviços especializados conforme demandas das atividades econômicas que a metrópole concentra. A organização espacial dessas atividades e dos fluxos do transporte de carga operou algumas mudanças no tradicional parque de depósitos e armazéns, pátios ferroviários e estacionamento de caminhões que marcaram algumas áreas da metrópole industrial paulistana, transbordando os limites da RMSP no contexto da região macrometropolitana, seguindo as rotas da desconcentração regional polarizada pela RMSP. (Ibid., p. 222)

O processo de constituição de novas redes de produção e consumo, controladas de maneira centralizada e articuladas pelas redes de transporte e informação em múltiplas escalas, é a forma contemporânea de ocorrência espacial dos grupos econômicos, que se inscrevem no espaço como nós e fluxos. Aqui, interessamo-nos pelos nós, que podem variar quanto à sua funcionalidade no sistema (pelo que absorvem e pelo que emitem) e pela sua localização. Como desdobramento da desarticulação da verticalidade da indústria, os nós tomam formas variadas. No caso da função produtiva, esses nós manifestam-se em aglomerações industriais, como apontou Finatti (2016)FINATTI, R. (2016). Aglomerações industriais no Brasil: uso do território e transformações recentes. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo.. Eles podem assumir as formas tradicionais, como distritos industriais e complexos industriais, e até as formas mais contemporâneas, como condomínios empresariais e loteamentos industriais. No caso da circulação, esses nós podem assumir a forma de portos, aeroportos e do galpão logístico, que armazena mercadorias prontas, semiprontas ou insumos. Os nós operam em articulação nessa rede, no ajuste flexível das cadeias de suprimento. Mais recentemente, os galpões têm se destinado, principalmente, à operação logística de grandes empresas do comércio varejista digital,4 (4) Apesar da relevância do comércio digital para as dinâmicas apresentadas, não abordaremos as relações entre digitalização, plataformas digitais e a logística, nosso interesse se concentra no setor imobiliário. o e-commerce, fato que exploraremos mais adiante.

Ao abordar os condomínios industriais como um novo produto imobiliário, Lencioni (2011a), inicialmente, traça uma pequena história da edificação industrial. Começa no ateliê e chega à fábrica, que sofre transformações à medida que se alteram as dimensões do capital fixo, o número de funcionários e a organização da produção, surgindo a demanda por grandes instalações fabris que vão se movimentando na cidade. Assim, a autora destaca que, em toda a “história dos edifícios fabris e da localização industrial, o custo do terreno e da construção do edifício sempre representou para o industrial – embora imprescindível – um dispêndio monetário improdutivo” (ibid., p. 186).

Os grupos econômicos sob a égide das finanças são constrangidos pela rápida obsolescência de máquinas, processos e procedimentos que demandam, constantemente, novas estruturas. Assim, desfazem-se de dispêndios improdutivos, terceirizam e adotam uma produção cada vez mais flexível. Os condomínios empresariais, loteamentos industriais e os galpões logísticos entre outros produtos imobiliários do ramo industrial surgem para suprir uma parte dessa demanda, proporcionando espaços flexíveis, redução dos custos de manutenção e gestão do espaço, além de fácil desmobilização de instalações. Desse modo, a reestruturação produtiva também se manifesta no setor imobiliário, neste caso industrial, na demanda por novos produtos imobiliários.

Do ponto de vista da produção do espaço, a reestruturação produtiva, ao mesmo tempo que dispersa, formando novas aglomerações, promove a manutenção da polarização da metrópole, com novas funções de comando e a “renovação” das antigas zonas industriais, o que Lencioni (ibid.) chamou de desconcentração-concentrada. Assim, o processo de dispersão e concentração das atividades industriais converge com a transformação da atividade imobiliária, ao gerar novas aglomerações nas fronteiras de expansão da metrópole ou mesmo em pequenos municípios distantes e ao abrir espaços para a mudança de usos do solo intrametropolitano em antigas zonas industriais. Portanto, falamos de uma dupla convergência, tanto numa dimensão “interna” da reorganização da empresa capitalista, como de sua expressão espacial, que dialoga com a nova territorialidade da indústria, podendo articular ambas pelo processo-base de divisão técnica e social do trabalho. Um movimento conjunto das atividades industriais e imobiliárias, de alteração de uso das antigas instalações industriais intraurbanas (destruição de capital fixo) (Harvey, 2013HARVEY, D. (2013). Os limites do capital. São Paulo, Boitempo.), em benefício do mercado imobiliário residencial de alto padrão e de lajes corporativas (centros de comando), e de abertura de novas frentes imobiliárias na produção de aglomerações fragmentadas no espaço, criando novos fluxos para além da metrópole, em escala regional. Nas duas dimensões, são novos produtos imobiliários que materializam os fluxos de capitais que se realizam no espaço metropolitano.

A emergência do galpão logístico

Após introduzirmos algumas dimensões do galpão logístico a partir da convergência entre a reestruturação produtiva, a produção da metrópole e a atividade imobiliária, vamos nos concentrar na sua dimensão de produto imobiliário.

A mercadoria produzida pela atividade imobiliária capitalista possui algumas particularidades em relação às demais mercadorias (Topalov, 1979TOPALOV, C. (1979). “La formación de los precios del suelo en la ciudad capitalista: introducción al problema de la renta”. In: TOPALOV, C. La urbanización capitalista: algunos elementos para su análisis. México, 0Edicol.; Jaramillo, 1980JARAMILLO, S. (1980). Produccion de vivienda y capitalismo dependiente: el caso de Bogota. Bogotá, Colômbia, Dintel.; Ribeiro, 1997RIBEIRO, L. (1997). Dos cortiços aos condomínios fechados: as formas de produção da moradia na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira/Ippur/UFRJ/Fase.): a) ela, ao se assentar sobre a terra, é sempre única, como uma fração do globo, que traz a renda fundiária como forma específica de precificação dessa mercadoria; b) possui um forma específica de produção e circulação, que demanda o deslocamento espacial dos meios de produção, demanda um grande volume de capital e de tempo para sua produção e para sua circulação, fase em que permanece, também, por longos períodos; c) ao se produzir essa mercadoria, também, produz-se o ambiente construído em configurações específicas social e historicamente determinadas. Em nosso trabalho, partimos dessas peculiaridades para a compreensão de nosso objeto, os galpões logísticos.

