Resumo
Este artigo oferece uma teoria para explicar como partidos políticos influem nos investimentos discricionários de ministérios no Brasil. Ao contrário de estudos anteriores que assumem que presidentes centralizam decisões alocativas do Governo Federal, argumento que eles e elas as partilham com outros partidos quando oferecem ministérios ao formar coalizões de governo. Uma vez no comando de um ministério, partidos passam a exercer influência e adquirir expertise sobre os investimentos geridos por suas pastas, o que, por sua vez, incentiva seus correligionários locais a pedir, e também receber, mais recursos destas. Dados que cobrem mais de 20 anos de transferências discricionários de ministérios a prefeituras no Brasil e um desenho de triplas-diferenças dão suporte à teoria. Em particular, os resultados mostram que prefeitos tanto demandam quando recebem até um terço a mais de transferências vindas de ministérios comandados por correligionários, efeito que é maior em anos eleitorais e em ministérios que investem mais em infraestrutura local, sem distinção entre partido na Presidência e parceiros de coalizão. Por outro lado, não há evidência de que ministros manipulam diretamente a burocracia para beneficiar aliados. No geral, esses achados indicam que partidos políticos extraem benefícios não-programáticos da ocupação de ministérios no Brasil.
política distributiva; presidencialismo de coalizão; ministérios; relações intergovernamentais; federalismo
Abstract
This paper provides a theory to explain how political parties influence cabinet portfolios’ targeted discretionary investments in Brazil. Contrary to previous studies that claim presidents centralize allocative decisions for electoral gains, I argue that they share them with coalition parties when they offer portfolios to obtain legislative support. Conversely, coalition parties acquire influence and expertise on portfolio-specific spending, incentivizing local incumbents to request more transfers from portfolios held by co-partisan ministers. Data covering more than twenty years of discretionary investments from cabinet portfolios to municipalities in Brazil and a triple-difference design support the theory. Results show that mayors demand and receive up to one-third more transfers from portfolios administered by co-partisan politicians, an effect that benefits both presidents’ and coalition parties alike. In addition, this effect is greater in election years and among portfolios responsible for local infrastructure. I find no evidence that ministers or their staff directly manipulate the bureaucracy to favor co-partisan mayors. These findings indicate that political parties reap non-programmatic benefits from joining government coalitions in Brazil.
distributive politics; coalitional presidentialism; cabinet portfolios; intergovernmental relations; federalism
Résumé
Cet article propose une théorie pour expliquer comment les partis politiques influencent les investissements discrétionnaires des ministères au Brésil. Contrairement aux études précédentes qui supposent que les présidents centralisent les décisions d’attribution du gouvernement fédéral, je soutiens qu’ils les partagent avec d’autres partis lorsqu’ils offrent des ministères lors de la formation de coalitions gouvernementales. Une fois en charge d’un ministère, les partis commencent à exercer une influence et à acquérir une expertise sur les investissements gérés par leurs ministères, ce qui, à son tour, encourage leurs coreligionnaires locaux à demander, et aussi à recevoir, plus de ressources de leur part. Les données couvrant plus de 20 ans de transferts discrétionnaires des ministères aux municipalités au Brésil et une conception à triples différences appuient la théorie. En particulier, les résultats montrent que les maires demandent et reçoivent jusqu’à un tiers de transferts supplémentaires des ministères dirigés par des coreligionnaires, un effet qui est plus important les années électorales et dans les ministères qui investissent davantage dans les infrastructures locales, quel que soit le parti à la présidence et les partenaires de la coalition. D’un autre côté, rien ne prouve que les ministres manipulent directement la bureaucratie au profit des alliés. Dans l’ensemble, ces résultats indiquent que les partis politiques tirent des avantages non programmatiques de l’occupation des ministères au Brésil.
politique de distribution; présidentialisme de coalition; ministères; relations intergouvernementales; fédéralisme
Resumen
Este artículo ofrece una teoría para explicar de qué forma los partidos políticos influyen en las inversiones discrecionales de los ministerios en Brasil. Contrario a estudios anteriores que asumen que presidentes centralizan las decisiones de asignación del Gobierno Federal, aquí argumento que ellos y ellas comparten dichas decisiones con otros partidos cuando ofrecen ministerios al formar coaliciones de gobierno. Una vez que asumen un ministerio, los partidos pasan a ejercer influencia y a adquirir experticia sobre las inversiones gestionadas por sus despachos, lo que, a su vez, incentiva a sus correligionarios locales a pedir, y también a recibir, más recursos de estos. Con datos que abarcan más de 20 años de transferencias discrecionales de ministerios a alcaldías en Brasil y a partir de un diseño de diferencias triples, se da soporte a la teoría. En particular, los resultados muestran que los alcaldes demandan y reciben hasta un tercio adicional de transferencias que provienen de ministerios dirigidos por sus correligionarios, efecto que se torna mayor en años electorales y en ministerios que invierten más en infraestructura local, sin haber diferencias entre el partido en la Presidencia y los partidarios de la coalición. Por otro lado, no hay evidencia de que los ministros manipulen directamente la burocracia para beneficiar a sus aliados. En general, estos resultados indican que los partidos políticos extraen beneficios no programáticos al ocupar ministerios en Brasil.
