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Comparação entre dois fios de sutura não absorvíveis na anastomose traqueal término-terminal em cães

Comparison of two nonabsorbable suture materials in the end-to-end tracheal anastomosis in dogs

Resumos

Doze cães sem raça definida, com idade variando entre 1 e 6 anos e peso de 6 a 20kg, foram submetidos a ressecção traqueal e anastomose término-terminal, na qual foram testados os fios poliéster trançado não capilar e náilon monofilamento. Seis animais, cada três com um mesmo tipo de fio de sutura, sofreram a excisão equivalente a três anéis traqueais. Com 15 dias foi executada uma nova intervenção onde se ressecou o equivalente a mais seis anéis, perfazendo um total de nove. Ao final de outros 15 dias foram sacrificados. Os outros seis animais, cada três com um mesmo tipo de fio, foram submetidos à excisão equivalente a três anéis traqueais e mantidos por 43 dias. As traquéias foram avaliadas por exames clínicos, radiográficos, macroscópicos e histopatológicos. O fio de náilon monofilamento apresentou menos reação tecidual do que o poliéster trançado não capilar, promoveu uma anastomose segura e com menor chance de formação de granuloma.

cão; sutura; traquéia; anastomose


Twelve mongrel dogs, with age between 1 and 6 years old and weight between 12 and 40 pounds, were submitted to tracheal resection and end-to-end anastomosis in which were tested braided polyester no capillary and monofilament nylon materiais. Six animais, every threeones with a same type of suture material, suffered the excision equivalent to three tracheal rings. A new intervention was performed with fifteen days, in which the equivalent of more six tracheal rings were removed, completing the total of nine. At the end of more fifteen days they were sacrificed. The other six animals, every three with a same type of suture material, were submitted to the excision equivalent to three tracheal rings and maintained for 43 days. The tracheal anastomosis were evaluated to clinic, radiographic, macroscopic and histopathologic studies. The monofilament nylon material exhibited less reaction than polyester and promoted a secure anastomosis with less risk of granuloma formation.

dogs; suture; tracheal; anastomosis


COMPARAÇÃO ENTRE DOIS FIOS DE SUTURA NÃO ABSORVÍVEIS NA ANASTOMOSE TRAQUEAL TÉRMINO-TERMINAL EM CÃES

COMPARISON OF TWO NONABSORBABLE SUTURE MATERIALS IN THE END-TO-END TRACHEAL ANASTOMOSIS IN DOGS

Sheila Canevese Rahal1 1 Médico Veterinário, MSc., Professor Assistente do Departamento de Cirurgia Veterinária e Reprodução Animal, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia - UNESP, 18618-000 Botucatu, SP. Autor para correspondência. Alceu Gaspar Raiser2 1 Médico Veterinário, MSc., Professor Assistente do Departamento de Cirurgia Veterinária e Reprodução Animal, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia - UNESP, 18618-000 Botucatu, SP. Autor para correspondência. Dominguita Lühers Graça3 1 Médico Veterinário, MSc., Professor Assistente do Departamento de Cirurgia Veterinária e Reprodução Animal, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia - UNESP, 18618-000 Botucatu, SP. Autor para correspondência.

RESUMO

Doze cães sem raça definida, com idade variando entre 1 e 6 anos e peso de 6 a 20kg, foram submetidos a ressecção traqueal e anastomose término-terminal, na qual foram testados os fios poliéster trançado não capilar e náilon monofilamento. Seis animais, cada três com um mesmo tipo de fio de sutura, sofreram a excisão equivalente a três anéis traqueais. Com 15 dias foi executada uma nova intervenção onde se ressecou o equivalente a mais seis anéis, perfazendo um total de nove. Ao final de outros 15 dias foram sacrificados. Os outros seis animais, cada três com um mesmo tipo de fio, foram submetidos à excisão equivalente a três anéis traqueais e mantidos por 43 dias. As traquéias foram avaliadas por exames clínicos, radiográficos, macroscópicos e histopatológicos. O fio de náilon monofilamento apresentou menos reação tecidual do que o poliéster trançado não capilar, promoveu uma anastomose segura e com menor chance de formação de granuloma.

Palavras-chave: cão, sutura, traquéia, anastomose.