Apesar da escassez de trabalhos sobre o segmento imobiliário industrial, as pesquisas de Finatti (2011FINATTI, R. (2011). Condomínios empresariais nas áreas metropolitanas do Estado de São Paulo: produção imobiliária e localização da indústria. Dissertação de mestrado. São Paulo, Universidade de São Paulo. e 2016) investigaram diversas formas de manifestação espacial da indústria nesse contexto de reestruturação, com foco na sua dimensão imobiliária. Pretendemos explorar as categorias utilizadas pelo autor para alguns apontamentos iniciais e para chegarmos ao nosso objeto específico, os galpões logísticos.5 (5) Aqui, não vamos utilizar o termo condomínios empresariais (Finatti, 2011 e 2016) nem o termo condomínios industriais (Lencioni, 2011a), utilizados pelos autores para definir empreendimentos imobiliários semelhantes, o condomínio modular industrial e o galpão logístico. Durante este trabalho, vamos utilizar, apenas, galpões logísticos, por dois motivos: o primeiro por ser esta a forma emergente da atividade imobiliária financeirizada que queremos destacar, não existindo outras formas de uso desses condomínios descritos pelos autores; o segundo por ser o termo utilizado pelos agentes do mercado em publicações sobre investimentos imobiliários financeiros (FIIs, 2018) e na mídia especializada. Em sua pesquisa, Finatti (2011)FINATTI, R. (2011). Condomínios empresariais nas áreas metropolitanas do Estado de São Paulo: produção imobiliária e localização da indústria. Dissertação de mestrado. São Paulo, Universidade de São Paulo., ao caracterizar os condomínios empresariais, não mobiliza somente os aspectos gerais da reestruturação produtiva e seu reflexo numa reestruturação imobiliária, mas, também, menciona a transformação do papel do Estado, que não é mais o promotor da concentração industrial, em distritos ou polos industriais. Ele agora promove essa concentração através de inventivos fiscais, oferta de terras e de outras benesses, que se materializam nesses novos empreendimentos imobiliários industriais. O autor concentra-se nos condomínios empresariais e ressalta a sua transformação em negócio imobiliário e a entrada de grandes incorporadoras no setor, fato que altera tanto sua forma, como o marketing e sua lógica de produção. Os galpões, também, são uma parte dessas transformações como já destacamos. Finatti (2016FINATTI, R. (2016). Aglomerações industriais no Brasil: uso do território e transformações recentes. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo., p. 10) ressalta que “como resultado da ação dos promotores imobiliários, devemos destacar a lógica da obtenção da renda fundiária ou da renda imobiliária, que invariavelmente é a intencionalidade presente nos processos de produção dos condomínios empresariais”. Ou seja, ao abstrairmos o conteúdo industrial ou logístico, esse novo objeto se define como uma mercadoria imobiliária, que, além de gerar lucro, como toda mercadoria, apropria-se de rendas, ao “embutir” essa mercadoria específica à propriedade privada da terra.

Lencioni (2011a), ao falar sobre os condomínios industriais, define-os como “uma novidade na produção do espaço industrial”. Destaca que essa novidade não se define por sua conexão com a reorganização das atividades produtivas nem por aspectos materiais dessa organização, como a existência de áreas de escritórios ou uma aglomeração de diversas empresas.

[Mas,] a novidade dos condomínios industriais reside na condição jurídica que assume a propriedade imobiliária que abriga a produção industrial, pois nela está contido (na propriedade condominial) o conceito de quota-parte da propriedade ou de fração ideal da propriedade da terra. (Ibid., p. 185)

Ao destacar a forma jurídica do condomínio como principal fator de ineditismo de tal forma de aglomeração industrial, a autora faz uma importante distinção entre uma expressão jurídica do espaço e o espaço em si: “A ideia de condomínio expressa uma condição jurídica da forma de propriedade e não do edifício. Isso que é fundamental perceber” (ibid., p. 187). Essa distinção é fundamental quando formos discutir as formas de circulação dessa nova mercadoria. Nos galpões logísticos, isso vai ocorrer de forma análoga; geralmente, é um espaço único,6 (6) Existem outros tipos de condomínios industriais com módulos separados, locados de forma integral. modulado e que é fracionado entre diversos locatários. Todavia, nos galpões, emergem novas formas de fragmentação da propriedade com o e-commerce, multiplicando-se as suas formas.

Os galpões surgem inicialmente ligados a empresas, com dimensão reduzida e para manejo de estoques de mercadorias prontas ou na gestão da cadeia produtiva com peças semiprontas. Além disso, também, é o estoque de grandes redes varejistas. Essas duas manifestações iniciais não desaparecem, o que se altera é o avanço do processo de reestruturação em que as empresas procuram liquidez e se desfazem de ativos fixos; com isso emergem o galpão como produto imobiliário e o avanço da logística como ciência da movimentação de insumos, mercadorias e pessoas. A partir disso, passam a se estabelecer certos atributos aos galpões. Portanto, o conjunto de características dos galpões logísticos se estabelece a partir do seu valor de uso social e historicamente constituído como viemos apresentando até aqui. Não obstante, essas características são formalizadas e se consolidam como no mercado de lajes corporativas através de certificações de referência, agências de avaliação e prêmios que gabaritam o empreendimento, estabelecendo um estado da arte de seus aspectos jurídicos e materiais. No caso dos galpões, são parâmetros arquitetônicos, como pé-direito, grandes dimensões, sistemas de segurança, formatação específica de docas de embarque e desembarque, circulação de máquinas e caminhões, etc. Juridicamente, vão se desenhar formatos de contrato específicos, chamados contratos atípicos, ou mesmo contratos que se encaixem a determinada situação. Isso ocorre muitas vezes ainda na concepção do empreendimento. Constrói-se um parâmetro para a homogeneização dos empreendimentos em um referencial que facilita a sua transformação em ativo financeiro, dotando este de certa previsibilidade, rentabilidade e liquidez. Para os investidores:

A CLASSIFICAÇÃO DA QUALIDADE de Condomínios Logísticos permitira-lhes perceber com mais acuidade o desempenho médio particular de cada classe no mercado, facilitando a formulação das estratégias de inserção competitiva de seus próprios empreendimentos nesses segmentos, estando eles em fase de formatação ou já ativos num certo mercado. (NREUSP, 2019NREUSP – Núcleo de Real State, Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (2019). Departamento de Engenharia de Construção Civil. Certificação de Condomínios Logísticos. Disponível em: https://www.realestate.br/site/conteudo/pagina/1,137+CONDOM%C3%8DNIOS-LOG%C3%8DSTICOS-CERTIFICADOS-PELO-NRE.html. Acesso em: jan 2019.
https://www.realestate.br/site/conteudo/...
, s/p)

