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Infraestruturas nas Copas do Mundo da Alemanha, África do Sul e Brasil

Infrastructures in the Germany, South Africa and Brazil World Cups

Resumos

O Brasil sediará, em 2014, a Copa do Mundo de Futebol: evento mundial que ocorre a cada quatro anos e é responsável pela movimentação de um grande número de pessoas. A preparação para receber a Copa exige do país-sede grandes investimentos em infraestruturas que muitas vezes permanecem subutilizadas após o evento. O objetivo do trabalho é avaliar se as infraestruturas – estádios e sistemas de transporte – construídas para as copas da Alemanha, África do Sul e Brasil constituem legado positivo para os países-sede. A metodologia utilizada foi o estudo de casos desenvolvido a partir de dados secundários. O trabalho mostrou que (1) no caso do Brasil, os investimentos em sistemas de transporte não atendem as reais necessidades das cidades-sede e (2) diferentemente da Alemanha, na África do Sul os estádios estão em grande parte subutilizados e com dificuldade para serem mantidos. As perspectivas para o Brasil também não são boas e há grandes chances de que o país enfrente problemas semelhantes aos da África do Sul.

copa do mundo; futebol; estádios; sistemas de transporte; legados


Brazil will host the FIFA World Cup in 2014, which is a worldwide event that occurs every four years and is responsible for moving a large number of people.The preparation to host the World Cup requires high investments in infrastructure that often remains underutilized after the event. The objective of this research is to evaluate whether the infrastructure (stadiums and transport systems) built for the Germany, South Africa and Brazil World Cups are positive legacies for the host countries. The methodology was case study, which was developed from secondary data. The study showed that (1) in Brazil, investments in transport ation systems do not meet the host cities’ real needs, and (2) unlike what happened in Germany, in South Africa stadiums are underutilized, and there are difficulties to maintain them. The perspectives to Brazil are not good and there are great chances that the country will face problems that are similar to those of South Africa.

world cup; soccer; stadiums; transport systems; legacies


Introdução

O Brasil será a sede da Copa de Futebol em 2014, um dos maiores eventos esportivos do mundo. De acordo com a Fédération Internationale de Football Association (Fifa), quase 31 milhões de pessoas já assistiram pelo menos um dos 708 jogos realizados na Copa do Mundo desde 1930, uma média de 44 mil pessoas por jogo (Fifa, 2012FÉDÉRATION INTERNATIONALE DE FOOTBALL ASSOCIATION (FIFA) (2012). Quality Concept for Football Turf – Handbook of Requirements.). Sediar uma Copa significa disponibilizar infraestrutura adequada para a realização de 64 partidas de futebol e hospedar e garantir o deslocamento, durante um mês, de 32 equipes, suas comitivas e torcedores vindos de todas as partes do mundo. Assim, a preparação para receber esse evento demanda dos países um volume significativo de recursos investidos na construção e/ou reforma dos estádios e, também, em sistemas de transporte (mobilidade urbana e infraestruturas como rodovias, aeroportos, portos e ferrovias).

A Fifa argumenta que a Copa traz para as cidades vários legados positivos como crescimento do turismo, capacitação da mão de obra e melhorias nas infraestruturas, além de divulgar a imagem do país para o mundo (Fifa, 2012FÉDÉRATION INTERNATIONALE DE FOOTBALL ASSOCIATION (FIFA) (2012). Quality Concept for Football Turf – Handbook of Requirements.). Mas, vários autores discutem se há de fato ganhos efetivos para os países que sediam grandes eventos (Cornelissen e Swart, 2006CORNELISSEN, S. e SWART, K. (2006). The 2010 Football World Cup as a political construct: the challenge of making good on an African promise. The Sociological Review, 54, pp. 108–123.; Lee e Taylor, 2005LEE, C. E TAYLOR, T. (2005). Critical reflections on the economic impact assessment of a mega-event: the case of 2002 FIFA World Cup. Tourism Management, v. 26, n. 4, pp. 595-603.; Matheson e Baade, 2004MATHESON, V. A. e BAADE, R. A. (2004). Mega-sporting events in developing nations: playing the way to prosperity. The South African Journal of Economics, v. 72, p. 5.; Matheson, 2009MATHESON, V. (2009). Economic Multipliers and Mega-Event Analysis. International Journal of Sport Finance, v. 4, n. 1, pp. 63-70., etc.). De modo geral, os autores observam que há poucos casos de sucesso e muitos relatos de problemas e dificuldades enfrentados pelos países. Entre as razões para os maus resultados estão:

  •  o custo final das obras quase sempre superior ao previsto. Na Copa 1994, nos Estados Unidos, houve prejuízo de 9 bilhões de dólares ao invés do lucro estimado de 4 bilhões (Matheson e Baade, 2004MATHESON, V. A. e BAADE, R. A. (2004). Mega-sporting events in developing nations: playing the way to prosperity. The South African Journal of Economics, v. 72, p. 5.). No Japão e Coréia do Sul, na Copa de 2002, os custos das obras de infraestrutura foram bem superiores aos previstos inicialmente. No Brasil, o custo atual estimado está quase 300% maior que o previsto em 2007 (Brasil, 2012);

