Resumos
Um canino macho, sem raça definida, com três anos, pesando 36kg, foi atendido no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Minas Gerais, apresentando tosse noturna, intolerância ao exercício, cansaço freqüente, emagrecimento e episódios de síncope. O exame clínico revelou mucosas discretamente cianóticas, tempo de perfusão capilar aumentado, presença de sopro sistólico no ápice cardíaco esquerdo e sinais de insuficiência cardíaca congestiva. Foram realizados exames radiográficos, eletrocardiográficos e ecocardiográficos, sendo diagnosticada cardiomiopatia dilatada canina.
cardiomiopatia dilatada; coração; cão
A three year-old male mixed breed dog, weighing 36kg was presented to Universidade Federal de Minas Gerais Veterinary Hospital, Brazil with history of nocturnal coughing, exercise intolerance, weakness, weight loss and syncopal episodes. Physical examination revealed cyanotic mucous membranes, prolonged capillary refill time, systolic regurgitant murmur at left apex and signs of congestive heart failure. Diagnostic techniques for heart disease were performed such as radiography, eletrocardiography and ecocardiography. These tests showed canine dilated cardiomyopathy.
dilated cardiomyopathy; heart; dog
CLÍNICA E CIRURGIA/ CLINIC AND SURGERY
Cardiomiopatia dilatada em cão - Relato de caso
Canine dilated cardiomyopathy - Case report
Ruthnéa Aparecida Lázaro Muzzi1 Leonardo Augusto Lopes Muzzi2 José Luiz Barros Pena3 Rodrigo Bernardes Nogueira4
RESUMO
Um canino macho, sem raça definida, com três anos, pesando 36kg, foi atendido no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Minas Gerais, apresentando tosse noturna, intolerância ao exercício, cansaço freqüente, emagrecimento e episódios de síncope. O exame clínico revelou mucosas discretamente cianóticas, tempo de perfusão capilar aumentado, presença de sopro sistólico no ápice cardíaco esquerdo e sinais de insuficiência cardíaca congestiva. Foram realizados exames radiográficos, eletrocardiográficos e ecocardiográficos, sendo diagnosticada cardiomiopatia dilatada canina.
Palavras-chave: cardiomiopatia dilatada, coração, cão.
SUMMARY
A three year-old male mixed breed dog, weighing 36kg was presented to Universidade Federal de Minas Gerais Veterinary Hospital, Brazil with history of nocturnal coughing, exercise intolerance, weakness, weight loss and syncopal episodes. Physical examination revealed cyanotic mucous membranes, prolonged capillary refill time, systolic regurgitant murmur at left apex and signs of congestive heart failure. Diagnostic techniques for heart disease were performed such as radiography, eletrocardiography and ecocardiography. These tests showed canine dilated cardiomyopathy.
Key words: dilated cardiomyopathy, heart, dog.
INTRODUÇÃO
A Cardiomiopatia dilatada (CMD) é uma doença crônica, progressiva e insidiosa, ocorrendo em cães de grande porte ou gigantes, e preferencialmente nos machos (VAN VLEET et al., 1981; ROBINSON & MAXIE, 1993; SISSON & THOMAS, 1995). A idade de maior incidência da doença é, em média, quatro a seis anos, sendo descritos casos em animais de seis meses até 14,5 anos (FOX, 1992). As raças mais acometidas são Doberman, Irish Wolfhound, Dog Alemão, Boxer, São Bernardo, Afghan Hound e Old English Sheepdog (THOMAS, 1987b; SISSON & THOMAS, 1995).
A importância da CMD é enfatizada pela sua gravidade, que além dos efeitos deletérios ao organismo causados pela insuficiência cardíaca congestiva, conduz à elevada taxa de mortalidade devido às arritmias (SISSON & THOMAS, 1995). Segundo BONAGURA & WARE (1986), a arritmia mais freqüente é a fibrilação atrial que leva à taquicardia, degeneração miocárdica e morte. Outro fator relevante é a existência de cães assintomáticos, que não apresentam qualquer sinal de disfunção miocárdica, e morrem repentinamente (SISSON & THOMAS, 1995).