As classificações, na medida em que se instituem, podem se tornar um notório referencial, tanto na concepção do produto pelo incorporador, como na orientação do investidor em suas estratégias de formação de portfólio. Uma influência no ciclo completo da mercadoria, na concepção, na produção e na circulação, que a valide como padrão triplo A e/ou com um certificado de sustentabilidade. A disseminação de certificações, que busca homogeneizar mundialmente os ativos, pode ser vista como mais uma dimensão da imposição do sharedholder value ou a lógica de valor do acionista (tradução livre), pela qual as expectativas dos investidores/acionistas constrangem os demais agentes privados e instituições por ganhos crescentes de dividendos e valorização do preço de face dos títulos. Uma lógica que se dissemina nos anos 1990, a partir da intensificação da competição global entre os resultados financeiros das corporações em mercados cada vez mais integrados. Sob os imperativos dessa lógica, as formas gerenciais corporativas transformam-se através da incorporação de uma série de práticas contábeis, utilizada como novas ferramentas de medir e melhorar o desempenho das corporações, sintetizadas em siglas e acrônimos de novos conceitos. Isso entrelaçado a uma série de discursos retóricos e conceitos sobre “cases de sucesso” (Froud et al., 1999FROUD, J.; HASLAM, C.; JOHAL, S.; WILLIANS, K. (1999). Consultancy Promises, Management Moves: Shareholder Value and Financialisation. In: CRITICAL MANAGEMENT STUDIES CONFERENCE. Paper. Manchester, 14-16th july.).

As certificações para empreendimentos imobiliários podem ser vistas como uma dessas práticas que têm o objetivo de trazer segurança e satisfazer os acionistas, na medida em que orientam a padronização das práticas e dos processos de gerenciamento das empresas. Desse modo, ao olharmos o sharedholder value a partir da disseminação de modelos, além do estabelecimento de novas métricas, podemos aproximar, a esse conceito, as certificações e as premiações de cases7 (7) As premiações no mundo corporativo e especialmente no mercado imobiliário são disseminadas, assim como nas políticas públicas e ações de ONGs. Um mundo de “melhores práticas”, ranqueamentos, certificações, em grande parte, modelos de disseminação do ideário neoliberal, para a melhoria do desempenho das corporações, do Estado e dos indivíduos (Brenner et al., 2012; Laval e Dardot, 2016). Uma adequação ao padrão de competição e concorrência da sociabilidade contemporânea. que estão presentes neste trabalho. Sem falar das certificações de sustentabilidade que movimentam uma grande indústria.

No Brasil, temos uma série de consultorias e agências de avaliação. Os relatórios de grandes grupos de consultoria de mercado (CBRE, Cushman & Wakefield) mencionam a classificação de ativos, sem indicar referenciais da avaliação. Em seus sites, muitas vezes existem listas e quadros de boas práticas, mas não exatamente formatados com rigor de uma certificação, como ocorre com outras certificações como selo Leed.8 (8) Certificado de critérios de sustentabilidade dado para construções que devem atingir uma pontuação mínima em determinados quesitos. Pelo que percebemos, no discurso de agentes do mercado, o que pesa mais é o prestígio da consultoria e a sua carteira de clientes, mais do que critérios objetivos. Nos relatórios de FIIs, nacionais, as classificações são feitas por agências diversas, caindo no mesmo caso de indefinição de um referencial.

Marcelo Hannud,9 (9) Entrevista realizada no canal InfomoneyTV. Disponível na página do FII-XPLOG <https://xplog.riweb.com.br. Acesso em: jan 2019. gestor do FII-XPLog, um dos maiores fundos de investimentos imobiliários do setor logístico, em entrevista, afirmou algumas vezes a necessidade de delimitar mais claramente o setor de logística, definir parâmetros claros não somente para a classificação, que mencionou ser fundamental, mas para o funcionamento do mercado como um todo. Hannud afirma que uma boa avaliação de um ativo passa por uma boa base de análise, fundamentada na abundância de informações sobre o ativo: seu padrão construtivo e as características funcionais e operativas do galpão, sua localização e a qualidade dos seus contratos. Portanto, a consolidação de uma certificação é uma demanda, com o desenvolvimento do mercado imobiliário logístico.

O polo logístico de Cajamar destaca-se nesse ponto. Os empreendimentos da Prologis, grupo estadunidense de galpões logísticos, no município, receberam o prêmio Master Imobiliário em 2012, uma notória premiação do setor; e ainda receberam o primeiro certificado triplo A concedido pelo Núcleo de Real State da Universidade de São Paulo, que recentemente desenvolveu um sistema de qualificação de galpões, gabaritando os empreendimentos da Prologis de Cajamar como referenciais do setor.

Trata-se de referências e critérios que permitirão aos principais atores do mercado, investidores, proprietários e locatários identificarem com mais precisão – nas classificações AAA, A, B e C – o estrato de qualidade que procuram, de acordo com as suas necessidades, seja de ocupação, posicionamento no mercado ou construção de uma imagem corporativa. (NREUSP, 2010, s/p)

O Prêmio [Master imobiliário] tem a função de divulgar nacional e internacionalmente os conceitos inovadores e as experiências bem-sucedidas que possam servir de modelo para o desenvolvimento global das atividades do setor. (Master, 2019, s/p)

A partir dessa classificação, hierarquizam-se os galpões e mesmo o espaço, não somente pela localização ou por atributos físicos do empreendimento; mas, como percebemos, isso também ocorre através da consolidação de uma convenção imobiliária e do prestígio de grandes grupos econômicos instalados nesses espaços. Desse modo, estabelece-se uma localização AAA. Em nossa pesquisa, revelamos que em Cajamar, além dos empreendimentos da Prologis, premiados e referenciais do setor, há a formação de uma coalizão entre proprietário de terras, grandes grupos econômicos e a prefeitura para a produção desse polo logístico em meados dos anos 2000. Polo que vai se fortalecendo com a chegada dos Correios e de seu braço de logística corporativa, Correios Log+, e com a entrada de outro gigante do setor, a Global Logistics Properties, que tem sede em Cingapura e hoje é um dos maiores grupos de galpão logístico no País. A chegada destes grandes agentes nacionais e internacionais, estatais e privados, pavimenta o reconhecimento de Cajamar como a “pérola da logística” na RMSP e a mais notória convenção do mercado imobiliário logístico na macrometrópole paulista, uma localização triplo A. Tornou-se sinal de posicionamento e distinção no mercado estar localizado em Cajamar junto das rodovias Anhanguera e Bandeirantes.

Figura 1
– Mancha urbana de Cajamar e a expansão dos galpões de 2005-2018

Apesar disso, é importante destacar a manutenção da posição competitiva do município para manter-se em tal posição, através de isenções tributárias e de outros incentivos, retrato da reestruturação produtiva em que se articula a gestão pública competitiva e de cunho neoliberal. Conforme afirmou o diretor de Habitação de Cajamar, Carlos Guio (2019), em entrevista: “Daqui [Cajamar] até depois de Campinas, é possível construir Galpões padrão AAA, por isso a competição é pesada para o município, temos que nos posicionar, nos modernizar.” Ou seja, é uma localização, bem flexível, mais ou menos linear, de mais de 60 km, que se abre para os incorporadores imobiliários, demandando apenas um bom acesso viário ao longo dessa extensão ou mesmo no entorno do rodoanel metropolitano da RMSP, grande local de concentração de galpões logísticos (Santoro e Rolnik, 2017SANTORO, P. F.; ROLNIK, R. (2017). Novas frentes de expansão do complexo imobiliário-financeiro em São Paulo. Cadernos Metrópole. São Paulo, v. 19, n. 39, pp. 407-431.).

