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Informação sobre medicamentos na imprensa: uma contribuição para o uso racional?

Information on medicines in the media: a contribution to rational use?

Resumos

O artigo tem por objetivo identificar como o tema "medicamentos" é apresentado pela imprensa e verificar a contribuição deste meio de comunicação para o uso racional de medicamentos. A pesquisa foi realizada a partir de artigos publicados por um jornal de grande circulação nacional disponibilizados em bancos de dados em CD-ROM e Internet. Os artigos que focalizaram temas relacionados a medicamentos foram selecionados e analisados pelo método de análise de conteúdo, com a identificação das categorias que emergiram no transcorrer do estudo. Este trabalho apresenta os resultados relativos a 377 textos jornalísticos que abordaram medicamentos no contexto da "medicina e saúde", em uma amostra aleatória de 1.067 artigos. Nos textos analisados, mensagens alertando para aspectos negativos relacionados ao uso de medicamentos foram menos veiculadas do que mensagens positivas. Destaca-se a necessidade de acompanhamento e avaliação da qualidade da informação veiculada pela imprensa visando ao uso racional de medicamentos.

Medicamentos; Uso racional de medicamentos; Imprensa; Informação; Análise de conteúdo


To identify as the theme "medicines" is presented by the press and to verify the contribution of this media for a rational use of medicines. Exploratory study was accomplished in articles published in a major Brazilian newspaper. These journalistic articles have been extracted from the newspaper database, available in CD-ROM and on the Internet. The analysis of content of the selected articles led to the identification of categories that emerged in the course of the study. This work presents the results of 377 articles that focused medicines in the context of the "medicine and health", in a random sample of 1,067 articles. In the evaluated articles, messages aiming at negative aspects related to the use of medicines were less published than positive ones. This research pointed out the necessity of following-up and evaluating the quality of the information released by the press, seeking the rational use of medicines.

Medicines; Rational use of medicines; Press; Information; Content analysis


ARTIGO ARTICLE

Informação sobre medicamentos na imprensa: uma contribuição para o uso racional?

Information on medicines in the media: a contribution to rational use?

Eloína Araújo LageI; Maria Imaculada de Fátima FreitasII; Francisco de Assis AcurcioI

IDepartamento de Farmácia Social, Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais. Av. Antônio Carlos 6.627, sala 1.040 B2, Bairro Pampulha, 31270-010, Belo Horizonte MG. eloinaraujo@yahoo.com.br

IIEscola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais

RESUMO

O artigo tem por objetivo identificar como o tema "medicamentos" é apresentado pela imprensa e verificar a contribuição deste meio de comunicação para o uso racional de medicamentos. A pesquisa foi realizada a partir de artigos publicados por um jornal de grande circulação nacional disponibilizados em bancos de dados em CD-ROM e Internet. Os artigos que focalizaram temas relacionados a medicamentos foram selecionados e analisados pelo método de análise de conteúdo, com a identificação das categorias que emergiram no transcorrer do estudo. Este trabalho apresenta os resultados relativos a 377 textos jornalísticos que abordaram medicamentos no contexto da "medicina e saúde", em uma amostra aleatória de 1.067 artigos. Nos textos analisados, mensagens alertando para aspectos negativos relacionados ao uso de medicamentos foram menos veiculadas do que mensagens positivas. Destaca-se a necessidade de acompanhamento e avaliação da qualidade da informação veiculada pela imprensa visando ao uso racional de medicamentos.

Palavras-chave: Medicamentos, Uso racional de medicamentos, Imprensa, Informação, Análise de conteúdo

ABSTRACT

To identify as the theme "medicines" is presented by the press and to verify the contribution of this media for a rational use of medicines. Exploratory study was accomplished in articles published in a major Brazilian newspaper. These journalistic articles have been extracted from the newspaper database, available in CD-ROM and on the Internet. The analysis of content of the selected articles led to the identification of categories that emerged in the course of the study. This work presents the results of 377 articles that focused medicines in the context of the "medicine and health", in a random sample of 1,067 articles. In the evaluated articles, messages aiming at negative aspects related to the use of medicines were less published than positive ones. This research pointed out the necessity of following-up and evaluating the quality of the information released by the press, seeking the rational use of medicines.