Relata-se a ocorrência da cardiomiopatia dilatada idiopática em um cão, demonstrando a importância da metodologia de exploração clínica, indispensável para um diagnóstico preciso, uma vez que, se diagnosticada precocemente essa alteração, é possível instituir medidas profiláticas, evitando sua progressão e aumentando a sobrevida do animal.
RELATO DO CASO
Um canino macho, sem raça definida, com três anos, pesando 36kg, foi atendido no Hospital Veterinário da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais, sendo relatado à anamnese que há cerca de 30 dias apresentava tosse noturna, intolerância ao exercício, cansaço freqüente, emagrecimento e episódios de síncope.
Após realização do exame clínico geral e específico, o animal foi internado, sendo tratado com furosemidaa (4,0mg/kg q8h) e deslanósidob (0,02mg/kg q12h), ambos por via intravenosa. Após a estabilização do quadro clínico, foi realizado exame radiográfico do tórax, nas posições látero-lateral esquerda e dorso-ventral, e exame eletrocardiográficoc, nas derivações I, II, III, aVR, aVL, aVF, seguindo-se a técnica citada por TILLEY (1992). O animal recebeu alta três dias após, sendo prescrita terapia oral à base de digoxinad (0,2mg/m2 q12h,), enalaprile (0,25 mg/kg q24h), furosemidaa1 (2,0mg/kg q12h), e dieta hipossódica. Foram realizados exames eletrocardiográficos mensais, por um período de seis meses, para avaliação da evolução da doença e monitorização da terapia instituída. Findo esse período, o animal foi novamente internado, sendo submetido à eletrocardiografia e acrescentado ao seu tratamento diltiazemf (0,5mg/kg q8h). Foi realizado exame ecocardiográficog, modos bidimensional e M, segundo recomendações de THOMAS et al. (1993).
O animal teve alta, retornando trimestralmente para reavaliação, sendo que após sete meses de acompanhamento, devido a transtornos geniturinários, foi indicada a eutanásia. O cão foi enviado à necropsia para exames anatomopatológicos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Devido à idade, porte, sexo e sintomatologia clínica presentes nesse animal, foi sugerido um diagnóstico provisório de cardiomiopatia dilatada canina, conforme relataram VAN VLEET et al. (1981), ROBINSON & MAXIE (1993) e SISSON & THOMAS (1995).
Ao exame clínico, foram observados tanto sintomas de insuficiência cardíaca congestiva esquerda (ICCE), como edema pulmonar e dispnéia acentuada, quanto àqueles relacionados à insuficiência cardíaca congestiva direita (ICCD), incluindo letargia, presença de pulso jugular positivo e quadro grave de ascite. Foram evidenciados, ainda, mucosas oral, conjuntival e peniana discretamente cianóticas, tempo de perfusão capilar superior a três segundos e episódios de síncope. DILL-MACKY et al. (1989), FOX (1992), ROBINSON & MAXIE (1993), KOCH et al. (1995) e SISSON & THOMAS (1995) descreveram que esses sintomas clínicos são similares em todas as raças, mas que a freqüência dos mesmos pode diferir, pois sintomas de ICCD são predominantes em cães de grande porte, enquanto que sintomas de ICCE acometem mais freqüentemente os da raça Doberman e Boxer.
A presença de sopro sistólico e ritmo de galope, mais evidentes na região apical esquerda, detectados à auscultação cardíaca, são atribuídos por THOMAS (1987a), BÖKENHANS (1992) e CALVERT (1995), à regurgitação mitral devido à dilatação do ventrículo esquerdo e, conseqüentemente, do anel mitral. Sons broncovesiculares aumentados e crepitações inspiratórias podem estar presentes na auscultação segundo FOX (1992) e THOMAS (1987a), devido ao edema pulmonar, sendo esta alteração observada no animal estudado.