O incorporador, gozando de relativa “liberdade” para escolher o local de implantação do empreendimento, vai se orientar pelo maior rendimento possível, aliado a benefícios fiscais, abandonando, quase totalmente, outras relações, com o entorno, para além do acesso viário. Movimenta-se em busca de rent gaps (Smith, 2007SMITH, N. (2007). Gentrificação, a fronteira e a reestruturação do espaço urbano. Revista Geousp, tempo e espaço, n. 21, pp. 15-31.), diferenças de renda fundiária a serem apropriadas no desenvolvimento de empreendimentos imobiliários que podem ser vendidos a certo preço referencial, discrepante em relação àquela localização. Ou seja, quanto mais barata a terra, maior é a renda apropriada, visto que o preço de locação de um metro quadrado de galpão logístico tem pouca oscilação na macrometrópole paulista.

Figura 2
– Infografia dos preços nos raios concêntricos a RMSP

Entretanto, apesar da flexibilidade de localização apontada, há outros fatores que constrangem tal liberdade. Os empreendimentos logísticos demandam grandes extensões de solo para sua implantação. Um lugar com uma grande fragmentação de proprietários pode atrapalhar a negociação ou mesmo travar um empreendimento, no sentido de o valor de uso da terra de um proprietário poder se constituir como barreira ao processo de acumulação na atividade imobiliária, como apontou Topalov (1979)TOPALOV, C. (1979). “La formación de los precios del suelo en la ciudad capitalista: introducción al problema de la renta”. In: TOPALOV, C. La urbanización capitalista: algunos elementos para su análisis. México, 0Edicol.. Portanto, aqui surge a grande propriedade de terra como um fator de convergência que pode viabilizar o projeto de um condomínio logístico e o acesso a grandes montantes de renda. A transformação do uso da terra pela atividade imobiliária é a forma inicial de valorização da propriedade privada, que pode ser ampliada pela sua fragmentação em um condomínio, além de outros fatores de valorização, como localização, padrão construtivo, convenções sociais, etc. (Jaramillo, 1980JARAMILLO, S. (1980). Produccion de vivienda y capitalismo dependiente: el caso de Bogota. Bogotá, Colômbia, Dintel.; Harvey, 1974HARVEY, D. (1974). Class-monopoly rent, finance capital and the urban revolution. Regional Studies, v. 8, n. 3-4, pp. 239-255. DOI: 10.1080/09595237400185251.
https://doi.org/10.1080/0959523740018525...
). Neste trecho de reportagem, fica mais evidente a busca por rendas fundiárias, sendo a localização importante, mas dentro de um espectro amplo:

Para ficar de pé, porém, a atividade [de e-commerce] demanda o desenvolvimento de centros de armazenagem e distribuição de mercadorias o mais próximo possível dos centros de consumo, superando barreiras, como os custos elevados dos terrenos nas regiões metropolitanas e a escassez de imóveis preparados para abrigar essas atividades […]. No Brasil, apenas 34% dos galpões logísticos de São Paulo e Rio de Janeiro estão localizados em um raio de até 30 quilômetros das capitais, o que permitiria as entregas ultrarrápidas [...]. Esse porcentual é baixo para atender à demanda crescente do comércio eletrônico e sinaliza um grande potencial para novos negócios imobiliários. (Souza e Bonatelli, 2018, s/p)

Na matéria acima, é ressaltado que, para o desenvolvimento do e-commerce, são necessários novos centros de armazenagem e distribuição, galpões logísticos, com os atributos locacionais supracitados e a preços que viabilizem os negócios. Tais atributos, ao que parece, foram encontrados em Cajamar pelas mãos da família Abdalla, grande proprietária de terra em todo o estado de São Paulo e, mais especificamente, com a propriedade de mais da metade das terras de Cajamar. Conforme nosso levantamento, alguns dos principais empreendimentos logísticos de Cajamar foram construídos em terras da família Abdalla, como o galpão da Correios Log+, da GLP e todos os da Prologis.

Ao buscar grandes extensões de terra, próximas aos grandes centros, os incorporadores, assim como em Cajamar, têm invadido outras áreas nas bordas da RMSP, principalmente nas proximidades dos acessos do rodoanel metropolitano (Santoro e Rolnik, 2017SANTORO, P. F.; ROLNIK, R. (2017). Novas frentes de expansão do complexo imobiliário-financeiro em São Paulo. Cadernos Metrópole. São Paulo, v. 19, n. 39, pp. 407-431.). São galpões com 60 mil metros quadrados de área construída, ocupando áreas de mais de 150 mil metros quadrados, aproximadamente quinze quarteirões médios, para um empreendimento. Um novo contexto para a periferia metropolitana com a entrada de agentes globais do setor imobiliário, em áreas marcadas muitas vezes pela precariedade e pelo alto índice de vulnerabilidade social, territórios populares que passam a se inserir na mercantilização do espaço de maneira mais intensa, uma mercantilização sob o ritmo das finanças globais. Esse processo tende a intensificar os conflitos fundiários e restringir ainda mais o acesso à terra e à moradia pelas camadas populares ou mesmo inviabilizar certos espaços para essas populações, seja por uma remoção forçada ou mesmo por estarem impactadas pelo ônus excessivo com o aluguel. Além disso, a demanda por grandes extensões de terreno aplainados requer uma enorme movimentação de terras em obras de terraplanagem, o que pode gerar uma série de impactos ambientais, como desmatamentos, supressão de corpos d’água, entre outros.

Ambos os impactos, sociais e ambientais, foram registrados em Cajamar para a construção de certos empreendimentos e da infraestrutura pública na área do polo logístico. Foram remoções, via reintegração de posse, de cerca de 180 famílias do bairro do Gato Preto, junto ao empreendimento da Prologis, em 2012. Ainda no mesmo ano, a prefeitura destruiu boa parte de uma antiga instalação ferroviária, que é um patrimônio histórico tombado, também, no bairro do Gato Preto, uma área cobiçada pelo setor de logística por estar junto da rodovia e ser de fácil acesso a ela. Além disso, um pequeno assentamento precário foi removido nas obras de abertura da avenida Dr. Antônio João Abdalla, principal avenida do polo logístico. Nas obras desse conjunto de infraestruturas e do empreendimento Cajamar I, da Prologis, também foram cometidos crimes ambientais autuados pela Cetesb, por aterramento de nascentes e de corpo hídrico. Parecem ser flagrantes, no caso de Cajamar, alguns conflitos fundiários que o avanço de agentes financeiros e da mercantilização do espaço pode gerar. São novos agentes articulados a antigas práticas autoritárias, evidenciando uma hibridização de formas de (re)produção do espaço capitalista e de expansão de suas fronteiras de acumulação. Um movimento que amplia as formas de privatização, hierarquização e diferenciação do espaço, agravando as desigualdades e a segregação socioespacial.