política distributiva; presidencialismo de coalición; ministerios; relaciones intergubernamentales; federalismo
Introdução
Decidir onde alocar recursos discricionários é uma das tarefas mais comuns do governo central no Brasil. Isso inclui a transferência de milhões de reais todos os anos para a construção de postos de saúde, escolas e estradas em algumas regiões em vez de outras. Não menos importante, decisões como essas têm consequências eleitorais para os presidentes que chefiam o governo: ao alocar mais recursos em localidades comandadas por partidos que integram a coalizão nacional, contribuem para o desempenho eleitoral de seus aliados; simultaneamente, punem rivais locais.
Certamente essa é uma visão estilizada de como presidentes influem na alocação de recursos discricionários. No entanto, ela é documentada por vários trabalhos que mostram que presidentes brasileiros beneficiam municípios comandados por partidos na coalizão ( Bueno, 2018BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. ; Brollo e Nannicini, 2012BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. ; Bugarin e Marciniuk, 2017BUGARIN, Mauricio; MARCINIUK, Fernanda. (2017), “Strategic Partisan Transfers in a Fiscal Federation: Evidence from a New Brazilian Database”. Journal of Applied Economics, v. 20, n. 2, pp. 211-239. ; Ferreira e Bugarin, 2007FERREIRA, Ivan; BUGARIN, Mauricio. (2007), “Transferências voluntárias e ciclo político-orçamentário no federalismo fiscal brasileiro”. Revista Brasileira de Economia, v. 61, n. 3, pp. 271-300. ), impedindo assim que oposicionistas locais se apropriem do crédito pelos investimentos (ver Bueno, 2018BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. ). No centro da explicação, isso seria possível porque, pela enorme influência no orçamento que possuem, esses presidentes centralizariam as decisões distributivas de seus governos ( Brollo e Nannicini, 2012BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. ). A política de alocação de recursos do executivo nacional seria, assim, a política distributiva do chefe do governo.
Este artigo oferece outro mecanismo para explicar por que municípios aliados recebem mais recursos do governo central no Brasil: a de que decisões distributivas do governo são compartilhadas pelos partidos na coalizão. Conforme sustento, isso ocorre porque são os ministérios que implementam os investimentos locais do governo, e também porque presidentes frequentemente delegam o comando deles a outros partidos em troca de apoio legislativo. Analiticamente, o argumento que sustento é relativamente simples: contando com ministros correligionários, políticos locais adquirem vantagem informacional para demandar recursos das pastas ocupadas pelos seus partidos. Em outras palavras, sustento que, ao oferecer ministérios a parceiros de coalizão, presidentes partilham a política distributiva do governo.
Analiso uma série de duas décadas de transferências discricionárias feitas pelos ministérios para prefeituras para testar esse argumento. Explorando o fato de que ministros são nomeados e demitidos por razões exógenas aos prefeitos, utilizo um desenho de diferença-em-diferenças para estimar o efeito do alinhamento partidário sobre a quantia de recursos ministeriais recebidos pelos municípios. Com essa estratégia, mostro que estes recebem cerca de 25% mais repasses quando ministro e prefeito são correligionários, chegando a 55% em anos de eleições gerais. Além disso, mostro que esse efeito não é exclusividade de um mandato presidencial ou de um ministério, e é positivo tanto para partidos na Presidência quanto para parceiros de coalizão – uma vez que se tome os ministérios como unidade de análise, diferentemente de estudos anteriores
Em um segundo momento, utilizo microdados de implementação das transferências dos ministérios para investigar os mecanismos do alinhamento partidário. Além de replicar meus achados principais nessa base, ofereço evidências consistentes com o argumento levantado: prefeituras demandam mais repasses de ministérios alinhados e recebem mais recursos por meio de emendas orçamentárias oriundas dessas pastas, o que interpreto como indício de que parlamentares são um elo na relação intrapartidária entre níveis local e nacional. Por outro lado, os resultados não permitem afirmar que ministros interferem diretamente para beneficiar determinadas localidades. Isso evidencia que não é a influência direta de presidentes ou de políticos nacionais sobre o orçamento federal o que explica o viés na alocação de recursos documentado pela literatura anterior, mas, sim, a articulação entre políticos de um mesmo partido situados em níveis diferentes de governo.