  •  número de turistas menor do que o esperado. Embora a Fifa afirme que haverá um crescimento no turismo, o número de visitantes pode ser equivalente ao de outros períodos, ou até mesmo inferior como ocorreu, em 2002, na Coreia (Lee e Taylor, 2005LEE, C. E TAYLOR, T. (2005). Critical reflections on the economic impact assessment of a mega-event: the case of 2002 FIFA World Cup. Tourism Management, v. 26, n. 4, pp. 595-603.). Isso acontece porque muitos turistas usuais evitam viajar na Copa (Matheson, 2009MATHESON, V. (2009). Economic Multipliers and Mega-Event Analysis. International Journal of Sport Finance, v. 4, n. 1, pp. 63-70.), mas também porque muitos deles pertencem à população local. Na África do Sul, por exemplo, mais de 60% da renda obtida na Copa foi resultado do turismo realizado pelos próprios sul-africanos (Cottle, 2011COTTLE E. (2011). South Africa´s World Cup: a legacy for whom? University of KawaZulu, Natal Press.);

  •  e, finalmente, prejuízos decorrentes do mau uso das infraestruturas. Dos dez estádios, preparados pela Coreia para a Copa, somente cinco são utilizados com regularidade (Cornelissen e Swart, 2006CORNELISSEN, S. e SWART, K. (2006). The 2010 Football World Cup as a political construct: the challenge of making good on an African promise. The Sociological Review, 54, pp. 108–123.). E muitos dos investimentos em transporte não priorizam as reais necessidades das populações locais, mas sim os interesses dos organizadores do evento (Essex e Chalkley, 2004ESSEX, S. e CHALKLEY, B. (2004). Mega-sporting Events in Urban and Regional Policy: A History of the Winter Olympics. Planning Perspectives, 19 (2), pp. 201-232.; Higham, 1999HIGHAM J. (1999). Sport as an avenue of tourism development: an analisys of positive and negative impacts of sports tourism. Current issues in Tourism, v. 2, n. 1, pp. 82-90.; Kassens, 2009KSSENS, E. (2009). Transportation Planning for Mega Events: Model of Urban Change. Tese de doutorado. Massachusetts Institute of Technology, Dept. of Urban Studies and Planning.; Pillay e Bass, 2012PILLAY, U. e BASS, O. (2008). Mega-events as a Response to Poverty Reduction: the 2010 FIFA World Cup and its Urban Development Implications. Urban Forum, v. 19, n. 3, pp. 329-346.).

Sediar a Copa do Mundo, portanto, diferentemente do propagado pela Fifa, não garante ao país um legado positivo. E, até mesmo as infraestruturas, consideradas por muitos como o legado mais importante, merecem uma análise mais criteriosa. O objetivo do trabalho é avaliar se as infraestruturas – estádios e sistemas de transporte – construídas para as copas da Alemanha, África do Sul e Brasil constituem um legado positivo para os países-sede. Cabe esclarecer que, além de certa imprecisão, as informações levantadas não tem o mesmo grau de profundidade para os três países estudados. Mesmo assim, sua sistematização permite estabelecer comparações e buscar o entendimento do papel dos legados nas copas em diferentes contextos.

O trabalho está organizado em quatro seções, além da introdução e conclusão: exigências impostas aos países sede pela Fifa, metodologia, sistematização das informações sobre estádios e sistemas de transporte e avaliação dos legados deixados para os países-sede. A metodologia utilizada foi estudo de casos a partir de dados secundários.

Exigências da Fifa para a realização da Copa do Mundo

Quando o país é escolhido para sediar os jogos, deve atender às inúmeras exigências da Fifa. A Fifa (2011)FÉDÉRATION INTERNATIONALE DE FOOTBALL ASSOCIATION (FIFA) (2011). Football stadiums technical recommendations and requirements. Disponível em: www.fifa.com/mm/document/ footballdevelopment. Acesso em: 10/6/2012.
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busca adequar suas exigências à realidade de cada país por meio de uma análise detalhada e a elaboração de uma Matriz de Responsabilidades onde estão definidas as obras prioritárias de infraestrutura e os responsáveis por sua execução:

  •  quanto ao sistema de transporte, além de investimentos em aeroportos, portos, rodovias e ferrovias, exige melhorias na mobilidade urbana;

  •  quanto aos estádios, exige cerca de doze instalações que devem oferecer no mínimo 30 mil assentos para os jogos internacionais, 50 mil para os jogos finais da Copa das Confederações e 60 mil para a final da Copa do Mundo.

