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ECTIMA CONTAGIOSO (DERMATITE PUSTULAR) DOS OVINOS

CONTAGIOUS ECTHYMA (PUSTULAR DERMATITIS) OF SHEEP

Resumos

É descrito um surto de ectima contagioso em ovinos no Rio Grande do Sul nos meses de junho e julho. Setenta (78%) de um total de 90 cordeiros de 10 a 45 dias de idade foram afetados. Não houve mortes. Também 3 ovelhas adultas desenvolveram lesões discretas na pele ao redor da boca. Os cordeiros apresentavam proliferações crostosas firmes, nodulares ou em forma de placas na pele da boca e junção mucocutânea da cavidade oral. Lesões proliferativas não ulceradas em forma de placa eram observadas no palato duro e almofada dental. Lesões proliferativas extensas, vegetantes, ocorriam na gengiva ao longo dos molares superiores e inferiores. Um cordeiro fêmea de 45 dias de idade foi sacrificado e necropsiado. As principais lesões microscópicas consistiam de epitélio hiperplástico pseudoepiteliomatoso com hiper e paraqueratose, cobrindo a derme ou a lâmina própia que se encontrava acentuadamente infiltrada por macrófagos, neutrófilos e linfócitos. Inclusões acidofílicas intracitoplasmáticas eram vistas nas células epiteliais da pele e da mucosa oral. Pústulas foram observadas na epiderme e mucosa oral. Vasculite associada a trombose era vista nos vasos da derme e lâmina própia. Numerosas partículas víricas com morfologia compatível com parapoxvírus foram encontradas em associação com as lesões epiteliais, ao exame no microscópio eletrônico. A epidemiologia, patogenia, meios de diagnóstico e profilaxia do ectima contagioso são discutidos.

ectima; doenças a vírus; poxviridae; doenças de ovinos


An outbreak of contagious ecthyma of sheep occuring in Rio Grande do Sul, Brazil in June/July is described. Seventy (78%) out of 90 lambs 10 to 45-day-old were affected with no mortalities. Additionally 3 adult sheep developed mild lesions in the skin around the mouth. The lambs had nodular or plaque-like, firm, crustous proliferations in the skin of the mouth and mucocutaneous junctions of the oral cavity. Proliferative non ulcerated plaque-like lesions were observed on the hard palate and dental pad. Extensive, red, verrucous proliferations were seen in the gums of the upper and inferior molar teeth. One 45-day-old female lamb was killed and necropsied, Microscopically the main lesions consisted of hyperplastic, hyperkeratotic, and parakeratotic, ocasionally ulcerated, pseudoepitheliomatous ephitelia covering the dermis or lamina propia which were heavily infiltrated by macrophages, neutrophils and lymphocytes. Intracytoplasmic acidophilic inclusion bodies were seen in the epithelial cells of the skin and oral mucosa. Pustules were observed in the epidermis and oral mucosa. Vasculitis and associated thrombosis were observed in vessels of the dermis or lamina propria. Up on electron microscopy examination numerous viral particles with morphology compatible with parapoxvirus were found associated with the epithelial lesions. The epidemiology, pathogenesis, diagnosis, and prophylaxis of contagious ecthyma are discussed.

ecthyma; viral diseases; poxviridae; sheep diseases


ECTIMA CONTAGIOSO (DERMATITE PUSTULAR) DOS OVINOS

CONTAGIOUS ECTHYMA (PUSTULAR DERMATITIS) OF SHEEP

Monica Weismann Seabra Salles1 1 Médico Veterinário, Aluno do Curso de Pós-Graduação em Medicina Veterinária, Área de Concentração em Patologia, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 97119-900, Santa Maria, RS Brasil. Ricardo Antonio Amaral de Lemos1 1 Médico Veterinário, Aluno do Curso de Pós-Graduação em Medicina Veterinária, Área de Concentração em Patologia, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 97119-900, Santa Maria, RS Brasil. Claudio Severo Lombardo de Barros2 1 Médico Veterinário, Aluno do Curso de Pós-Graduação em Medicina Veterinária, Área de Concentração em Patologia, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 97119-900, Santa Maria, RS Brasil. Rudi Weiblen3 1 Médico Veterinário, Aluno do Curso de Pós-Graduação em Medicina Veterinária, Área de Concentração em Patologia, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 97119-900, Santa Maria, RS Brasil.

