Open-access Cobertura de Planos de Saúde na população brasileira, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde, 2013

Resumo

O objetivo do estudo é descrever as coberturas de planos de saúde no Brasil, conforme características sociodemográficas, a partir dos dados da Pesquisa Nacional de Saúde, realizada em 2013, e comparar com dados administrativos da Agencia Nacional de Saúde Suplementar para este mesmo ano. Foram utilizados dados da Pesquisa Nacional de Saúde e do Sistema de Informações de Beneficiários da Agência Nacional de Saúde para o ano de 2013. Foi descrita a cobertura dos planos de saúde segundo estratificação para Brasil, urbano/rural, Grandes Regiões, Unidades da Federação e Capitais, sexo, faixa etária, nível de instrução, posição na força de trabalho, cor/raça e estado de saúde. Como resultado, a proporção de pessoas que referiu ter algum plano de saúde no Brasil foi de 27,9% (IC95%: 27,1-28,8). Foi observada diferença significativa com relação a nível de instrução, sendo maior para os que referiram ter educação superior completa (68,8% IC95%: 67,2-70,4) e para aqueles que referiram ter ocupação (32,5% IC95%: 31,5-33,5). O aumento da cobertura de planos de saúde na população brasileira reflete a melhora da oferta de empregos e do crescimento da economia do país na época.

Palavras-chave Planos de pré-pagamento em saúde; Cobertura de serviços privados de saúde; Inquéritos epidemiológicos; Serviços de saúde; Brasil

Abstract

This study aims to present the percentages of the Brazilian population holding health insurance plans, itemized by social-demographic characteristics, based on the data of the National Health Survey carried out in 2013, and to compare this information with the administrative data of the National Supplementary Health Agency for the same year. Data from the National Health Survey, and from the Beneficiaries Information System of the National Health Agency for the year 2013, were used. The percentage of people having a health plan was described according to stratification for: all of Brazil, urban/rural, Brazilian official Regions, Brazilian States and state capitals, gender, age group, level of schooling, position in the workforce, ethnic classification, and self-assessed state of health. Results include the following: The percentage of people saying they had some health plan in Brazil was 27.9% (CI 95%: 27.1-28.8). A significant difference was found relating to level of schooling – the percentage being highest for those who stated they had complete secondary education (68.8% CI 95%: 67.2-70.4) and for those who said they were currently in work (32.5% CI 95%: 31.5-33.5). The increase in health plan coverage in the Brazilian population reflects the improvement of the suply of employment and the growth in the country's economy.

Key words Pre-paid health plans; Prevalence of private health plans; Epidemiological surveys; Health services; Brazil

Introdução

O Sistema Único de Saúde (SUS) foi ordenado pela Constituição da República Federativa de 19881, cujos princípios são: universalidade, integralidade e equidade. Foi, ainda, estabelecido que o setor privado se organizaria de forma complementar ao público2. Desde então, foram estabelecidas normas e regulamentos para o funcionamento do setor suplementar, dentre eles a Lei 9.656/983, que determina regras para o funcionamento do setor, e a Lei 9.961/20004, que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), designando a esta a competência na elaboração de normas e a fiscalização das operadoras, inclusive quanto aos conteúdos e aos modelos assistenciais.

As operadoras de planos de saúde atuam no Brasil desde a década de 19405,6, e o subsetor Saúde Suplementar (SS) compreende o mercado de planos privados de assistência à saúde. O segmento comercial é composto pelas cooperativas de trabalho médico, cooperativas odontológicas, as empresas de medicina de grupo, as empresas de autogestão e as seguradoras2,7. Outro segmento, sem fins lucrativos, portanto, não alcançado pela regulação do Setor/ANS, constitui o segmento de Instituições Públicas, de instituição de assistência de servidor público (municipal, estadual ou militar).

O setor tem se expandido e, no final da década de noventa, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD 1998)8, estimou cerca de 38,7 milhões de brasileiros cobertos por pelo menos um plano de saúde, o que correspondia a 24,5% da população do país. Já na PNAD 20039, foi estimado que 24,6% da população brasileira tinha pelo menos um plano de saúde, passando para 25,9%, ou 49,2 milhões de pessoas no ano de 200810. Em 2013, em continuidade ao suplemento saúde da PNAD de anos anteriores, foi realizada a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), que incluiu no seu escopo informações sobre as características do setor da Saúde Suplementar, em especial sobre coberturas territoriais. A PNS ampliou, ainda, os temas pesquisados, como doenças crônicas, estilos de vida, dentre outros11.

