Open-access Narrativas e ação pública nas ruínas da Fábrica de Cimento de Perus

Resumo

Interpreto as relações entre o abandono e a rememoração a partir das possibilidades de ressignificação da Fábrica de Cimento Portland de Perus. Abandonada desde a década de 1970, as instalações da falida Companhia Brasileira de Cimento Portland são, hoje, objeto de ações culturais de movimentos sociais de Perus, distrito da zona noroeste da Cidade de São Paulo. Estes procuram retomar memórias pessoais e coletivas da chamada Greve dos Queixadas, que tomou a Fábrica durante sete anos e legou ao território uma identidade de luta por direitos e cidadania. A partir da análise de entrevistas, discuto como um desses coletivos, a Comunidade Cultural Quilombaque, elabora uma contranarrativa que se opõe ao esquecimento para anunciar as potencialidades de seu território.

patrimônio industrial; luta operária; movimento social; narrativas

Abstract

In this paper, I interpret the relationship between abandonment and remembrance based on possibilities for re-signifying the Perus Portland Cement Factory. Abandoned since the 1970s, the facilities of the bankrupt Companhia Brasileira de Cimento Portland are today the object of cultural actions organized by social movements in Perus, a district in the northwest of the city of São Paulo. The movements aim to recapture personal and collective memories of the so-called Queixadas Strike, which took over the factory for seven years and left to the territory an identity of struggle for rights and citizenship. Based on the analysis of interviews, I discuss the counter-narrative created by one of these collectives, the Comunidade Cultural Quilombaque, to oppose oblivion and announce the potential of its territory.

Introdução

Mobilizaram todo o esquema policial existente lá, e também o de fora, porque chegaram com brucutus, naquela época uma novidade e o que tinha de mais moderno para dispersar a multidão. O bairro foi acordado às 5 horas da manhã com um desfile de viaturas de todas as espécies. Eles distribuíam volantes esclarecendo o lado da empresa, chamando os operários grevistas de vagabundos, dizendo que o Sindicato era de comunistas e ladrões, que queriam levar todo mundo à ruína, inclusive o bairro, e que as donas de casa deveriam forçar seus filhos, vizinhos e maridos a voltarem ao trabalho. E com isso eles conseguiram botar a fábrica em funcionamento. Foi aí que começou a repressão e a caça a todo aquele que fosse grevista. Prendiam, batiam, processavam, enfim, todo tipo de perseguição. (Breno, 1977, p. 38)

Esse depoimento foi escrito por João Breno Pinto, liderança operária, sobre acontecimentos na década de 1960 que tiveram as instalações da Companhia Brasileira de Cimento Portland como cenário. Instalada no noroeste da cidade de São Paulo, a Fábrica de Cimento de Perus foi a primeira planta de grande porte no país para a produção do cimento, utilizado na expansão urbana da cidade, no encobrimento de rios e em grandes obras de infraestrutura, assim como também foi levado para a construção da capital federal. Projetada por canadenses na década de 1920, foi comprada pelo Grupo Abdalla que, na década de 1950, passou a ser acusado de expor operários a más condições de trabalho. Estes, fartos, mantiveram-se em greve não violenta por sete anos, até que, na década de 1970, a Companhia faliu. Desde então, da Fábrica só restam ruínas.

Neste artigo, interpreto as relações entre o abandono e a rememoração a partir do caso das ações de ressignificação da Fábrica de Cimento Portland de Perus. Como ressalta Kühl (2010), os desafios para a preservação do patrimônio industrial no Brasil passam por veredas complexas de cunho teórico-metodológico e técnico-operacional. Na mesma direção, Rodrigues (2010, p. 39) alerta para o fato de que são desvalorizadas, principalmente, as facetas relacionadas ao trabalho: “[...] considerados menos nobres, os locais de trabalho são lugares de desenvolvimento de identidades profissionais, que, concomitantemente, guardam memórias difíceis, como as de cerceamento de vontades”. Trazendo o foco da preservação do patrimônio industrial para a sua capacidade de nos lembrar das lutas operárias, alcançamos os objetivos de Perrot (1988) ao estabelecer essa categoria como sujeitos históricos. Com esse viés, discutirei as possibilidades de preservação de um patrimônio industrial tendo como horizonte a valorização das lutas pela garantia de direitos.

O desafio reside nas formas de associar as ruínas de uma fábrica, ou seja, a sua materialidade frequentemente monumental, às lembranças de operários e operárias que, naquele espaço, construíram famílias, tiveram direitos violados e afrontaram seus algozes. Trata-se não apenas de garantir a preservação física desses espaços, mas de salvaguardar as memórias pessoais e coletivas dos trabalhadores. Como, então, se utilizar de ruínas para contar histórias inspiradoras de luta social e resistência?

É com esse questionamento que analiso como as ações de um coletivo político-cultural se opõem ao apagamento da memória operária da Fábrica de Cimento. A Comunidade Cultural Quilombaque é uma organização sem fins lucrativos que surgiu em 2005, a partir da iniciativa de um grupo de jovens moradores em Perus, bairro periférico situado na zona noroeste de São Paulo (Figura 1) que concentra os piores índices socioeconômicos e culturais (Quilombaque, s. d.). De acordo com o Mapa da desigualdade (Rede Nossa São Paulo, 2022), entre os distritos do município, Perus ocupa o segundo lugar no índice de mortalidade materna e está entre os dez distritos com maior violência contra a mulher e casos de feminicídio. Na pandemia de Covid-19, foram bairros como o de Perus, que não possui nenhum leito hospitalar, que apresentaram os piores indicadores de taxa de contaminação e morte (Instituto Pólis, 2020): enquanto a proporção média de óbitos causados pelos vírus em relação ao total de óbitos em 2021 foi de 24,6%, Perus chegou à marca de 30,2% (ibid.). Além disso, em termos de equipamentos públicos, Perus possui apenas uma biblioteca municipal como centro diretamente relacionado à área cultural.