RESUMO

É descrito um surto de ectima contagioso em ovinos no Rio Grande do Sul nos meses de junho e julho. Setenta (78%) de um total de 90 cordeiros de 10 a 45 dias de idade foram afetados. Não houve mortes. Também 3 ovelhas adultas desenvolveram lesões discretas na pele ao redor da boca. Os cordeiros apresentavam proliferações crostosas firmes, nodulares ou em forma de placas na pele da boca e junção mucocutânea da cavidade oral. Lesões proliferativas não ulceradas em forma de placa eram observadas no palato duro e almofada dental. Lesões proliferativas extensas, vegetantes, ocorriam na gengiva ao longo dos molares superiores e inferiores. Um cordeiro fêmea de 45 dias de idade foi sacrificado e necropsiado. As principais lesões microscópicas consistiam de epitélio hiperplástico pseudoepiteliomatoso com hiper e paraqueratose, cobrindo a derme ou a lâmina própia que se encontrava acentuadamente infiltrada por macrófagos, neutrófilos e linfócitos. Inclusões acidofílicas intracitoplasmáticas eram vistas nas células epiteliais da pele e da mucosa oral. Pústulas foram observadas na epiderme e mucosa oral. Vasculite associada a trombose era vista nos vasos da derme e lâmina própia. Numerosas partículas víricas com morfologia compatível com parapoxvírus foram encontradas em associação com as lesões epiteliais, ao exame no microscópio eletrônico. A epidemiologia, patogenia, meios de diagnóstico e profilaxia do ectima contagioso são discutidos.

Palavras-chave: ectima, doenças a vírus, poxviridae, doenças de ovinos.

SUMMARY

An outbreak of contagious ecthyma of sheep occuring in Rio Grande do Sul, Brazil in June/July is described. Seventy (78%) out of 90 lambs 10 to 45-day-old were affected with no mortalities. Additionally 3 adult sheep developed mild lesions in the skin around the mouth. The lambs had nodular or plaque-like, firm, crustous proliferations in the skin of the mouth and mucocutaneous junctions of the oral cavity. Proliferative non ulcerated plaque-like lesions were observed on the hard palate and dental pad. Extensive, red, verrucous proliferations were seen in the gums of the upper and inferior molar teeth. One 45-day-old female lamb was killed and necropsied, Microscopically the main lesions consisted of hyperplastic, hyperkeratotic, and parakeratotic, ocasionally ulcerated, pseudoepitheliomatous ephitelia covering the dermis or lamina propia which were heavily infiltrated by macrophages, neutrophils and lymphocytes. Intracytoplasmic acidophilic inclusion bodies were seen in the epithelial cells of the skin and oral mucosa. Pustules were observed in the epidermis and oral mucosa. Vasculitis and associated thrombosis were observed in vessels of the dermis or lamina propria. Up on electron microscopy examination numerous viral particles with morphology compatible with parapoxvirus were found associated with the epithelial lesions. The epidemiology, pathogenesis, diagnosis, and prophylaxis of contagious ecthyma are discussed.

Key words: ecthyma, viral diseases, poxviridae, sheep diseases.

INTRODUÇÃO

O ectima é uma doença vírica altamente infecciosa de distribuição cosmopolita. Afeta principalmente ovinos e caprinos e caracteriza-se pelo desenvolvimento de lesões pustulares e crostosas no focinho e lábios (BLOOD & RADOSTITIS, 1989).

O agente etiológico do ectima pertence à família Poxviridae, gênero parapoxvírus (CHEVILLE, 1975; YAGER & SCOTT, 1985).

Além de ovinos e caprinos, a infecção tem sido esporadicamente descrita em bovinos e outros rumimantes. Pessoas que mantêm contato direto com animais infectados podem desenvolver as lesões (FALK, 1978; ROBINSON & BALASSU, 1981; BLOOD & RODOSTITIS, 1989). Há também descrição da doença em cães (WILKISON et al, 1970).

A morbidade é alta, podendo atingir 100%, mas a mortalidade, em casos não complicados, raramente excede 1%. As mortes geralmente resultam da invasão de lesões primárias por larvas de mosca (Cochlyomyia hominivorax, C. macellaria), Fusobacterium necrophorum e ocasionalmente, Dermatophilus congolensis (NEWSON & CROSS, 1931; BOUGHTON & HARDY, 1934; YAGER & SCOTT, 1985; BLOOD & RADOSTITS, 1989). Nessas situações o índice de mortalidade pode atingir 50% (YAGER & SCOTT, 1985).