As informações sobre coberturas de planos de saúde no Brasil são importantes para o monitoramento das tendências regionais e da distribuição sociodemográfica, permitindo o aperfeiçoamento das medidas de regulação pública11,12.

O objetivo deste artigo é descrever as coberturas de planos de saúde no Brasil, conforme características sociodemográficas, a partir dos dados da Pesquisa Nacional de Saúde realizada em 2013 e comparar com dados administrativos da Agência Nacional de Saúde Suplementar para este mesmo ano.

Métodos

Foram analisados os dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), inquérito domiciliar realizado no Brasil em 2013 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com o Ministério da Saúde. A PNS compõe o Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares (SIPD) do IBGE e utiliza a Amostra Mestra deste Sistema, que possui maior espalhamento geográfico e ganho de precisão das estimativas.

Utilizou-se de amostragem por conglomerados divididos em três estágios: tendo como unidade primária de amostragem os setores censitários; como unidade secundária, os domicílios; e como unidade terciária, um morador adulto (≥ 18 anos). Os domicílios e os moradores foram selecionados por amostragem aleatória simples. O tamanho mínimo de amostra definido foi de 1.800 domicílios por UF, sendo inicialmente selecionados 81.767 domicílios, sendo que as entrevistas foram obtidas em 64.348 deles. Considerando-se os domicílios fechados, a proporção de perdas foi de 20,8%, e a proporção de não resposta, de 8,1%13.

As estimativas fornecidas pela PNS foram ponderadas considerando o peso da Unidade Primária de Amostragem (UPA) em relação à probabilidade de fazer parte da pesquisa, o peso do domicílio, com ajustes para correção de não resposta e calibração pelos totais populacionais, e o peso do morador selecionado, que considera ainda a probabilidade de seleção do morador, ajustes de não resposta por sexo e calibração pelos totais populacionais por sexo e classes de idade estimados com o peso de todos os moradores. Outros detalhes sobre o processo de amostragem e ponderação estão disponíveis em publicações prévias13,14.

As entrevistas foram feitas com a utilização de computadores de mão (Personal Digital Assistance - PDA), programados para crítica de valores recebidos. O questionário da PNS foi dividido em três blocos: 1) informações do domicílio: um para cada domicílio; 2) informações de todos os moradores: um morador (proxy) respondia pelos demais que residiam no mesmo domicílio; e 3) morador selecionado: um morador adulto (com 18 anos ou mais) era selecionado para responder aos blocos específicos do questionário14.

As informações sobre posse de plano de saúde foram obtidas por meio do bloco para todos os moradores do domicílio. Assim, a PNS coletou informação válidas para 205.000 moradores14.

Foram analisadas informações sobre posse de planos de saúde referentes ao indicador:

1) Proporção (%) de pessoas que têm algum plano de saúde (médico ou odontológico), tendo como numerador: número de pessoas que têm algum plano de saúde; e denominador: soma do número de moradores de todos os domicílios visitados. O indicador foi analisado segundo características sociodemográficas: sexo (masculino e feminino), faixa etária (0 a 17, 18 a 29, 30 a 39, 40 a 59, 60 anos e mais), nível de instrução (sem instrução e fundamental incompleto, fundamental completo e médio incompleto, médio completo e superior incompleto, e superior completo); condição na força de ocupação (ocupado, desocupado e fora da força de trabalho); estado de saúde (muito bom e bom, regular, ruim e muito ruim); local de residência (urbano e rural); Grandes Regiões (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste); e Brasil.

As coberturas de planos para Brasil e Unidades da Federação foram comparadas com dados administrativos do Sistema de Informação de Beneficiários da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)15, de dezembro de 2013, visando manter a comparação com os dados coletados pela PNS, em 2013.