Figura 1
– Destaque do Distrito de Perus na Região Metropolitana de São Paulo, 2024

Essas e outras dimensões de vulnerabilidade convergem para a noção de “espoliação urbana” (Kowarick, 1979), e é a partir desses dados que o coletivo em foco atua para que esse quadro não leve a visões reducionistas da vida nas periferias. A partir de ações no campo cultural, procura ressaltar as potencialidades do território, valorizando sua identidade e suas raízes. Sem ignorar situações dramáticas que cerceiam o exercício da cidadania, a Comunidade Cultural Quilombaque mobiliza diferentes agentes para que outros lados de Perus também sejam visíveis. Uma dessas ações retoma histórias como as de João Breno sobre a greve “da Perus” para atribuir outros significados para a carcaça da Fábrica que ocupa parte da paisagem do bairro.

Partindo de uma abordagem que une a ênfase na ação pública com a análise de narrativas – o que será abordado na próxima seção –, a pesquisa foi baseada em um estudo de caso qualitativo, e a análise de entrevistas foi sua principal técnica – discutida na terceira seção do texto. A estratégia teórico-metodológica foi usada para discussão de contextos mais amplos de patrimonialização (Peria, 2022; Peria e Farah, 2023), mas aqui nos debruçamos sobre um objeto mais restrito. Procuro questionar como as narrativas enunciadas pela Comunidade Cultural Quilombaque sobre a Fábrica de Cimento Portland de Perus conseguem ressignificar um patrimônio aparentemente abandonado.

O delineamento disso que chamarei de contranarrativa é feito na quarta seção deste texto, dedicada à apresentação e interpretação do caso. Na quinta seção, associo as estratégias de retomada da Quilombaque com moldura mais ampla de análise sobre ações culturais nas periferias, mostrando que não se trata de um episódio isolado, mas de uma tendência e de aplicações de um conhecimento compartilhado sobre a prática política. Entendidos esses pontos, proponho que as ações desse coletivo, no campo da memória e sobre um patrimônio industrial “esquecido”, podem servir de modelo para compreendermos formas pelas quais os significados dessas ruínas podem ser reconstruídos.

Ações e narrativas para além das políticas públicas

No caso aqui estudado, como veremos, as políticas oficiais sobre o patrimônio cultural da cidade de São Paulo figuram sob o signo do abandono, do desrespeito, do apagamento e da primazia do privado sobre o público. Sem cair apenas na denúncia, a escolha operada na pesquisa, que levou a este artigo, foi direcionada à procura de espaços de resistência nos quais espaços esquecidos pela política pública tornam-se mananciais de sentidos.

Para tanto, a abordagem da ação pública no campo da política pública mostra-se um caminho frutífero. Esta perspectiva parte do entendimento de que “governos não têm o monopólio sobre o público e que o público nunca abriu mão da sua disposição de agir publicamente” (Spink, 2015, p. 13), ou seja, o que consideramos como público é construído cotidianamente não apenas pelo Estado, mas também – talvez, principalmente – pela sociedade civil. Os estudos que se utilizam dessa definição passaram a usar o termo “ação pública” para designar as intervenções sobre o público de forma mais abrangente do que as “políticas públicas”. Spink e Burgos (2019) compreendem que a centralidade da noção de “política pública” pode criar uma falsa ideia de que tudo começa e termina com o Estado, quando, na verdade, há uma variedade de “linguagens de ação”. Como observa Abreu (2019), podemos dizer que, no âmbito dessa diversidade, há a interconexão da ação estatal com a pressão do público sobre o Estado, e esse mesmo público agindo por si.

Admitindo uma “cacofonia performática” (Spink, 2013), essa abordagem nos permite estudar a interlocução entre diferentes maneiras de agir publicamente; no nosso caso, diferentes formas de performar ações de patrimonialização. A noção de ação pública, então, cumpre o papel de oferecer um mecanismo analítico para dar conta da multiplicidade de formas de agir no espaço público (Spink e Silva, 2014), e a questão de fundo torna-se como “descrever a mutação das experiências coletivas” (Cefaï, 2009, p. 16), mais do que identificar erros e acertos em um curso de ação estatal específico. Sem dúvida, é uma concepção que torna a análise mais complexa, afinal, o agir publicamente para e pelo público pode emergir de qualquer lugar e em diferentes formatos – na verdade, acontece em todos os lugares e em todos os formatos. Por isso, afirmamos que a abordagem da ação pública é um pedido e um convite para a sensibilização do olhar acadêmico para as formas como agentes aquém do Estado se organizam para elaborar uma questão como “problema público” digno de atenção. Sobre esse processo, Cefaï (2017a) afirma que devemos focar as análises na criação de ambientes e preocupações comuns:

As pessoas se juntam, se associam, discutem, inquietam-se, indignam-se, começam a indagar, discutem de novo. Encontram aliados em quem se apoiar, políticos ou especialistas que retransmitem suas vozes, ou outras organizações com que se associar. [...] Ao fazê-lo, constituem-se como um ‘público’ – a parte coletiva de um trabalho de si sobre si mesmo, submetida à prova da transformação da relação com os problemas, com os outros, com as situações, com as instituições […]. (Ibid., pp. 196-197)

Aqui, os estudos sobre movimentos sociais são um combustível necessário para o aprofundamento das análises que se vinculam à abordagem da ação pública. Devemos admitir que “a relação entre movimentos sociais e instituições políticas é contingente e mutuamente constitutiva, cujas implicações ou efeitos decorrentes são produzidos sobre ambos os atores societários e institucionais” (Carlos, 2015, p. 86). Dessa forma, as múltiplas performances do público pelo Estado e por atores da sociedade civil estão intimamente relacionadas, não de forma homogeneizante, mas a partir de diversos “repertórios de interação” (Abers, Serafim e Tatagiba, 2014). Trata-se de perceber, portanto, que as ações do Estado e da sociedade civil se dão a partir de fronteiras mais imprecisas e ambíguas do que comumente imaginamos. A ação pública não é um evento pontual, harmônico, uníssono, extraordinário e bem delimitado, mas um fenômeno difuso, cotidiano, compartilhado e conflituoso. Se a política pública é uma das muitas formas pelas quais a ação pública é performada, as análises devem se voltar para compreender como se dão as outras performances e quais as relações que são construídas nessa “cacofonia”.

Nesse quadro aparentemente instável, somos capazes de enxergar uma grande capacidade criativa e, nesse sentido, essa mobilização é, também, um “laboratório de experimentação” (Cefaï, 2017b, p. 129). Essa criatividade se dá, é importante lembrar, pela necessidade imperiosa de construir soluções em cenários de violência simbólica, material ou institucional; em situações de abandono e desprezo como aquelas que analisaremos ao discutir o caso da Fábrica de Cimento Portland de Perus. A leitura desses “laboratórios”, então, não deve recair em defesas recreativas e calmas da ação social, mas na lembrança de que há resistência perante a opressão.