Cordeiros de 3 a 6 meses constituem a faixa etária mais freqüentemente atingida, ocorrendo também em animais entre 10 a 12 dias (BLOOD & RADOSTITS, 1989 ). Animais adultos podem desenvolver as lesões ao primeiro contato com o vírus, porém, nesses, a ocorrência é baixa e a doença clínica mais branda (BOUGHTON & HARDY, 1934; LOFSTEDT, 1963; MORALES & VAN KRUININGEN, 1971).

Casos de ectima podem ocorrer durante todo o ano, embora a maior freqüência esteja relacionada com a época de parição (TORRES, 1939; ROBINSON & BALASSU, 1981).

O vírus pode persistir no meio ambiente, nas crostas por vários anos e infectar os animais através de feridas na boca e peie causadas por pastagens fibrosas, instrumentos usados na descola, colocação de brincos, ou por contato direto com animais infectados. Lesões no úbere de ovelha podem resultar da amamentação de cordeiros infectados (ROBINSON & BALASSU, 1981; AMES et al. 1984; YAGER & SCOTT, 1985; ALLWORTH et al, 1987; BLOOD & RADOSTITS, 1989). Alguns autores, no entanto, questionam a viabilidade das partículas virais no meio ambiente, sugerindo que a contaminação se dê pelo contato com animais portadores sãos ou com infecção crônica (ROBINSON & BALASSU 1981; McKEEVER & REID. 1986).

As lesões do ectima consistem de pústulas e crostas que, quando arrancadas, deixam superfície ulcerada com projeções papilomatosas. Ocorrem usualmente nas comissuras labiais, lábios, focinho e ao redor dos olhos. Em casos mais graves há o envolvimento da gengiva, palato, língua e, menos freqüentemente, virilha, axila, vulva, ânus, prepúcio e rodete coronário (GARDINER et al, 1967; ROBINSON & BALASSU, 1981; YAGER & SCOTT, 1985; BLOOD & RADOSTITS, 1989). Casos com lesões nas orelhas (ALLWORTH et al, 1987), e cauda (AMES et al, 1984) são observados ocasionalmente. O animal acometido sofre geralmente emaciação por dificuldade na apreensão de alimentos (MORALES & VAN KRUININGEM, 1971). Edema da cara, corrimento nasal mucupurulento e febre são ocasionalmente encontradas (DARBYSHIRE, 1961, GARDINER et al, 1967). O curso da doença não complicada é de aproximadamente 3 a 4 semanas.

Na necropsia podem ser encontradas úlceras no trato respiratório superior, esôfago, rúmen, omaso, abomaso e intestino delgado e, ainda, lesões necróticas no pulmão, coração é fígado (NEWSOM & CROSS, 1931; DARBYSHIRE, 1961; MORALES & VAN KRUININGEN, 1971; BLOOD & RADOSTITS, 1989). Essas lesões são consideradas secundárias, resultantes de infecções sobrepostas por microorganismos oportunistas como Fusobacterium necrophorum (NEWSOM & CROSS, 1931) e ficomicetos (MORALES & VAN KRUININGEM, 1971), lesões atribuídas à ação primária do vírus na mucosa do rúmen são também descritas em ovinos (MORALES & VAN KRUININGEN, 1971).

Microscopicamente há tumefação celular aguda e degeneração hidrópica dos queratinócitos da parte superior do estrato espinhoso associada à acentuada hiperplasia da epiderme com formações pseudoepiteliomatosas, acúmulos focais intradérmicos de neutrófilos (pústulas) e formação de crostas na superfície epidérmica. Inclusões eosinofílicas intracitoplasmáticas podem ser vistas nos queratinócitos. Na derme há edema, marcadas infiltrações monoclueares e neutrofílica e proliferação vascular (CHEVILLE, 1975; ROBINSON & BALASSU, 1981; YAGER & SCOTT, 1985).