Os exames radiográficos do tórax evidenciaram uma cardiomegalia moderada, com sinais de insuficiência biventricular, incluindo hepatomegalia e aumento do diâmetro da veia cava caudal, sem sinais de edema pulmonar acentuado, uma vez que as radiografias foram realizadas após um período de internação e estabilização do quadro (Figura 1). Essas observações estão de acordo com as descritas por DILL-MACKY et al. (1989) e BÖKENHANS (1992), e segundo THOMAS (1987b), DILL-MACKY et al. (1989), BÖKENHANS (1992), FOX (1992) e SISSON & THOMAS (1995) nas raças de grande porte ou gigantes, há evidências de aumentos atrial e ventricular direitos ou biventriculares, incluindo aumento do diâmetro da veia cava caudal, hepatomegalia e ascite, como evidenciado neste relato.
O primeiro exame eletrocardiográfico revelou aumentos atrial e ventricular esquerdos, que são caraterísticos no quadro inicial da CMD, como citado por BÖKENHANS (1992), FOX (1992) e SISSON & THOMAS (1995). Os eletrocardiogramas mensais subseqüentes mantiveram as mesmas caraterísticas do primeiro, até que seis meses após o início do tratamento, o eletrocardiograma revelou a presença de fibrilação atrial, com freqüência cardíaca de aproximadamente 200 batimentos por minuto (Figura 2). O animal foi devidamente medicado e os exames eletrocardiográficos trimestrais realizados após essa data, indicavam a presença dessa arritmia, mas com melhora progressiva em relação à frequência cardíaca, que se manteve entre 70-80 batimentos por minuto. Esses achados foram descritos por BONAGURA & WARE (1986), BÖKENHANS (1992), FOX (1992) e SISSON & THOMAS (1995), que relataram a fibrilação atrial como uma arritmia bastante freqüente, indicativa de prognóstico desfavorável e responsável por uma elevada taxa de mortalidade, embora alguns animais, recebendo terapia adequada, evoluam para uma melhora do quadro geral.
O exame ecocardiográfico confirmou o diagnóstico de CMD. No modo bidimensional, foram evidenciadas câmaras esquerdas dilatadas, com parede póstero-lateral do ventrículo esquerdo fina e hipocinética. No modo M, foi confirmada a presença da fibrilação atrial, visualizada através da ausência de ondas A na ecocardiografia da valva mitral, e também um aumento caraterístico da separação da onda E ao septo interventricular, que denota hipocinesia ventricular e sinais de débito cardíaco diminuído. Todos esses achados são caraterísticos dessa alteração miocárdica, como enfatizaram DILL-MACKY et al. (1989), BÖKENHANS (1992), CALVERT (1995), KIENLE & THOMAS (1995) e SISSON & THOMAS (1995). Segundo os mesmos autores, o exame ecocardiográfico é fundamental para o diagnóstico da CMD idiopática, propiciando uma avaliação rápida, segura e não-invasiva.
À necropsia observou-se aumento de volume do coração (cerca de 10,0 x 11,0 centímetros de diâmetro), com formato globoso e consistência flácida (figura 3). As câmaras cardíacas estavam dilatadas, com paredes cardíacas finas (especialmente no ventrículo esquerdo), anéis atrioventriculares dilatados e atrofia dos músculos papilares (figura 4). Não foram observados outros achados relacionados à insuficiência cardíaca congestiva, pois esse cão recebia terapia cardiovascular intensiva. Para VAN VLEET et al. (1981), THOMAS (1987b), BÖKENHANS (1992) e ROBINSON & MAXIE (1993) as alterações post-mortem, tais como as observadas no presente animal, são conclusivas para o diagnóstico de CMD.
FONTES DE AQUISIÇÃO
2Medico Veterinário, MSc., Professor Assistente, Departamento de Medicina Veterinária, UFLA.
3Médico Cardiologista, MSc., Chefe do setor de Ecocardiografia do Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG.
4Medico Veterinário, Professor Auxiliar, Departamento de Medicina Veterinária, UFLA.
Recebido para publicação em 10.12.98. Aprovado em 28.04.99
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Dez 2006 -
Data do Fascículo
Abr 2000
Histórico
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Recebido
10 Dez 1998 -
Aceito
28 Abr 1999