Acessibilidade / Reportar erro

YOUDALE, Roy. Using Computers in the Translation of Literary Style: Challenges and Opportunities. New York/London: Routledge, 2020, 242pp.

YOUDALE, Roy. Using Computers in the Translation of Literary Style: Challenges and Opportunities. New York/London: Routledge, 2020. 242pp

Roy Youdale é um pesquisador afiliado à University of Bristol, na Inglaterra. Sua área de pesquisa é os Estudos da Tradução. Sua importância para a área vem de suas numerosas publicações, dentre as principais o livro Using Computers in the Translation of Literary Style: Challenges and Opportunities. Atua também como tradutor, tendo traduzido o romance Gracias por el fuego, do uruguaio Mario Benedetti durante seu doutorado. O principal objetivo com o livro é expor seu método de tradução, indicando os benefícios do uso de máquinas de tradução.

Neste livro, Roydale expõe sua visão sobre o uso de computadores na tradução de obras literárias. Logo de início, o autor enfatiza a interdisciplinaridade entre estudos literários e estudos da tradução. Em primeiro lugar, o autor não defende a ideia de tradução automática ou tradução assistida por computador. Na verdade, ele busca criar uma ponte entre o tradutor e a tecnologia, dando sugestões para um melhor funcionamento dessa relação. O foco do autor é o uso de ferramentas da linguística de corpus na tradução do estilo literário, buscando aproximar a tecnologia da prática de tradução.

O livro é dividido em 8 capítulos, cada um dedicado a uma temática, abordada em diferentes tópicos. No primeiro capítulo, o autor inicia discutindo a afirmação de Sin-Wai Chan de que todas as traduções atualmente utilizam computadores, de forma direta ou indireta. Essa afirmação se baseia no fato de que atualmente os mais importantes meios de comunicação estão disponíveis na internet, de modo que para divulgar uma tradução é necessário usar recursos computacionais. Afirma-se também que os computadores ajudaram a diminuir o trabalho de tradução; assim, um livro que normalmente seria traduzido por seis tradutores, agora pode ser feito por somente um. Tal ideia vai de encontro ao que aconteceu no processo de industrialização, em que o uso de tecnologias diminui o trabalho braçal humano, aumentando assim a produção e automatizando processos tradutórios.

Nos páginas seguintes, o autor discute a história da tradução automática, mostrando sua evolução ao longo do tempo. Além de explicitar esse processo, Youdale explica o funcionamento das primeiras MTs (Machine Translation), o que é importante para dar o contextualizar a temática da obra. É possível perceber que todas as MTs tinham necessidade de intervenção humana, pois em algumas das máquinas era necessário que as pessoas alimentassem a máquina com informações, para que os algoritmos pudessem entender como traduzir determinadas frases. O autor ressalta que as primeiras máquinas de tradução não ofereciam bons resultados, pois os algoritmos eram incapazes de compreender o texto a ser traduzido.

Após uma explicação técnica sobre como funcionam as MTs, o autor fala sobre a influência que o campo da tradução sofreu com a implementação de diferentes tecnologias. De início, ele mostra que, contrariamente aos tempos mais antigos, hoje em dia existe um corpo de estudos sobre o assunto. O autor utiliza os estudos de Pym, como veremos abaixo para fundamentar sua afirmação:

Segundo Pym ‘[…] whereas much of the translator’s skillset and effort was previously invested in identifying possible solutions to translation problems (i.e., the generative side of the cognitive process), the vast majority of these skills and efforts are now invested in selecting between available solutions (i.e., the selective side of the cognitive processes)’.

(Apud Youdale, 14Youdale, Roy. Using Computers in the Translation of Literary Style: Challenges and Opportunity. London/New York: Routledge. 2020.)

A ideia é que o tradutor já tem várias possibilidades de tradução de uma determinada frase ou palavra; assim, o autor não perde tempo criando essas possibilidades. Excluir a tecnologia dos métodos de tradução não seria uma ideia boa, pois a mesma já foi incorporada à prática tradutória. Claro que, mesmo com o auxílio positivo dos computadores, o mau uso desses novos artifícios pode gerar grandes consequências, segundo Youdale:

While TMs have undoubtedly increased productivity, improved consistency and eliminated some boring and repetitive tasks (LeBlanc 2017:48), they have also led to some adverse consequences: ‘TMs render the translator’s work more mechanical and, when misused, may lead to deskilling and may have an effect on the translator’s professional satisfaction’ (Ibidem) as well as lowering rates of pay.