SUMMARY

Twelve mongrel dogs, with age between 1 and 6 years old and weight between 12 and 40 pounds, were submitted to tracheal resection and end-to-end anastomosis in which were tested braided polyester no capillary and monofilament nylon materiais. Six animais, every threeones with a same type of suture material, suffered the excision equivalent to three tracheal rings. A new intervention was performed with fifteen days, in which the equivalent of more six tracheal rings were removed, completing the total of nine. At the end of more fifteen days they were sacrificed. The other six animals, every three with a same type of suture material, were submitted to the excision equivalent to three tracheal rings and maintained for 43 days. The tracheal anastomosis were evaluated to clinic, radiographic, macroscopic and histopathologic studies. The monofilament nylon material exhibited less reaction than polyester and promoted a secure anastomosis with less risk of granuloma formation.

Key words: dogs, suture, tracheal, anastomosis.

INTRODUÇÃO

A reconstrução traqueal pode ser necessária em diversas circunstâncias, tais como: trauma severo VASSEUR, 1979; ELKINS, 1984); excisão de tumores HARVEY & SYKES, 1982); estenose congênita (WHITE & KELLAGHER, 1986) e colapso traqueal traumático (BRADLEY, 1987).

Na reparação de lesões circunferenciais a anastomose término-terminal apresenta resultados altamente satisfatórios (CANTRELL & FOLSE, 1961). O sucesso deste tipo de anastomose depende da adequada mobilização da traquéia, ausência de tensão, prevenção da formação de granuloma ou tecido fibroso na área operatória, preservação de um fluxo mucoso e do reflexo de tosse (LAU et al., 1980); manutenção do diâmetro do lume traqueal que seja no mínimo 80% da medida pré-operatória (DALLMAN & BOJRAB, 1982).

Inicialmente houve dificuldades em se estabelecer os limites da excisão que permitissem uma anastomose traqueal adequada. Segundo CANTRELL & FOLSE (1961) a essecção de 8 a 27 anéis traqueais no cão é viável desde que a anastomose seja executada em uma tensão inferior a 1.700g. Observaram que o grau de tensão é diretamente proporcional ao grau de mobilização traqueal, sem enfraquecimento da circulação nem da cicatrização do órgão, pois este pode ser suprido pelo plexo vascular colateral extenso que se desenvolve. VASSEUR (1979) indicou que no cão lesões de 2cm (aproximadamente 4 anéis) ou menores podem ser prontamente excisadas e suturadas somente com o solamento e mobilização do segmento envolvido. Lesões maiores que 2cm requerem a colocação de suturas de alívio de tensão para reduzir o estresse no local da anastomose.

De acordo com LAU et al. (1980) a formação de glanuloma intraluminal pode levar à estenose. Sua formação parece estar relacionada com a precisão com que a anastomose é executada, método de colocação de suturas e nós, o tipo de material de sutura e a presença de infecção. A estemose pode tornar-se uma séria complicação, porque reduz a depuração mucociliar e pode causar sinais clínicos de obstrução traqueal (HEDLUND, 1987). Quando a anastomose não for precisa, a mucosa pode retrair nas extremidades traqueais incisadas e o tecido de granulação pode preencher este defeito antes da epitelização (LAU et al., 1980; HEDLUND, 1984; HEDLUND, 1987).

Diversas formas de sutura traqueal término-terminal têm sido utilizadas, tais como: a interanular (BOJRAB & DALLMAN, 1980; DALLMAN & BOJRAB, 1982), a de sobreposição dos anéis (VARSHNEY & KUMAR, 1984), a de suturar ao redor dos anéis traqueais (LAU et al., 1980; ELKINS, 1984), a técnica do ligamento anular (HEDLUND, 1984; BRADLEY, 1987) e a da divisão do anel (HEDLUND, 1984).

HEDLUND (1984) comparando as técnicas de divisão do anel e a interanular concluiu que a primeira oferece vantagens de um alinhamento mais preciso, menor estenose luminal dorsoventral e produção de uma forte união devido a cicatrização fibrocartilaginosa. Com a técnica da divisão do anel observou uma protrusão de tecido mole intraluminal que foi circunferencial em dois cães, menor que 270° em três e não evidente em cinco. Pelo exame histopatológico verificou que a protrusão era composta de tecido conjuntivo fibroso e coberta com um epitélio delgado, porém intacto. Na submucosa de alguns cães havia acúmulo de células mononucleares, poucos neutrófilos e macrófagos carregados de hemossiderina. Granulomas seguiam as regiões de sutura. Concluiu que uma das causas da estenose anastomótica estaria relacionada com a retratação da mucosa, que sendo maior na membrana traqueal dorsal corresponderia a maior protusão de tecido mole intraluminal na região dorsolateral.