Key words: Medicines, Rational use of medicines, Press, Information, Content analysis

Introdução

Os fatores que influenciam o uso de medicamentos são muitos e estão inter-relacionados. Podemos citar, entre outros aspectos, a forma como a população compreende e conceitua as doenças e os tratamentos, bem como a pressão do fabricante sobre os médicos e usuários, gerando uma tensão entre a necessidade sanitária dos medicamentos e a necessidade de expansão constante do mercado (Nascimento, 2000). Ademais, a informação e a propaganda promocional de medicamentos podem influenciar em grande medida a forma pela qual eles são utilizados (Lefèvre, 1999; Woloshin et al., 2001).

Reconhecidos como instrumentos indispensáveis às ações de saúde, os medicamentos ocupam papel central na terapêutica da atualidade. Fatores relacionados ao modo de utilização refletem-se no efeito terapêutico e por isso nem sempre eles exercem plenamente o seu papel. Muitas vezes, os pacientes não receberam ou não tomaram a dose do medicamento de forma correta, ou usaram tratamento inadequado. Após obter a prescrição médica, o paciente torna-se responsável pelo uso do medicamento, sobre como, quando e quanto tomar. A orientação recebida no consultório médico é confrontada com outras fornecidas por diferentes profissionais da área da saúde, com aquelas obtidas por parentes, vizinhos e, também, nos meios de comunicação de massa. A decisão do paciente é fortemente influenciada por valores culturais e fatores psicossociais (Arnau & Laporte, 1989), podendo levar ao uso incorreto desses produtos. Além de prejuízo para a saúde, o uso inadequado supõe um desperdício de recursos, a princípio pagos pelos pacientes.

Diante deste quadro, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estabeleceu como seu grande desafio para a próxima década a melhoria na racionalidade do uso de medicamentos, havendo uma necessidade de promover a avaliação desse uso e vigiar o seu consumo (Organización Mundial de la Salud, 2002).

O desenvolvimento de atividades educacionais de caráter público constitui um dos meios de alcançar o uso racional de medicamentos, proposto pela OMS. O doente e o público em geral devem ter acesso à informação correta, objetiva e relevante a respeito dos medicamentos, para que se obtenha maior adequação em seu uso, além de evitar a automedicação desnecessária.

O uso racional de medicamentos dentro da proposta da Política Nacional de Medicamentos é o processo que compreende a prescrição apropriada; a disponibilidade oportuna e a preços acessíveis; a dispensação em condições adequadas; e o consumo nas doses indicadas, nos intervalos definidos e no período de tempo indicado de medicamentos eficazes, seguros e de qualidade (Brasil, 2001). Esta definição ampla reconhece que promover o uso racional de medicamentos é um desafio que depende de vários fatores, dentre eles, educação, informação adequada aos médicos, equipes de saúde e consumidores.

Neste contexto, alguns autores consideram a imprensa um meio fértil e propício à educação sanitária, especialmente para a implantação de hábitos sadios. De acordo com Lopes & Nascimento (1996), os meios de comunicação têm um papel fundamental na disseminação de informações para os cidadãos, assumindo um papel de "educador coletivo" em caso de endemias, cuidado e preservação do funcionamento do corpo. Kucinski (2000) argumenta que a informação jornalística possui grande "valor pedagógico" para a medicina preventiva, destacando a importância dos meios de comunicação de massa no processo de socialização da informação voltada para a ampliação da consciência sanitária.

Outros estudos, ao contrário, apontam que as informações sobre medicamentos veiculadas na mídia são tendenciosas, predominando as boas notícias e a supervalorização das propriedades medicamentosas (Finzen et al., 1999; Moynihan et al., 2000). As pesquisas assinalam, também, que essas notícias estimulam o autoconsumo e contribuem para o aumento da demanda por consultas médicas especializadas (Thompson, 1998; Findlay, 2001).

Por reconhecer a enorme influência dos meios de comunicação na conformação da sociedade e da cultura, procurou-se identificar como um jornal diário, de grande circulação nacional, apresentou as informações relacionadas aos medicamentos que poderiam potencialmente contribuir para o seu uso racional, analisando essa dimensão quanto ao tipo e conteúdo das informações veiculadas.

