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Formação do fonoaudiólogo no município de Salvador e consolidação do SUS

Speech-language pathology formation in the city of Salvador and the consolidation of SUS

Resumos

A formação dos Recursos Humanos em Saúde (RHS) é reconhecidamente área crítica do processo de reorientação do setor saúde. A construção do SUS apresenta desafios ao processo de formação, em especial, ao se tratar de profissões recentes, como a fonoaudiologia, pois se verifica pouca familiaridade com a saúde coletiva e com históricos de lutas que reafirmaram uma política pública de saúde no Brasil, além da forte tendência ao modelo de atendimento à demanda espontânea e terapêutica reabilitadoras. O objetivo deste estudo foi analisar o perfil da formação do fonoaudiólogo no município de Salvador (BA). Utilizaram-se a análise documental e entrevista com coordenadores, investigando como a área da Saúde Pública está disposta em três cursos. Observouse pouca aderência das instituições de ensino superior (IES) à legislação do campo; reduzido contato dos graduandos com a área da Saúde Coletiva e desarticulação ensino-serviço. A formação do fonoaudiólogo se mostrou incipiente em relação as políticas de consolidação do SUS. Identificar os desafios e oportunidades de mudança na formação dos RHS no âmbito das IES pode se reverter em melhores níveis de assistência à população, qualidade de ensino e expansão do conhecimento dos modelos práticos e teóricos.

Currículo; Educação dos profissionais de saúde; Fonoaudiologia; SUS; Recursos humanos em Saúde; Ensino em saúde


The Human Resources in Health (HRH) academic field is recognized as a critical area, which is part of the reorientation process in the health sector. The elaboration of the Unified Health System (SUS) represents challenges to the academic field process, especially regarding new careers such as speech-language pathology. This is related with the lack of awareness regarding collective health and the past history that strengthened the public health policies in Brazil. Yet, the powerful influence of the service model to the spontaneous demand and reabilitation therapy plays another key role in the aspect. The aim was to analyze the academic field of the speech-language pathology profile in the city of Salvador, Bahia State. Documental analysis and coordinator interviews were used to investigate how the public area is characterized in 3 modules. It was noticed little adhesion of the upper level institutions to the legislation of the field; lack of contact between graduating students and collective health, and a teaching-service disconnection. The graduation of the speech therapist was shown incipient regarding SUS's consolidation. Identifying challenges and opportunities of changes in HRH formation in upper level institutions may lead to better levels of aid to the population, quality of education and expansion of theoretical and practical models of knowledge.

Curriculum; Health workers' education; Speech-language pathology; Unified Health System; Health manpower; Education in health


TEMAS LIVRES FREE THEMES

Formação do fonoaudiólogo no município de Salvador e consolidação do SUS

Speech-language pathology formation in the city of Salvador and the consolidation of SUS

Marcio LemosI; Leda Maria Fonseca BazzoII

ISecretaria da Saúde do Estado da Bahia, Escola Estadual de Saúde Pública Prof. Francisco Peixoto de Magalhães Netto. Rua Conselheiro Pedro Luiz 171, Rio Vermelho. 41950-610 Salvador BA. marciofono@yahoo.com.br

IIUniversidade Federal da Bahia

RESUMO

A formação dos Recursos Humanos em Saúde (RHS) é reconhecidamente área crítica do processo de reorientação do setor saúde. A construção do SUS apresenta desafios ao processo de formação, em especial, ao se tratar de profissões recentes, como a fonoaudiologia, pois se verifica pouca familiaridade com a saúde coletiva e com históricos de lutas que reafirmaram uma política pública de saúde no Brasil, além da forte tendência ao modelo de atendimento à demanda espontânea e terapêutica reabilitadoras. O objetivo deste estudo foi analisar o perfil da formação do fonoaudiólogo no município de Salvador (BA). Utilizaram-se a análise documental e entrevista com coordenadores, investigando como a área da Saúde Pública está disposta em três cursos. Observouse pouca aderência das instituições de ensino superior (IES) à legislação do campo; reduzido contato dos graduandos com a área da Saúde Coletiva e desarticulação ensino-serviço. A formação do fonoaudiólogo se mostrou incipiente em relação as políticas de consolidação do SUS. Identificar os desafios e oportunidades de mudança na formação dos RHS no âmbito das IES pode se reverter em melhores níveis de assistência à população, qualidade de ensino e expansão do conhecimento dos modelos práticos e teóricos.

