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TORACOTOMIA EM BLOCO NO CÃO

EN BLOC THORACOTOMY IN DOG

Resumos

A técnica de toracotomia em bloco foi realizada em 12 cães com um regime anestésico constando de acetilpromazina e tiopental sódico. Após a intubação orotraqueal foi utilizado um minirespirador automático à pressão positiva intermitente. A parede torácica foi aberta com uma incisão em forma de "U invertido", ficando a base da letra "U" paralela a coluna vertebral, distando 4 a 5cm aproximadamente da mesma e mais duas perpendiculares, sendo a primeira mais cranial, no espaço compreendido entre a quarta e quinta costelas, estendendo-se de cima para baixo até a junção costo-condral; a segunda, mais caudal, no espaço intercostal entre a nona e décima costelas, estendendo-se até a inserção da porção muscular do diafragma. A diérese de pele e músculos foi seguida de secção das costelas 5, 6, 7, 8 e 9 que integraram o bloco, o qual foi rebatido ventralmente para exposição da cavidade torácica. A osteossíntese das referidas costelas foi com fio de aço inoxidável e a síntese dos tecidos moles foi efetuada de maneira rotineira, com categute e poliéster cirúrgico trançado. Foi restabelecida a pressão negativa do tórax. A toracotomia em bloco permitiu uma ampla exposição das vísceras do hemitórax abordado, dispensando o uso de afastadores costais, além de facilitar as manipulações cirúrgicas e a abordagem das vértebras da coluna vertebral torácica, com preservação das costelas.

cirurgia canina; toracotomia


The en bloc thoracotomy was used in twelve dogs and was given acetylpromazine and thiopental sodium. An endotracheal tube was inserted and the automatic minirespirator Narcomatic with intermittent positive pressure was used. Thoracic wall was openned with an first incision approximately 4 to 5cm lateral to the dorsal midline and two additional dorsoventral incisions were made at right angles to the original, joing it at each end to form and inverted U. The cranial incision over the 4th interspace, extended ventrally to a point of costochondral junction and the caudal dorsoventral incision was made over the 9th interspace and extended ventrally to the costal attachment of the diaphragm. After the soft tissue incision, the ribs 5, 6, 7, 8 and 9 were transected and the large block of thoracic wall was retracted ventrally and it provided exposure of the thoracic cavity. The ribs were sutured with stainless steel wire and the remainder of the thoracotomy closure was routine with catgut and polyester twisted fiber. It was re-established negative pressure. The en bloc thoracotomy provided excellent exposure of the thoracic viscera and was not necessary the use of the rib retractors, besides to make easy the surgical manipulation and the exposure of the vertebrae of thoracic vertebral column, with preservation of the ribs.

canine surgery; thoracotomy


TORACOTOMIA EM BLOCO NO CÃO

EN BLOC THORACOTOMY IN DOG

Amaury Regis de Moura1 1 Médico Veterinário, aluno(a) do Curso de Mestrado em Medicina Veterinária - Centro de Ciências Rurais - Universidade Federal de Santa Maria. 97.119 - Santa Maria, RS. Juan Thomás Wheeler1 1 Médico Veterinário, aluno(a) do Curso de Mestrado em Medicina Veterinária - Centro de Ciências Rurais - Universidade Federal de Santa Maria. 97.119 - Santa Maria, RS. Sérgio Amaro Guimarães Fialho1 1 Médico Veterinário, aluno(a) do Curso de Mestrado em Medicina Veterinária - Centro de Ciências Rurais - Universidade Federal de Santa Maria. 97.119 - Santa Maria, RS. Daniel Roulin Stainki1 Cláudio Corrêa Natalini2 1 Médico Veterinário, aluno(a) do Curso de Mestrado em Medicina Veterinária - Centro de Ciências Rurais - Universidade Federal de Santa Maria. 97.119 - Santa Maria, RS. Sonia Terezinha dos Anjos Lopes3 1 Médico Veterinário, aluno(a) do Curso de Mestrado em Medicina Veterinária - Centro de Ciências Rurais - Universidade Federal de Santa Maria. 97.119 - Santa Maria, RS.