(Youdale, 14Youdale, Roy. Using Computers in the Translation of Literary Style: Challenges and Opportunity. London/New York: Routledge. 2020.).

Nesse caso, pode existir uma queda na qualidade do produto e também na remuneração do tradutor, em princípio pelo fato do computador ter feito a maior parte do trabalho. Mas, podemos entender que se o tradutor usar de forma correta a tecnologia, teremos uma tradução rápida e de qualidade. Então é perceptível que o controle da tradução continua nas mãos do tradutor, sendo a máquina apenas uma ferramente, semelhante a um lápis ou uma caneta.

Ainda no capítulo 1, o autor busca expressar e fundamentar o uso das CAT tools em traduções literárias. No primeiro ponto, ele apresenta opiniões divergentes de vários autores. O primeiro compreende que as CAT tools só se aplicam a traduções comerciais, dando a entender que não são úteis na tradução literária. Já o segundo mostra situações em que as CAT tools ajudam na tradução literária, especificamente no glossário. Tais opiniões mostram uma mudança, não do mesmo autor, mas sim da comunidade científica. De certa maneira, o autor acredita na evolução dos computadores no âmbito da tradução.

Avançando em sua argumentação, Youdale busca contextualizar o uso de computadores nos Estudos da Tradução (ET). As tecnologias computacionais entraram de forma mais efetiva na área dos estudos da tradução no início dos anos de 1990. Segundo o autor, os estudos de corpora nos Estudos da Tradução (corpus-based translation studies) compilaram textos em computadores e contabilizaram resultados válidos através de aplicativos. Esses processos auxiliam no uso de máquinas em pesquisas na área de humanas, o que contribuiu para diminuir o preconceito que muitos pesquisadores têm contra a utilização dos recursos computacionais. Para o autor, “Shoshana Blum-Kulka’s (1986) explicitation hypothesis and Gideon Toury’s suggestion that there might be ‘universal’ laws of translation (2012) are perhaps two of the best-known examples”. Com essa ideia de leis universais da tradução, é possível pensar que um dia existirá um algoritmo capaz de utilizar tais leis.

A complexidade do texto literário é fator reconhecido e pertinente. Um dos elementos dessa complexidade é a multiplicidade de interpretações que o texto literário pode ter. Contudo, pequenas frases simples e objetivas, podem, sim, ser traduzidas pelas CAT tools. É o que o autor afirma na seguinte passagem:

A TM, the quintessential CAT tool, has been shown to work best on texts which are repetitive, linguistically regular and contain fairly short sentences. The system draws on a parallel bilingual database of translated texts and automatically suggests a possible translation for each new segment of text, usually a sentence.

(Youdale, 18Youdale, Roy. Using Computers in the Translation of Literary Style: Challenges and Opportunity. London/New York: Routledge. 2020.)

Com o referencial fornecido pelo autor e suas ideias, é possível compreender que as CAT tools ajudam na tradução literária e reforçam a função do tradutor de avaliar a tradução feita pelo software e utilizar a ferramenta de forma consciente. Em seguida, o autor usa de forma prática a sua visão, na tradução do livro Gracias por el fuego.

Após explicar o que são as CAT tools e sua importância para os estudos da tradução, Youdale busca, nos capítulos seguintes de seu livro, mostrar o passo a passo utilizado na sua tradução. Um dos primeiros pontos é a análise do texto fonte, que foi dividida em estrutura e estilo. Youdale parte do pressuposto de que a análise do texto está ligada à interpretação e apreciação da obra, junto com o funcionamento do texto como um fenômeno comunicativo e linguístico, pressuposto este formulado por Leech (195)Leech, Geoffrey. Language in Literature: Style and Foregrounding. Harlow: Pearson Longman, 2008..

Logo no início da análise, o autor expõe de forma clara o uso da abordagem CDR (Close and Distant Reading), buscando detalhes importantes da obra. Em outra seção do livro, temos informações sobre Mario Benedetti, cujo livro será traduzido. Então, começa a utilização de computadores para a análise rápida do texto de origem; vale ressaltar que o computador, nessa etapa, é utilizado apenas como auxiliar, pois o tradutor tem total controle do texto final. As informações obtidas são simples, mas úteis, como a frequência de palavras utilizadas, palavras-chave e tamanho médio das frases. Cada um desses itens vai auxiliar nas escolhas tradutórias, ajudando a entender determinados padrões de escrita do autor.