Ainda, foram investigados outros indicadores, também apresentado segundo características sociodemográficas:

2) Proporção (%) de pessoas que têm algum plano de saúde (médico ou odontológico) na situação de titular do plano. Numerador: número de pessoas que têm algum plano de saúde e são titulares do plano; Denominador: número de pessoas que têm algum plano de saúde;

3) Proporção (%) de pessoas que têm mais do que um plano de saúde (médico ou odontológico). Numerador: número de pessoas que têm mais de um plano de saúde; Denominador: soma do número de moradores de todos os domicílios visitados;

4) Proporção (%) de pessoas que têm algum plano de saúde apenas para assistência odontológica. Numerador: número de pessoas que têm algum plano de saúde apenas para assistência odontológica; Denominador: soma do número de moradores de todos os domicílios visitados;

5) Proporção (%) de pessoas cujo principal (ou único) plano de saúde é de instituição de assistência de servidor público (municipal, estadual ou militar). Numerador: número de pessoas cujo principal plano de saúde é de instituição de assistência de servidor público; Denominador: soma do número de moradores de todos os domicílios visitados;

6) Proporção (%) de pessoas que têm plano de saúde por mais de um ano sem interrupção. Numerador: número de pessoas que têm plano de saúde por mais de um ano sem interrupção; Denominador: soma do número de moradores de todos os domicílios visitados;

7) % de pessoas com plano e que avaliam o principal plano de saúde (médico ou odontológico) como bom ou muito bom (Numerador : % de pessoas com plano e que avaliam o principal plano de saúde (médico ou odontológico) como bom ou muito bom/ Pessoas com Plano de saúde)

Adicionalmente foram descritas os formatos de financiamento do plano:

8) Proporção (%) de pessoas cujo plano de saúde é pago pelo empregador do titular; (Numerador número de pessoas cujo plano é pago pelo empregador/ Denominador: Pessoas com Plano de saúde)

9) Proporção (%) de pessoas cujo plano de saúde é pago pelo titular através do trabalho atual ou anterior; (Numerador número de pessoas cujo plano é pago pelo titular através do trabalho atual ou anterior / Denominador: Pessoas com Plano de saúde)

10) Proporção (%) de pessoas cujo plano de saúde é pago diretamente pelo titular ou outro morador do domicílio; (Numerador número de pessoas cujo plano é pago diretamente pelo titular ou outro morador do domicílio / Denominador: Pessoas com Plano de saúde)

Estes indicadores foram descritos segundo: sexo (masculino e feminino); faixa etária (0 a 17, 18 a 29, 30 a 39, 40 a 59, 60 anos e mais); e nível de instrução (sem instrução e fundamental incompleto, fundamental completo e médio incompleto, médio completo e superior incompleto, e superior completo).

Foi utilizado o software Stata versão 11.0, por meio do módulo survey, que considera efeitos do plano amostral, sendo apresentadas as prevalências e os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%). As diferenças entre as categorias foram avaliadas pela sobreposição dos intervalos de confiança.

A PNS foi aprovada na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Todos os indivíduos foram consultados, esclarecidos e aceitaram participar da pesquisa.

Resultados

Do total de entrevistados pela PNS, a proporção de pessoas que referiu ter algum plano de saúde (médico ou odontológico) no Brasil foi de 27,9% (IC95%: 27,1-28,8), não havendo diferença por sexo. Quanto à faixa etária, houve diferença para as mais velhas (30-39, 40-59 e 60 e mais) em relação as anteriores (0-17 e 18-29), sendo que as proporções foram menores nestas últimas. No que se refere ao nível de instrução, as proporções aumentaram conforme os anos de estudo. Assim, a proporção de pessoas que referiu nível superior completo e posse de plano de saúde foi de 68,8% (IC95%: 67,2-70,4) enquanto para os sem instrução ou com ensino fundamental incompleto, esta proporção foi de 16,4% (IC95%: 15,7-17,1) (Tabela 1).

Tabela 1
Proporção de pessoas que possuem algum plano de saúde (médico ou odontológico), com intervalo de confiança de 95%, segundo características sociodemográficas - Brasil, Grandes Regiões e urbano/rural, Pesquisa Nacional de Saúde – 2013.