RESUMO

A técnica de toracotomia em bloco foi realizada em 12 cães com um regime anestésico constando de acetilpromazina e tiopental sódico. Após a intubação orotraqueal foi utilizado um minirespirador automático à pressão positiva intermitente. A parede torácica foi aberta com uma incisão em forma de "U invertido", ficando a base da letra "U" paralela a coluna vertebral, distando 4 a 5cm aproximadamente da mesma e mais duas perpendiculares, sendo a primeira mais cranial, no espaço compreendido entre a quarta e quinta costelas, estendendo-se de cima para baixo até a junção costo-condral; a segunda, mais caudal, no espaço intercostal entre a nona e décima costelas, estendendo-se até a inserção da porção muscular do diafragma. A diérese de pele e músculos foi seguida de secção das costelas 5, 6, 7, 8 e 9 que integraram o bloco, o qual foi rebatido ventralmente para exposição da cavidade torácica. A osteossíntese das referidas costelas foi com fio de aço inoxidável e a síntese dos tecidos moles foi efetuada de maneira rotineira, com categute e poliéster cirúrgico trançado. Foi restabelecida a pressão negativa do tórax. A toracotomia em bloco permitiu uma ampla exposição das vísceras do hemitórax abordado, dispensando o uso de afastadores costais, além de facilitar as manipulações cirúrgicas e a abordagem das vértebras da coluna vertebral torácica, com preservação das costelas.

Palavras-chave: cirurgia canina, toracotomia.

SUMMARY

The en bloc thoracotomy was used in twelve dogs and was given acetylpromazine and thiopental sodium. An endotracheal tube was inserted and the automatic minirespirator Narcomatic with intermittent positive pressure was used. Thoracic wall was openned with an first incision approximately 4 to 5cm lateral to the dorsal midline and two additional dorsoventral incisions were made at right angles to the original, joing it at each end to form and inverted U. The cranial incision over the 4th interspace, extended ventrally to a point of costochondral junction and the caudal dorsoventral incision was made over the 9th interspace and extended ventrally to the costal attachment of the diaphragm. After the soft tissue incision, the ribs 5, 6, 7, 8 and 9 were transected and the large block of thoracic wall was retracted ventrally and it provided exposure of the thoracic cavity. The ribs were sutured with stainless steel wire and the remainder of the thoracotomy closure was routine with catgut and polyester twisted fiber. It was re-established negative pressure. The en bloc thoracotomy provided excellent exposure of the thoracic viscera and was not necessary the use of the rib retractors, besides to make easy the surgical manipulation and the exposure of the vertebrae of thoracic vertebral column, with preservation of the ribs.

Key Words: canine surgery, thoracotomy.

INTRODUÇÃO

A cirurgia torácica nos animais domésticos tomou um grande impulso nas últimas três décadas devido ao avanço verificado no campo da anestesia. Atualmente são feitos diagnósticos mais específicos de alterações de órgãos da cavidade torácica passíveis de tratamento cirúrgico.

ACCIOLY (1965) realizou toracotomias laterais direita e esquerda, mediana e transversal bilateral, com o objetivo de comparações destas técnicas de abordagens do tórax no cão. Enfatizou a utilidade de cada via de acesso em relação a exposição de elementos anatômicos. Abordagens cirúrgicas convencionais do tórax, ocasionalmente não apresentam exposição adequada necessárias às manipulações cirúrgicas. Informou que das várias técnicas de toracotomia por ele desenvolvidas, as menos sangrentas foram as toracotomias laterais. Salientou que deve ser efetuada a hemostasia dos vasos pela ligadura dos mesmos, observando-se uma rigorosa técnica cirúrgica.