Além da capacidade mínima, os estádios devem possuir amplas áreas de estacionamento e acesso por transporte de massa. Para os eventos internacionais, recomenda-se proximidade com hotéis, centros comerciais, heliportos e aeroportos. Jogadores e árbitros devem ter uma entrada exclusiva e segura, vestiários bem equipados, escritórios próximos aos vestiários, túnel de acesso ao campo e duas áreas para o aquecimento. Para atender ao público, os estádios devem ter cobertura, especialmente em locais com elevada incidência solar ou com clima úmido, assentos individuais fixados na estrutura da arquibancada, visibilidade perfeita do campo de qualquer ponto, cinco pontos para venda de ingresso para cada mil espectadores, e acessibilidade para portadores de deficiência. Para a mídia, devem ser construídas cabines com proteção acústica, com todos os equipamentos e tecnologias de última geração para a transmissão das partidas, três estúdios de televisão, sala para coletiva de imprensa com sistema de som e cem assentos e equipamentos para a realização de tradução simultânea.

A Fifa recomenda, ainda, a instalação de geradores e inúmeras ações para redução da emissão de CO2 como armazenamento da água da chuva para irrigação, reuso da água nas instalações sanitárias, coleta seletiva de lixo, venda de produtos sem embalagem descartável, e utilização de painéis solares. Finalmente, para aumentar a utilização e a viabilidade financeira dos estádios, recomenda que as instalações possam ser adaptadas para receber shows, festivais e outros eventos de grande porte.

A contrapartida a todos esses investimentos seria o legado positivo que o evento traz para o país-sede. O conceito de legado para a Fifa é bastante amplo e abrange benefícios sociais e econômicos, criação de empregos, ampliação do turismo e da rede hoteleira, desenvolvimento da infraestrutura (estádios, sistemas de transporte, telecomunicação) e treinamento e aperfeiçoamento dos trabalhadores da construção e dos voluntários. Mas diversos autores defendem que somente heranças duradouras, que permanecem ao longo do tempo, devem ser consideradas legados (Cottle, 2011COTTLE E. (2011). South Africa´s World Cup: a legacy for whom? University of KawaZulu, Natal Press.; DaCosta, 2007DACOSTA, L. (2007). Beijing 2008 e a Busca de um Modelo de Avaliação e de Gestão de Legados de Megaeventos Esportivos (Modelo 3D). III Fórum Olímpico – São Paulo/USP, set.; Villano e Terra, 2007VILLANO, B. e TERRA, R. (2007). Proposta Metodológica para Análise de Legados das Instalações do PAN 2007. 8º FÓRUM OLÍMPICO DA ACADEMIA OLÍMPICA BRASILEIRA. Anais. Rio de Janeiro.).

Metodologia de estudo de casos

O trabalho foi desenvolvido utilizando a metodologia de estudo de casos múltiplos a partir de dados secundários. O estudo de casos caracteriza-se como uma pesquisa que coleta e registra informações sobre um ou vários objetos (organizações, empresas, comunidades, etc.) e pode descrever, explicar, analisar e comparar fenômenos atuais que não estão sob o controle do investigador (Yin, 2003YIN, R. K. (2003). Case Study Research: design and methods. Sage, London.). Assim, o método é adequado para tratar o tema da pesquisa porque o objetivo é avaliar a natureza dos legados deixados para os países-sede.

A Figura 1 descreve as etapas percorridas. Yin (2003)YIN, R. K. (2003). Case Study Research: design and methods. Sage, London. aponta a importância de escolher casos que atendam aos objetivos da pesquisa. Como unidades de análise foram selecionadas as duas últimas Copas do Mundo realizadas, respectivamente, na Alemanha e na África do Sul, e a Copa de 2014 que será realizada no Brasil. A Alemanha é um dos países mais desenvolvidos do mundo e grande potência europeia. A África do Sul é um país em desenvolvimento com níveis elevados de pobreza e desigualdade social e infraestrutura regular. O Brasil, como a África do Sul, é um país em desenvolvimento, com parte importante da população vivendo na pobreza. Mas, diferentemente dos outros dois países, suas dimensões são continentais e enfrenta graves problemas de infraestrutura. Portanto, os três países tem características que contribuem para o entendimento do papel dos legados em contextos distintos.

Figura 1
– Etapas do estudo de casos

No protocolo, foram detalhados os procedimentos seguidos para coleta e organização dos dados secundários. As informações sobre os estádios e os sistemas de transporte nos três países foram levantadas em periódicos científicos e documentos oficiais, jornais, revistas e publicações especializadas. Em seguida, as informações foram organizadas e confrontadas (triangulação). Foram identificadas diversas imprecisões, principalmente com relação aos dados relativos aos custos dos estádios e de outros investimentos. Nesses casos, foi dada preferência às fontes oficiais. Para cada país estudado, foi elaborado um relatório com estrutura predefinida e, finalmente, avaliados os resultados e conclusões.

Infraestruturas das copas da Alemanha, África do Sul e Brasil

Serão apresentadas as informações sobre as infraestruturas (estádios e sistemas de transportes) construídas para as duas últimas Copas do Mundo – Alemanha e África do Sul – e as planejadas para o Brasil.