Para este mesmo indicador, houve, ainda, diferenças significativas para posição na força de ocupação, sendo que a proporção de pessoas que referiu ter plano de saúde foi maior entre aqueles com ocupação (32,5% IC95%: 31,5-33,5) em relação aos desocupados (16,3% IC95%: 14,4-18,1) ou fora da força de trabalho (24,7% IC95%: 23,6-25,7). Também foi encontrada diferença entre ter estado de saúde muito bom e bom (31,3% IC95%: 30,3-32,3) em relação aos demais. Diferença entre local de residência (urbano/rural) também foi encontrada, uma vez que a proporção foi maior em pessoas que residiam em área urbana (31,7% IC95%: 30,7-32,7). Com relação às regiões do país, a maior proporção de posse de plano de saúde se deu na região Sudeste (36,9% IC95%: 35,2-38,6) e a menor, na região Norte (13,3% IC95%: 12,2-14,4) (Tabela 1).

Os dados obtidos também foram comparados com dados administrativos da ANS, referentes ao mesmo período investigado. De acordo com dados da PNS e ANS, a região e a UF com maior cobertura de planos de saúde foi a Sudeste e São Paulo, respectivamente. Observou-se correspondência e/ou proximidade entre os dados da PNS e ANS em outras localidades também, como na região Norte, e nos estados do Maranhão, Rio Grande do Norte e Alagoas. No entanto, algumas UF apresentaram valores muito distintos, como Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás e Distrito Federal, por exemplo. A Figura 1 apresenta as proporções de posse de planos para Brasil, Grades Regiões e UF, com base nos dados referidos da PNS e do Sistema de Informação de Beneficiários da ANS.

Figura 1
Posse de planos de saúde segundo comparativo dos dados da Pesquisa Nacional de Saúde e do Sistema de Informação de Beneficiários da Agência Nacional de Saúde Suplementar - Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação – 2013.

A Tabela 2 apresenta os demais indicadores investigados segundo o sexo dos entrevistados. Houve diferença significativa com relação à posse de plano de saúde na condição de titular, em que a proporção foi maior para os homens (54,5% IC95%: 53,5-55,5) do que para as mulheres (41,8% IC95%: 40,6-43,0). Não obstante, também foram encontradas diferenças por sexo para: pessoas cujo plano de saúde é pago pelo titular através do trabalho, sendo maior nos homens (35,6% IC95%: 34,2-37,0); e pessoas cujo plano de saúde é pago diretamente pelo titular, sendo maior nas mulheres (27,7% IC95%: 26,5-28,8). Os demais indicadores não apresentaram diferenças significativas.

Tabela 2
Indicadores selecionados segundo a posse de planos de saúde por sexo, com intervalo de confiança de 95% - Brasil. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil – 2013.

A Tabela 3 apresenta os indicadores segundo faixa etária dos entrevistados. A proporção de pessoas com posse de plano de saúde exclusivamente odontológico foi maior em pessoas na faixa etária de 30 a 39 anos (7,3% IC95%: 6,6-7,9) em relação às demais. Para pessoas com plano de instituição de assistência de servidor público, maiores proporções foram encontradas nas faixas de 40 a 59 anos (8,0% IC95%: 7,4-8,6) e 60 anos e mais (8,7% IC95%: 7,9-9,4). Ainda, estas faixas também foram as que apresentaram as maiores proporções no que se refere a posse de plano de saúde por mais de um ano sem interrupção. A proporção de pessoas cujo plano de saúde foi pago diretamente pelo titular foi maior em pessoas com 60 anos ou mais (43,5% IC95%: 41,1-45,8).

Tabela 3
Indicadores selecionados segundo a posse de planos de saúde por faixa etária, com intervalo de confiança 95% - Brasil. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil – 2013.