ALEXANDER (1971) descreveu uma técnica de toracotomia com uma ampla abertura do tórax, por meio de uma incisão em forma de letra "U" deitada e secção de várias costelas. Forma-se no local da intervenção cirúrgica uma depressão permanente por ação da pressão atmosférica, devido a falta de sustentação óssea das costelas que foram retiradas.

As toracotomias foram classificadas por ARCHIBALD & HARVEY (1974) de acordo com as incisões utilizadas: lateral, transversal, ventral, anterior e transabdominal. O acesso lateral pode ser feito de três maneiras: por secção intercostal, por ressecção costal e por semi-ressecção da costela. Segundo os autores, no caso de infecção é indicada a administração de antibióticos, antes, durante e depois da cirurgia. Não é necessário colocar antibióticos dentro da cavidade torácica. As áreas ou estruturas contaminadas, tais como esôfago e brônquios, devem ser protegidas com panos de campos e compressas esterilizadas.

LUMB & BUTTERFIELD (1977) desenvolveram a toracotomia em bloco em suínos miniatura, para a colocação de marcapasso cardíaco, fazendo referência à mecânica respiratória, mas não especificando o parâmetro por eles avaliado. Segundo os autores, a técnica da toracotomia em bloco promoveu uma excelente exposição das vísceras com preservação das costelas e apesar desta técnica ser muito traumática para a parede torácica, nenhum dos animais apresentou sinais de desconforto da mecânica respiratória.

NELSON (1986) descreveu a técnica da toracotomia lateral. Foi indicado o quarto ou quinto espaço intercostal como via de acesso ao coração e área hilar dos pulmões e o oitavo, como via de acesso ao esôfago caudal e diafragma.

STOPIGLIA et al (1986) realizaram toracotomia com ressecção parcial da sexta, sétima e oitava costelas. O local ocupado pelas costelas foi substituído por uma placa de pericárdio de eqüino. Esses autores concluíram que o implante com pericárdio de eqüino conservado em glicerina foi satisfatório na cirurgia reconstrutiva da parede torácica do cão.

SCHULMAN & LIPPINCOTT (1987) realizaram a toracotomia de costela em "pivot" em 25 cães. A cirurgia consistiu de uma incisão sobre a sexta costela, estendendo-se da articulação costo-vertebral até um ponto abaixo da articulação costo-condral. O periósteo foi circunferencialmente refletido. Uma osteotomia foi realizada na articulação costo-condral e a costela foi movimentada dorsalmente sendo usada a articulação costo-vertebral como "dobradiça ou pivot".

RIVIERE (1988) afirmou que o uso de drogas antimicrobianas na clínica cirúrgica pode ser dividida em 2 classes: uso profilático e terapêutico. A primeira situação envolve a seleção de uma droga preventiva na ausência de uma infecção documentada. No segundo caso a infecção é detectada pós-operatoriamente, como uma seqüela de um procedimento cirúrgico e a droga precisa ser administrada para o tratamento do distúrbio específico. As indicações para a terapia antimicrobiana profilática, entre outras, podem justificar-se na presença de extensa lesão tissular em qualquer classe de técnica cirúrgica, visto que o microambiente resultante favorece a colonização bacteriana. O autor citou que o pico das concentrações tissulares devem ser alcançados no local da infecção, por ocasião da incisão. As drogas bactericidas de escolha são a penicilina, a ampicilina e suas congêneres e as cefalosporinas.

BEDFORD (1990) informou que a drenagem da cavidade torácica é usada para esvaziar a cavidade pleural de qualquer fluído ou ar. Serve para drenar o ar, exsudatos, transudatos, sangue, pus e linfa. Esse autor citou a pleurisia e o pneumotórax entre as possíveis complicações advindas de uma drenagem.