Copa da Alemanha

A Alemanha está localizada na Europa Central, conta com uma área de aproximadamente 357 mil km2BAADE, R. e MATHESON, V. (2004). The quest for the cup assessing the economic impacto of the World Cup. Taylor and Francis Journals, 38(4), pp. 343-354. e uma população de cerca de 81 milhões de pessoas. O país é desenvolvido e oferece boa qualidade de vida para seus habitantes: o PIB alemão é elevado e a renda per capita está em torno de 25 mil dólares por ano. Em termos de infraestrutura, o país conta com excelentes rodovias e ferrovias, transporte aéreo eficiente e os seus portos estão entre os melhores do mundo (Banco Mundial, 2010BANCO MUNDIAL (2010). Base de Dados do Banco Mundial. Disponível em: databank.worldbank.org. Acesso em: 7/6/2012.
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).

Instalações esportivas

Para a Copa do Mundo de 2006, a Alemanha construiu apenas um estádio – Allianz Arena – em Munique. Os outros onze já existiam e foram reformados para o evento. A Figura 2 mostra suas localizações.

Figura 2
– Localização dos estádios na Alemanha

No total foram investidos cerca de 1,9 bilhão de dólares nos estádios, sendo 60% financiado por clubes e outros investidores privados e 40% com recursos públicos. O Quadro 1 elenca os doze estádios, as cidades onde estão localizados, capacidade e valor investido.

Quadro 1
– Estádios da Copa na Alemanha

A Copa da Alemanha foi um caso de sucesso, com a maioria dos estádios recebendo um grande fluxo de espectadores durante e após o evento. Para avaliar a utilização dos estádios, Alm (2012)ALM, J. (2012). World Stadium Index: built for major sporting events-bright future o future burden? Danish Institute for Sports Studies. Disponível em: http://www.playthegame.org/theme-pages/worldstadium-index.html. Acesso em: 5/2/2013.
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propôs um índice que relaciona o número de espectadores no ano e a capacidade do estádio. O autor levantou dados de 75 estádios em vinte países em jornais, publicações especializadas e questionários enviados diretamente para os administradores. O Allianz Arena de Munique é o estádio que apresenta o melhor índice de utilização da Europa (33,3 espectadores por assento em 2009), seguido do RheinEnergie, em Colônia (22,2 espectadores por assento), e do Commerzbank em Frankfurt (19 espectadores por assento).

O Quadro 2 descreve a utilização dos doze estádios da Copa de 2006.

Quadro 2
– Utilização dos estádios na Alemanha

Entre os fatores que explicam a boa utilização das instalações esportivas estão a forte tradição da Alemanha no esporte, localização em regiões densamente povoadas e o fato de pertencerem a clubes consagrados, que atraem grande número de espectadores. O único estádio que enfrenta problemas é o Zentralstadion, em Leipzig. Financiado pelo município e por fundos privados, não tem um time profissional e atrai pouco público.

Sistema de transporte

A Alemanha conta com uma extensa rede de rodovias e ferrovias e um grande número de aeroportos. Além disso, trens e rodovias de alta velocidade conectam as diversas regiões do país às doze cidades-sede da Copa. A Figura 3 indica, além dos estádios, (1) linhas férreas e aeroportos internacionais e (2) principais rodovias do país.

Figura 3
– Infraestrutura logística da Alemanha

Como já contava com um bom sistema de transporte, a maioria dos projetos executados para a Copa visava modernizar e adequar infraestruturas já existentes. Os investimentos totalizaram 7 bilhões de dólares (Quadro 4), uma vez que a maior parte desse recurso (80%), bancada pelo governo federal, foi aplicado no melhoramento de rodovias e em sistemas de informação.

Quadro 4
– Investimentos em sistemas de transporte na Alemanha

A Alemanha ocupa um território pequeno, com distâncias curtas entre suas cidades e uma infraestrutura viária densa e de boa qualidade. Assim, o transporte terrestre recebeu apenas melhorias. No transporte aéreo, dez das doze cidades-sede possuem aeroportos ligados a linhas férreas, metrô e redes de ônibus. Nuremberg e Gelsenkirchen, que não têm aeroportos, estão próximas (menos de 45 km) e interligadas por boas rodovias a aeroportos vizinhos. No transporte ferroviário, o tempo de viagem entre cidades foi reduzido e seis estações foram modernizadas. Além disso, todas as cidades-sede têm estações com plataformas para trens de alta velocidade.

Tecnologias de última geração também foram destaque na Copa da Alemanha. Foi desenvolvido sistema que permitiu o uso dos ingressos dos jogos no transporte público para ir ao estádio ou a outras atrações turísticas. Outro destaque foi um sistema de roteirização implantado em diversos pontos das cidades e nas rodovias federais. Através dos três campos do ingresso – logotipo da Copa, símbolo do estádio e setor da arquibancada – indicava-se o melhor roteiro para o deslocamento. As recomendações direcionavam os espectadores por diferentes caminhos, ajudando a organizar o tráfego e a reduzir o tempo de deslocamento.

Em mobilidade urbana, a cargo dos estados e municípios, foi investido volume bem menor de recursos em melhoramento de vias, transporte público e estacionamentos. Isso porque, no geral, as cidades já são bem atendidas por serviços de qualidade, com trens, metrôs e/ou ônibus interligados, permitindo fácil deslocamento. O Quadro 5 traz um panorama da mobilidade urbana nas doze cidades-sede (Deutschland, 2006DEUTSCHLAND CIDADES E ESTÁDIOS (2006). Disponível em: wm2006.deutschand.de/PT. Acesso em:10/6/2012.
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).