Aproximadamente 3 dias após a penetração do vírus há avermelhamento no local, formação de pequenas pápulas, vesículas e pústulas que rompem liberando pequena quantidade de líquido que, ao dessecar, origina as crostas vistas ao 6° dia pós-infecção (PI) (ROBINSON & BALASSU, 1981). O aparecimento das inclusões ocorre 72 horas PI e coincide com o surgimento da degeneração hidrópica e picnose de queratinócitos. As inclusões persistem por 3 a 4 dias, associadas à degeneração hidrópica. As lesões proliferativas da epiderme iniciam 55 horas PI, por aumento de mitoses na camada germinativa. Em três dias o epitélio triplica a espessura normal. Não havendo complicações, a lesão regride completamente em cerca de 25 dias (YAGER & SCOTT, 1985).

No Rio Grande do Sul, a doença é bastante freqüente, mas, raramente documentada As perdas econômicas decorrentes da enfermidade não foram ainda conclusivamente avaliadas.

Embora a mortalidade ocasionada em ovinos pelo ectima seja usualmente baixa, as perdas econômicas significativas podem decorrer da redução no ganho de peso devido a dificuldade do cordeiro em se alimentar ou pela recusa da mãe em amamentá-lo devido à lesão no úbere (BOUGHTON & HARDY, 1934; PYE, 1990). Adicionalmente, em cortas regiões, complicações das lesões por outros agentes podem ocasionar índices de até 50% de mortalidade (BOUGHTON & HARDY, 1934; YAGER & SCOTT, 1985).

O objetivo deste trabalho é documentar um surto de ectima contagioso em ovinos na área de influência do Centro de Diagnóstico Veterinário na Universidade Federal de Santa Maria (CDV/UFSM), a fim de fornecer subsídios para o reconhecimento, controle e profilaxia da enfermidade.

MATERIAL E MÉTODOS

A enfermidade ocorreu numa criação de ovinos lle de France do município de Cruz Alta, RS. Os dados epidemiológicos foram obtidos do veterinário local. Um ovino fêmea de 45 dias de idade foi enviado ao CDV/UFSM, examinado clinicamente, sacrificado com sulfato de magnésio e necropsiado. Fragmentos de lesões labiais e orais, linfonodos sublingual e mesentérico, baço, timo, pulmão, rim, adrenal e olho foram fixados em formol a 10% e processados rotineiramente para exame histológico. Fragmentos das lesões dos lábios e da mucosa oral foram fixados em glutaraldeído a 2,5% em solução tampão de cacodilato de sódio a 4°C por duas horas, pós-fixados em tetroxído de ósmio a 1% em tampão cacodilato por uma hora a 4°C, desidratados em etanol e incluídos em resina epóxil. Cortes semifinos (1 m) foram corados pelo azul de metileno e cortes ultrafinos foram contrastados com acetato de uranila e citrato de chumbo. Colorações negativas de raspados de crostas foram realizados conforme técnica anteriormente descrita (TABONE & ANDUJAR, 1980) e examinados ao microscópio eletrônico.

RESULTADOS

O surto ocorreu de junho a julho de 1990. De 90 cordeiros na faixa etária de 10 a 45 dias. 70 (78%) foram afofados. Três ovelhas adultas apresentaram lesões discretas ao redor da boca. Não houve mortes.

O animal enviado para necropsia apresentava lesões proliferativas recobertas por crostas espessas e enegrecidas na pele, junção mucocutanêa e parte da mucosa do lábio inferior. Proliferações firmes nodulares ou em forma de placas, com superfície lisa e não ulcerada foram vista no palato duro e almofada dental. O nódulo da almofada dental apresentava aproximadamente 0,5cm de diâmetro e superfície hiperêmica; o do palato, forma de placa e cerca de 2,0cm na maior extensão. As gengivas apresentavam proliferações verrucosas irregulares ao longo dos molares superiores e inferiores. O veterinário que atendeu o surto no local, informou que os outros cordeiros afetados apresentaram lesões semelhantes. A córnea do olho direito era opaca. A temperatura retal era de 40,5°C.

Na necropsia os lobos diafragmáticos do pulmão estavam moderadamente firmes e não totalmente colapsados.