Ao mostrar que a política distributiva é compartilhada pelos partidos na coalizão, faço algumas contribuições neste artigo. Primeiro, ao oferecer evidência empírica, usando diferentes desenhos de pesquisa, de que tanto partidos na Presidência quanto parceiros de coalizão extraem benefícios não programáticos da ocupação de ministérios no presidencialismo de coalizão, robustecendo o nosso entendimento sobre o que está em jogo na formação e manutenção de governos multipartidários. Mais importante, mostro que a política distributiva do governo não é centralizada pelos presidentes. Quando ministérios são compartilhados com outros partidos, a coalizão divide as decisões de onde investir recursos – o que significa que algumas regiões acabam sendo melhor atendidas que outras apenas por razões políticas. Por tudo isso, o artigo ilustra como estudos sobre política distributiva podem se beneficiar ao tomar ministérios e equivalentes como unidade de análise.
Uma teoria distributiva
Uma teoria sobre como a política influencia transferências intergovernamentais discricionárias deveria oferecer respostas a perguntas como essas: 1) Por que alguns governos subnacionais são beneficiados com mais recursos? 2) Quem comanda esse processo? 3) Como governos subnacionais beneficiados são selecionados? 4) Como são identificadas as demandas de cada um deles? Argumento que a visão majoritária na literatura especializada não responde adequadamente às últimas duas questões, porque parte de uma resposta insuficiente para a segunda. Tendo como caso o Brasil, desenvolvo uma teoria simples que tem como elementos centrais partidos e ministérios. Além de estar em linha com o processo burocrático das transferências, ela avança ao oferecer respostas para questões negligenciadas pela literatura corrente e, também, ao iluminar alguns aspectos do funcionamento do presidencialismo de coalizão.
Alinhamento partidário e viés alocativo
Este artigo lida com uma proposição disseminada na literatura sobre política distributiva: a de que regiões comandadas por políticos alinhados com o governo central recebem mais recursos do que outras governadas por políticos de partidos oposicionistas. Em uma revisão sobre o tema, Golden e Min (2013)GOLDEN, Miriam; MIN, Brian. (2013), “Distributive Politics around the World”. Annual Review of Political Science, v. 16, pp. 73-99. documentam ocorrências desse fenômeno tanto em democracias recentes quanto em outras mais antigas. Como mostram Larcinese et al. (2006)LARCINESE, Valentino; RIZZO, Leonzio; TESTA, Cecilia. (2006), “Allocating the US federal Budget to the States: The Impact of the President.” The Journal of Politics, v. 68, n. 2, pp. 447-456. , por exemplo, pertencer ao partido na Presidência prediz um aumento de nada menos que 135 dólares per capita anuais nas receitas recebidas pelos estados americanos entre 1982 e 2000 (ver também Berry et al. , 2010). Evidência de países tão diferentes como Chile, Espanha, Portugal, Reino Unido e Índia, além disso, mostram que esse viés partidário na alocação de recursos independe da composição do eleitorado – isto é, o compartilhamento de filiação entre políticos nacionais e locais causa distorções na alocação de bens públicos ( Bohlken, 2018BOHLKEN, Anjali. (2018), “Targeting Ordinary Voters or Political Elites? Why Pork Is Distributed Along Partisan Lines in India”. American Journal of Political Science, v. 62, n. 4, pp. 796-812. ; Corvalan et al. , 2018CORVALAN, Alejandro; COX, Paul; OSORIO, Rodrigo. (2018), “Indirect Political Budget Cycles: Evidence from Chilean Municipalities”. Journal of Development Economics, v. 133, n. 1, pp. 1-14. ; Curto-Grau et al. , 2018CURTO-GRAU, Marta; SOLÉ-OLLÉ, Albert; SORRIBAS-NAVARRO, Pilar. (2018), “Does Electoral Competition Curb Party Favoritism?”. American Economic Journal: Applied Economics, v. 10, n. 4, pp. 378-407. ; Fouirnaies e Mutlu-Eren, 2015FOUIRNAIES, Alexander; MUTLU-EREN, Hande. (2015), “English Bacon: Copartisan Bias in Intergovernmental Grant Allocation in England”. The Journal of Politics, v. 77, n. 3, pp. 805-817. ; Toro, 2019TORO, Sergio. (2019), “Tactical Distribution in Local Funding: The Value of an Aligned Mayor”. European Journal of Political Economy, v. 56, n. 1, pp. 74-89. ; Migueis, 2013MIGUEIS, Marco. (2013), “The Effect of Political Alignment on Transfers to Portuguese Municipalities”. Economics & Politics, v. 25, n. 1, pp. 110-133. ; Sollé-Ollé e Sorribas-Navarro, 2008SOLÉ-OLLÉ, Albert; SORRIBAS-NAVARRO, Pilar. (2008), “The Effects of Partisan Alignment on the Allocation of Intergovernmental Transfers. Differences-In-Differences Estimates for Spain”. Journal of Public Economics, v. 92, n. 12, pp. 2302-2319. ).