À custa de certa repetição, trata-se de sensibilizar o olhar, pois a noção de política pública não dá conta de tudo que queremos e precisamos estudar e, nessa falta, acaba por invisibilizar processos e pessoas que estão agindo (sempre agiram e continuarão a agir) em prol do público. É nesse sentido, também, que a abordagem da ação pública é frequentemente apresentada com uma visão normativa sobre a intensificação do processo democrático. Sobre o contexto político recente, pesquisas demonstraram que, na contracorrente de ações e inações do governo federal – como na desarticulação institucional (Abrucio et al., 2020), na desconstrução de políticas públicas consolidadas (Gomide, Sá e Silva e Leopoldi, 2023), no assédio institucional a servidoras e servidores (Lotta et al., 2023) e no cenário da emergência sanitária da pandemia de Covid-19 –, novos espaços de colaboração e construção de redes na sociedade civil foram alimentados (Alves e Costa, 2020; Andion, 2020). Como argumenta Borges (2020):

[Em] um período de retrocesso democrático por parte do Estado, a ação coletiva que emerge da sociedade ganha centralidade e precisa ser compreendida em sua potencialidade de gerar oportunidades de resistência e reinvenção democráticas. A análise de como essa ação coletiva tem se construído pode trazer luz para a compreensão dos espaços ou interstícios possíveis de retomada de uma ação pública que avance mesmo com ações contrárias do Estado. (Ibid., p. 178)

Na observação desse tensionamento no campo do patrimônio cultural, admitimos, então, que não há apenas uma forma de patrimonialização: este é um fenômeno plural, polissêmico, construído por muitos atores além e aquém do Estado. Partimos de uma estratégia a favor da procura de lugares de conflito nos quais a diversidade de narrativas – performances cacofônicas – consegue emergir, fazendo com que a coerência da narrativa oficial seja, mesmo que pontualmente, tumultuada. É nessa desarmonia que outras identidades podem ser ouvidas: a esse aparente ruído daremos o nome de contranarrativas, semelhante aos “contrausos” descritos por Leite (2007) em seu estudo sobre a apropriação popular do centro histórico de Recife. São narrativas “contra” porque se apresentam a contrapelo não apenas em oposição a uma noção de patrimônio, mas a uma prática de patrimonialização cuja orientação é o apagamento de tudo que ameace uma narrativa pacificada.

A ideia de contranarrativa, para Czarniawska (2017), sugere que certas narrativas foram elevadas ao status de oficiais, enquanto outras cumprem o papel de questionar tal seleção. Para Gabriel (2017), as contranarrativas atuam ao refutarem e desafiarem uma narrativa identificada como dominante. Enquanto as master narratives trabalham na base da naturalização, as contranarrativas emergem ao produzir um desequilíbrio (Hyvärinen, 2021). A imagem que Andrews (2002, p. 2) usa para caracterizar as contranarrativas é de “histórias que atuam ‘por debaixo do tapete’ das narrativas dominantes”. Lueg, Bager e Lundholt (2021) chamam a atenção para o aspecto criativo das contranarrativas, que podem ser um vetor para a mudança social. No contexto das mobilizações periféricas em defesa de direitos, Comelli (2021) atribui lugar central à luta por narrativas como forma de um “ativismo cultural urbano”. No campo do turismo, Noy (2012) afirma a necessidade de:

Enfatizar como as histórias, além de suas funções de descrever e organizar o mundo, também são estruturas de poder; veículos para a performance de hierarquias sociais, exclusões e Outridades. Uma perspectiva crítica traz à tona o imenso poder performativo das narrativas na indústria do turismo e levanta um conjunto de questões sobre a constituição da agência social. A mudança das abordagens estruturais e funcionais para abordagens mais críticas envolve não apenas uma mudança na interpretação e análise de conteúdos e temas narrativos, mas também uma mudança de foco para as questões de quem tem os direitos e os recursos para recontar narrativas publicamente, e quem ou o que está implicado nelas; quem tem uma narrativa bem ordenada e quem tem uma (não-)narrativa traumática, pontuada por silêncios e gagueiras. (Ibid., pp. 135-136)

Devemos enfatizar duas características centrais na relação entre contranarrativas e narrativas dominantes, questão fundamental para a nossa reflexão. Em primeiro lugar, a contranarrativa se define pela oposição; sua emergência está intimamente ligada à negação do que se entende por narrativa dominante. Em segundo lugar, a contranarrativa apenas se consuma pela proposição; sua urgência está interessada na necessidade imperiosa de substituição de um enredo socialmente estabelecido. Nesses termos, a contranarrativa é uma estratégia de rejeição criativa (Peria, 2022). Remetendo à ideia freireana de ação cultural para a liberdade (Freire, 1976), trata-se de estar aberto tanto às denúncias quanto aos anúncios. A leitura que faremos das contranarrativas parte do diapasão abrangente da oposição-proposição. Não é estática, mas sob constante movimentação para produzir novos desequilíbrios e gestar novas disposições.

As narrativas escutadas para esta pesquisa e costuradas neste artigo, enunciadas por agentes de um movimento político-cultural de Perus, denunciam o abandono de um patrimônio cultural ao mesmo tempo que anunciam histórias de resistência e luta. Ao constituir uma trilha de turismo comunitário por entre os restos da Fábrica de Cimento Portland de Perus, contam as histórias de grevistas e apontam para os indícios de décadas de abandono. Enquanto propõem um enredo diferente para as ruínas de uma fábrica da primeira metade do século XX, opõem-se a um esquecimento deliberado em prol da especulação imobiliária. Rememoram e comemoram as disputas trabalhistas da década de 1960 que tiveram a Fábrica como palco e questionam os motivos do apagamento da história de movimentos sociais nas periferias da cidade. É sobre esse pêndulo entre a denúncia e o anúncio que as próximas seções se debruçam a fim de discutirmos formas pelas quais ruínas de um patrimônio fabril são ressignificadas.