Palavras-chave: Currículo, Educação dos profissionais de saúde, Fonoaudiologia, SUS, Recursos humanos em Saúde, Ensino em saúde

ABSTRACT

The Human Resources in Health (HRH) academic field is recognized as a critical area, which is part of the reorientation process in the health sector. The elaboration of the Unified Health System (SUS) represents challenges to the academic field process, especially regarding new careers such as speech-language pathology. This is related with the lack of awareness regarding collective health and the past history that strengthened the public health policies in Brazil. Yet, the powerful influence of the service model to the spontaneous demand and reabilitation therapy plays another key role in the aspect. The aim was to analyze the academic field of the speech-language pathology profile in the city of Salvador, Bahia State. Documental analysis and coordinator interviews were used to investigate how the public area is characterized in 3 modules. It was noticed little adhesion of the upper level institutions to the legislation of the field; lack of contact between graduating students and collective health, and a teaching-service disconnection. The graduation of the speech therapist was shown incipient regarding SUS's consolidation. Identifying challenges and opportunities of changes in HRH formation in upper level institutions may lead to better levels of aid to the population, quality of education and expansion of theoretical and practical models of knowledge.

Key words: Curriculum, Health workers' education, Speech-language pathology, Unified Health System, Health manpower, Education in health

Introdução

A formação de Recursos Humanos em Saúde (RHS) representa uma área critica do processo de reorientação dos sistemas de saúde. O processo de construção do SUS tem evidenciado grandes desafios ao processo de formação e capacitação de profissionais de saúde em todos os níveis.

Nas instituições de ensino superior (IES), os cursos de graduação em saúde têm perpetuado modelos essencialmente conservadores, centrados em aparelhos e sistemas orgânicos e tecnologias altamente especializadas, dependentes de procedimentos e equipamentos de apoio diagnóstico e terapêutico. Neste contexto, situa-se a formação em fonoaudiologia, que apresenta um incipiente contato com a Saúde Coletiva e com os movimentos de construção de lutas que reafirmam uma política pública de saúde no Brasil, o que favorece a reprodução do modelo tradicional médico-centrado e pautado no atendimento à demanda espontânea e terapêutica reabilitadoras.

O debate sobre as competências na formação de RHS para o SUS exige uma análise da situação atual e das perspectivas legais do processo de sua implementação. A utilização de estratégias de descentralização e democratização da gestão e a experimentação de formas de organização do processo de trabalho em busca de modelos assistências, coerentes com os princípios e diretrizes da reforma sanitária, impõem uma reflexão crítica e a formulação de proposições relativas aos perfis profissionais, aos processos pedagógicos e, em última instância, à direcionalidade da política educacional em saúde.

Estudos realizados abordam análises de programas de cursos de graduação e pós-graduação, residências, estágios, reformas curriculares, experiências de projetos de integração docenteassistencial, entre outros, apontando como responsáveis pela crise da formação dos RHS determinantes externos (interesses capitalistas médicos industriais, organização dos serviços de saúde, mercado de trabalho e política de saúde do estado) e internos (desintegração básico-profissional, biológico-social, especialismo, domínio da ideologia liberal, conservadorismo docente, desarticulação ensino-serviço, etc.)1.