A Tabela 4 apresenta os indicadores segundo nível de instrução dos entrevistados. Deste modo, diversos indicadores apresentaram diferenças significativas, com maiores proporções para nível superior completo: pessoas com plano de saúde na situação de titular do plano (67,4% IC95%: 66,0-68,8), pessoas com mais de um plano de saúde (8,5% IC95%: 7,6-9,4), pessoas que possuem plano de saúde exclusivamente odontológico (12,6% IC95%: 11,6-13,6), pessoas com plano de instituição de assistência de servidor público (17,8% IC95%: 16,7-19,0), pessoas que possuem plano de saúde por mais de um ano sem interrupção (63,4% IC95%: 61,7-65,1). Foi possível observar que ocorreu um incremento gradual nas proporções conforme aumento do nível de instrução. Assim, as menores proporções de posse de planos, em sua maioria, foram observadas na categoria na qual se enquadravam as pessoas sem instrução e com ensino fundamental incompleto (Tabela 4).

Tabela 4
Indicadores selecionados segundo a posse de planos de saúde por nível de instrução, com intervalo de confiança 95% - Brasil. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil – 2013.

Discussão

A proporção de pessoas com planos de saúde no país aumentou nos últimos cinco anos, chegando a 27,9%, ou cerca de 56 milhões de brasileiros em 2013. A proporção de planos é maior após os 30 anos de idade e para os que estão inseridos no mercado de trabalho, seguidos dos aposentados e idosos. Ainda, é maior entre pessoas com maior escolaridade, chegando a ser até quatro vezes maior entre os que têm nível superior completo, sendo ligeiramente mais frequente entre as mulheres. As populações das regiões Sudeste e Norte têm a maior e a menor cobertura de planos de saúde, respectivamente. Na região urbana, os planos são quatro vezes mais frequentes que na rural.

A PNS mostrou um aumento do número de beneficiários de planos de saúde no país, o que pode ser explicado pelo aumento do número de pessoas empregadas, crescimento econômico, maior disponibilidade de dinheiro, o que levou setores da população, em especial, pessoas com emprego formal e empresas, à aquisição dos mesmos10-12.

Este aumento coincide com os dados cadastrais da ANS, identificados pelo Sistema de Informações de Beneficiários. Tais dados apontam que o número de beneficiários no ano de 2008 era de, aproximadamente, 40 milhões, passando para 50 milhões em 2013, ou seja, um aumento de 25% em 5 anos. Porém, ressalta-se que os dados da ANS se referem ao número de planos, podendo um indivíduo possuir mais de um. Além disto, estes não incluem planos referentes aos servidores públicos, que não estão sob regulação da ANS15.

Outro dado que merece destaque é que os beneficiários de planos de saúde, em sua maioria, estão vinculados a planos coletivos15, o que já foi apontado na PNAD 200810, bem como nos dados administrativos da ANS. Estes indicam crescimento de 23,4 milhões de planos coletivos empresariais em 2008, para 33,7 milhões em 2014, além daqueles por adesão, que somaram cerca de 6,7 milhões em 2013, totalizando cerca de 40 milhões, ou aproximadamente 75% do mercado16. Alguns planos contratados coletivamente são patrocinados por empresas do país, e são referentes à população inserida no mercado de trabalho, ou seja, a população em idade produtiva14,16.

Além disso, o aumento da oferta de planos coletivos pode ser atribuído à legislação do setor, que define medidas como fixação de valores máximos de reajuste para os planos individuais, sendo que o mesmo não ocorre entre primeiros, pressupondo que o mercado poderia regular os reajustes dos preços. Assim, os planos coletivos se tornaram mais competitivos e atrativos, além de oferecerem um grande número de beneficiários, na grande maioria de população inserida no mercado, em idade produtiva, mais jovem e com menor risco de adoecimento. Estes movimentos acabaram por aumentar o custo dos planos individuais, levando a redução de demanda e oferta12.

Embora tenha aumentado a proporção de planos, as variações regionais persistiram. As diferenças entre populações urbana e rural foram significantes, bem como entre as Regiões brasileiras e as Unidades da Federação. Dados de PNADs anteriores já apontaram a diferença entre o Sudeste e Sul do país e as demais regiões, o que persistiu nesta edição, talvez pela maior concentração da riqueza, empregos, bem como maior parcela da população nessas duas regiões10,17. Entretanto, o maior crescimento da cobertura ocorreu na região Centro-Oeste do país: 24,5% em 2008 para 30,4% em 2013, aumento de 24%14.