Nota metodológica

Os resultados construídos durante a pesquisa são fruto de um estudo de caso qualitativo e intrínseco (Stake, 2005). Sem procurar generalizações e comparações, admitimos que se debruçar sobre as idiossincrasias e ordinariedades de um único caso pode oferecer reflexões originais e gerar ressonâncias teórico-empíricas. É importante ressaltar que enunciamos o caso estudado como as narrativas construídas por um movimento social, a Comunidade Cultural Quilombaque, sobre um patrimônio cultural fabril, a Fábrica de Cimento Portland de Perus. Assim, não enfocamos nem as diversas outras narrativas enunciadas pelo coletivo nem as produções de outros agentes sobre o mesmo objeto histórico. Assim, a escolha pela discussão da narrativa da Comunidade Cultural Quilombaque sobre a Fábrica de Cimento de Perus é propositiva pelo seu potencial de nos ensinar formas pelas quais um patrimônio aparentemente abandonado e em ruínas pode ser ressignificado e valorizado para e pela comunidade.

A fim de apreender as complexidades de uma contranarrativa, a principal técnica de produção de dados foi a coleta de testemunhos, tanto de forma primária quanto secundária. Buscando vídeos produzidos pelo próprio movimento e outros materiais disponíveis, foi possível enriquecer o rol de vozes capazes de nos contar histórias sobre a Fábrica. Nessa direção, uma série de entrevistas produzidas e disponibilizadas pelo Museu da Pessoa fornece ricas descrições sobre a vida de personalidades centrais para os anos iniciais do coletivo. A longa entrevista com José Soró tem especial interesse, pois “Mestre Soró” é apontado como um grande líder comunitário do bairro de Perus (Moreira e Veloso, 2019) e, tendo falecido em 2019, as mais de 50 páginas com suas palavras configuram um material ímpar. Além disso, duas entrevistas com roteiro semiestruturado foram realizadas com pessoas fundamentais para as ações sobre cultura e patrimônio praticadas pela Comunidade Cultural Quilombaque.

Entendemos a noção de narrativa não apenas como material empírico, mas como estratégia de produção desta pesquisa (Langley, 1999) e, por isso, o relato-análise presente nas próximas páginas procura, além da coesão, trazer uma interpretação sobre a contranarrativa da Quilombaque que instigue reflexões produtivas acerca das limitações da atual política pública de patrimônio cultural e das possibilidades de sua reinvenção.

O cimento da memória

Cleiton “Fofão” Ferreira de Souza (2020, p. 9), um dos fundadores da Quilombaque, já teve a oportunidade de escrever que “para falar de capacidade e potencialidade na periferia é necessário voltar ao passado e entender os processos de transformações e desenvolvimento que ocorreram nesses lugares”. No caso de Perus, é impossível separar a história do crescimento urbano do bairro e das suas mobilizações sociais sem lembrar a Fábrica de Cimento. Essa fábrica foi instalada na primeira metade do século XX (Moreira e Gould, 2013; Bortoto e Bezerra, 2019), com capital estrangeiro, e tinha como objetivo ser a primeira planta de grande porte de produção de cimento no país para responder à demanda trazida pela urbanização. Na fala de Soró, todo o bairro estava orientado para os acontecimentos que tinham a fábrica como palco: “a fábrica chegou a ter em torno de 1.100 trabalhadores. E o bairro de Perus sempre foi pequeno, então basicamente todo mundo vivia em função da fábrica ou a fábrica em função do bairro, todo mundo tinha um parente trabalhando na fábrica” (Museu da Pessoa, 2017). De acordo com Cleiton, “tudo era em torno dessa fábrica de cimento, em 1926, tinha energia elétrica, o bairro só veio a ter energia na década de 1950, quase década de 1960. Então tudo girava em torno dessa fábrica, quem era trabalhador da fábrica tinha credibilidade” (Cleiton Fofão, entrevista, em 2021). Para Mestre Soró, essa “é uma história bem longa”, mas, mesmo assim, devemos nos atentar para suas palavras:

Nos anos 50, com a chegada do Abdalla, os enfrentamentos se acirraram e foi o resto da vida os trabalhadores enfrentando as mazelas do ‘mau patrão’. No final da década de 50 já eram enfrentamentos brabos, porque o cara era cão chupando manga. Então o povo que trabalhava na fábrica frequentava, por exemplo, um bar que tem aqui perto da esquina, se juntavam muito ali, ou na praça, as assembleias eram na praça, e, não sei por que cargas d’água, resolveram fazer um motim, o negócio pegou, aderiu, e eles já faziam um movimento meio com barulho. E começaram a enfrentar brigas e a ganharem, porque eles tinham uma tenacidade, uma vontade de ir para o pau que era impressionante. Um deles falou assim: “Ah, vocês se parecem queixadas”. Que é um porco do mato, que eu conheço muito bem desde a minha infância. No Mato Grosso, no mato, você cresce, tem vários medos que são colocados e tem medos muito concretos, um deles se chama queixada. O bicho que mais mete medo é o queixada. E eles atacam em bando. Então como eles se tornaram queixadas? Foi por conta dessa história, dessa associação com os porcos que se juntam em bando, eles atacam e não param enquanto não... Tem essa resistência, essa firmeza. Passaram a se chamar Queixadas. Depois chegou o Mário Carvalho de Jesus, que veio ser advogado do sindicato, e o Mário vinha das pastorais e de um movimento humanista, foi pra França, passou um ano em fábricas ocupadas, que era um movimento do pessoal ligado ao Gandhi, à não violência, ao Martin Luther King, esse período aí do final dos anos 50. E o Mário trazia pra cá uma proposta de estratégia de resistência, que era a tal da não violência ou da firmeza permanente. Eles acharam a “não violência” fresco demais… pra quem carregava cimento e comia pó de cimento e carregava pedra, aí resolveram de chamar de firmeza permanente. É isso que ganha qualquer parada, você ser firme o tempo todo e não desistir, é isso que faz o outro... Então eles iniciaram a greve em 62, que durou três, ou quatro meses. Depois eles foram todos demitidos, aí entraram na justiça, e enquanto o processo durou até 69, eles permaneceram em greve. E aí permaneceram em movimento, fizeram greve de fome, passaram todos esses anos lutando até 69, quando eles ganharam na justiça o direito à reintegração. Sete anos de dias parados, por isso a gente considera uma greve de sete anos. Esses são os Queixadas. (Museu…, 2017)

Vejamos as etapas dessa narrativa. Tudo se inicia com o chamado “mau patrão”, desmandos, violências e falta de direitos para os trabalhadores da fábrica. Segundo Breno (1977, p. 37), um dos líderes da greve, os trabalhadores do Grupo Abdalla sofriam com “atrasos de pagamento e condições desumanas de trabalho”. De acordo com o principal advogado do Sindicato, “os trabalhadores viviam amedrontados” (Jesus, 1977, p. 41). A organização dos operários se dá organicamente, na praça e no bar. Amotinam-se e são apelidados. O queixada bicho, assim como o queixada operário, ataca em bando e não desiste. A luta ganha novos nomes com a chegada de um advogado formado nas trincheiras da organização trabalhista e cristã francesa. A firmeza permanente inverte o jogo da violência do patrão e do aparato repressivo estatal e, com isso, os Queixadas permaneceram sete anos (1962-1969) em greve durante a ditadura militar (Figura 2).