Pode-se dizer que há consenso entre os críticos da educação dos profissionais de saúde em relação ao fato de ser hegemônica a abordagem biologicista, medicalizante e procedimento centrada. O modelo pedagógico hegemônico de ensino é centrado em conteúdos, organizado de maneira compartimentada e isolada, fragmentando os indivíduos em especialidades da clínica, dissociando conhecimentos das áreas básicas e conhecimentos da área clínica, centrando as oportunidades de aprendizagem da clínica no hospital universitário. A reorientação da formação dos profissionais de saúde enfrenta-se com a matriz flexneriana que, apesar de questionada, tem demonstrado fôlego, até em países que introduziram mudanças significativas na organização dos serviços de saúde.

A aproximação da fonoaudiologia e o campo da Saúde Coletiva se mostra um processo discreto se levarmos em consideração o contexto intrincado da rede de saúde e das políticas públicas no país. A entrada da fonoaudiologia nos serviços públicos de saúde acontece apenas em 1989, quando surgiram cargos e concursos em algumas prefeituras e estados2.

No início da década de noventa, a necessidade de revisão dos currículos para a formação do fonoaudiólogo passou a ser alvo de fortes discussões, que tinham como eixo central atender às grandes mudanças sociais, aos avanços desta ciência e às necessidades apresentadas pela política nacional de saúde vigente (Sistema Único de Saúde - SUS).

O desenvolvimento dos RHS não acompanhou as transformações ocorridas nos serviços de saúde, embora seja parte importante nas modificações da infraestrutura dos mesmos. Essa realidade remete a uma urgência no repensar da identidade profissional, o que reverteria em melhores níveis de assistência à população, qualidade do ensino para formação e expansão do conhecimento dos modelos teóricos e práticos.

Ao considerar que a mudança nas práticas e a mudança na formação são duas faces do mesmo movimento de produção da atenção integral à saúde3, amplia-se a importância da discussão sobre o novo modelo de atenção à saúde e da formação dos recursos humanos.

O estudo problematiza a mudança da formação do fonoaudiólogo e, portanto, dos RHS para a reorientação do sistema de saúde aos moldes da reforma sanitária, tendo como objetivo central analisar/caracterizar o perfil da formação em três instituições de ensino superior em fonoaudiologia do município de Salvador (BA), uma vez que a oferta de cursos de formação deste profissional é recente.

Materiais e métodos

Foi realizado um estudo de revisão de literatura a partir de trabalhos que refletem acerca das discussões sobre a formação dos profissionais e os currículos em saúde, pautando a articulação das práticas educativas no sentido de assegurar as propostas do SUS. Também foram realizadas entrevistas com coordenadores de três cursos de fonoaudiologia do município de Salvador, além da análise documental desses cursos, sendo dois de caráter público e um privado, analisando as disciplinas que abordam a temática da saúde pública, forma e tempo da prática dos graduandos no serviço de saúde junto à comunidade, formação dos professores que ministram essas disciplinas, ocorrência de processos de reforma curricular, carga-horária das disciplinas de saúde pública em relação à carga-horária total do curso, metodologia, referências e os conteúdos abordados nas mesmas, analisando se há comprometimento da formação com o SUS, mediante práticas educativas realizadas.

Análise/caracterização dos currículos

Utilizaremos as letras A, B e C para identificar as instituições.

Saúde pública/carga horária

As coordenadoras das instituições A e B consideraram que a carga horária da disciplina de Saúde Pública não é suficiente para suprir as necessidades do conhecimento básico para atuar nos serviços públicos de saúde, apesar de reconhecerem ser parte importante do processo ensino/aprendizagem. Já a coordenadora da instituição C considera a disciplina suficiente, pois a mesma teria a função apenas de situar a temática, não instrumentalizando de fato para a prática posterior dos graduandos (Tabela 1).

Nas instituições B e C, nunca houve mudanças substanciais na disciplina de Saúde Pública, o mesmo acontecendo em A; porém, algumas mudanças como o aumento da carga horária e criação de uma nova disciplina (Fonoaudiologia em Saúde Coletiva II), com 34 horas, são vistas como alternativas.