RAISER (1990) apresentou um protocolo para controle da infecção cirúrgica em pequenos animais. Nas feridas consideradas "limpas-contaminadas" ou "contaminadas" o esquema antibacteriano foi profilático e nas feridas consideradas "sujas" o esquema foi terapêutico. O esquema profilático consiste de uma aplicação intravenosa de ampicilina, na dose de 20mg/kg, 30 minutos antes da cirurgia, repetindo-se a dose duas horas após se o paciente ainda estiver no período trans-operatório.

O desenvolvimento da técnica de toracotomia em bloco no cão foi motivada pela possibilidade da fácil obtenção desta espécie, melhor controle experimental e pela inexistência de relatos desta técnica no cão. A presente pesquisa teve como objetivo o desenvolvimento da técnica da toracotomia em bloco no cão.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados 12 cães adultos procedentes do Biotério Central da Universidade Federal de Santa Maria, sem raça definida, com idade e peso variáveis, entre 5,7kg e 18,5kg, machos ou fêmeas, tendo sido descartadas as fêmeas em cio e em estado de gestação .

Antes do início do experimento os animais receberam vermífugo (mebendazolea na dose de 10mg/kg), por via oral. Durante o experimento os animais foram alimentados com ração comercial para cãesb.

Os animais foram divididos em dois grupos: grupo I e grupo II, contendo cada um seis animais, nos quais foram praticadas as toracotomias em bloco, sendo que nos animais do grupo I foram realizadas no hemitórax esquerdo e nos do grupo II, no hemitórax direito.

Após o exame clínico dos animais, os mesmos tiveram privação de alimentos sólidos por 24 horas. Neste período foram colhidas amostras de sangue venoso para verificação do hemograma, uréia, creatina, alanino-amino-transferase e fosfatase alcalina, sendo também coletada urina para exame. Estas análises foram realizadas no Laboratório de Análises Clínicas do Hospital de Clínicas Veterinárias da Universidade Federal de Santa Maria.

Cada cão recebeu, 30 minutos antes da intervenção cirúrgica, ampicilinac na dose de 20mg/kg, pela via intravenosa, como profilaxia cirúrgica de acordo com RIVIERE (1988) e RAISER (1990) e ao mesmo tempo foi depilada a sua parede costal.

Na medicação pré-anestésica foi empregada acetilpromazina a 0,2%d na dose de 0,1mg/kg, pela via intravenosa.

Após 10 minutos foi feita a indução da anestesia com tiopental sódico a 2,5%e, na dose de 25mg/kg, pela via intravenosa e ao atingir o estágio III da anestesia cirúrgica procedeu-se a intubação orotraquealf do animal, que foi adaptado ao minirespiradorg automático por pressão positiva intermitente.

A manutenção da anestesia foi realizada com o mesmo fármaco, na dose de 12,5mg/kg, pela via intravenosa.

Depois da antissepsia do campo operatório com álcool-iodo-álcool, já com o animal contido em decúbito lateral esquerdo ou direito, delimitação da área operatória com panos de campo estéreis e fenestrados, foi iniciado o ato cirúrgico que constou dos seguintes tempos:

Primeiro Tempo: Diérese da pele e divulsão da tela subcutânea que teve a forma da letra "U" invertida, localizada entre a quarta e quinta costelas e nona e décima costelas. A base da letra "U" ficou paralela à coluna vertebral, distando 4 a 5cm da mesma, aproximadamente. A hemorragia da pele e tela subcutânea foi contida por pinçamento e compressão digital.

Segundo Tempo: A diérese foi aprofundada pela incisão do músculo grande dorsal (M. latissimus dorsi) na sua base paralela à coluna vertebral e dos músculos serratos dorsais e ventrais (Mm. serratus dorsalis et ventralis) e oblíquo abdominal externo (M. obliquus externus abdominis) nas incisões praticadas entre quarta e quinta costelas e nova e décima costelas, respectivamente. Os vasos sanguíneos incididos foram pinçados e ligados com categute cromado n° 3-0h.