Figura 2
– Assembleia na Sede do Sindicato (1962)

Um verso de uma das ladainhas de jongo, ritmo de música afro-brasileira muito presente na região Sudeste e nas festas da Quilombaque, diz: “O coro come, na mata fechada / mas queixada me ensinou a lutar sem a espada” (IMS, 2020). A greve acabou em 1969 e, na década de 1970, a fábrica faliu. No entanto, a memória queixada, passada essencialmente de forma oral, dada a parca documentação do período, é colocada como a semente que germinou em mobilizações sociais posteriores, levando à caracterização de Perus como “um bairro de lutas”. Cleiton Fofão afirmou, em roda promovida pelo Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura (DPH), que “a luta dos Queixadas nunca parou, a forma de organização e as diversas frentes se ramificaram. Quando tem alguma luta social que é de importância pro bairro, o bairro se organiza conforme a herança que os Queixadas deixaram” (DPH, 2020). Mesmo sem terem participado da greve, a experiência dos operários da Fábrica de Cimento é uma inspiração para a geração que criou a Quilombaque, afinal, aqueles operários “entenderam o potencial que eles tinham na época: se o Brasil estava em desenvolvimento e precisava do cimento, eles perceberam que se travassem tudo, ficariam com os caras na mão” (Cleiton Fofão, entrevista, em 2021).

A constituição dessa memória como formadora da identidade do bairro não foi tarefa fácil. Dar continuidade a essa luta não é apenas estabelecer conexões em relação às inspirações éticas e políticas da organização queixada, mas, sobretudo, lutar para que o fenômeno dos Queixadas não seja esquecido. A perda dos remanescentes físicos e simbólicos da “greve da Perus” mostra a iminência do esquecimento e, por isso, o trabalho com a memória pessoal de grevistas foi essencial, capaz de inspirar gerações mais jovens. Sobre esse processo, Mestre Soró lembra:

O João Breno já tinha morrido, mas encontrar o Tião, o seu Oliveira, todos os velhos, Dona Maria Velci. Todas essas grandes lideranças que estavam há 50 anos em luta aqui e com quem eu aprendi muito, encontrar muitos deles doentes com depressão... Tinha a ver com a depressão e tinham a ver com esse desencanto todo. A gente lutou pra construir um país, um mundo. Imagina agora como eles estão… Eu falei: ‘Resgatar essa memória, valorizar essas pessoas, é também um modo de tirá-las dessa depressão’. Então esse compromisso, essa relação com esses velhos mestres que eu conheço vai durar até o fim. E juntar essa coisa desse fogo deles e vamos botar fogo, incendiar e tal. E essa é uma das maiores vitórias que eu tenho muita honra de ter conseguido. (Museu…, 2017)

Na luta pela memória do movimento queixada, logo após a desativação da fábrica, a população se mobilizou para que todo o espaço se transformasse em um centro cultural que incluísse um memorial do trabalhador, ou seja, transformando a Fábrica em um espaço de uso público voltado para a valorização do patrimônio imaterial das lutas. O primeiro vislumbre de realização desse projeto se deu na gestão de Luiza Erundina como prefeita e de Marilena Chauí como secretária de cultura, de 1989 a 1992, como lembra Mestre Soró:

Surgiram coisas muito importantes. Uma delas, que foi a Marilena que trazia, que era a ideia do resgate da memória das lutas sociais. [...] E a Marilena desde o começo já falava dos Queixadas, que ela conhecia o pessoal, o Mário Carvalho, e aí entraram nessa de fazer o resgate da memória da fábrica, dos trabalhadores Queixadas. Então toda terça-feira o povo sentava lá e tome conversa, o povo gravou, escreveu livros. [...] Começou o processo pra tombamento, e aí foi legal porque acho que deu um dos primeiros tombamentos que foi material e imaterial. Então se tombou o patrimônio em Perus, mas se tombou a luta, e todas as coisas que são significativas: o sindicato... Enfim, nasceu dentro desse processo. Em um ano, quando terminou o registro da memória, já tava o tombamento encaminhado, tanto é que no final do governo, ela veio fazer a festa de entrega do tombamento. (Ibid.)

Incorporado na própria metodologia do trabalho com a preservação, o comprometimento político da prefeita e da secretária permitiu que a firmeza permanente, presente em Perus desde a década de 1950, ocupasse a instância de decisão da política cultural. A concretização desse projeto está no tombamento da Fábrica, que levou em conta o trabalho com história oral de ex-grevistas queixadas (Retroz e Borges, 2021). A então diretora do DPH, Déa Fenelon, afirmou que, entre as metas de sua gestão, estavam:

[A] implantação de projetos de história oral, através da coleta de depoimentos relativos à vida cotidiana da cidade, à memória do trabalho fabril e de movimentos sociais, visando ampliar o universo de registros relativos à memória e à história da cidade. Subsidiar tecnicamente os movimentos populares na cidade, no sentido da organização dos registros de sua própria memória e da preservação de suas tradições e referências culturais, em condições de autonomia. (Fenelon, 1992, p. 32)

De forma condizente, Raquel Schenkman, servidora do DPH e diretora do órgão entre março de 2019 e meados de 2020, afirmou que “o tombamento da fábrica de Perus é um dos primeiros tombamentos do DPH e saiu inclusive dessa mobilização da comunidade que sempre esteve engajada com toda essa discussão do patrimônio” (DPH, 2020). A Resolução n. 27, de 1992, do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo – Conpresp (1992) definiu o tombamento não apenas de uma parcela dos remanescentes da Fábrica, mas da sede do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Cimento e Gesso de São Paulo e de um conjunto de residências de operários. O texto é categórico ao justificar o tombamento: “Considerando a importância da memória enquanto alicerce na construção da história e a relevância da memória dos trabalhadores da Companhia Brasileira de Cimento Portland Perus enquanto símbolo de determinada forma de organização, luta e resistência dos trabalhadores” (ibid.).