Invariavelmente, as origens desse viés têm raízes eleitorais. Para alguns trabalhos, premiar governos subnacionais de correligionários evitaria que oposicionistas locais se apropriassem dos créditos dos investimentos ( Arulampalam et al. , 2009ARULAMPALAM, Wiji; DASGUPTA, Sugato; DHILLON, Amrita; DUTTA, Bhaskar. (2009), “Electoral Goals and Center-State Transfers: A Theoretical Model and Empirical Evidence from India”. Journal of Development Economics, v. 88, n. 1, pp. 103-119. ). Essa estratégia seria incentivada pela capacidade limitada que os eleitores geralmente têm em distinguir a origem dos recursos recebidos pelas suas regiões, especialmente os que vivem em países com descentralização fiscal. Nesses casos, se um governo central investir recursos em uma região governada pela oposição, corre o risco de perder o crédito pelo investimento para o governo local, uma vez que este está em melhor posição para reivindicar para si o crédito pelos investimentos. Com essa tática, portanto, políticos locais garantem que aliados farão o credit claiming dos recursos repassados. Para outros trabalhos, a explicação seria mais direta: premiando aliados locais, governos centrais obteriam seus apoios nas eleições ( Brollo e Nannicini, 2012BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. ). A predição nos dois casos, entretanto, é a mesma.
No Brasil, o viés partidário na alocação de recursos é bem documentado. Entre 1999 e 2010, Brollo e Nannicini (2012)BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. sustentam que prefeituras alinhadas com as coalizões de governo federal receberam até 40% mais repasses em infraestrutura, chamando a atenção para o fato de que partidos na Presidência foram os principais beneficiários dessas alocações. Evidência similar também é encontrada por Bueno (2018)BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. , Ferreira e Bugarin (2007)FERREIRA, Ivan; BUGARIN, Mauricio. (2007), “Transferências voluntárias e ciclo político-orçamentário no federalismo fiscal brasileiro”. Revista Brasileira de Economia, v. 61, n. 3, pp. 271-300. , Nunes (2013)NUNES, Felipe. (2013), “Core Voters or Local Allies? Presidential Discretionary Spending in Centralized and Decentralized Systems in Latin America”. SSRN. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=2278719> ou <http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2278719>
https://ssrn.com/abstract=2278719...
Bugarin e Marciniuk (2017)BUGARIN, Mauricio; MARCINIUK, Fernanda. (2017), “Strategic Partisan Transfers in a Fiscal Federation: Evidence from a New Brazilian Database”. Journal of Applied Economics, v. 20, n. 2, pp. 211-239. com dados de transferências voluntárias; e, com evidência mais limitada para os primeiros governos após a redemocratização, por Ames (2002)AMES, Barry. (2002), The Deadlock of Democracy in Brazil. Ann Arbor, University of Michigan Press. . Amorim Neto e Simonassi (2013)AMORIM NETO, Octavio; SIMONASSI, Andrei Gomes. (2013), “Bases políticas das transferências intergovernamentais no Brasil (1985-2004)”. Brazilian Journal of Political Economy, v. 33, n. 4, pp. 704-725. , expandindo em relação a um trabalho anterior de Arretche e Rodden (2004)ARRETCHE, Marta; RODDEN, Jonathan. (2004), “Política distributiva na federação: estratégias eleitorais, barganhas legislativas e coalizões de governo”. Dados, v. 47, n. 3, pp. 549-576. , também indicam que estados como um todo se beneficiam com mais recursos em função de seus alinhamentos com o Governo Central, embora este efeito seja diretamente associado ao tamanho das coalizões legislativas estaduais que dão apoio ao governo, e não à filiação partidária de governadores.
Consistente com a literatura comparada, no Brasil também o viés alocativo ocorreria porque eleitores teriam dificuldade para distinguir a origem de recursos federais ( Bueno, 2018BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. ), e também porque prefeitos aliados seriam assim recrutados pelo governo para atuarem como cabos eleitorais ( Brollo e Nannicini, 2012BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. ). Dentre esses trabalhos, cabe destacar que Ames (2002)AMES, Barry. (2002), The Deadlock of Democracy in Brazil. Ann Arbor, University of Michigan Press. é o único a chamar a atenção para a possibilidade de um esforço coordenado de política distributiva no qual presidentes cedem ministérios a parceiros de coalizão para que estes, por sua vez, pratiquem diretamente política distributiva. Em todo caso, Ames (2002)AMES, Barry. (2002), The Deadlock of Democracy in Brazil. Ann Arbor, University of Michigan Press. não desenvolve um mecanismo para explicar como opera essa política distributiva, ficando subentendido que políticos nacionais controlam escolhas alocativas unilateralmente.