Terceiro Tempo: As costelas de números 5, 6, 7, 8 e 9 foram evidenciadas no terço superior ou dorsal, sendo utilizado um elevador de periósteo. Após foram perfuradas com um fio de Kirschner adaptado ao perfurador de Jacobs. Os furos foram feitos no terço superior das costelas a uma distância de 2cm um do outro, com a finalidade, posteriormente, de osteossíntese. Logo após as costelas foram seccionadas com serra elétrica oscilatóriai no espaço compreendido entre os dois furos.

Quarto Tempo: Neste momento foram incididos os músculos intercostais externos e internos (Mm. intercostalis externi et interni), periósteo periosteum) e pleura parietal (pleura parietalis) na abertura paralela à coluna vertebral. Logo após, os espaços intercostais quarto e nono foram seccionados através dos músculos intercostais e pleura parietal. Neste momento, a parede costal foi rebatida em bloco, no sentido ventral, sem necessidade de outras secções ósseas ou musculares. A incisão no quarto espaço intercostal foi prolongada até a articulação costo-condral (Articulaciones costocondrales) e no nono foi até a inserção muscular do diafragma (Arcus lumbocostalis).

Quinto Tempo: Após a exploração da cavidade torácica foi procedido o fechamento desta parede. As cinco costelas seccionadas foram reunidas com fio de aço inoxidávelj, de calibre mais adequado ao animal, n° 0 ou 1, aproveitando-se os furos realizados anteriormente. Neste momento, no décimo espaço intercostal foi feita a perfuração da cavidade torácica para passagem de um tubo de drenagem através de um túnel subcutâneo emergindo na altura do décimo-segundo espaço intercostal. Este tubo foi adaptado a um frasco com selo de água para drenagem e restabelecimento da pressão negativa do tórax. Neste momento, as costelas quarta e quinta, bem como a nona e décima, foram unidas com um ponto isolado simples na altura do terço médio, utilizando-se fio de náilon n° 0l. A síntese muscular foi efetuada com um padrão de pontos contínuos, utilizando-se categute cromado n° 2-0m. A pele foi suturada com pontos isolados simples, com fio de poliéster trançado cirúrgico n° 4-0n. Finalmente o tubo de drenagem foi retirado após o fechamento completo da parede torácica, comprovando-s e previamente o restabelecimento da pressão negativa intratorácica, através da ausência de borbulhamento no interior do frasco com selo de água utilizado para drenagem. Em algumas oportunidades este tubo foi conectado ao equipo de aspiração e drenagem do aparelho de anestesia.

O animal manteve-se intubado recebendo oxigênio até a volta dos reflexos orotraqueais e respiração espontânea, ocasião em que foi feita a retirada da sonda endotraqueal.

Findo o ato cirúrgico, os animais foram alojados em jaulas metálicas individuais medindo 70x90x90cm, onde tiveram alternância de decúbito lateral esquerdo ou direito, a cada 20 minutos até a recuperação da anestesia.

Os pontos da pele foram retirados no final do período de avaliação da presente pesquisa, isto é, no sétimo dia pós-operatório.

Durante todo o procedimento anestésico e cirúrgico os animais receberam por via venosa uma solução hidroeletrolítica balanceadao (10ml/kg/hora).

Os cuidados pós-operatórios constaram de curativos locais na ferida cirúrgica com o antisséptico timerosalp pela manhã, além de ausculatação cárdio-respiratória e tomada da temperatura corporal . Logo após foram submetidos a uma caminhada para estimular o funcionamento do aparelho digestivo e urinário.

RESULTADOS

A toracotomia em bloco permitiu uma ampla exposição das vísceras torácicas e ofereceu um bom acesso aos corpos vertebrais das vértebras torácicas. Na abordagem pelo hemitórax direito foi possibilitada a exploração visual e palpação geral dos lobos pulmonares, pleura, esôfago, veia cava caudal, diafragma e coluna vertebral toracolombar da quarta vértebra torácica até as duas primeiras vértebras lombares. Na abordagem pelo hemitórax esquerdo foram vistos e palpados plenamente os lobos pulmonares, pleura, esôfago, artéria aorta torácica, diafragma e coluna vertebral toracolombar da quarta vértebra torácica até as duas primeiras lombares .