É inegável, então, que a luta dos Queixadas e de seus sucessores foi capaz de gerar resultados práticos em termos de políticas públicas de memória. Da mobilização em termos de ação pública, do público para o público, a população organizada conseguiu incidir sobre as instâncias oficiais para pautar a preservação não apenas da materialidade da fábrica, mas da imaterialidade da memória da resistência operária.

No entanto, se o tombamento representa segurança jurídico-institucional à perda total dos referentes das histórias que tiveram a Fábrica como cenário, a política pública não se mostrou capaz de cumprir com as tarefas de valorização. Sobre os contatos atuais com os órgãos de preservação, Camila Cardoso, coordenadora da Agência Queixadas, braço da Quilombaque dedicado às ações de turismo cultural, admitiu que “não é próxima a relação, de grana menos ainda, conversa rola, parceria nem sempre” (Camila Cardoso, entrevista, em 2021). Na entrevista com Cleiton Fofão, a mesma posição foi afirmada: “a gente dialoga, mas não tem resultado, não tem recurso também” (Cleiton Fofão, entrevista, em 2021). O órgão de preservação é a área com menos recursos na Secretaria Municipal de Cultura, que já possui o menor orçamento da prefeitura em relação às demais. Tal fato se agrava com o avanço da precarização do serviço público: “a estrutura da Secretaria tá sucateada, as pessoas não dão conta de acompanhar projetos, editais, não tem pessoa pra trabalhar. Um técnico lá cuida de cem, duzentos projetos” (ibid.). A situação é dramática para a preservação do patrimônio dos Queixadas e o respeito que lhe é dado, o que podemos depreender da narração de Cleiton Fofão sobre um episódio:

Fomos na Fábrica de Cimento uma vez e o dono alugou pros policiais treinar paintball… Ela tem o tombamento material e imaterial pela luta dos Queixadas e eles treinando tiro?! Nós fizemos a denúncia e travou. Mas é o mínimo… mancharam toda a fábrica de tinta usando um espaço de memória nossa, da não violência, pra treinar tiro… pra pegar a nossa comunidade depois. A gente tem que barrar. Se a gente não vai lá puxar a orelha dos caras [órgãos de patrimônio] pra eles verem o que tá pegando, o negócio não sai. [...] a cada dia cai um pedaço da fábrica e fica por isso mesmo. Se a gente não fizer a preservação, ninguém vai fazer. (Cleiton Fofão, entrevista, em 2021)

A propriedade é ainda do “mau patrão”. Patrimônio e herança: a terceira geração da família mantém o lugar por motivos escusos. Para acessar o espaço há dois portões: o primeiro, no qual os Queixadas fizeram seus piquetes, fica sempre aberto e é ocupado por uma motoescola; o segundo fica sempre trancado e protegido para evitar que as ruínas se tornem moradia. Foi um longo percurso de conversas estrategicamente amenas entre a Comunidade e o porteiro para que um grau de confiança fosse garantido, permitindo que a Quilombaque tivesse certo acesso ao lugar de memória. Nas ruínas, nada é feito ou desfeito, porque a ação do tempo é mais barata; o mote da gestão daquele espaço parece ser o “deixe que caia”. A disputa pelos significados da Fábrica é constante; no relato de Fofão, trata-se, novamente, da luta entre a força policial e a memória dos operários Queixadas. A frase final de seu testemunho é importante, pois mostra o não conformismo característico da contranarrativa. Se a preservação não se dá pelos instrumentos da política pública, a ação pública dos movimentos sociais, em Perus, preenche esse vácuo.

É nesse cenário que agentes da Comunidade Cultural Quilombaque passam a articular, desde 2014, no âmbito da revisão do Plano Diretor Estratégico (Sandeville, Fernandes e Bortoto, 2016), a constituição de um museu com muitas particularidades. Sem espaço físico delimitado, a ideia do Museu Territorial Tekoa Jopo’i é que “o nosso território é todo um patrimônio cultural” (Camila Cardoso, entrevista, em 2021). Foi em intenso contato com grupos de moradores que esses espaços foram elencados: “[...] a gente não pensou sozinho ou não pensou apenas academicamente neste território, por isso que a gente fala que são os lugares de memória e de afeto, porque foram pensados com as pessoas daqui desse território” (ibid.). Dividida em diversas trilhas, a Agência Queixadas organiza grupos de visitantes que buscam conhecer as histórias daquele território por meio das vozes e narrativas de seus próprios moradores e, por isso, Cleiton Fofão afirma que “esse museu é uma sala de aula onde a história é contada onde ela ocorreu” (DPH, 2020).

Uma das trilhas dentro do Museu Tekoa Jopo’i é chamada de Memória Queixadas (Figura 3). Durante o trajeto, é possível entranhar-se pelas ruínas monumentais da Fábrica. Aproximando-se dos antigos fornos e chaminés, vê-se a vegetação que invade o concreto; fábrica e floresta se misturam. A estrutura que, cem anos atrás, depenou paisagens, hoje é engolida, pouco a pouco, por raízes e folhas; o cimento que ali foi ensacado para cobrir os rios da cidade, hoje é o chão por onde corre a água da chuva e onde crescem novas árvores. É um labirinto: perde-se a noção de escala, tudo é grandioso, desde os parafusos espalhados pelo chão aos silos de armazenagem e, principalmente, o forno giratório onde a matéria-prima era quebrada junto de esferas de chumbo e a chaminé que expelia fumaça tóxica.