Métodos

Foi realizada uma pesquisa exploratória, seguindo os princípios da análise de conteúdo, enfocando a discussão sobre medicamentos em artigos publicados pelo jornal Folha de S. Paulo. Foi adotada a definição de análise de conteúdo utilizada por Bardin (1994), que a conceitua como: um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.

Os textos jornalísticos foram coletados no banco de dados do jornal disponibilizado em CD-ROM e na Internet publicados entre novembro de 1998 e dezembro de 2000. As palavras-chave utilizadas para pesquisa foram: drogaria(s), farmácia(s), fármaco(s), medicamento(s), remédio(s). Entre os textos capturados foram excluídos aqueles em que alguma das palavras-chave aparecia como metáfora ou numa citação circunstancial. Os textos selecionados para análise foram obtidos a partir de amostragem aleatória das notícias capturadas após a pré-seleção. O tamanho da amostra foi calculado em 1.067 textos, considerando-se a probabilidade de ocorrência do evento (p) igual a 0,5, um intervalo de confiança de 95% e um erro máximo permitido de 0,03.

A análise de conteúdo foi desenvolvida percorrendo as seguintes etapas: a) leitura flutuante do material coletado, fase inicial de contato e assimilação das primeiras impressões dos textos; b) constituição do corpus de análise, realizada pela organização do material e delimitação do número de textos a serem trabalhados; c) levantamento de núcleos de sentido (temas); d) agregação dos dados em categorias; e) análise do corpus. A partir da exploração do material foram realizados o levantamento dos temas abordados e a agregação dos mesmos em categorias que emergiram da análise. A análise do corpus envolveu, na primeira etapa, a análise quantitativa dos dados. Numa segunda etapa, efetuou-se a análise qualitativa das matérias.

Resultados

Foram capturados 3.601 textos que abordavam o tema, no período estudado. Entre os 1.067 textos jornalísticos amostrados e analisados, 76% foram classificados em três categorias centrais de análise identificadas: "medicina e saúde" (35%), "regulação do mercado farmacêutico" (31%) e "acesso a medicamentos" (10%). Este trabalho apresenta os resultados relativos aos 377 textos que focalizaram temas relacionados a medicamentos no contexto da "medicina e saúde". Neste conjunto, as categorias que emergiram da análise das notícias e os critérios estabelecidos para classificar cada uma delas foram as seguintes:

a) Cuidados no uso e abuso de medicamentos: qualquer informação que alertasse para a possibilidade do surgimento de efeitos indesejáveis decorrente do uso incorreto ou sem orientação médica, aquisição de produtos cuja publicidade enfatizava resultado rápido, comercialização de produtos sem comprovação da eficácia.

b) Medicina complementar: notícias que informavam o tratamento de doenças por meio de métodos não-convencionais, tais como: homeopatia, fitoterapia, hipnose, seita religiosa, entre outros; e ainda depoimentos de usuários e profissionais que utilizavam esse tipo de tratamento. Esta categoria foi incluída nesta análise por abordar as maneiras complementares de manter a saúde e de tratar e explicar as doenças.

c) Pesquisas científicas e descobertas: notícias que relatavam as pesquisas desenvolvidas em todo o mundo, as descobertas apresentadas em congressos e encontros científicos, testes com novos medicamentos e lançamento de novos produtos.

d) Saúde, diagnóstico e tratamento de doenças: notícias que abordavam um ou mais dados de descrição de uma doença, tais como, etiologia, modo de transmissão, diagnóstico clínico (sintomas e sinais), tratamento medicamentoso ou não, epidemiologia, teste de avaliação clínica, formas de prevenção, depoimentos de usuários e especialistas sobre a eficácia e eficiência de um produto usado num tratamento.

A distribuição de textos abordando cada tema é apresentada na figura 1. A categoria "pesquisas científicas e descobertas" foi a mais freqüente (47% dos textos), seguida por "saúde, diagnóstico e tratamento de doenças" (36%).


A análise da cobertura do jornal sobre as doenças enfocadas revelou que a maioria (66,7%) das notícias não fez menção a um tratamento específico para a doença em discussão ou abordou o tratamento medicamentoso de uma forma ampla, por categoria terapêutica (Tabela 1). Porém, não se pode desconsiderar que 33,3% das notícias informavam o tratamento medicamentoso específico para a doença em questão. A divulgação do diagnóstico acompanhado do tratamento pode contribuir como fator indutor de automedicação.