Em síntese, a literatura sobre política distributiva corrobora a visão de que governos centrais discriminam partidariamente seus equivalentes subnacionais quando transferem recursos, isto é, atuam de forma top-down para premiar e punir governos locais. A principal explicação do fenômeno, como visto, está nos incentivos dos políticos nacionais, cujo exemplo típico seria o chefe de governo no Brasil.
A origem presidencial do viés alocativo
Se regiões governadas por partidos na coalizão recebem mais recursos do governo federal, a questão seguinte é saber como isso ocorre. Quem é responsável por decidir onde alocar recursos? A resposta a essa questão, implícita ou explicitamente, converge na literatura: no Brasil e em outros locais, presidentes. Como argumentam Brollo e Nannicini (2012BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. , p. 749; tradução minha) em seu estudo sobre o Brasil, isso ocorre porque “presidentes têm a última palavra no processo decisório e diversas oportunidades de influenciar a alocação geográfica de transferências em infraestrutura”. Esse é também o pressuposto implícito em Bugarin e Marciniuk (2017)BUGARIN, Mauricio; MARCINIUK, Fernanda. (2017), “Strategic Partisan Transfers in a Fiscal Federation: Evidence from a New Brazilian Database”. Journal of Applied Economics, v. 20, n. 2, pp. 211-239. , por exemplo, para os quais são os presidentes os responsáveis por influir politicamente nas transferências para governos locais. Mais ainda, essa visão é partilhada pela literatura comparada recente sobre governos de coalizão no presidencialismo ( Chaisty et al. , 2014CHAISTY, Paul; CHEESEMAN, Nic; POWER, Timothy. (2014), “Rethinking the ‘Presidentialism Debate’: Conceptualizing Coalitional Politics in Cross-Regional Perspective”. Democratization, v. 21, n. 1, pp. 72-94. , 2018CHAISTY, Paul. (2018), Coalitional Presidentialism in Comparative Perspective: Minority Presidents in Multiparty Systems. Oxford, Oxford University Press. ; Raile et al. , 2011RAILE, Eric; PEREIRA, Carlos; POWER, Timothy. (2011), “The Executive Toolbox: Building Legislative Support in a Multiparty Presidential Regime”. Political Research Quarterly, v. 64, n. 2, pp. 323-334. ), que afirma que bens discricionários são utilizados por presidentes para obter apoio legislativo de seus parceiros de coalizão.
O foco nos presidentes como atores distributivos não é arbitrário. Na América Latina, a maioria deles concentra amplos poderes para formular e aprovar peças orçamentárias, o que os permite tanto criar investimentos quanto evitar que o legislativo inclua outros indesejados ( Figueiredo e Limongi, 2008FIGUEIREDO, Argelina; LIMONGI, Fernando. (2008), Política orçamentária no presidencialismo de coalizão. Rio de Janeiro, FGV Editora. ; Scartascini e Stein, 2009SCARTASCINI, Carlos; STEIN, Ernesto. (2009), Who Decides the budget?: A Political Economy Analysis of the Budget Process in Latin America. Cambridge, Harvard University Press. ). Especificamente no Brasil, presidentes têm a prerrogativa exclusiva de iniciar o processo orçamentário, significando que as redações dos orçamentos anuais são feitas sob suas influências. E ainda que parlamentares tenham oportunidade de modificar essas peças, no mais das vezes, como argumentam Figueiredo e Limongi (2008)FIGUEIREDO, Argelina; LIMONGI, Fernando. (2008), Política orçamentária no presidencialismo de coalizão. Rio de Janeiro, FGV Editora. , essa possibilidade é constrangida por uma série de restrições formais, tais como a de limitar a criação de novos gastos e a de delimitar áreas passíveis de alteração; ou por restrições informais, como a falta de expertise sobre o processo orçamentário.
Presidentes, seguindo essa visão, decidiriam onde pôr recursos para alavancar seus interesses. Como sugere a discussão anterior, esses atores teriam meios suficientes para conduzir unilateralmente a política distributiva de seus governos. Vale dizer que isso não significa que os trabalhos anteriormente mencionados não apontassem para a influência de partidos parceiros de coalizão na política distributiva, mas fica nítido que, do ponto de vista analítico, o mecanismo que explicaria essa influência estaria na Presidência, que atenderia às demandas distributivas de seus parceiros como forma de incentivar cooperação. Mais ainda: o governo central faria essa política distributiva de cima para baixo, interferindo na execução orçamentária para premiar governos locais selecionados. Não é por outra razão que a maioria dos trabalhos revisados analisam os gastos do governo central brasileiro de forma agregada, desconsiderando a origem dos recursos em seu interior – afinal, presidentes controlariam globalmente o orçamento, a despeito da filiação partidária de ministros. Independentemente de programa ou classificação orçamentária, se há influência política na alocação de bens públicos federais, ela passaria pelos presidentes.