Quadro 5
– Panorama da mobilidade urbana na Alemanha
Quadro 5
– Estádios da Copa da África do Sul

Copa da África do Sul

A África do Sul foi o primeiro país do continente africano a sediar, em 2010, uma copa de futebol. Com uma área de 1220 mil km2 e uma população de cerca de 46 milhões de pessoas, é conhecida por sua pluralidade cultural, possuindo onze línguas oficiais. O país é considerado em desenvolvimento e apresenta uma taxa de desemprego de 28%. Em 2010, o PIB africano era de 360 milhões de dólares e a renda per capita 3,7 mil dólares por ano. Os portos africanos são considerados de média eficiência e a qualidade da infraestrutura é regular (Banco Mundial, 2010).

Instalações esportivas

A África tinha sediado, em 1995, a Copa do Mundo de Rúgbi e já possuía algumas boas instalações. Assim, dos dez estádios que sediaram os jogos de 2010, cinco já existiam e foram reformados para o evento e cinco novos foram construídos. A Figura 4 indica a localização dos estádios.

Figura 4
– Estádios da África do Sul

No total foram investidos cerca de 2,3 bilhões de dólares, financiado basicamente pelo setor público, que participou tanto das construções de novos estádios quanto das renovações (Alm, 2012ALM, J. (2012). World Stadium Index: built for major sporting events-bright future o future burden? Danish Institute for Sports Studies. Disponível em: http://www.playthegame.org/theme-pages/worldstadium-index.html. Acesso em: 5/2/2013.
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). O Quadro 5 lista os estádios, as cidades onde estão localizados, capacidade e o valor investido.

A Copa da África do Sul não pode ser considerada um caso de sucesso. O estádio Cape Town, por exemplo, foi construído na Cidade do Cabo a despeito de já existirem outras instalações no local. O custo final foi cerca de 30% superior ao previsto inicialmente e resultou em uma instalação pouco utilizada: o estádio tem alto custo de manutenção e dificuldade para atrair times populares. Outras instalações com problemas são os estádios Nelson Mandela Bay, Peter Mokaba, Mbombela, Royal Bafokeng e Free State (Alm, 2012ALM, J. (2012). World Stadium Index: built for major sporting events-bright future o future burden? Danish Institute for Sports Studies. Disponível em: http://www.playthegame.org/theme-pages/worldstadium-index.html. Acesso em: 5/2/2013.
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).

O Quadro 6 descreve a utilização dos estádios da África do Sul após o mundial de futebol.

Quadro 6
– Utilização dos estádios na Copa da África do Sul

Dos estádios, pelo menos cinco estão subutilizados o que levou o secretário do Planejamento de Durban a afirmar que diante dos elevados custos de manutenção, a melhor alternativa seria a demolição (IG Economia e Mercado, 2012IG ECONOMIA E MERCADO. Dois anos após a Copa a África do Sul vive encruzilhada política e econômica. Disponível em: <http://economia.ig.com.br/mercados/2012-08-27>. Acesso em: 2/10/2012.
http://economia.ig.com.br/mercados/2012-...
). O principal problema enfrentado, sobretudo com relação às novas instalações, é como atrair o público e desta forma garantir a sustentabilidade.

Sistema de transporte

A África do Sul tem uma infraestrutura de transporte bem desenvolvida, com ampla rede de rodovias e ferrovias. A Figura 5 mostra, além da localização dos estádios, (1) ferrovias e portos e (2) rodovias e aeroportos. As nove cidades-sede são atendidas por rodovias e ferrovias e, com a construção do aeroporto em Durban, quatro delas têm aeroporto.

Figura 5
– Infraestrutura logística da África do Sul

Cerca de 15 bilhões de dólares de recursos públicos foram investidos no sistema de transporte. Como na Alemanha, a maior parte dos recursos foi para as rodovias (55%).

Aeroportos, ferrovias e mobilidade urbana dividiram os 45% restantes (Quadro 7).

Quadro 7
– Investimentos em sistema de transporte na África do Sul

As rodovias foram modernizadas, como a ampliação para cinco faixas na rodovia que liga Johanesburgo a Pretória. Foram investidos

2.4 bilhões de dólares na ampliação dos aeroportos de Johannesburg e Cape Town, construção de um novo terminal em Bloemfontein e de um novo aeroporto em Durban. Foram gastos 2 bilhões nas ferrovias, inclusive na construção do sistema de trem rápido – o Gautren – ligando Johanesburgo a Pretória e passando pelo Aeroporto Internacional OR Tambo. O Gautrain está interligado a uma rede de ônibus e visa aliviar os pesados congestionamentos entre as duas cidades. E, finalmente, na mobilidade urbana, destacam-se sistema de bilhete único, implantação de Bus Rapid Transit (BRT), de corredores exclusivos e de estações intermodais para transporte público, melhorias nos trens urbanos e investimentos nos sistemas de gerenciamento de congestionamento (Cottle, 2011COTTLE E. (2011). South Africa´s World Cup: a legacy for whom? University of KawaZulu, Natal Press.). No Quadro 8, estão detalhados os principais investimentos realizados em mobilidade urbana na África do Sul.