Nas instituições A e C, apenas as disciplinas específicas abordam os conceitos da Saúde Pública, das estruturas dos serviços públicos de saúde e da fonoaudiologia preventiva. Segundo a coordenação do curso da instituição B, existem algumas disciplinas que começaram a introduzir este tema, sendo que seus professores estão tentando "hierarquizar" o que os alunos precisam saber. As disciplinas citadas são: Introdução à Fonoaudiologia, Ciências Sociais em Saúde (optativa), Introdução à Epidemiologia e Bioestatística. Este ajuste, por não ter passado pelo processo de reforma curricular, ainda não esta regularizado.

Saúde pública/atividade prática

Na instituição A, após avaliação realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), passou a existir o estágio em Saúde Pública, desde 2003.1; porém, neste semestre, o estágio em Saúde Pública contava ainda com apenas vinte horas, estando os estudantes em campo na Unidade Básica de Saúde (UBS) em cinco oportunidades durante o semestre. A partir dos encontros dos docentes no processo de reforma curricular deste departamento, o estágio passa por um aumento da carga horária no primeiro semestre de 2004; porém, somente em 2006 passa a ocupar dois semestres letivos correntes.

Na instituição B, o estágio em Saúde Pública também é realizado no mesmo local onde ocorrem as atividades na disciplina teórica, incluindo maternidade e escola, ambas estaduais, acontecendo no oitavo e nono semestres. A coordenadora considera importante a prática em Saúde Pública, pois a mesma permite pensar a fonoaudiologia não apenas com enfoque reabilitador, mas também na questão preventiva. Na instituição C, ainda não existe estágio em Saúde Pública, uma vez que a turma mais avançada está no terceiro semestre (Tabela 2).

Fica evidente a necessidade de se incentivar um maior espaço de articulação entre a graduação e a extensão na produção das mudanças na formação e de implementação de políticas públicas intersetoriais voltadas à saúde, contribuindo para a superação de desigualdades regionais e sociais (Tabela 3).

É necessário que a formação em Saúde Coletiva não se dê apenas quando os profissionais já estão inseridos nos locais de atuação, sendo indispensável o conhecimento do sistema público de saúde durante toda a formação. Portanto, estratégias de integração entre os serviços de saúde e as instituições de ensino parecem ser alternativas que possibilitem mudar o contexto da fonoaudiologia no SUS.

Entendendo o currículo como um plano de estudos para solução de problemas de complexidade crescente e não como um recorte mais ou menos arbitrário de matérias e disciplinas, poder-se-ia programar a oferta de oportunidades de aproximação de docentes e alunos à rede regionalizada e hierarquizada de serviços de saúde, organizada através de distritos sanitários, capazes de evoluir para distritos docente-assistenciais.

Nesta perspectiva, todo estudante de graduação teria, desde o primeiro ano, a oportunidade de realizar atividades extramurais junto à comunidade residente nos distritos sanitários e, progressivamente, prestar serviços educativos, preventivos e curativos, à medida que viesse avançar no plano de estudos. Este processo de crescente articulação entre instituições de educação e de serviços de saúde serviria para a melhora na atenção á saúde, orientando a produção do conhecimento e a formação de pessoal, tomando como base o perfil epidemiológico num determinado contexto populacional, que permitiria à continuidade do processo educacional - educação permanente1.

A revisão das atividades de ensino não deve se limitar às alterações de conteúdo de disciplinas; deve ser uma redefinição global do processo de produção de RHS, pelo menos naquilo que depende do nível decisório das instituições de ensino.

Saúde pública/ementas

Os conteúdos programáticos presentes nas ementas dos programas das disciplinas de Saúde Pública analisadas pouco colaboram para a construção de uma nova atuação dos fonoaudiólogos nos serviços públicos de saúde, estando muitas vezes desvinculados dos próprios objetivos que visam ser alcançados dentro da disciplina.

Verifica-se que os conteúdos programáticos abordados, assim como as metodologias e referências utilizadas, ainda são incipientes para capacitar a atuação nos serviços de saúde do SUS, bem como para instrumentalizar estes profissionais para a gestão de sistemas e serviços de saúde. As habilidades de avaliar, sistematizar e decidir as condutas mais apropriadas para a condução da saúde da comunidade, assim como a possibilidade de lidar com o novo pensar e fazer saúde, não são estimuladas.