Esse foco tem limitações, entretanto. Primeiro, ao aludir aos seus poderes orçamentários, não há indicação dos meios específicos que são empregados para influir nas alocações, tampouco evidência sobre o uso deles. Segundo, ao assumir que presidentes praticam política distributiva, assume-se também que eles identificam quais localidades devem ou não receber recursos e quanto e quais tipos deles são necessários para obter retornos eleitorais. Por fim, também não sabemos como parceiros de coalizão asseguram alocações para seus governos locais.
Uma teoria partidária da distribuição de recursos
O argumento que desenvolvo supera as limitações da perspectiva que sustenta que presidentes praticam política distributiva unilateralmente. Ele pode ser resumido da seguinte maneira: ao ocupar ministérios, partidos repassam mais recursos discricionários de suas pastas para as prefeituras que comandam e, com isso, obtêm o apoio eleitoral de prefeitos para mobilizar votos nas eleições gerais. Além disso, meu argumento fornece um mecanismo para explicar o viés partidário na alocação de recursos: indicando um representante para ocupar determinado ministério, partidos adquirem informações sobre os investimentos de suas pastas; prefeitos correligionários demandam mais recursos dessas pastas e, pela conexão partidária entre níveis de governo que facilita a comunicação, obtêm mais deles. Desse modo, o que sustento é que partidos extraem benefícios distributivos da ocupação de ministérios no presidencialismo de coalizão.
Minha explicação é apoiada em dois pressupostos. Primeiro, o de que o cargo de ministro confere aos seus ocupantes papel central na distribuição de recursos de suas pastas. Quanto a esse ponto, é reconhecida a importância desses atores para a implementação das políticas do governo em suas jurisdições ( Laver e Shepsle, 1994LAVER, Michael; SHEPSLE, Kenneth. (1994), Cabinet Ministers and Parliamentary Government. Cambridge, Cambridge University Press. ; 1996LAVER, Michael; SHEPSLE, Kenneth. (1996), Making and Breaking Governments: Cabinets and Legislatures in Parliamentary Democracies. Cambridge, Cambridge University Press. ). É pelo mesmo motivo que governos e partidos selecionam criteriosamente ministros para evitar perdas de agência ( Huber e Martinez-Gallardo, 2008HUBER, John; MARTINEZ-GALLARDO, Cecília. (2008), “Replacing Cabinet Ministers: Patterns of Ministerial Stability in Parliamentary Democracies”. American Political Science Review, v. 102, n. 2, pp. 169-180. ). No processo orçamentário brasileiro, além disso, ministros são peças-chave porque geralmente têm expertise em suas áreas de atuação e porque podem nomear aliados para cargos de ordenamento de despesas ( Lopez e Praça, 2015LOPEZ, Félix; PRAÇA, Sérgio. (2015), “Critérios e lógicas de nomeação para o alto escalão da burocracia federal brasileira”, in Félix Lopez. (org.), Cargos de confiança no presidencialismo de coalizão brasileiro. Brasília, IPEA, pp. 107-138. ). Não menos importante, ministros têm a prerrogativa de empenhar recursos uma vez que seus orçamentos tenham sido aprovados e seus limites de empenho estabelecidos (Alston et al. , 2005). Como já apontava Ames (2002AMES, Barry. (2002), The Deadlock of Democracy in Brazil. Ann Arbor, University of Michigan Press. , cap. 6), disso decorre que o cargo de ministro proporciona aos seus ocupantes influência sobre os investimentos do governo (ver também Henrique e Batista, 2021HENRIQUE, Anderson; BATISTA, Mariana. (2021), “A politização dos desastres naturais: alinhamento partidário, declarações de emergência e a alocação de recursos federais para os municípios no Brasil”. Opinião Pública, v. 26, n. 3, pp. 522-555. ; Power e Mochel, 2008, p. 225-226; Samuels, 2003SAMUELS, David. (2003), Ambition, Federalism and Legislative Politics in Brazil. Cambridge, Cambridge University Press. . p. 18-19).
O segundo pressuposto está relacionado com a dinâmica de governos multipartidários no presidencialismo. Especificamente, parto da constatação de que presidentes minoritários geralmente incorporam ao seu gabinete ministros indicados por outros partidos, compartilhando com eles influência legislativa sobre a agenda do governo e recursos (Chaisty et al. , 2018; Cheibub, 2007CHEIBUB, José. (2007), Presidentialism, Parliamentarism, and Democracy. Cambridge, Cambridge University Press. ). Como ministros possuem as vantagens e os poderes descritos anteriormente, os membros de um partido passam a demandar mais recursos dos ministérios que ocupam, antecipando maior facilidade em obtê-los.