A sutura predominante para a anastomose traqueal tem sido a interrompida simples (WHITE & KELLAGHER, 1986; BRADLEY, 1987). Segundo Grillo apud LAU et al. (1980) os nós devem ser extraluminais, visto que podem formar granulomas se ficarem intraluminais.

Os fios empregados podem ser: absorvíveis como o poliglactin 910 (HEDLUND, 1984) polidioxanone (BRADLEY, 1987) ou inabsorvíveis como o náilon (LAU et al., 1980; HARVEY & SYKES, 1982), aço (CANTRELL & FOLSE, 1961), tevdek (VASSEUR, 1979; BOJRAB & DALLMAN, 1980) e polipropileno (WHITE & KELLAGHER, 1986).

Considerando que o tipo de material de sutura utilizado pode tomar-se crítico, pois precisa proporcionar uma anastomose segura e sem formação de granulomas, é propósito comparar a efetividade de dois tipos de fios inabsorvíveis: o poliéster trançado, originado de polímeros de resina sintética, tido como um material extremamente forte e de boa durabilidade (CRANE, 1983; CAMPBELL & MARKS, 1985) e o náilon, originado de filamento de poliamida, considerado um excelente material, mas que requer cuidado na confecção dos nós (CRANE, 1983).

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados doze cães sem raça definida, com idade de 1 a 6 anos e peso de 6 a 20kg, sendo dois machos. Foram divididos aleatoriamente em quatro grupos de 3 animais que receberam os seguintes tratamentos: grupo I - excisão equivalente a três anéis traqueais e anastomose término-terminal com fio de náilon monofilamento n° 3-0a. Quinze dias após esses animais sofreram uma segunda cirurgia com a remoção equivalente a mais seis anéis traqueais, abrangendo a porção da primeira anastomose. Isto perfez um total de nove anéis. Foram sacrificados ao final de mais 15 dias; grupo II - procedimento semelhante ao grupo I, entretanto, foi utilizado o fio poliéster trançado não capilar n° 3-0b; grupo III - ressecção equivalente a três anéis traqueais e sutura com fio de náilon monofilamento n° 3-0, tendo sido mantido por 43 dias; grupo IV - mesmo procedimento do grupo III, mas com emprego do fio poliéster trançado não capilar n° 3-0.

À todos os animais, em jejum de 12 horas, foi administrado como medicação pré-anestésica maleato de acetilpromazinac na dose de 0,5mg/kg, pela via intravenosa e sulfato de atropinad na dose de 0,044mg/kg por via subcutânea. Quinze minutos após, a anestesia cirúrgica foi induzida e mantida pela aplicação intravenosa de tiopental sódicoe na dose de 12,5mg/kg. Imediatamente após a perda dos reflexos foi efetuada a intubação orotraqueal. Os cães foram posicionados em decúbito dorsal, com seus membros anteriores colocados lateralmente à região tóraco-abdominal e com o pescoço em extensão.

Foi realizada uma incisão na linha média cervical ventral, através da pele e tecido subcutâneo. Os músculos estemohioídeos e estemomastóideos direito e esquerdo foram separados e retraídos lateralmente para expor a traquéia. Um segmento médio da traquéia cervical foi mobilizado mediante divulsão do tecido conjuntivo peritraqueal, evitando danificar os nervos laríngeos recurrentes. Duas suturas de reparo de categute cromado n° 2-0 foram colocadas ventrolateralmente ao redor do segundo anel cranial e duas no segundo anel caudal à porção traqueal a ser resseccionada. Foram submetidos à técnica de divisão do anel, que consistiu numa incisão circunferencial no meio do anel traqueal cranial e outra semelhante no anel caudal. O tubo endotraqueal foi retraído temporariamente durante a ressecção. As porções traqueais remanescentes foram aproximadas com sutura término-terminal em pontos simples isolados ao redor dos anéis traqueais divididos. As suturas constituíram de no máximo 12 a 15 pontos a uma distância aproximada de 2 a 3mm entre si. Todos os fios de sutura atingiram a mucosa e todos os nós foram extraluminais. Ao completar a anastomose a traquéia foi irrigada com solução de cloreto de sódio 0,9% a fim de verificar a aerostasia da sutura. Os músculos estemohióideos e estemomastóideos foram aproximados com pontos em Sultan com fio categute cromado n° 2-0. O tecido subcutâneo foi aproximado com uma sutura tipo Cushing com o mesmo fio. A pele foi suturada usando pontos simples isolados com poliéster trançado não capilar n° 2-0.