Os diversos fragmentos de lesões examinados microscopicamente apresentavam lesões semelhantes: acentuada hiperplasia pseudoepiteliomatosa da epiderme ou epitélio da mucosa oral com hiperqueratose e paraquetose acentuadas, vacuolização do citoplasma e formação de microvesículas nas camadas mais superficiais do estrato espinhoso (degeneração balonosa) e acúmulos focais de neutrófilos. Nos fragmentos de pele havia áreas de ulceração e intenso infiltrado neutrofílico no derma. Queratinócitos das camadas mais superiores ocasionalmente tinham citoplasma distendido por material eosinófilo e homogêneo. Em algumas células epiteliais da epiderme ou mucosa oral foram observadas corpúsculos eosinófilos de tamanho e forma variáveis. Lâmina própria e derma estavam acentuadamente infiltradas por macrófagos, neutrófilos, linfócitos associados a intensas dilatação e proliferações vasculares e tromboses ocasionais associados a vasculite. Microorganismos com características morfológicas de D. congolensis foram vistos ocasionalmente associadas às lesões da pele e mucosa oral. O linfonodo sublingual apresentava hiperplasia reacional, o pulmão estava congesto e, o abomaso, com focos neutrofílicos na mucosa. Na córnea, havia vascularização e infiltrado linfocitário discretos. Nos demais órgãos não se observaram alterações significativas. Na microscopia eletrônica, tanto nos cortes quanto nas preparações de coloração negativa feitas a partir das crostas observaram-se numerosas partículas com morfologia de parapoxvírus (KLUGE et al, 1972; CHEVILLE, 1975).

DISCUSSÃO

O diagnóstico de ectima contagioso baseou-se na epidemiologia, nas lesões macro e microscópicas e na observação ao microscópio eletrônico, de partículas virais com características morfológicas de parapoxvírus (KLUGE et al, 1972; ROBINSON & BALASSU, 1981).

Os corpúsculos eosinofílicos vistos no interior do citoplasma de queratinócitos, provavelmente tratam-se de inclusões do vírus. Tais achados são descritos associados às lesões de ectima (KLUGE et al 1972; CHEVILLE, 1975; SAMUEL et al, 1975; DIETERICH et al, 1981; ROBINSON & BALASSU, 1981; AMES et al, 1984; YAGER & SCOTT, 1985).

A infiltração neutrofílica na mucosa do abomaso e a queratite não foram interpretados como relacionados à doença, já que não foram encontradas lesões histológicas semelhantes às da cavidade oral e pele em associação com estes focos inflamatórios. No caso do abomaso, tais lesões podem ser causadas por pequenos traumatismos resultantes de migração parasitária ou penetração de fibras vegetais.



A morbidade foi de 78% e a mortalidade zero. Dados epidemiológicos semelhantes são comumente descritos para essa doença (ROBINSON & BALASSU, 1981; YAGER & SCOTT, 1985; BLOOD & RADOSTITS, 1989).

No presente estudo, a fonte de infecção não foi determinada. Como foi o primeiro surto na propriedade, a vacinação não era praticada, nem foi introduzido qualquer animal de fora no rebanho. Os animais tinham o hábito de mastigar caraguatá (Tillandsia usneoides), o que poderia ter facilitado a disseminação da doença, explicando a alta morbidade. Situação semelhante foi descrita num surto de ectima em ovinos na Austrália (GARDINER et al, 1967), onde uma morbidade de 100% deveu-se aos animais terem acesso a uma fonte comum de planta com caule espinhoso (Templetonia retusa). Ao mastigarem a planta os animais afetados feriam a boca disseminando o vírus a animais não infectados. A presença, nos animais deste estudo, de lesões em locais da cavidade oral como gengiva, palato duro e almofada dental, não é freqüente (GARDINER et al, 1967; ROBINSON & BALASSU, 1981; YAGER & SCOTT, 1985; BLOOD & RADOSTITS, 1989), e reforça a possibilidade desse modo de disseminação. Localizações semelhantes são mencionadas no surto da Austrália (GARDINER et al, 1967).

O diagnóstico diferencial de ectima contagioso deve incluir enfermidade com lesões vesiculares, ulcerativas e proliferativas como dermatose ulcerativa, dermatofilose, dermatite proliferativa, varíola ovina, eczema facial, língua azul, papiloma e carcinoma epidermóide da pele.

Não há tratamento específico para o ectima. Soluções de sulfato de cobre a 5%, e de iodo a 7%, banho de creosoto e vaselina com fenol a 3% são indicadas quando haver poucos animais doentes (ROBINSON & BALASSU, 1981). O uso de óleos e adstringentes não é recomendado (BLOOD & RADOSTITS, 1989), pois retarda a cicatrização. Repelentes são indicados para evitar miíases. Havendo suspeita de infecção bacteriana secundária o uso de antibióticos locais ou sistêmicos é recomendado (ROBINSON & BALASSU, 1981).