Os dois pressupostos formam a base para entender como vieses partidários na alocação de recursos ocorrem. Ao ocupar um ministério, ministros partidários usam suas prerrogativas para facilitar – seja fornecendo informações, instruindo as burocracias de suas pastas para prestar auxílio, recebendo pessoalmente parlamentares e prefeitos correligionários – a obtenção de recursos por parte das prefeituras comandadas por seus aliados. Independentemente do partido de quem ocupa a Presidência, alguns ministérios serão oferecidos a partidos políticos para formar coalizões legislativas. Como resultado, isso implica que presidentes partilham o poder necessário para que cada parceiro de gabinete implemente suas estratégias distributivas.
Com base nesses pressupostos, meu argumento explica como o governo identifica as demandas de governos locais aliados. Por dependerem de recursos federais para realizar melhorias locais sem comprometer os orçamentos de suas administrações, prefeitos direcionam pedidos para ministérios controlados pelos seus partidos, indicando quanto e quais tipos de investimentos precisam. Esse processo, como descrevo adiante, envolve diversos procedimentos burocráticos complexos, e por isso contar com correligionários no governo central ajuda a contorná-los. Deputados, ministros e seus respectivos assessores levam aos prefeitos informação necessária para vencer entraves, bem como intercedem por eles junto à burocracia federal quando necessário – esperando obter votos em troca. Ao fim, ministérios recebem mais demandas de governos locais alinhados e, como estes têm vantagem informacional, conseguem mais verbas para suas comunidades. Consequentemente, não é necessário assumir que presidentes ou ministros manipulam prerrogativas formais para enviesar a distribuição de recursos (cf. Brollo e Nannicini, 2012BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. ; Nunes, 2013NUNES, Felipe. (2013), “Core Voters or Local Allies? Presidential Discretionary Spending in Centralized and Decentralized Systems in Latin America”. SSRN. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=2278719> ou <http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2278719>
https://ssrn.com/abstract=2278719...
).
Além de ser congruente com o processo de transferências intergovernamentais, meu argumento é consistente com alguns estudos anteriores. Quanto ao foco no interior do executivo, e não nos chefes de governo, a literatura sobre governos de coalizão enfatiza a importância dos ministérios para os partidos. Por meio deles, estes avançam suas agendas em determinadas áreas para beneficiar seus eleitores ( Laver e Shepsle, 1994LAVER, Michael; SHEPSLE, Kenneth. (1994), Cabinet Ministers and Parliamentary Government. Cambridge, Cambridge University Press. ; 1996); adquirem expertise sobre o funcionamento do governo ( Martinez-Gallardo, 2010MARTINEZ-GALLARDO, Cecília. (2010), “Inside the Cabinet: The Influence of Ministers in the Policymaking Process” in Carlos Scartascini, Ernesto Stein e Mariano Tommasi (eds.), How Democracy Works: Political Institutions, Actors, and Arenas in Latin American Policymaking, Cambridge, Inter-American Development Bank, pp. 119-45. ); e fiscalizam a atuação de seus parceiros de coalizão (Fernandes et al. , 2016). Pelas prerrogativas que concentram, ocupar ministérios também permite aos partidos influir na alocação de recursos ( Ames, 2002AMES, Barry. (2002), The Deadlock of Democracy in Brazil. Ann Arbor, University of Michigan Press. ; Henrique e Batista, 2021HENRIQUE, Anderson; BATISTA, Mariana. (2021), “A politização dos desastres naturais: alinhamento partidário, declarações de emergência e a alocação de recursos federais para os municípios no Brasil”. Opinião Pública, v. 26, n. 3, pp. 522-555. ; Indridason, 2005INDRIDASON, Indridi. (2005), “A Theory of Coalitions and Clientelism: Coalition Politics in Iceland, 1945-2000”. European Journal of Political Research, v. 44, n. 3, pp. 439-464. ; Martin, 2016MARTIN, Shane. (2016), “Policy, Office and Votes: The Electoral Value of Ministerial Office”. British Journal of Political Science, v. 46, n. 2, pp. 281-296. ). Reconhecendo essas possibilidades, o argumento central na literatura sobre formação de coalizões é o de que portfólios ministeriais são os principais payoffs que parceiros de governo podem almejar ( Budge e Laver, 1986BUDGE, Ian; LAVER, Michael. (1986), “Office Seeking and Policy Pursuit in Coalition Theory”. Legislative Studies Quarterly, v. 11, n. 4, pp. 485-506. ; Laver e Shepsle, 1994LAVER, Michael; SHEPSLE, Kenneth. (1994), Cabinet Ministers and Parliamentary Government. Cambridge, Cambridge University Press. ; 1996).