Figura 3
– Trilha Memória Queixadas e explicações nos antigos laboratórios da Fábrica

Durante a caminhada, quem guia a visita conta a história da greve e tem-se, de forma muito transparente, a escolha de quais narrativas devem ser valorizadas e quais vozes devem ser amplificadas no percurso do Museu: “eu posso passar na Fábrica de Cimento e contar a história dos pelegos, que também faz parte da história, mas nossa vertente é a vertente dos Queixadas, que é outro lado” (Camila Cardoso, entrevista, em 2021). Passando por todas as fases da Fábrica e dos consequentes impactos urbanísticos e populacionais no bairro, o foco do trajeto é a “herança dos Queixadas”:

Então é muito importante pra história do Brasil essa fábrica e esse processo de luta operária, porque tem um desdobramento: quando eles se organizam, eles constroem a Frente Nacional do Trabalho, uma outra organização muito potente que nasceu aqui em Perus, e depois disso foram dar formação lá pro ABC o que se desdobrou até a gente chegar num operário presidente. São contextos de desdobramento de luta que a gente também precisa entender. Por isso a importância desse processo de organização operária aqui do território. (Cleiton Fofão, entrevista, em 2021)

Com essa narrativa, povoam as ruínas de uma fábrica abandonada pelo poder público e pelo mercado, com histórias de luta e resistência. Na contramão do descaso, a trilha Memória Queixada denuncia lados obscuros e violentos do progresso industrial ao mesmo tempo que propõe possibilidades de reinvenção desses patrimônios pela própria comunidade. Ao se contrapor a uma narrativa do esquecimento, que justifica a queda material da Fábrica, lança ao espaço público uma narrativa de valorização do território e de sua identidade. Contra o uso para treinos de tiro, a comunidade transforma a Fábrica em um espaço cultural e educativo. Na caminhada, podemos ver ruínas, mas escutamos formas pelas quais se comemoram acontecimentos e personagens frequentemente soterrados.

Na esteira dessa ação de valorização e resgate, outra iniciativa, mais atual, é relevante. A criação do Centro de Memória Queixadas – Sebastião Silva de Souza (CMQ) marca outra fase de apropriação da história da resistência operária pelos movimentos culturais de Perus (CMQ, 2018). Com o objetivo de coletar, restaurar e preservar documentos textuais, fotográficos, fílmicos e orais, o Centro constitui um trabalho intenso de edificar um arquivo da resistência Queixadas. Com amplo acesso disponibilizado por meio do sistema Tainacan, é possível pesquisar histórias pessoais de trabalhadores. Suas organizadoras, uma delas neta de um operário queixada, admitem que o lugar ideal para o funcionamento do Centro seria dentro da Fábrica, para que aquelas histórias voltassem para sua origem. Todavia, enquanto o uso das suas dependências é restrito, o Centro Sebastião Silva de Souza funciona em espaço cedido na Biblioteca Padre Anchieta, a única de Perus.

A Fábrica povoada pelos visitantes e guias do Museu Territorial e da Agência Queixadas e o arquivo do Centro de Memória são efeitos de processos da ação pública longos; devemos considerar que se iniciaram com os próprios operários grevistas. Da década de 1960 para nossos dias, os contextos de atuação política foram radicalmente alterados, mas nossos narradores de Perus insistem em unir suas lutas sob o signo da “herança Queixada”. Seja sob a ditadura, seja sob um governo petista ou malufista, seja sob o neoliberalismo e sob as pressões do mercado imobiliário, o exemplo dos trabalhadores “da Perus”, ensinado pela tradição oral, são como guias da atuação política de movimentos jovens no território. Observando, todos os dias, o abandono, as paredes que caem e a deterioração proposital do patrimônio material, essas mobilizações se firmam no imaterial, nas memórias, para contar um outro lado da história. Sob o mesmo espaço, são capazes de contar histórias do treino de paintball de policiais, mas também de lutas operárias que levaram à eleição de um presidente que foi operário. Ao disponibilizarem relatos orais, documentos pessoais – como carteiras de trabalho e fotos dos piquetes e das assembleias –, contrapõem o apagamento com a comemoração. Nas mesmas ruínas, denunciam o abuso do “mau patrão” ao mesmo tempo que anunciam a força operária.

A contranarrativa mobilizada pela Quilombaque altera, no campo discursivo, as maneiras pelas quais o território e seus espaços de memória são representados. As relações ambíguas, no campo das políticas públicas de preservação, entre a Comunidade Cultural e o Estado – que tomba, mas permite o treino de paintball – fazem lembrar que o público se constrói sob diversas e múltiplas gramáticas. Transitando entre diferentes “repertórios de interação” (Abers, Serafim e Tatagiba, 2014), participando de uma “cacofonia performática” (Spink, 2013) e atuando como um “laboratório de experimentação” (Cefaï, 2017b), as ações de patrimonialização discutidas constituem estratégias de movimentos sociais que usam a memória como cimento. Na próxima seção, poderemos relacionar brevemente essas ações com perspectivas mais amplas de ressignificação de espaços públicos para refletir como um patrimônio aparentemente vazio e silencioso é transformado em fonte de valorização de memórias de pessoas e movimentos da periferia.

A memória cimentada

As ações públicas sobre o patrimônio industrial analisado, no caso da contranarrativa da Comunidade Cultural Quilombaque sobre a Fábrica de Cimento Portland de Perus, muito se assemelham aos movimentos de ressemantização do termo “periferia” descritos por outros estudos. Em propostas recentes, movimentos de áreas periféricas das grandes cidades brasileiras são lidos como partes de um processo de crítica das visões reducionistas e detratoras desses territórios. Como proposto por Comelli (2021), as categorias “periférico/favelado” são mobilizadas com propósitos diversos:

Nota-se a dificuldade de tratar da suposta identidade do morador de favela, do subúrbio ou da periferia para a construção de lutas urbanas de caráter insurgente. Em alguns casos, tal categoria pode funcionar como um mero reforço de estereótipos gerados a partir de visões de mundo hegemônicas sobre a cidade. Em outros, essa identidade pode ser capaz de traduzir e conectar as pluralidades de corpos e de demandas urbanas; pode servir como um fio condutor para narrativas cidadãs contra-hegemônicas. De certa forma, a identidade periférica/favelada é uma espécie de tensão que simultaneamente reduz e conecta: conecta as identidades complexas que lutam pelo Direito à Cidade, enquanto as compacta e as reduz a um determinado tipo de território. (Comelli, 2021, p. 682)