Quadro 8
– Principais investimentos em mobilidade urbana da África do Sul

Copa do Mundo do Brasil

O Brasil é o maior país da América do Sul, ocupando uma área de 8.514 mil km2BAADE, R. e MATHESON, V. (2004). The quest for the cup assessing the economic impacto of the World Cup. Taylor and Francis Journals, 38(4), pp. 343-354. e com uma população de 190 milhões de habitantes. Considerado um país emergente, sua economia é a sétima do mundo: o PIB brasileiro é de 1.6 trilhões de dólares e a renda per capita de 4 mil dólares/ano. Mas, a despeito do crescimento que o país vem experimentando nos últimos anos, ocupa a 73ª posição no ranking de desenvolvimento humano, revelando grandes disparidades econômicas e sociais (Banco Mundial, 2010).

Instalações esportivas

O Brasil contará com 12 estádios para a Copa do Mundo de 2014, uma vez que sete deles serão construídos (ou inteiramente reconstruídos) e cinco reformados. A Figura 6 indica a localização dos estádios.

Figura 6
– Estádios do Brasil

Serão investidos cerca de 4 bilhões de dólares, visto que quase a totalidade dos recursos são públicos (estaduais e federais). Somente dois estádios – Curitiba e São Paulo – têm participação de capital privado. O Quadro 9 elenca os estádios, cidades, capacidade e investimentos previstos (Portal Brasil, 2012PORTAL BRASIL. Disponível em: http://www.portalbrasil.net/brasil_transportes.htm. Acesso em: 2/10/2012.
http://www.portalbrasil.net/brasil_trans...
).

Quadro 9
– Estádios da Copa do Brasil

A despeito da preocupação dos organizadores em construir espaços múltiplos e flexíveis, muitos estádios enfrentarão problemas e permanecerão subutilizados. O Quadro 10 descreve as perspectivas de utilização dos estádios após o mundial de futebol.

Quadro 10
– Utilização dos estádios da Copa do Brasil

Dos doze estádios, pelo menos sete enfrentarão dificuldades para se sustentar após o evento. Mesmo focando em concertos e outros eventos culturais, esses estádios provavelmente não irão conseguir atrair o número de pessoas necessário para garantir a sustentabilidade. Isso porque estão localizados em cidades sem tradição no esporte, com clubes com baixa popularidade e que levam ao estádio número insuficiente de espectadores. Os principais times do estado de Fortaleza (Ceará e Fortaleza), por exemplo, não se interessaram em assinar contrato de parceria para realização de seus jogos no estádio do Castelão. Os clubes alegam que o alto custo exigiria um público mínimo de 30 mil pagantes, considerado por eles muito elevado. E, de fato é: a média de público no Campeonato Brasileiro do principal evento esportivo do país foi de 15 mil espectadores (Confederação Brasileira de Futebol, 2013CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL. Média de utilização dos estádios. Disponível em: http://www.cbf.com.br. Acesso em: 1/4/2013.
http://www.cbf.com.br...
).

Est ádios que hospedam clubes tradicionais, como Maracanã, no Rio de Janeiro, Itaquerão, em São Paulo, Arena da Baixada, em Curitiba e Beira-Rio, em Porto Alegre, certamente terão um desempenho melhor. O Mineirão, em Belo Horizonte, firmou contrato de fidelização com um tradicional time mineiro. O contrato garante ao clube a renda da bilheteria dos jogos sem pagamento de aluguel e ao administrador do estádio a receita dos bares, restaurantes e lojas. Dessa forma, espera atrair um grande número de torcedores e, principalmente, garantir a sustentabilidade da instalação.

Sistema de transporte

No Brasil, predomina o modal rodoviário, mas 60% das estradas não estão em boas condições (Confederação Nacional dos Transportes, 2013ESSEX, S. e CHALKLEY, B. (2004). Mega-sporting Events in Urban and Regional Policy: A History of the Winter Olympics. Planning Perspectives, 19 (2), pp. 201-232.). O número de passageiros de avião vem crescendo de forma significativa nos últimos anos, o que levou à saturação dos aeroportos. Os portos brasileiros, assim como as ferrovias, são utilizados prioritariamente para o transporte de cargas. O transporte ferroviário foi privatizado e, nos últimos anos, melhorou seu desempenho. A Figura 7 mostra, além da localização dos estádios, (1) ferrovias e aeroportos e (2) rodovias.

Figura 7
– Infraestrutura logística do Brasil

Os 89 projetos em transporte inicialmente planejados para a Copa no Brasil contemplam diferentes modais e a construção de complexas infraestruturas. O Ministério do Esporte elencou os investimentos previstos em portos e aeroportos e mobilidade urbana (avenidas, corredores metropolitanos, acessos a aeroportos, urbanização no entorno dos estádios). Não estão previstos investimentos em rodovias. O Quadro 11 detalha os empreendimentos e os valores investidos.