Quando foi efetuada a perfuração das costelas, após a secção das mesmas, este procedimento tornou-se mais difícil. Foi superada a dificuldade em relação a perfuração das costelas, quando realizadas antes de sua secção.

No momento da secção das costelas foi observado sangramento das artérias de menor a maior importância segundo o porte do animal.

Na reconstituição da parede torácica, a osteossíntese das costelas seccionadas com fio de aço n° 0 e a síntese dos planos musculares com fio de categute cromado n° 3-0, com padrão de sutura tipo contínuo, proporcionaram fechamento da parede costal e não apresentaram qualquer sintomatologia clínica de rejeição ou qualquer complicação pós-operatória.

Não foi observado nenhum óbito nos animais da presente pesquisa, inclusive além do período de observação clínica.

DISCUSSÃO

Foi observado por ALEXANDER (1971), ARCHIBALD & HARVEY (1974) e NELSON (1986) que a indicação das toracotomias é subordinada as disposições anatômicas que se pretende atingir, num critério de melhor exposição e acesso. A técnica da toracotomia lateral é a via de acesso à cavidade torácica na maioria dos casos clínicos, sendo relatado por estes diferentes autores inclusive abordagens pelo hemitórax direito ou esquerdo, com escolha do espaço intercostal segundo o diagnóstico obtido por meios clínicos e complementares.

Quanto à comparação da toracotomia em bloco com as abordagens cirúrgicas convencionais, a vantagem da técnica desenvolvida neste trabalho ficou evidenciada quando ocasionalmente os demais tipos de abordagem não apresentam exposição adequada. Acrescenta-se ainda indicação na ausência de radiografias e com finalidade exploratória.

Na técnica desenvolvida por ALEXANDER (1971) no cão, a incisão foi em forma de letra "U" deitada, com a base da letra "U" seguindo a trajetória da sexta costela, com um comprimento de 12 a 15cm conforme o tamanho do animal. As incisões superior e inferior partem da extremidade da primeira incisão e seguem em direção cranial. Como há ressecção das costelas, forma-se na zona da intervenção cirúrgica uma depressão permanente por ação da pressão atmosférica, devido a falta de sustentação óssea das costelas que foram retiradas.

A técnica descrita por LUMB & BUTTERFIELD (1977) foi divergente comparativamente em dois aspectos com a relatada por ALEXANDER (1971). A direção da incisão embora tenha a forma da letra "U" varia sua posição, adotando a forma de uma letra invertida, sua base é paralela a coluna vertebral dorsal distante 4cm aproximadamente da mesma. O segundo aspecto foi o fato de não ter havido ressecção de costelas. Além disso constatou-se nesse trabalho que a técnica da toracotomia em bloco dispensou o uso de afastadores durante a exploração da cavidade torácica. As articulações costocondrais da sexta à nona costelas funcionaram como "dobradiças" por ocasião do rebatimento da parede costal, não havendo dano às respectivas articulações.

Comparando-se a técnica da semi-remoção da costela de SCHULMAN & LIPPINCOTT (1987) com a técnica desenvolvida nesta pesquisa, notou-se que em ambas há preservação das costelas, porém, a maior exposição das vísceras foi observada na segunda técnica.

Comparando-se a presente pesquisa com a técnica da ressecção parcial de costelas efetuada por STOPIGLIA et al (1986), verifica-se que a técnica de toracotomia em bloco não está indicada para os casos de fratura costal com perda de segmento.