Dentre os textos jornalísticos analisados, 286 deles (76%) salientaram aspectos positivos ou negativos relacionados à utilização de medicamentos (Tabela 2). Neste estudo, foram registrados como "benefícios" ou aspectos "positivos" as informações de: indicação de uso, vantagem de uso, eficiência ou eficácia do tratamento e menor risco de aparecimento de reações adversas. As informações classificadas como "riscos" ou aspectos "negativos" foram aquelas sobre: restrição de uso, efeitos colaterais ou reações adversas, redução do efeito terapêutico pelo uso incorreto e desvantagem de uso.

Cerca de 28% das notícias abordaram, simultaneamente, benefícios e riscos, mas esses aspectos não foram apresentados na mesma proporção. Entre os textos analisados, as mensagens alertando para aspectos negativos (25%) relacionados ao uso de medicamentos foram menos veiculadas do que mensagens positivas (38%).

Assim, as informações ressaltando os cuidados no uso e abuso de medicamentos foram pouco freqüentes, no período analisado. As notícias sobre as conseqüências do uso incorreto do medicamento abordaram o efeito da subdose ou sobredose num tratamento terapêutico e os modos de evitar a intoxicação por medicamentos. Ressaltaram também os riscos da automedicação por uso de antiácidos, analgésicos, antiinflamatórios e por medicamentos de venda livre, assim como o risco de medicar bebês sem orientação médica. Denunciaram a propaganda enganosa, principalmente de emagrecedores e anabolizantes, além de destacarem a necessidade de combater o anúncio de produtos com efeitos terapêuticos não comprovados. A veiculação de mensagens reconhecendo os limites dos medicamentos dentro da atenção à saúde é fundamental para promover maior racionalidade na utilização desses produtos. E esta é uma atividade que pode ser realizada pelos meios de comunicação de massa.

Discussão

O tema que apareceu como o mais freqüente na cobertura da imprensa – Pesquisas científicas e descobertas – confirma o ponto de vista defendido por autores como Helman (1994) e Camargo Júnior (1995), que apontam o fascínio público pelas novas descobertas no campo da saúde, visto que elas dão esperanças de cura, de prolongamento da vida e da juventude. O discurso científico confere verossimilhança e credibilidade à matéria. As concepções médico-científicas acerca da saúde e da doença exercem importante papel cultural em nossa sociedade, o que faz privilegiar a ciência para valer a informação veiculada. Camargo Júnior (1995) chama a atenção para o papel da ciência em nossa cultura, constituindo um "grande eixo de sustentação da produção de sentido em nossa sociedade". Na visão deste autor, "dizer-se que algo é científico equivale dizê-lo verdadeiro, fundamentado, merecedor de crédito". A divulgação científica pelos meios de comunicação de massa representa um modo importante para o estabelecimento e difusão de verdades.

A baixa freqüência de textos tratando dos riscos de utilização de medicamentos tende a reforçar o mito da saúde promovido pelo uso de medicamentos, o caráter simbólico do seu poder de cura. As notícias sobre medicamentos são categorias importantes no campo da ciência como um todo, e cada vez mais aspectos da vida diária são classificados como problemas médicos podendo ser tratados com esses produtos. As mensagens ressaltando os cuidados e advertências sobre o uso de medicamentos poderiam "potencialmente" interferir no processo de consumo de medicamentos, na demanda por consultas e nos procedimentos de saúde, além de fomentar o nível de consciência sanitária social que funcionaria como uma barreira para uso inadequado.

A análise do relato jornalístico em torno das doenças e seus tratamentos revelou que, ao informar o tratamento medicamentoso específico para a doença em questão, o jornal atrai a atenção do leitor, e ao mesmo tempo estimula o consumo do medicamento. Lefèvre (1999) argumenta que no contexto da situação social e comunicativa, o jornal, ao orientar, informar e educar, promove a venda num ato "desinteressado", tornando eficaz o processo de venda. Esse processo induz também à automedicação por pessoas que não têm uma atitude crítica diante da propaganda de medicamento para reconhecer o limite de seu uso dentro da atenção à saúde.