Quadro 11
– Investimentos em sistemas de transporte no Brasil

No total serão investidos cerca de 11 bilhões de dólares. Os investimentos mais significativos estão destinados à mobilidade urbana (7 bilhões de dólares), seguido dos aeroportos (4 bilhões de dólares) e, por último, portos (514 milhões de dólares). O modelo de financiamento está apoiado, no caso da mobilidade urbana, em recursos públicos municipais, estaduais e federais. Nos aeroportos e portos, os financiamentos são exclusivamente federais, exceção feita à parte das obras dos dois aeroportos de São Paulo (Guarulhos e Viracopos) e o de Natal.

Para os aeroportos, estão previstas a construção ou ampliação de terminais de passageiros em todas as cidades-sede (exceto Recife). O montante investido em São Paulo é muito superior ao das demais cidades: cerca de 1,8 bilhão de dólares. Esse fato se justifica pela importância econômica da cidade e por seus já conhecidos problemas e gargalos nessa área. Quanto aos portos, os investimentos são bem menos significativos, sendo beneficadas as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. Finalmente, em mobilidade urbana, São Paulo, Recife e Manaus receberão os maiores investimentos, seguidas de Cuiabá e Belo Horizonte. Somente Salvador não tem programado nenhum investimento desse tipo. O Quadro 12 detalha os principais projetos na área de mobilidade urbana nas doze cidades-sede (Ministério do Esporte, 2012MINISTÉRIO DO ESPORTE. Disponível em: www.esporte.gov.br. Acesso em: 14/4/2012.
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).

Quadro 12
– Principais investimentos em mobilidade urbana no Brasil

Avaliação da natureza dos legados

Os gastos da África do Sul com estádios superaram os da Alemanha, e os investimentos previstos para o Brasil são ainda maiores do que dos outros dois países.

O Quadro 13 apresenta o número de estádios construídos e reformados, os valores investidos pelos países e a origem dos recursos.

Quadro 13
– Comparação dos estádios

Além dos recursos necessários para a construção, essas instalações precisam abrigar eventos periódicos e com bom apelo de público para se sustentarem ao longo do tempo. Mas, muitas vezes, estão em locais onde a demanda é insuficiente, permanecendo ociosas, com seus custos elevados de manutenção a cargo de seus proprietários, geralmente gestores públicos. Enquanto na Alemanha, os estádios têm um grande fluxo de espectadores e apenas um está ocioso, na África do Sul a maior parte está subutilizada, gerando prejuízos financeiros. O Brasil, a despeito da popularidade do futebol no país, parece que terá o mesmo destino da África: vários estádios terão problemas de sustentabilidade após o término do evento. Cidades como Brasília, Cuiabá, Natal, Fortaleza e Salvador não tem potencial esportivo para manter estruturas de grande porte, exigindo, portanto, ações que garantam a manutenção desses empreendimentos no longo prazo.

A questão da ociosidade dos estádios fica ainda mais crítica quando observamos que os recursos investidos na África e no Brasil são predominantemente públicos. Esses recursos poderiam atender necessidades básicas das populações como saneamento, transporte público, educação, etc., mas estão sendo direcionados para obras que não são prioritárias. Além disso, muitas vezes essas infraestruturas, bancadas com recursos públicos, passam para a iniciativa privada após o evento. É o caso de diversos estádios construídos no Japão para a Copa de 1992, da Arena Olímpica dos jogos Pan-americanos de 2007, administrada atualmente pelo HSBC, e do Estádio do Maracanã cujo edital recém-lançado pelo governo do Rio de Janeiro prevê, em 35 anos de concessão, a recuperação de apenas 15% do valor investido (Globo Esporte, 2013GLOBO ESPORTE. Edital do Maracanã prevê investimento de R$ 594 milhões. Disponível em: <http://globoesporte.globo.com/futebol/copa-do-mundo/noticia/2013/02>. Acesso em: 1/4/2013.
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).

Quanto aos sistemas de transporte, a África do Sul foi o país que realizou os maiores investimentos, seguido do Brasil e, por último, a Alemanha. O Quadro 14 mostra os investimentos nos três países.

Quadro 14
– Comparação dos sistemas de transporte

Alemanha e África do Sul efetuaram investimentos significativos no modal rodoviário. No Brasil, a despeito da má conservação de grande parte das rodovias, não foram previstos investimentos nessa área. No modal aéreo, na Alemanha, os aeroportos foram adequados para receber o evento, passando apenas por pequenas reformas. Já na África, além da construção de um novo aeroporto em Durban, foram necessárias adaptações e modernização em outros. No Brasil, dada a extensão territorial do país e a distância entre as cidades-sede, o transporte aéreo será bastante utilizado e estão previstas reformas e ampliação dos aeroportos para receber o evento. Finalmente, o Brasil foi o país que mais investiu em mobilidade urbana: cerca de 60% do volume total dos recursos do sistema de transporte foi destinado a melhorias nessa área, valor três vezes superior ao da África do Sul e quatro vezes ao da Alemanha.