A técnica cirurgica empregada na segunda intervenção a que foram submetidos os cães dos grupos I e II foi semelhante à primeira, porém com inclusão de duas suturas de alívio de tensão, em posição ventrolateral aplicadas ao redor do segundo anel cranial e caudal à região da anastomose.

No pós-operatório receberam a aplicação via muscular de penicilina G benzatina na dose de 20.000 UI/kg. Diariamente a ferida cirúrgica foi tratada com tintura de timerosal até a remoção dos pontos cutâneos no sétimo dia.

A avaliação clínica constou de exames físicos e exames radiográficos semanais na posição lateral durante a inspiração.

Todos os animais foram necropsiados. Os cães dos grupos I e II no 30° dia e dos grupos III e IV no 43° dia de pós-operatório. A avaliação da sutura foi efetuada pela observação macroscópica e exame histopatológico pela microscopia óptica. Nos grupos I e II a coleta do primeiro material ocorreu durante a segunda cirurgia. As peças fixadas em formol a 10%, foram submetidas à inclusão em parafina, seccionadas com 5µ de espessura e coradas conforme técnica de hematoxilina-eosina.

RESULTADOS

Observações clínicas:

Cinco cães apresentaram tosse no máximo por quatro dias, que cedeu por si só, porém um do Grupo III manifestou uma tosse seca e acentuada que persistiu por volta de 10 dias. Em um animal do Grupo IV foi notado dificuldade respiratória com estridor e tosse. Este adquiriu uma pneumonia com secreção purulenta nasal, tendo o processo iniciado na terceira semana após a cirurgia. Apesar do tratamento com antibiótico e expectorante ter promovido melhora da infecção pulmonar, o quadro de estenose se acentuou até resultar em severa angústia respiratória ao mínimo exercício.

Achados radiográficos:

As medidas radiográficas percentuais dos diâmetros traqueais dorsais foram consideradas como aproximações do tamanho do lume, pois houve dificuldade na padronização da posição do pescoço. O grau de extensão e rotação do pescoço influenciaram o diâmetro. Nos cães dos grupos I e II, tanto na primeira como na segunda cirurgia, foi observado radiograricamente uma diminuição do diâmetro luminal ventrodorsal, mais acentuada na região dorsal (cerca de 7 a 25%). Foi bem menos evidente nos grupos III e IV aos 43 dias (em torno de 1 a 9%). Um animal do grupo II apresentou ao 15° dia, tanto na primeira como na segunda intervenção, uma redução de mais ou menos 29% do lume, sem manifestação de dificuldade respiratória. No cão do grupo IV, que apresentou sinais clínicos de estenose, aos 21 dias houve diminuição de quase 39% da luz traqueal. Concordante com a acentuada dificuldade respiratória, houve redução cada vez mais acentuada do lume.

Observações cirúrgicas e macroscópicas:

Durante a anastomose traqueal foi encontrada maior dificuldade na adaptação de suturas na região dorsal. Foram notadas aderências dos músculos estemohióideos à traquéia no local da primeira cirurgia, sendo mais acentuada nos indivíduos onde foi empregado o fio poliéster trançado (grupos II e IV) e também nos que sofreram duas cirurgias (grupos I e II). Os animais dos grupos I e II apresentaram uma circulação colateral grande quando da segunda operação, o que acarretou maior sangramento durante a mobilização da região a ser excisada. A anastomose estava em posição em todos, porém com um pequeno desvio em quatro cães, principalmente nos que apresentaram uma certa diferença no diâmetro dos anéis traqueais a serem suturados. Em todos os animais foi observada uma protrusão de tecido mole intraluminal mais evidente na região dorso lateral, sendo menos acentuada naqueles mantidos por 43 dias (grupos III e IV) (Figura 1a). No cão do grupo IV que apresentou sinais de estenose houve uma protrusão de tecido mole circunferencial, enquanto o indivíduo do grupo II que não manifestou sinais clínicos esta atingia menos de 270° (Figura 1b). No lume dos animais mantidos por 15 dias, as suturas anastomóticas eram na sua maioria visíveis no anel cartilaginoso e parcial ou totalmente cobertas na região dorsolateral. Nos grupos III e IV os fios geralmente estavam cobertos na região dorsolateral e parcialmente visíveis no anel cartilaginoso, principalmente com o fio de náilon. As suturas de alivio de tensão (grupos I e III) estavam parcial ou totalmente cobertas. Os anéis cartilaginosos apresentavam-se mais espessos na região da anastomose.