Os resultados encontrados neste estudo quanto ao número de informações sobre benefícios e riscos foram semelhantes àqueles observados por Moynihan et al. (2000) ao analisarem a cobertura jornalística dos medicamentos pravastatina, alendronato e ácido acetil salicílico por 36 jornais dos Estados Unidos entre 1994 e 1998. Estes autores também detectaram que as notícias supervalorizavam os benefícios e subestimavam as reações adversas. Informações como essas podem estimular o consumo, levando ao uso indiscriminado de medicamentos. A informação que acompanha um produto é um parâmetro importante para o uso racional de medicamento.

A análise dos textos evidenciou um predomínio de conteúdos informativos com pouca preocupação de educação para consumo. O jornal levantou, divulgou e debateu pontos importantes relacionados à questão dos medicamentos, exercendo bem seu papel informativo, mas muitos outros aspectos poderiam ter sido explorados. Como assinalado por Epstein (2002), muitas informações que poderiam ser mais importantes e de maior utilidade pública sobre saúde, em geral, "raramente se tornam notícia no seu sentido jornalístico".

Apesar de ser reconhecida como necessária e indispensável, a educação voltada para o uso correto de medicamentos encontra barreiras para o seu desenvolvimento. Sevalho (2003), ao discutir a racionalidade do uso do medicamento, apresenta-o como um objeto híbrido, que deve ser considerado nas suas perspectivas de instrumento terapêutico e de bem de consumo. Em nosso meio, o medicamento é uma mercadoria como qualquer outra, a propaganda estimula o autoconsumo, a legislação é frágil e conflitos comerciais refletem de forma negativa o seu uso. Por isso, promover a educação pública sobre medicamentos por meio da mídia é certamente um desafio. O impacto de tal informação depende, entre outros fatores, da credibilidade da fonte informadora, das atitudes pessoais sobre saúde, doença, prevenção e cura, e, acima de tudo, de visualização dos limites e das potencialidades de interferência desses produtos no processo saúde-doença.

A disponibilidade de informação sobre medicamentos é uma condição necessária, mas insuficiente para promover o uso racional. Notícias chamando a atenção para os cuidados no uso de medicamentos e para as conseqüências de sua utilização incorreta podem contribuir para incrementar a racionalidade deste uso. Entretanto, a pesquisa revelou que mensagens alertando para os riscos da utilização foram menos freqüentes que aquelas que deram destaque aos benefícios. A denúncia de propaganda enganosa e excessiva de medicamentos também constitui informação importante para uma atitude crítica do usuário no consumo destes produtos. Mas nada disso implica, necessariamente, que os medicamentos serão usados corretamente. Principalmente, porque não se pode afirmar, por exemplo, se os leitores compreenderam as mensagens, nem se eles mudaram seus comportamentos por causa da informação. Conforme avalia Thompson (1998), é imprevisível o sentido que o indivíduo dá à mensagem recebida. O ambiente e as experiências pessoais influenciam na recepção da mensagem que pode ser entendida de várias maneiras, em diferentes contextos. Por isso é importante o desenvolvimento de estudos complementares que avaliem o processo de comunicação, mais especificamente, a recepção da informação pelos leitores.

No contexto da saúde pública torna-se relevante o conhecimento da qualidade das informações sobre medicamentos veiculadas nos meios de comunicação de massa. As informações são instrumentos imprescindíveis para ampliação da consciência sanitária. Além disso, é desejável a formação de um corpo de conhecimentos que permita avançar na discussão de como fazer chegar efetivamente, via mídia, informações pertinentes aos usuários de medicamentos e à população em geral, visando ao aprimoramento da qualidade da informação veiculada e de sua assimilação.

Colaboradores

EA Lage trabalhou na coleta, processamento, análise e interpretação dos dados, elaboração e redação final do texto; MIF Freitas e FA Acurcio participaram na análise e interpretação dos dados e revisão final do texto.

Artigo apresentado em 3/11/2004

Aprovado em 4/07/2005

Versão final apresentada em 19/07/2005

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Mar 2006
  • Data do Fascículo
    Dez 2005

Histórico

  • Aceito
    19 Jul 2005
  • Revisado
    04 Jul 2005
  • Recebido
    03 Nov 2004
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