Observou-se que os programas dos estágios em Saúde Pública são vinculados ao estágio supervisionado em clínica; portanto, fazem parte de um projeto pautado no atendimento clínico em terapia dos distúrbios da comunicação, que tem por objetivo colocar os alunos no exercício de práticas clínicas envolvendo a execução e avaliação das terapias. A própria biografia recomendada e utilizada descarta os conteúdos do estudo e atuação relacionados ao campo da prevenção de doenças e promoção à saúde.

Relação entre a carga horária total do curso e a de Saúde Pública

É grande a desproporção existente entre os conteúdos da Saúde Pública, como princípios e diretrizes do SUS, práticas que visem à diminuição dos agravos, prevenção de doenças e realização de atividades que conduzam à promoção da saúde e os conteúdos estudados pela clinica tradicional.

Ratifica-se nesta análise a hegemonia da abordagem biologicista, médico centrada e procedimento centrada na qualificação para o trabalho tal como efetuada pela educação superior nacional. É colocada, portanto, a necessidade de explicitação de um marco conceitual e dos princípios e teorias pedagógicas, coerentes com a imagem-objetivo considerada, além da definição de estratégias e táticas visando construir viabilidade para o projeto mediante a instauração de uma nova hegemonia (direção política e cultural) (Gráfico 1).


Mudanças na graduação

Na coleta de dados realizada, foi constatado que em nenhuma das instituições aconteceram reformas curriculares significativas que adequassem seus currículos ao SUS. A coordenadora na instituição A referiu ser importante planejar mudanças no currículo do curso para atualizar e adequar o mesmo à nova legislação, bem como aos princípios e teorias que vêm sendo produzidos nos últimos anos no campo da fonoaudiologia. Informou que, até o momento, foram feitos apenas alguns ajustes no currículo, como quebras de pré-requisitos, mudanças de nomes e remanejamento de disciplinas.

A coordenadora na instituição B informou que não passaram também por processo de reforma curricular. Porém, após reconhecimento do curso no final do ano passado, foi iniciado o estágio de Saúde Pública a partir do oitavo semestre, depois que os alunos tivessem o conteúdo teórico no semestre anterior. Segundo a mesma, é importante que ocorram mudanças no currículo e que o ponto crucial da discussão das alterações no interior do curso diga respeito à temática da Saúde Pública, contemplando as diretrizes para o curso de fonoaudiologia, a política nacional de saúde no Brasil, além da preocupação do corpo docente e discente.

A coordenadora na instituição C, por sua vez, afirmou não ser importante planejar mudanças no currículo do curso por considerar que o mesmo foi planejado com as novas perspectivas de atuação. Segundo a mesma, o curso passou por uma reforma curricular na qual os pontos principais da mudança no currículo foram o aumento da carga horária dos estágios e a diversificação dos mesmos.

As diretrizes curriculares propõem diversificação de cenários de aprendizagem e ampliação dos tempos de prática e aproximação ao sistema de saúde, mas ainda são genéricas demais em relação à orientação do perfil ético, humanístico, científico e tecnológico dos profissionais à multiprofissionalidade, em especial ao caráter interdisciplinar. Reconhecer a necessidade da transformação, trilhar novos caminhos conceituais e explorar práticas inovadoras são elementos indispensáveis, mas não suficientes para superar conceitos e práticas hegemônicos, solidamente instalados dentro e fora das instituições formadoras. Algumas experiências de mudança na formação de profissionais de saúde revelam que o mais potente eixo integrador dos processos educativos inclui as práticas organizadas a partir das necessidades de saúde da população4.