A profilaxia é baseada na vacinação de cordeiros a partir de 3 até 8 semanas de idade (BOUGHTON & HARDY, 1934; LOFSTEDT, 1963; BLOOD & RADOSTITS, 1989), realizada após escarificação da face interna da coxa, axila ou face da cauda. A vacina de vírus vivo é obtida de lesões provocadas em ovinos pela inoculação do vírus e confere uma boa imunidade em aproximadamente 3 semanas (LOFSTEDT, 1963), por um período de 6 a 8 meses (ROBINSON & BALASSU, 1931). No campo a imunidade é mais duradoura, pois os animais são continuamente expostos ao vírus (ROBINSON & BALASSU, 1981). Não é recomendada a vacinação de rebanhos livres da doença (LOFSTEDT, 1963; MARSH, 1965).

É freqüente a ocorrência de ectima em animais vacinados. Isto é atribuído a erros da vacina ou presença de cepas víricas diferentes (PEDDIE, 1950; TRUEBLOOD et al, 1963; BUDDLE et al, 1984ª; BUDDLE et al, 1984b). Erros na aplicação da vacina incluem obstrução da agulha ao realizar escarificação o que dificulta a retirada de quantidade suficiente de vacina para as vacinações subseqüentes e, também escarificação insuficiente do local da aplicação da vacina (PEDDIE, 1950).

Existem controvérsias quanto à eficácia da imunidade passiva conferida pelo colostro (BOUGHTON & HARDY, 1934; ROBINSON & BALASSU, 1981; BLOOD & RADOSTITS, 1989) e quanto a existência e eficácia de anticorpos neutralizantes, sugerindo que a base da imunidade contra o ectima seja celular (TRUEBLOOD et al, 1963; ROBINSON & BALASSU, 1981; BUDDLE et al, 1984b).

No Uruguai, pratica-se a vacinação anual após o nascimento do último cordeiro do rebanho (RIETCORREA, 1990 - Informação verbal), medida aparentemente mais adequada do que a vacinação a partir de 3 semanas ja que há suspeita de não haver transferência da imunidade passiva peto colostro (BOUGHTON E HARDY, 1934; ROBINSON & BALASSU, 1981; BLOOD & RADOSTITS, 1989). A evolução do surto aqui descrito não seria evitada eficientemente pelo esquema de vacinação (dos 2 aos 8 meses) indicado na literatura (BOUGHTON & HARDY, 1934; LOFSTEDT, 1963; BLOOD & RADOSTITS, 1989), uma vez que cordeiros com 10 dias já apresentavam a doença. Estudos experimentais indicam que a vacinação em animais infectados é recomendável pois a cura é mais rápida (BOUGHTON & HARDY, 1934).

Medidas de controle incluem: evitar o ingresso em região enzoótica de animais não vacinados, examinar os animais por um período de, pelo menos, 5 dias antes de introduzi-los no rebanho, não levar animais enfermos aos bretes e vacinar anualmente os cordeiros em áreas enzoóticas (CAPANO & BALTAR, 1987). Preferencialmente as vacinações não devem ser realizadas concomitantemente com a descola, castração ou colocação de brincos, pois pode haver contaminação das feridas pela vacina. A ocorrência do ectima em ovinos tem sido descrita após a assinalação da orelha (ALWORTH et al, 1987) ou descola (AMES et al, 1984). Como no entanto, não é prático realizar esses serviços separadamente, é recomendável que a pessoa que execute as vacinações não seja a mesma que realize as outras operações.

INFORMAÇÃO VERBAL

a - Laboratório Regional de Diagnóstico, Faculdade de Veterinária, UFPel Caixa Posta, 354, 96010-900, Pelotas, RS.

2Médico Veterinário, PhD, Professor Titular do Departamento de Patologia da UFSM, Pesquisador do CNPq.

3Médico Veterinário, PhD, Professor Titular do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva, Microbiológica e Parasitologia da UFSM. Pesquisador do CNPq.

Recebido para publicação em 10.07.92. Aprovado para publicação em 26.08.92.

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    Médico Veterinário, Aluno do Curso de Pós-Graduação em Medicina Veterinária, Área de Concentração em Patologia, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). 97119-900, Santa Maria, RS Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Set 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 1992

    Histórico

    • Aceito
      26 Ago 1992
    • Recebido
      10 Jul 1992
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