O galpão logístico e sua circulação como ativo financeiro

A mercadoria imobiliária – mercadoria específica produzida pelo setor imobiliário –, como um bem durável, demanda uma grande soma de recursos para sua produção e para sua circulação, exige um longo prazo para sua produção e sua depreciação é lenta, ou seja, ela possui uma liquidez particular. Nesse sentido, é, historicamente, dependente do sistema de crédito para sua produção e para sua circulação. Mas, apesar de compartilhar essas características, ela difere de outros bem duráveis, pois, na sua produção, a propriedade da terra é um insumo e é “embutida” nessa mercadoria (Topalov, 1979TOPALOV, C. (1979). “La formación de los precios del suelo en la ciudad capitalista: introducción al problema de la renta”. In: TOPALOV, C. La urbanización capitalista: algunos elementos para su análisis. México, 0Edicol.; Jaramillo, 1980JARAMILLO, S. (1980). Produccion de vivienda y capitalismo dependiente: el caso de Bogota. Bogotá, Colômbia, Dintel.; Ribeiro, 1997RIBEIRO, L. (1997). Dos cortiços aos condomínios fechados: as formas de produção da moradia na cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira/Ippur/UFRJ/Fase.). Isso torna específica essa mercadoria, pois a terra é um bem que não tem valor, por não ser produzido pelo homem, mas, possui um preço, a renda fundiária, que, sem lastro em um valor, é um valor fictício, sujeito à especulação e a outras convenções sociais para sua precificação. Portanto, por se valorizar de maneira fictícia, essa mercadoria é propícia a se constituir como um ativo financeiro (Harvey, 2013HARVEY, D. (2013). Os limites do capital. São Paulo, Boitempo.). Entretanto, de maneira contraditória, possui uma liquidez particular que travaria a acumulação no setor. Então, como ajustar esse objeto fixo aos fluxos de capital? As formas de resolver esse problema são parte da especificidade da maneira como se organiza a atividade imobiliária e tem impacto direto no processo de acumulação de capital do setor.

O galpão logístico é um nicho do mercado imobiliário que tem, nos últimos anos, um crescimento acentuado. O setor imobiliário conta com uma ampla quantidade de publicações internacionais e nacionais que reúnem informações na intenção de acompanhar sua dinâmica e orientar os investimentos de agentes financeiros. Nessas diversas publicações, o galpão logístico figura ao lado das lajes corporativas, compondo o setor de Comercial Properties, que são empreendimentos que abrigam atividades que geram lucro. Somente em relatórios mais específicos, os galpões são monitorados à parte. Apesar de serem mercados e produtos bem distintos, ambos são acessados através do arrendamento ou do aluguel, no qual o imóvel é cedido ao locatário por tempo determinado em troca de uma renda mensal; ou seja, uma forma de cessão/circulação da propriedade. A semelhança do seu formato de circulação traduziu-se em parâmetros de monitoramento do mercado também semelhantes. Entretanto, esse movimento não é tão neutro. Nos relatórios mais sintéticos, ambos os nichos de mercado são apresentados pelos itens abaixo mencionados.

Quadro 1 – Índices de acompanhamento do mercado de lajes corporativas e de galpões logísticos
Índices de acompanhamento do mercado de lajes corporativas e galpões logísticos
  • Estoque

  • – área total existente –

  • Novo Estoque

  • – metragem adicionada em determinado período, geralmente trimestral –

  • Vacância

  • – apresentada como porcentagem do estoque total –

  • Absorção líquida

  • – metragem ou porcentagem absorvida do novo estoque em determinado período, geralmente trimestral –

  • Preço

  • – R$/m2/mês –

Fonte: CBRE. Reprodução.

Apesar da enorme diferença material desses dois nichos, ambos são monitorados de forma análoga. Além desse formato de apresentação de dados sobre esses dois produtos, existe ainda uma gama muito extensa de relatórios sobre ambos os setores, mas entendemos que este, mais simplificado, traz elementos importantes para entender o movimento do mercado. Todos os cinco fatores estão em interação constante e trazem apontamentos iniciais aos agentes do mercado para orientar suas decisões, mas o dado que recebe mais atenção dos analistas é a absorção líquida, que pode indicar movimentos ainda não expressos numa variação dos preços nem na atividade imobiliária em si, representada pelo novo estoque. Um índice de absorção alto indica um mercado em expansão, o que não acontece se olharmos somente a vacância, pois ela pode estar baixa, mas não existe uma dinâmica de absorção que demande a produção de um novo estoque. Ou seja, a absorção é o primeiro sinal para a produção de novos galpões. O importante a guardar aqui é a sua semelhança em relação ao nicho de lajes corporativas, principalmente sob dois aspectos, a sua cessão de uso da propriedade via locação ou arrendamento e a sua consequente equiparação estatística para análises de suas dinâmicas. Isso permitindo, entre outros, que os relatórios das empresas de consultoria imobiliária, como Cushman & Wakefield, CBRE e Hines, cubram todos os mercados ao redor do globo de forma indistinta, sintetizando todos em índices comparáveis que orientarão decisões de investimento.

Entendemos que essa equiparação é um mecanismo de descaracterização da especificidade do produto, operada pelo mercado com foco na transformação dessa propriedade em ativo financeiro, fato que acontece com uma grande variedade de ativos e que já destacamos aqui, ao falarmos das certificações. Os agentes financeiros, através de órgãos multilaterais e think-tanks, criam uma série de modelos, fornecem consultorias e suporte técnico para o enquadramento de mercados específicos aos parâmetros globais, como destaca Fernandez e Aalbers (2016)FERNANDEZ, R.; AALBERS, M. B. (2016). Financialization and housing: between globalization and varieties of capitalism. Competition & Change, v. 20, n. 2, pp. 71-88. Disponível em: https://doi.org/10.1177/1024529415623916. Acesso em: jan 2019
https://doi.org/10.1177/1024529415623916...
. A adequação dos mercados pela disseminação de regulações é fundamental para reduzir as rugosidades sociais e especificidades dos mercados, criando um ambiente de maior fluidez para a circulação do capital dinheiro.