A academia deveria atuar sobre a estrutura das práticas de saúde, mediante o ensino, pesquisa e a extensão, a fim de interagir dinamicamente com o processo da reforma sanitária. A difusão de ideologias modernizantes através dos movimentos de reforma em saúde, ainda que relevante para o projeto político de transformação do ensino, tem sido insuficiente para promover alterações significativas e continuadas na formação dos RHS. Portanto, há que se colocar os aspectos técnicos e ideológicos das práticas educativas nos seus devidos lugares e encarar o espaço político em que se tem de mover qualquer projeto consequente de mudança.

Nas instituições educacionais, movimentos de reforma curricular, esforços de avaliação das escolas, implementação de projetos inovadores de articulação ensino-serviço-comunidade, iniciativas de articulação de grupos, lideranças e outros atores sociais comprometidos com as transformações do sistema de saúde e das instituições de ensino superior representam avanços positivos5.

Conclusão

A formação dos fonoaudiólogos no município de Salvador mostrou-se incipiente com relação à política de formação de RHS direcionada ao SUS, que busca o conhecimento e a vivência da gestão, da atenção e do controle social na saúde, visando formar bons profissionais técnicos, mas, sobretudo, críticos e preparados para o sistema de saúde.

As relações de compromisso e responsabilidade entre o SUS e as instituições de educação superior se requerem políticas e, por tal, incluem proposições de governo. Para a viabilização da política, serão indicações a um projeto de governo:

. a atividade de implementação das diretrizes curriculares nacionais para as carreiras da saúde;

. a previsão ativa de participação conjunta em projetos locorregionais de educação permanente para docentes e profissionais em serviço;

. o estabelecimento de projetos de cooperação técnica para o desenvolvimento de capacidades e competências pedagógicas à rede de serviços e gestão local em saúde, para apoiar a qualificação da gestão local e locorregional do SUS;

. a produção de conhecimento científico e tecnológico relevante para a consolidação e avanço do SUS;

. a construção de saberes, informações e tecnologias relativas ao cuidado tecnoassistencial e às relações de cuidado;

. a construção do ensino de saúde de maneira articulada e negociada com o SUS.

Como proposição de governo, uma política de mudança na formação deve possibilitar o fortalecimento da articulação entre a universidade e os serviços/sistema de saúde de modo a ampliar as chances de indução de novos compromissos de cooperação entre universidade e SUS, desde a base locorregional de inserção da instituição formadora, dos órgãos de gestão do SUS e de sua rede de atenção. Esse processo de aproximação e construção de compromissos, sem dúvida, favorece a ampliação da responsabilidade pública e da relevância social da universidade, na medida em que traz para o cenário da educação o conjunto das referências centrais da reforma sanitária brasileira ou das diretrizes do SUS: descentralização da gestão, integralidade da atenção e fortalecimento do controle da sociedade sobre as ações, serviços e sistema de saúde.

Colaboradores

M Lemos e LMF Bazzo participaram igualmente de todas as etapas da elaboração do artigo.

Artigo apresentado em 31/07/2007

Aprovado em 07/11/2007

Versão final apresentada em 05/12/2007

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  • 2. Befi D. Fonoaudiologia na atenção primaria à saúde São Paulo: Lovise; 1997.
  • 3. Ceccim RB, Ferla AA. Residência integrada em saúde: uma resposta da formação e desenvolvimento profissional para montagem do projeto de integralidade da atenção à saúde. In: Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Construção da integralidade: cotidiano, saberes e práticas em saúde Rio de Janeiro: IMS-UERJ/Abrasco; 2003. p. 212-226.
  • 4. Feuerwerker LCM. Reflexões sobre as experiências de mudança na formação dos profissionais de saúde. Olho Mágico2003; (10):21-26.
  • 5. Teixeira CF, Paim JS. Políticas de formação de recursos humanos em saúde: conjuntura atual e perspectivas. Divulg. saude debate 1996; (12):19-23.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Ago 2010
  • Data do Fascículo
    Ago 2010

Histórico

  • Aceito
    05 Dez 2007
  • Revisado
    07 Nov 2007
  • Recebido
    31 Jul 2007
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