Achados histopatológicos:

As mudanças teciduais na maioria dos casos envolvia todas as camadas da traquéia. O epitélio da mucosa mostrava-se ora atrófico, ora só com depleção das células caliciformes, ora com metaplasia escamosa. A mucosa mostrava protrusões intraluminais bem maiores do que as do órgão normal, acompanhada por proliferação de tecido fibroso, por vezes abundante e correspondentemente invadido por células mononucleares. A membrana nasal, usualmente bem desenvolvida no órgão normal apresentava-se inaparente ou irregularmente aumentada. Os fragmentos de cartilagem às vezes estavam desalinhados, sendo isto evidente quando empregado o fio poliéster. O pencôndrio ou estava proeminente ou dava origem a nova cartilagem, a qual espessou os anéis consideravelmente. Quando o fio poliéster foi usado os fragmentos de cartilagem chegavam a invadir o músculo traqueal modificando muita esta porção. Em certas ocasiões a adventícia encontrava-se muito espessada por tecido de granulação infiltrado por quantidades variáveis de células mononucleares. Na maioria dos cortes e principalmente na mucosa e na adventícia foram notados macrófagos carregados de hemossiderina. Havia presença de microgranulomas de sutura em todas as camadas, sendo bem mais proeminentes quando usado o fio poliéster. No cão do grupo IV que apresentou protrusão do tecido mole circunferencial foi verificado que a mucosa apresentava grandes protrusões intraluminais, epitélio com hiperplasia zonal de células caliciformes, fibroplasia do córion e fibroso da adventícia com granulomas de sutura.

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

O método de anastomose término-terminal desenvolvido neste experimento foi fundamentado na técnica de divisão do anel descrita por HEDLUND (1984). Embora tenha ocorrido um espessamento dos anéis na área de anastomose, foi considerado um método aceitável para a reconstrução traqueal por ser fácil de executar, oferecer rigidez e resultar em uma união forte, devido à cicatrização fibrocartilaginosa como fora constatado por aquele autor.

Apesar de não ter sido medida a tensão da anastomose, como indicado por CANTRELL & FOLSE (1961), a mobilização da traquéia junto com a utilização de suturas de alívio de tensão aplicadas nos animais dos grupos I e II, durante a segunda cirurgia, permitiram a ressecção do equivalente ao total de nove anéis traqueais sem induzir uma maior diminuição da luz em relação à primeira cirurgia. As suturas de alivio de tensão, como referido por VASSEUR (1979), podem ter auxiliado na redução do estresse no local da anastomose. Cabe lembrar, entretanto, que em uma segunda ressecção muito da tensão da região de sutura é reduzida após os tecidos traqueais inter-anulares elásticos terem se distendido e adaptado à sua nova posição (BOJRAB & DALLMAN, 1980).

O sangramento mais evidente ocorrido durante a mobilização da traquéia nos cães dos grupos I e II, durante a segunda cirurgia, está de acordo com a citação de CANTRELL & FOLSE (1961), de que a traquéia desenvolve um plexo vascular colateral extenso quando mobilizada.

Embora as medidas radiográficas tenham sido consideradas como aproximações do tamanho do lume, elas permitiram uma associação entre o grau de estenose e os sinais clínicos.

A presença de tecido fibroso intraluminal de espessamento variável, foi também observado por HEDLUND (1984). Apesar do mesmo ter verificado com a técnica da divisão do anel dois casos de protrusão de tecido de forma circunferencial, nenhum dos seus animais teve uma redução do diâmetro luminal a ponto de apresentar sinais clínicos de estenose, como foi observado com o cão do grupo IV.