Constatou-se que o tempo médio necessário para a realização desta cirurgia foi de três horas. Verificou-se ainda que a técnica da toracotomia em bloco foi mais trabalhosa do que a toracotomia por incisão intercostal, porém, LUMB & BUTTERFIELD (1977) omitiram-se na informação dos tempos cirúrgicos e na duração da técnica cirúrgica por eles descrita.

As dificuldades observadas na técnica cirúrgica foram as seguintes: a) no primeiro animal os furos nas costelas foram feitos após a secção das mesmas tornando este procedimento mais difícil, ocasionando demora cirúrgica e riscos para o operador, assistente e paciente; b) o sangramento das artérias intercostais ocorrido no momento da secção das costelas poderá causar uma complicação para os animais de maior porte, devendo-se dar maior atenção ao pinçamento e ligadura das artérias antes da secção das costelas, fato também ressaltado por ACCIOLY (1965).

Nos animais da presente pesquisa foi utilizado fio de aço monofilamentoso na osteossíntese das costelas seccionadas, na síntese dos planos musculares categute cromado com padrão de pontos contínuos e na síntese da pele fio de náilon, com padrão de pontos separados tipo Donatti, todos de calibre adequado aos tecidos a serem suturados. Não houve rejeição ou alteração na ferida cirúrgica atribuída ao material de sutura empregado.

A drenagem da cavidade torácica e o restabelecimento da pressão negativa foram efetuados com um tubo para infusão de soro, conectado a um frasco de soro servindo como um selo de água e, em algumas oportunidades, ligadas ao equipo de aspiração e drenagem do aparelho de anestesia que se demonstrou eficiente na drenagem do ar e fluídos da cavidade torácica, como citaram CROWE (1986) e BEDFORD (1990).

Um aspecto importante a ser discutido foi a ausência de processos infecciosos pós-operatórios, visto que, nenhum dos animais apresentou sinais clínicos de efusão pleural, tais como, letargia, anorexia, tosse, relutância em deitar-se, abdução dos cotovelos, febre, alterações dos sons pulmonares e cardíacos, mencionados por FOWLER (1973) e ARCHIBALD & HARVEY (1974). A ausência de infecção pode-se justificar pêlos cuidados na técnica asséptica citados por ARCHIBALD & HARVEY (1974) e pelo uso de esquema profilático do antibiótico segundo RIVIERE (1988) e RAISER (1990).

A técnica usada promoveu uma excelente exposição das vísceras com preservação das costelas, o que foi também observado por LUMB & BUTTERFIELD (1977) em suínos miniatura. Esta técnica permitiu a observação global do hemitórax direito e esquerdo, sendo o terço anterior de ambos hemitórax cobertos pelas quatro primeiras costelas a única região pouco acessível cirurgicamente. Foi observado que os limites máximos do campo cirúrgico acham-se entre a quarta e nona costelas, pois cranialmente a localização da escápula e as massas musculares que recobrem as três ou quatro primeiras costelas limitam o acesso, sendo que a porção muscular do diafragma na nona costela limita a abordagem caudal.

A presença de espaço pouco acessível cirurgicamente não foi mencionado por LUMB & BUTTERFIELD (1977) na descrição da técnica original, porém, resulta de suma importância para determinar as possibilidades cirúrgicas desta técnica no cão. O limite da incisão dorsal que também não foi discutido por LUMB & BUTTERFIELD (1977), não deve ultrapassar a distância de 4cm, aproximadamente, da coluna vertebral torácica, para facilitar a reconstrução óssea da parede costal. O número de costelas a serem seccionadas poderá ser menor dependendo da lesão e do tamanho da cavidade torácica.

A maior desvantagem achada neste procedimento consistiu no tempo cirúrgico prolongado, porém, deve-se avaliar as condições prévias do animal a ser submetido a esta cirurgia e se a ampla exposição das vísceras, obtida por este método, justifica a sua aplicação. Embora os cães sadios tenham tolerado bem o trauma cirúrgico desta abordagem, é provável que pacientes portadores de patologias tenham um prognóstico mais reservado. Por outro lado, como citaram LUMB & BUTTERFIELD (1977), sua justificativa para fins experimentais devem ser levadas em consideração.