A despeito do elevado valor investido no sistema de transporte pelo país africano, não há indicações de que o legado deixado pela Copa tenha sido positivo. Além de enfrentar atrasos nas obras e custos significativamente superiores aos previstos inicialmente, um dos principais problemas de mobilidade urbana enfrentados pelo país – cidades congestionadas, dominadas por carros e vans que transportam principalmente negros sem conforto ou regularidade – não foi amenizado. Embora os BRTs pudessem contribuir para a racionalização do uso do espaço urbano, a população resiste em trocar as tradicionais vans pelos ônibus. Segundo o professor Wallers, do Departamento de Transporte da Universidade de Johannesburgo, a questão é bastante complexa e envolve aspectos culturais e políticos (Gazeta do Povo, 2012).

A questão da mobilidade urbana é também um problema grave na maioria das cidades brasileiras de médio e grande porte. Além da má conservação de grande parte das rodovias e dos problemas de saturação nos aeroportos, muitas cidades brasileiras sofrem com infraestruturas deficientes e transporte público de má qualidade, sobretudo porque, durante décadas, as políticas públicas vêm privilegiando o uso do automóvel. Assim, investimentos nessa área são necessários e bem vindos.

Pesquisa realizada pelo Centro de Logística Urbana do Brasil (Club, 2012CENTRO DE LOGÍSTICA URBANA DO BRASIL – CLUB. Disponível em: http://www.clubbrasil.org. Acesso em: 1/4/2012.
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), nas principais cidades brasileiras, revelou que os problemas mais frequentes são transporte público de má qualidade, ruas mal conservadas e congestionamentos. A região norte do Rio de Janeiro, por exemplo, onde o transporte público é mais demandado, é mal atendida e enfrenta escassez na oferta do serviço. Em São Paulo, o mais

importante centro econômico do país, a população carente está dispersa nas regiões periféricas da cidade e, portanto, é altamente dependente do ineficiente transporte público e vítima dos graves problemas de congestionamento enfrentados cotidianamente pela cidade. Belo Horizonte e Brasília também enfrentam congestionamentos em função da saturação das vias públicas. Em Natal, Recife, Fortaleza e Manaus, as vias estão em péssimo estado de conservação e há problemas decorrentes da má gestão na regulamentação e operação do serviço de transporte. Mesmo Porto Alegre e Curitiba, cidades urbanisticamente diferenciadas, enfrentam problemas causados pelo grande número de veículos particulares em circulação.

Diante desses desafios e observando os projetos demobilidade urbana propostos, é possível afirmar que para a maioria das cidades brasileiras os legados de transporte não resolverão os principais problemas enfrentados pelas populações. Em São Paulo, por exemplo, está em construção um monotrilho ligando o aeroporto de Congonhas ao Morumbi. Nessa região, estão concentrados diversos hotéis e uma população com elevado poder aquisitivo que não utiliza o transporte público. Certamente, esses recursos poderiam ser melhor empregados se direcionados para regiões mais populosas e carentes.

Conclusão

O objetivo do trabalho era avaliar se as infraestruturas – estádios e sistemas de transporte – construídas para as copas da Alemanha, África do Sul e Brasil constituem um legado positivo para os países-sede.

As exigências da Fifa com relação às instalações esportivas são grandes. A começar pelo número de estádios que o país deve ter para sediar o evento (em torno de 12), suas capacidades, além de uma série de outros requisitos técnicos como tecnologias de última geração para transmissão das partidas. Essas exigências obrigam os países a realizar amplas reformas ou a construir novos estádios. No caso do Brasil, muitas das instalações já existiam há décadas e não atendiam aos requisitos da Fifa, sendo mais vantajosa a construção de novos estádios do que a execução das adaptações exigidas.

Com relação aos sistemas de transporte, os investimentos requeridos pela Fifa para as cidades-sede privilegiam o deslocamento dos torcedores e, assim, visam à modernização ou construção de infraestruturas que facilitem os fluxos entre aeroportos, estádios e hotéis e entre as cidades-sede. A questão central é se esses investimentos contribuem, de fato, para a solução dos principais problemas e para uma melhor qualidade de vida das populações. Nem sempre exigência da Fifa, tidas como fundamentais para a realização do evento, refletem as reais necessidades das populações locais.

Assim, o argumento da Fifa de que a Copa do Mundo pode melhorar a qualidade de vida das populações não se sustentam. Pelo contrário, as evidências indicam que muitas cidades-sede enfrentam dificuldades com os altos custos de construção e de manutenção dos estádios e com a implantação de projetos de transporte que não resolvem os principais problemas das cidades. É importante que os países-sede questionem as exigências da Fifa e se posicionem, defendendo seus próprios interesses. Essa questão é ainda mais crítica para os países em desenvolvimento, que enfrentam, por um lado, infraestruturas mais precárias que requerem um volume maior de investimento para a realização da Copa e, por outro, limitação de recursos e grandes demandas sociais que muitas vezes não são atendidas pelos investimentos realizados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2013

Histórico

  • Recebido
    10 Mar 2013
  • Aceito
    30 Abr 2013
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