No Brasil, a transformação das formas de financiamento do setor imobiliário, para maior adequação aos fluxos financeiros globais, ocorre nos anos 1990. Na esteira da enxurrada neoliberal do governo de Fernando Henrique Cardoso de estabilização macroeconômica, ajustes fiscais e redução do Estado, cria-se o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), que tem o objetivo de viabilizar uma fonte de financiamento, via mercado de capitais, em oposição ao Sistema de Financiamento Habitacional (SFH), que utiliza recursos de poupanças opcionais e compulsórias, criado durante a ditadura militar e seu projeto nacional desenvolvimentista. Portanto, a criação do SFI surge a partir da retórica neoliberal para ampliar as modalidades de captação de recursos no mercado financeiro para a produção imobiliária que transformaram o financiamento imobiliário num contexto de crise fiscal do Estado desenvolvimentista (Royer, 2010ROYER, L. O. (2010). Financeirização da política habitacional: limites e perspectivas. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo.).

Os fundos de investimento imobiliário (FIIs), apesar de serem um produto que amplia a relação do setor imobiliário com o mercado de capitais, surgem antes do SFI, em 1993. Em 1997, no SFI, é um conjunto de inovações regulatórias que “buscam articular o setor imobiliário com o mercado financeiro, estabelecendo um processo de desintermediação bancária para o financiamento da produção, ao mesmo tempo que oferecem possibilidades de ganhos financeiros aos investidores” (Botelho, 2007BOTELHO, A. (2007). A cidade como negócio: produção do espaço e acumulação do capital no município de São Paulo. Cadernos Metrópole. São Paulo, v. 9, n. 18, pp. 15-38,, p. 29). Assim, as empresas do setor conseguem um “acesso direto ao mercado de capitais, reduzindo, teoricamente, os custos e riscos da captação de recursos financeiros” (ibid.). A partir dessas novidades na regulação do setor, outra característica une os galpões e as lajes corporativas: o produto financeiro que as empacota para a circulação no mercado financeiro. Os dois tipos de propriedades imobiliárias, seja a logística ou a corporativa, podem compor carteiras de investimentos através de FII. O FII é uma “comunhão de recursos captados por meio do sistema de distribuição de valores mobiliários e destinados à aplicação em empreendimentos imobiliários” (UQBAR, 2018UQBAR (2018). Anuário UQBAR 11a edição – Fundos de Investimentos Imobiliários. Disponível em: https://www.uqbar.com.br/anuarios-uqbar-fidc-fii-cri-cra/. Acesso em: maio 2018.
https://www.uqbar.com.br/anuarios-uqbar-...
, p. 7). O FII é “uma das dimensões recentes da articulação entre mercados financeiros liberalizados e a produção das cidades” (Sanfelice, 2017SANFELICE, D. (2017). La industria financiera y los fondos inmobiliarios en Brasil: lógicas de inversión y dinámicas territoriales. Economía, Sociedad Y Territorio, v. XVII, n. 54, pp. 367-397., p. 368; tradução nossa).

Os fundos imobiliários nada mais são do que fundos de investimentos constituídos em cotas de condomínio fechado, geridos por um profissional (gestor ou administrador), que têm como finalidade investir em empreendimentos imobiliários dos mais diversos, como: shoppings centers, galpões logísticos, hospitais, ativos imobiliários voltados para a educação, lajes corporativas, etc. Além disso, tais fundos podem investir ainda em ativos de renda fixa na forma de dívida imobiliária, como: LCIs (Letras de Crédito Imobiliários), CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários), LHs (Letras Hipotecárias), etc. (FIIs, 2018FIIS (2018). Manual do Investidor em FIIs. Disponível em: <https://fiis.com.br/ebook-manual-do-investidor-em-fiis/. Acesso em: maio 2018.
https://fiis.com.br/ebook-manual-do-inve...
, s/p)

O FII é o principal meio de circulação das propriedades de galpões logísticos. O imobiliário logístico representa hoje uma fatia significativa do mercado de FIIs, com mais de 10% do patrimônio líquido total, algo em torno de R$10,5 bilhões (UQBAR, 2020). Esses números mostram uma ascensão meteórica dos galpões, visto que, em 2016, este nem figurava como um setor discriminado, sendo englobado no montante de “outros”, num mercado dominado pelos shoppings e lajes corporativas. Em 2018, passa a figurar como um setor com mais destaque, mas com apenas 2,5% do patrimônio líquido total, cerca de R$1,02 bilhão dos FIIs abertos na B3; ocupando a sexta posição no ranking liderado pelas lajes corporativas, que representam cerca de R$10 bilhões (ibid.). Em 2020, o setor passa à quarta posição com R$10 bilhões em ativos, ou seja, o setor atinge o patamar do setor de lajes corporativas em 2018 e se consolida no mercado de FIIs, em poucos anos. A sua crescente importância pode ser verificada, também, no Gráfico 1, que indica a parcela captada pelo setor de logística na captação total feita pelos FIIs em 2020. Não obstante, isto se traduziu em um aumento significativo na composição do Ifix, principal índice do setor de fundos imobiliários (Gráfico 2). A intensa procura por fundos relacionados a esses ativos refletiu-se, também, na sua dinâmica de preços, sendo o segmento com maior valorização acumulada em 2020, em oposição ao corporativo que sofreu maior perda (Gráfico 3).

Gráfico 1
– Montante captado por FIIs e porcentagem de fundos de logística

Gráficos 2
Porcentagem dos FIIs dentro do Ifix em 2020 e valorização acumulada por setor em 2020

Gráficos 3
– Porcentagem dos FIIs dentro do Ifix em 2020 e valorização acumulada por setor em 2020

Apesar do crescimento e da razoável dispersão de ativos por todo Brasil, comparado ao cenário apresentado por Botelho (2007)BOTELHO, A. (2007). A cidade como negócio: produção do espaço e acumulação do capital no município de São Paulo. Cadernos Metrópole. São Paulo, v. 9, n. 18, pp. 15-38, e Sanfelici (2017), os FIIs de logística ainda se concentram na região Sudeste e principalmente em São Paulo, com 54% de área bruta locável (ABL), como podemos ver no Mapa 2. A concentração é relacionada a uma variedade de fatores, alguns tácitos, como o conhecimento e a proximidade dos investidos do local do ativo, e outros relacionados a lógica financeira de previsibilidade, certificação triplo A, grandes clientes corporativos, que os brindam com menor risco e maior liquidez. A junção desses fatores constitui, para Sanfelice (2017)SANFELICE, D. (2017). La industria financiera y los fondos inmobiliarios en Brasil: lógicas de inversión y dinámicas territoriales. Economía, Sociedad Y Territorio, v. XVII, n. 54, pp. 367-397., um obstáculo a dispersão dos ativos.