CONCLUSÕES

As condições deste trabalho foram as seguintes:

1 - A técnica da toracotomia em bloco no cão permite uma ampla exposição das vísceras do hemitórax abordado, sendo possível a manipulação cirúrgica de praticamente todo o hemitórax visualizado, excluindo a porção compreendida no terço anterior do mesmo.

2 - A técnica da toracotomia em bloco é indicada para casos clínicos e experimentais que necessitarem de uma ampla exposição cirúrgica.

FONTES DE AQUISIÇÃO

a - Sirben - Biolab Indústrias Farmacêuticas S/A. Rua Independência, 706 São Paulo, SP.

b - Dogui - Cargill Agrícola S/A. Rodovia Campinas-Paulina Km 3 - Campinas, SP.

c - Ampicilina - Indústrias Farmacêuticas Fontoura Wyeth S/A. Av. Rangel Pestana, 1105 - São Paulo, SP.

d - Acepran a 0,2% - Univet S/A Indústria Veterinária. Rua Climaco Barroso, 700 - São Paulo, SP.

e - Thionembutal - Abbott Lab. do Brasil Lida. Rua Nova York, 245 - São Paulo, SP.

f - 6-0 Oral Trimilene - England.

g - Narcomatic - Narcosul S/A. Av. dos Estados - Porto Alegre, RS.

h - Categute Cromado - Cirumédica S/A. Av. Miguel Farias e Vasconcelos, 811 - São Paulo, SP.

i - Stryker - Eletro Surgical Unit - Kalamazoo - Michigan, USA.

j - Fio de Aço Inox -Cirumédica S/A. Av. Miguel Farias e Vasconcelos, 811 - São PauIo, SP.

l - Fio de Nylon - Cirumédica S/A. Av. Miguel Farias e Vasconcelos, 811 - São PauIo, SP.

m - Categute Cromado - Cirumédica S/A. Av. Miguel Farias e Vasconcelos, 811 - São PauIo, SP.

n - Surgilene Verde - Cirumédica S/A. Av. Miguel Farias e Vasconcelos, 811 - São PauIo, SP.

o - Ringer com Lactato de Sódio - Beker Produtos Fármaco Hospitalares Lida. Rua Feitiço da Vila, 88 - São Paulo, SP.

p - Tintura de Timerosal - Laboratório e Ind. Farmacêutica de Produtos Oficinais UFSM. Cidade Universitária - Stª Maria, RS.

2Médico Veterinário, Professor do Departamento de Clínica de Pequenos Animais - Centro de Ciências Rurais da Universidade Federal de Santa Maria. 97.119 - Santa Maria. RS.

3Médico Veterinário do Laboratório Clínico do Hospital de Clínicas Veterinárias da Universidade Federal de Santa Maria.

Aprovado para publicação em 11.12.91.

  • ACCIOLY, A. L. Contribuição para o estudo das toracotomias in "Canis familiaris". Vias de acesso ao coração e aos seus pedículos vasculares Niterói, 1965. 63 p. Tese (para o provimento da 18ª cadeira - Propedêutica, Patologia, Clínica Cirúrgica - Obstetrícia). Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 1965.
  • ALEXANDER, A. Técnica quirurgica en animales 2. ed. México: Interamericana, 1971. 313 p.
  • ARCHIBALD, D. J., HARVEY, C.E. Thorax. In: ARCHIBALD, D.J. Canine surgery 2. ed. Santa Barbara: American Veterinary Publications, 1974. cap. 9. p. 381-427.
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    Médico Veterinário, aluno(a) do Curso de Mestrado em Medicina Veterinária - Centro de Ciências Rurais - Universidade Federal de Santa Maria. 97.119 - Santa Maria, RS.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Set 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 1991

    Histórico

    • Aceito
      11 Dez 1991
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