Nessa disputa por significados e usos semânticos, D’Andrea (2013, p. 26) focaliza movimentos culturais e artísticos para compreender como buscaram, desde a década de 1990, a “ressignificação do fazer político nas periferias”. Na mesma direção, Raimundo (2017, p. 146) afirma que a escolha pela atuação no campo cultural operada por esses coletivos não se dá sem razão: “esses novos olhares que constroem a cidade, modos de ser e viver as experiências cotidianas e políticas, têm na arte uma linguagem privilegiada para expressar uma infinidade de reflexões, questionamentos, críticas, utopias e projetos”. De maneira complementar, Oliveira (2021, p. 36) afirma que a ação cultural nas periferias é “um complexo de ações e práticas simbólicas de resistência a mecanismos de opressão mobilizando a ressignificação de elementos constitutivos desta paisagem periférica e sinalizando para mudanças na estrutura social”. Consonantes, esses estudos mostram uma tendência da associação entre ações culturais e movimentos sociais de regiões periféricas para afirmar que podem, também, construir a própria cidade como personagens ativas, sendo, enfim, sujeitos históricos. Indo contra a marginalização, esses coletivos ocupam espaços como sedes irradiadoras de diferentes manifestações, como dança, teatro, comunicação, literatura, esporte, educação, turismo, artes plásticas e suas múltiplas interconexões.

Admitindo essa moldura, vemos que as práticas da Quilombaque não se realizam como um fenômeno isolado, mas como um nó de uma complexa rede de indivíduos, grupos, coletivos e movimentos; rede que, talvez, tenha se iniciado com mutirões de moradia, comunidades eclesiais de base e movimentações partidárias na periferia paulistana dos anos 1980 – presentes nos estudos de Kowarick (1979), Caldeira (1984) e Sader (1988). Na constante busca por referências inspiradoras no passado, os coletivos, como a Quilombaque e o Centro de Memória Queixadas, procuram ressignificar o que é ter nascido em Perus. Vemos a aparição do “sujeito periférico” (D’Andrea, 2013) não apenas morador de lugar geográfico específico, mas sujeito histórico que assume e tem orgulho de sua condição e, a partir disso, age politicamente.

Nesse sentido, a Quilombaque, o Museu e a Agência fazem parte de um movimento mais amplo e mais antigo de ampliação dos sentidos de “periferia” e “periférico”. A ocupação material e simbólica que esses agentes promovem nas ruínas da Fábrica de Perus deve ser vista, então, como um instrumento no contexto de um projeto cultural e político maior. O uso do que resta de um momento de pujança industrial serve à função de questionar se o signo que marca o território e suas gentes é o do abandono ou o da resistência. Levando visitantes para a Fábrica, conseguindo acessá-la a despeito das restrições dada pelos proprietários, narrando histórias de grevistas, apontando suas estratégias, expondo as ameaças sofridas e direitos violados, coletando, preservando e comunicando acervos pessoais de operários, dizem: “aqui houve luta”. Se, aos poucos, o mato toma conta da Fábrica, as paredes caem e seus corredores são usados como campos de tiro, as estratégias para que a narrativa dos trabalhadores Queixadas não se perca sob escombros são formas de cimentar, na comunidade, memórias aparentemente frágeis.

Retomando o mote e atualizando os significados da “firmeza permanente”, as ações estudadas mostram-se eficazes na constituição de uma contranarrativa ao apagamento. Enquanto Estado e mercado atuam direta ou indiretamente para que os remanescentes físicos do patrimônio industrial da Fábrica de Perus sejam perdidos, os agentes da ação pública procuram meios criativos para que a sua contraparte – o patrimônio intangível da memória operária – continue inspirando as atividades político-culturais no território. Na dinâmica freireana da denúncia e do anúncio, essa contranarrativa coloca a Fábrica e os Queixadas constantemente no circuito da memória, enquanto as pressões da narrativa dominante os impelem ao esquecimento. Na próxima seção, que fecha este texto, procuro sugerir que as ações da Comunidade Cultural Quilombaque e do Museu Territorial podem inspirar outras iniciativas de ressignificação de patrimônios industriais.

Palavras finais

Neste artigo, as perspectivas teóricas da abordagem da ação pública e da visada narrativa sobre as políticas públicas permitiram superar o foco excessivo na ação do Estado sobre o patrimônio para observar as múltiplas linguagens que atuam sobre a valorização de lugares de memória. De um lado, a concepção da “cacofonia performática” nos ajuda a ver a riqueza do espaço público e os diversos agentes que, harmônica ou conflituosamente, constroem problemas e respostas públicas. De outro lado, a óptica narrativa nos permite entender que estudos de patrimonialização são mais instigantes se não nos questionarmos sobre a coisa, mas sobre o falar sobre a coisa. Nessa direção, a utilização do conceito de contranarrativa traz o foco para a disputa entre diferentes formas de atribuir significados ao patrimônio ao articular a denúncia de uma narrativa dominante com o anúncio de uma narrativa resistente.

A prática das entrevistas e da pesquisa documental, buscando testemunhos, permitiu que diversas vozes fossem costuradas a fim de entender como a ação da Comunidade Cultural Quilombaque sobre a Fábrica de Cimento de Perus constitui uma contranarrativa ao esquecimento. Essa ação se dá na contação das histórias dos operários grevistas ao mesmo tempo que mostram os remanescentes da Fábrica. Camila Cardoso adverte que “das bibliografias que têm hoje, a gente se aproxima mais do turismo de base comunitária, enquanto a gente ainda não escreveu um livro ou fez um mestrado, doutorado, sobre o turismo de resistência” (Camila Cardoso, entrevista, em 2021). Com base na comunidade, sim, mas tendo como cerne a valorização da resistência que teve o território como palco. Com relevante impacto na geração de trabalho e renda e, principalmente, fundamentado nos “lugares de memória e afeto” dos mais velhos, como Sebastião Silva – o Seu Tião Queixada – e Mestre Soró, o “turismo de resistência” articula a denúncia da situação de abandono e desprezo com o anúncio das potencialidades do território.

Talvez, essa estratégia de ação político-cultural possa servir de exemplo para a ocupação de lugares de memória relegados ao esquecimento. Outras pesquisas podem interpretar mais exemplos de “turismos de resistência” atuantes sobre patrimônios industriais em estado de degradação, nos quais são as lutas operárias as primeiras a sofrerem com o esquecimento. Como nos ensinaram os movimentos pela memória, incluindo os Queixadas na História, não há vazio entre as ruínas de concreto armado da abandonada Fábrica de Cimento de Perus.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2024
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    24 Jan 2024
  • Aceito
    27 Maio 2024
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