Mapa 2
– Inventário do estoque de área de galpão logístico – 2017

Apesar da crise político-econômica que se instalou no País após o impeachment da presidente Dilma Roussef, a baixa do mercado logístico, que pode ser verificada a partir de 2014 (Gráfico 4), tem relação com o boom especulativo dos FIIs entre 2011 e 2013 (Sanfelice, 2017SANFELICE, D. (2017). La industria financiera y los fondos inmobiliarios en Brasil: lógicas de inversión y dinámicas territoriales. Economía, Sociedad Y Territorio, v. XVII, n. 54, pp. 367-397.; XPInvestimentos, 2020XPINVESTIMENTOS (2020). Fundos Imobiliários. Galpões Logísticos: Resiliência durante a crise do coronavírus. Abril. Disponível em: <https://conteudos.xpi.com.br/wp-content/uploads/2020/04/Galp%C3%B5es-Log%C3%ADsticos-Abr20.pdf. Acesso em: 5 maio 2021.
https://conteudos.xpi.com.br/wp-content/...
), que foi ocasionado por uma avalanche de novos fundos e grande produção de galpões, o que levou a uma inflação das cotas de FIIs que, logo em seguida, foram reprecificadas para baixo. A crise brasileira, também, impactou o setor logicamente, mas já havia uma dinâmica interna em curso. É possível notar, também, no mesmo gráfico, a franca retomada do setor, na barra de absorção líquida, que, como na dinâmica dos últimos anos, é puxada pelo setor de e-commerce. O “catalisador do processo” (XPInvestimentos, 2020XPINVESTIMENTOS (2020). Fundos Imobiliários. Galpões Logísticos: Resiliência durante a crise do coronavírus. Abril. Disponível em: <https://conteudos.xpi.com.br/wp-content/uploads/2020/04/Galp%C3%B5es-Log%C3%ADsticos-Abr20.pdf. Acesso em: 5 maio 2021.
https://conteudos.xpi.com.br/wp-content/...
), o setor de comércio digital, é responsável por mais da metade da área locada em galpões. Portanto, como já salientamos ao longo do trabalho, é um imbricamento de setores que indica novos arranjos e coalizões na produção do espaço. Com a pandemia do coronavírus, esse arranjo imobiliário-financeiro-e-commerce explodiu, como podemos verificar nos Gráficos 1 e 3.

Gráfico 4
– Dinâmica de novo estoque, absorção e vacância – 2012-2021

Cajamar, como importante polo da macrometrópole paulista, possui empreendimentos que são ativos de propriedade de fundos imobiliários. Destacamos os empreendimentos da Prologis, cujo avanço desproporcional na cidade, tendo construído três empreendimentos, praticamente concomitantes, com uma metragem que excede os 200 mil metros quadrados de área construída, foi articulado graças à alavancagem numa venda antecipada ao fundo de pensão Previ e à expansão das atividades da gigante global do varejo digital, a Amazon no Brasil, estratégia já utilizada nos Estados Unidos. Esses empreendimentos abrigam o principal centro de distribuição (CD) da Amazon e fazem parte do fundo de investimento PBVL11, do mesmo grupo, lançado poucos meses após o anúncio da entrada desse locatário multinacional, uma temporalidade ajustada que alavancou a operação, realizando a maior captação de um FII de logística até aquele momento. Em Cajamar, também está o CD da Leroy Merlin, grande grupo varejista francês de material de construção e objetos para casa; ativo integrante do fundo XPLOG, gerido pela XPInvestimentos. Nos galpões de Cajamar, houve, também, a entrada de outras gigantes do setor, como Mercado Livre, B2W, Netshoes, entre outros. Portanto, Cajamar é um palco privilegiado das ações desse arranjo imobiliário-financeiro-e-commerce e, com a atual crise sanitária, esse processo em curso chega a um novo patamar.

Conclusão

A financeirização tem promovido a reestruturação da geografia do capitalismo, e as metrópoles são palco privilegiado dessas mudanças. Aqui apresentamos algumas características desse produto imobiliário, os galpões logísticos, a partir dessas transformações e depois delimitando suas características enquanto produto imobiliário. Os galpões são parte da emergência da logística dentro da reestruturação produtiva, em que grupos econômicos procuram liquidez, fragmentando a produção, terceirizando e desfazendo-se de certos ativos de baixa liquidez. A partir disso, o galpão logístico vai se consolidando como um setor importante do ramo imobiliário, sendo modelado e concebido de acordo com referenciais específicos, certificações e gabaritado em categorias, até o mais alto posto, o triplo A. Modelado e parametrizado, o galpão torna-se um objeto inteligível aos códigos e aos procedimentos do mercado financeiro. Um ativo comparável, mesurável e mais previsível, características que auxiliam, na visão de mercado, a diminuir os riscos e a prover liquidez a ele. Já pronto e modelado, apresentamos como os Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs) tornam-se a forma dominante de circulação da propriedade dos galpões. Encerramos a caracterização desse, produto dando destaque para o arranjo que se forma entre o setor imobiliário logístico, as finanças e o setor varejista digital, o e-commerce.

A partir do caminho que trilhamos até aqui para apresentar os galpões logísticos, desde sua inserção em dinâmicas gerais e abstratas do capitalismo global, até as suas dimensões materiais e concretas dos empreendimentos em Cajamar e das dinâmicas dos fundos imobiliários, parece ser evidente o avanço desse tipo de empreendimento, dos grandes grupos de e-commerce, dos agentes e produtos financeiros atrelados a ele pelo Brasil. Ou seja, os galpões são uma dimensão emergente da financeirização do espaço urbano que intensifica a sua mercantilização e que se dissemina em novos espaços. No caso dos galpões, esse avanço se dá nas bordas da metrópole, em cidades pequenas e médias, em seu entorno próximo, complexificando as relações interurbanas e metropolitanas. São polos logísticos em Cajamar, Guarulhos e Barueri, na RMSP; novos polos na região metropolitana do Rio de Janeiro, em torno do arco metropolitano, principalmente na cidade de Itaguaí e Seropédica; em Jaboatão dos Guararapes na Região Metropolitana do Recife, para citar alguns que têm aparecido de forma recorrente no portfólio de fundos e na imprensa especializada. Novos espaços inseridos nessa dinâmica de certificações, performance, ranking e outros métodos e procedimentos do mercado financeiro para homogeneizar e hierarquizar o espaço. Portanto, estamos diante de novas manifestações da financeirização do setor imobiliário que encontram, em novos espaços da metrópole, sua fronteira de acumulação. A entrada nesses espaços, ao intensificar a mercantilização da terra, pode agravar os conflitos em torno do acesso à moradia e do direito à cidade em áreas já precárias e marcadas por problemas fundiários e de acesso à infraestrutura.