Outro diferencial foi a maior proporção de planos entre pessoas com maior escolaridade. A escolaridade é tida como proxy de renda e tem sido apontada como fator determinante no acesso aos serviços de saúde2,18,19. Outros estudos também apontam que a escolaridade está fortemente associada à posse de um plano de saúde7,20,21.

A PNS mostra um segmento que não é abrangido pelos dados administrativos da ANS, que são os planos de assistência ao servidor público Estadual, Municipal ou Militar. São cerca de 6,1% da população, ou aproximadamente 12 milhões, com maior proporção no Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul, bem como para as pessoas acima de 40 anos e com maior escolaridade. Portanto, apenas dados de base populacional podem monitorar a distribuição destes planos14. Esta diferença no cadastro da ANS também explica a diferença encontrada nos dados referidos da PNS.

A PNS apontou que crianças e jovens têm menor cobertura nos planos de saúde, o que pode ser explicado por serem populações mais saudáveis, e com isto as famílias retardariam a adesão deles. Além disto, pela legislação em vigor, foram estabelecidas dez faixas etárias e seis de reajustes dos planos, e os custos destes devem ser distribuídos entre todos e não concentrados entre os mais idosos, ou seja, a criação do princípio da solidariedade intergeracional. Desta forma, os custos dos planos para as faixas etárias de idade iniciais é maior, e populações até 59 anos pagam mensalidades maiores que o risco de sua idade, e os idosos pagam mensalidades inferiores ao risco associado à sua faixa etária22,23. Este mecanismo também estimulou a entrada nos planos de pessoas já inseridos no mercado de trabalho, com faixas de idade produtivas, em geral nos coletivos.

A PNS apontou uma elevada participação de idosos nos planos, o que pode ser compreendido pela maior necessidade em saúde nesta faixa, em função da maior morbidade. Com aumento da idade, tende a haver maior procura dos planos, pretendendo maior acesso à assistência15,19. Estudos no Japão, demonstram que os gastos per capita em saúde para pessoas com mais de 75 anos são 7,5 vezes superiores do que para os jovens entre 15 e 19 anos de idade24. Estudos europeus também apontam que os gastos aumentam com a idade em até 10 vezes acima de 70 anos em relação aos gastos para as faixas etárias dos 5 aos 19 anos25, Mostrando a importância na medida de estabelecer a solidariedade intergeracional para a cobertura dos custos comuns entre idosos23.

Em outros países, fatores como cor branca, escolaridade, renda, faixas etárias mais velhas e pessoas inseridas no mercado de trabalho também estão associados a posse de plano, bem como menor cobertura entre jovens26-28. Este padrão se repete em estudos nacionais11,29,30.

A autoavaliação do estado de saúde é um indicador utilizado internacionalmente como medida objetiva de morbidade e de uso de serviços, constituindo um poderoso preditor da mortalidade e, portanto, seria um indicativo de maior utilização de serviços e de mais gastos31. Houve maior posse de planos entre pessoas que avaliam seu estado de saúde como bom, podendo refletir a maior concentração de planos entre adultos em idade produtiva, por serem inseridos no mercado de trabalho e terem acesso aos planos coletivos. Estas populações são mais saudáveis e têm menor risco de adoecimento. Além disto, populações com planos têm maior escolaridade e renda e, em geral, melhor acesso a serviços de saúde, assistência e práticas de promoção à saúde e portanto, melhor avaliam a própria saúde12,29,30. A concentração entre os que têm melhor estado de saúde, também reflete o crescimento dos planos coletivos, com pessoas mais jovens e com menor risco de adoecimento. O elevado custo dos planos individuais e a regra de doença pré-existente13 dificultam a entrada de pessoas doentes.

Conclusão

O aumento da cobertura de planos de saúde na população brasileira reflete a melhora da oferta de empregos e do crescimento da economia do país.

Informações de base populacional constituem um grande desafio no conhecimento das características do setor, como distribuição regional, distribuição sociodemográfica, faixa etária, escolaridade, renda, posse de planos, dentre outros, apoiando as políticas públicas de regulação do setor.

Estes dados podem apoiar políticas de saúde, inclusive orientar políticas de regulação setorial.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan 2017

Histórico

  • Recebido
    24 Set 2015
  • Revisado
    06 Nov 2015
  • Aceito
    08 Nov 2015
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