A estenose anastomótica pode ocorrer devido a diversos fatores (LAU et al., 1980; HEDLUND, 1984; HEDLUND, 1987). A presença de uma maior protrusão de tecido dorso lateral estana associada, segundo HEDLUND (1984, 1987) com maior retração de mucosa na membrana traqueal. Este tato pode também ser correlacionado com a dificuldade na aplicação de suturas nesta região, o que possibilita uma anastomose menos precisa. No entanto, no caso que o tecido de granulação atingiu proporções semelhantes àquela verificada no cão do grupo IV outros fatores, com a presença de sutura intraluminal e o tipo de fio, podem ter contribuído para o processo. Aliado a isto deve ser lembrado que o animal desenvolveu um processo infeccioso, que tem uma grande influência na regeneração epitelial (LAU et al., 1980; HEDLUND, 1987).

A utilização de diferentes tipos de fios de sutura. como o Poliglactin 910 (HEDLUND, 1984), polidioxanone (BRADLEY, 1987), náilon (HARVEY & SYKES, 1982) aço (CANTREL & FOLSE, 1961), tevdek (BOJRAB & DALLMAN, 1980), polipropileno (WHITE & KELLAGHER, 1986) várias vezes tem sido efetuada sem preocupação com a possibilidade de serem mais um fator indutor de estenose. No exame histopatológico foi verificado microgranulomas de sutura em todas as camadas.

As propriedades de um material de sutura ideal têm sido freqüentemente descritos, mas ainda não foram obtidos em um único produto (CRANE, 1983). O fio poliéster trançado é considerado de baixa reatividade e força de tensão muito alta (CRANE, 1983; CAMPBELL & MARKS, 1985), porém, tanto macroscopicamente como microscopicamente as maiores reações teciduais ocorreram com este fio. A segurança do nó e manipulação são ditas regulares (CRANE, 1983), fatos que foram observados, provavelmente por ser fio trançado e oferecer índice de fricção maior.

Como citado por CRANE (1983), o fio de náilon monofilamento apresentou reatividade muito baixa, força de tensão alta e manipulação regular à pobre. Apesar da segurança do nó ser considerada regular (CRANE, 1983), mostrou-se melhor do que o poliéster trançado. Outro fato a ser considerado é que o fio de sutura trançado embora seja de manipulação melhor do que o náilon monofilamento, apresenta interstício entre as fibras que aumentam a chance de infecção clínica (CRANE, 1983; CAMPBELL & MARKS, 1985). Este é mais um fator a ser considerado para explicar o tecido de granulação tão exuberante apresentado pelo cão do Grupo IV, após adquirir um processo infeccioso.

Por sua vez, o fio de náilon apesar de preconizado como permanente, apresenta hidrólise vagarosa, sendo o produto de degradação inibidor da colonização bacteriana e infecção (CRANE, 1983; CAMPBELL & MARKS, 1985).

Ainda que uma variedade de materiais de sutura pareçam dar resultados aceitáveis na anastomose traqueal, foi observado que na comparação de dois fios de sutura não absorvíveis, o náilon monofilamento apresentou menos reação tecidual do que o poliéster trançado e promoveu uma anastomose mais segura e com menor chance de formar granuloma.

FONTES DE AQUISIÇÃO

a - MONOFILAMENTO PRETO 3-0 - Johnson & Johnson - Rod. Pres. Dutra, Km 325 - São José dos Campos, SP.

b - FLEXIDENE 3-0 - Lab. Bruncau - Rua do Cruzeiro, 374 - São Bernardo do Campo, SP.

c - ACEPRAN 1% - UNIVET - Rua Clímaco Barbosa, 700 - São Paulo, SP.

d - SOLUÇÃO INJETÁVEL DE SULFATO DE ATROPINA - Img - Lab. Geyger - Porto Alegre, RS.

e - THIONEMBUTAL - Abbolt Lab. do Brasil - Rua Nova York, 245 -São Paulo, SP.

2Médico Veterinário, MSc., Professor Titular do Departamento de Clínica de Pequenos Animais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), 97119-900 - Santa Maria, RS.

3Médico Veterinário, PhD., Professor Titular do Departamento de Patologia, UFSM.

Recebido para publicação em 09.08.94. Aprovado em 11.10.94.

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  • 1
    Médico Veterinário, MSc., Professor Assistente do Departamento de Cirurgia Veterinária e Reprodução Animal, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia - UNESP, 18618-000 Botucatu, SP. Autor para correspondência.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Out 2009
    • Data do Fascículo
      1995

    Histórico

    • Aceito
      11 Out 1994
    • Recebido
      09 Ago 1994
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