A proliferação desses galpões, para além dessa dimensão de produto da financeirização do setor imobiliário, trouxe à tona a sua articulação com o setor de e-commerce, formando o arranjo imobiliário-financeiro-e-commerce que destacamos aqui. A pandemia catapultou o setor de comércio digital. Com muitas pessoas em quarentena e trabalhando de casa, o consumo nessas plataformas ampliou-se muito e acentuou a ascensão de um setor que já vinha crescendo a dois dígitos há alguns anos. Entretanto, este não é um movimento simples. Ele já tem sido o motor de grandes mudanças nas cidades. Nos Estados Unidos, onde esse movimento já apresenta um agravamento, ele resultou no fechamento expressivo de estabelecimentos comerciais nos últimos anos, o que vem sendo chamado de “apocalipse do varejo”.10 (10) ‘Retail apocalypse’ now: Analysts say 75,000 more U.S. stores could be doomed. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/business/2019/04/10/retail-apocalypse-now-analysts-say-more-us-stores-could-be-doomed/. Acesso em: jan 2019. São milhares de estabelecimentos vazios, de grandes a pequenos comércios, um esvaziamento da cidade. A expansão acelerada dos gigantes do varejo digital está transformando a forma de consumo e, ao mesmo tempo, impulsionando a oligopolização do comércio a novos patamares. Em paralelo a isso, o avanço dos grandes grupos de e-commerce é também a ascensão de todo sistema logístico, novos pontos intraurbanos de pequenos estoques e retiradas de mercadorias, sistemas de vans e motoqueiros. Agentes do setor financeiro ligado ao ramo imobiliário já discutem estes impactos no Brasil, principalmente nos FIIs de shopping. Como será o impacto dessas mudanças no Brasil, somado ao desastre da pandemia?

Neste trabalho, quisemos trazer esse novo elemento que compõe o ambiente construído e refletir sobre suas características e seus impactos. Como vimos, ele traz novos conteúdos para pensarmos a financeirização e o futuro das nossas cidades, do imobiliário ao nosso consumo cotidiano. As cidades parecem estar à venda de novas formas, assim, pensar novos aportes teóricos e novos estudos empíricos é muito importante para a compreensão dessa dinâmica.

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Notas

  • (*)
    Este artigo é resultado da pesquisa de mestrado realizada no Instituto de Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Ippur-UFRJ) com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Agradeço a Laisa Stroher e ao Fernando Yassu, pela revisão atenta e pela contribuição com este artigo.
  • (1)
    Entendemos por (re)produção da metrópole os processos e as formas de produção e reprodução social do espaço metropolitano; concentramo-nos na atividade imobiliária como importante agente desse processo, com formas renovadas, devido a financeirização e reestruturação do setor.
  • (2)
    Outros trabalhos aprofundaram-se nas atividades do setor de forma mais sistemática e sobre outros aspectos (Zioni, 2009ZIONI, M. S. (2009). Espaços de Carga na Região Metropolitana de São Paulo. Tese de doutorado. São Paulo, Universidade de São Paulo.; Finatti, 2011FINATTI, R. (2011). Condomínios empresariais nas áreas metropolitanas do Estado de São Paulo: produção imobiliária e localização da indústria. Dissertação de mestrado. São Paulo, Universidade de São Paulo. e 2016).
  • (3)
    A logística como forma de gestão de suprimentos é mais antiga e tem origem na atividade militar, ainda no século XIX; ela passa a penetrar na atividade empresarial nos anos 1970 (Danyluk, 2018DANYLUK, M. (2018). Capital’s logistical fix: Accumulation, globalization, and the survival of capitalism. Environment and Planning D: Society and Space, v. 36, n. 4, pp. 630-647. DOI:10.1177/0263775817703663.
    https://doi.org/10.1177/0263775817703663...
    ).
  • (4)
    Apesar da relevância do comércio digital para as dinâmicas apresentadas, não abordaremos as relações entre digitalização, plataformas digitais e a logística, nosso interesse se concentra no setor imobiliário.
  • (5)
    Aqui, não vamos utilizar o termo condomínios empresariais (Finatti, 2011FINATTI, R. (2011). Condomínios empresariais nas áreas metropolitanas do Estado de São Paulo: produção imobiliária e localização da indústria. Dissertação de mestrado. São Paulo, Universidade de São Paulo. e 2016) nem o termo condomínios industriais (Lencioni, 2011a), utilizados pelos autores para definir empreendimentos imobiliários semelhantes, o condomínio modular industrial e o galpão logístico. Durante este trabalho, vamos utilizar, apenas, galpões logísticos, por dois motivos: o primeiro por ser esta a forma emergente da atividade imobiliária financeirizada que queremos destacar, não existindo outras formas de uso desses condomínios descritos pelos autores; o segundo por ser o termo utilizado pelos agentes do mercado em publicações sobre investimentos imobiliários financeiros (FIIs, 2018FIIS (2018). Manual do Investidor em FIIs. Disponível em: <https://fiis.com.br/ebook-manual-do-investidor-em-fiis/. Acesso em: maio 2018.
    https://fiis.com.br/ebook-manual-do-inve...
    ) e na mídia especializada.
  • (6)
    Existem outros tipos de condomínios industriais com módulos separados, locados de forma integral.
  • (7)
    As premiações no mundo corporativo e especialmente no mercado imobiliário são disseminadas, assim como nas políticas públicas e ações de ONGs. Um mundo de “melhores práticas”, ranqueamentos, certificações, em grande parte, modelos de disseminação do ideário neoliberal, para a melhoria do desempenho das corporações, do Estado e dos indivíduos (Brenner et al., 2012BRENNER, N.; PECK, J.; THEODORE, N. (2012). Após a neoliberalização? Cadernos Metrópole. São Paulo, v. 14, n. 27, pp. 15-39.; Laval e Dardot, 2016LAVAL, P.; DARDOT, C. (2016). A nova razão do mundo – Ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo, Boitempo.). Uma adequação ao padrão de competição e concorrência da sociabilidade contemporânea.
  • (8)
    Certificado de critérios de sustentabilidade dado para construções que devem atingir uma pontuação mínima em determinados quesitos.
  • (9)
    Entrevista realizada no canal InfomoneyTV. Disponível na página do FII-XPLOG <https://xplog.riweb.com.br. Acesso em: jan 2019.
  • (10)

    ‘Retail apocalypse’ now: Analysts say 75,000 more U.S. stores could be doomed. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/business/2019/04/10/retail-apocalypse-now-analysts-say-more-us-stores-could-be-doomed/. Acesso em: jan 2019.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2021
  • Aceito
    12 Maio 2021
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