Na sequência, o autor volta a utilizar o CDR de forma mais diversificada, buscando novos resultados, e acaba encontrando informações sobre o título e a caracterização. Nesses pontos, são descobertos os personagens, as interações entre eles e os discursos de cada personagem. Assim, Youdale consegue mostrar a aplicabilidade do CDR de forma efetiva, validando o uso dessa abordagem na sua pesquisa.

O aspecto cultural é levado em conta no livro, pois Youdale acredita que “in a real sense the understanding and appreciation of a work of literature will be ‘tied to a specific context’, that of its birth.” (98). Por acreditar nisso, ele prioriza a cultura da época em suas traduções, e usa o método CDR para conseguir informações sobre aspectos pontuais. Essas informações são o uso de diferentes idiomas no texto de origem, itens específicos da cultura e o uso da palavra “usted” em um contexto interpessoal formal. O texto foi marcado e quantificado nessas ocorrências e cada ponto específico é analisado e traduzido de forma individual, mas sempre levando em conta os dados obtidos com o CDR.

Outro ponto analisado é a pontuação; seu argumento é que a pontuação tem uma grande importância na obra original e que a pontuação influencia a tradução. Com isso, ele leva em conta que o comprimento e a estrutura das frases são características importantes de Gracias por el fuego. Utilizando o CDR, ele avalia a estilística do texto fonte. Foi assim que ele percebeu que a maior parte do texto era constituída de frases curtas, com a função de prender o leitor à narrativa. A análise quantitativa serviu para revelar detalhes da estrutura do texto, o que serve de auxílio ao tradutor para reproduzir parte da estrutura do texto fonte.

Nesse ponto do livro, o autor já tem um rascunho da tradução de Gracias por el fuego; com isso, ele usa o método CDR no próprio texto recriado e faz uma comparação com o texto fonte. Segundo Youdale, “the goal I set myself was to stick very closely to Benedetti’s style in an attempt to achieve an equivalence of stylistic effect in the translation as far as possible.” (153). Na comparação entre os textos, o autor notou algumas diferenças e percebeu que manter as estruturas em frases curtas foi extremamente difícil, pois compactar a tradução na mesma quantidade de palavras e mantendo o sentido era complicado. Nas frases longas, o autor sentia a necessidade de dividir a sentença em várias, seguindo o padrão hegemônico atual nas editoras britânicas e americanas. Com todas essas diferenças, a análise por CDR do texto fonte com a tradução teve como objetivo perceber as diferenças de escrita, para que correções acontecessem; assim, o autor conseguiria deixar o texto com a estética mais próxima do texto fonte.

O último ponto de análise é do seu próprio texto traduzido. Youdale utiliza o CDR para analisar antigas traduções suas feitas do espanhol para o inglês, buscando encontrar padrões de escrita. Outro ponto era saber até onde seus “vícios” de tradução vão de encontro com as ideias “universais da tradução”. Esse ponto de autoanálise é fundamental para todo pesquisador, pois existe uma necessidade do pesquisador-tradutor de conhecer seu estilo de tradução e entender o próprio processo de tradução, tanto quanto os ganhos obtidos ao longo da carreira.

Finalmente, é clara a tentativa de Youdale de criar um Benedetti cuja língua materna é o inglês. Em momento algum isso é algo ruim; pelo contrário, o esforço para alocar a obra em um novo contexto sem que ela perca a relevância é algo complexo. As estratégias usadas pelo autor, com o uso do CDR e a quantidade de informações obtidas são uma ferramenta em sua função de tradutor. O foco do livro é mostrar que a utilização de computadores pode, sim, ajudar na tradução de um texto literário, pois quanto mais informações o autor tiver sobre o livro, mais caminhos ele pode seguir em sua tradução. O autor consegue expor seu ponto de vista muito bem e oferece aos colegas tradutores uma nova visão sobre o processo de tradução, auxiliando no crescimento da área.

Referências

  • Youdale, Roy. Using Computers in the Translation of Literary Style: Challenges and Opportunity London/New York: Routledge. 2020.
  • Leech, Geoffrey. Language in Literature: Style and Foregrounding Harlow: Pearson Longman, 2008.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2021
  • Aceito
    10 Dez 2021
  • Publicado
    Fev 2022
Universidade Federal de Santa Catarina Campus da Universidade Federal de Santa Catarina/Centro de Comunicação e Expressão/Prédio B/Sala 301 - Florianópolis - SC - Brazil
E-mail: suporte.cadernostraducao@contato.ufsc.br