Na literatura comparativa sobre política distributiva, alguns estudos dialogam diretamente com este. Bertelli e Grose (2009)BERTELLI, Anthony; GROSE, Christian. (2009), “Secretaries of Pork? A New Theory of Distributive Public Policy”. The Journal of Politics, v. 71, n. 3, pp. 926-945. , por exemplo, mostram que secretarias de estado americanas direcionam mais recursos para distritos de congressistas com ideologias próximas das suas, e isso justamente porque presidentes não teriam total controle sobre a burocracia que implementa as políticas do governo. Como sugere esse resultado, alguma delegação do chefe de governo para secretários deve ocorrer para que recursos sejam distribuídos por razões políticas. A influência de ministros na provisão de bens públicos, por sua vez, é corroborada na Itália por Golden e Picci (2008)GOLDEN, Miriam.; PICCI, Lucio. (2008), “Pork-Barrel Politics in Postwar Italy, 1953-94”. American Journal of Political Science, v. 52, n.2, pp. 268-289. , que mostram que regiões onde ministros atuam tendem a receber mais repasses; e, ligando diretamente ocupação ministerial e alocações, por Ames (2002)AMES, Barry. (2002), The Deadlock of Democracy in Brazil. Ann Arbor, University of Michigan Press. , no Brasil. Esses últimos dois trabalhos, além disso, exemplificam a proposição de que comandar um portfólio pode servir para implementar estratégias distributivas.
Mais próximos do mecanismo que proponho, Baião et al. (2018) e Batista (2015)BATISTA, Mariana. (2015), “A Conexão Ministerial: governo de coalizão e viés partidário na alocação de emendas parlamentares ao orçamento (2004-2010)”. Revista Ibero-Americana de Estudos Legislativos, v. 4, n. 1, pp. 3-16. mostram que deputados incluem mais emendas orçamentárias – que são um subconjunto das transferências discricionárias do governo central – no orçamento de ministérios de correligionários. Como ambos argumentam, deputados agiriam assim esperando executar mais recursos, o que ambos os trabalhos corroboram. Com foco no antigo Ministério da Integração Nacional, também Henrique a Batista (2021) oferecem evidência de que partidos da coalizão, mas especialmente o partido no comando da pasta, se beneficiam com mais repasses de recursos de emergência que, em tese, deveriam ser alocados exclusivamente em função de necessidade frente a situações de emergência ou calamidade pública. Esses resultados encontram um paralelo em Goldstein e You (2017)GOLDSTEIN, Rebecca; YOU, Hye. (2017), “Cities as Lobbyists”. American Journal of Political Science, v. 61, n. 4, pp. 864-876. , que argumentam que governos locais fazem mais esforço nos Estados Unidos para demandar recursos do governo federal quando os equivalentes estaduais são comandados por opositores, o que significa que alinhamento partidário pode tanto facilitar quanto dificultar a comunicação entre níveis de governo para a provisão de bens públicos. Todos esses trabalhos indicam que partidos têm papel relevante na articulação entre demanda e oferta por recursos públicos entre níveis de governo.
Em suma, proponho uma explicação de como recursos são alocados por razões políticas no Brasil. Para ela, a indicação de ministros importa porque assegura aos partidos acesso contínuo a recursos discricionários. Ao contrário de supor que ministros identificam individualmente quais municípios devem ou não receber recursos, de qual tipo, em qual montante, além de interferir constante e diretamente para realizar as alocações, meu argumento requer muito menos. Basta a um partido ocupar um ministério que, coletivamente, seus membros passam a articular a demanda de recursos para seus governos locais.
Mecanismos de distribuição de recursos
A principal implicação do argumento defendido é a de que partidos extraem benefícios distributivos da ocupação de ministérios. Como dito, isso porque esses partidos têm influência e maior informação sobre os investimentos de suas pastas. Em decorrência disso, políticos locais de um partido com assento no gabinete levam mais demandas aos ministérios comandados por seus correligionários porque podem contar com seus auxílios para obter recursos. A seta causal, dessa forma, começa com (1) a nomeação de um ministro alinhado, o que (2) deflagra mais demandas por recursos direcionadas ao ministério alinhado e, enfim, (3) resulta em viés alocativo.
Como ilustra o modelo causal exibido na Figura 1 , esse argumento estabelece que (1) causa (3). A expectativa, em particular, é a de que a nomeação de um ministro partidário, considerada exógena para os fins do modelo, causa mais transferências de recursos do respectivo ministério para prefeituras comandadas por correligionários dos ministros. Para afirmar que a cadeia causal completa passa pelo mediador (2), afetando a demanda por recursos de governos locais de um partido, é necessária alguma evidência mostrando que é principalmente por esse elo que passa o caminho entre (1) e (3). Discuto aqui dois mecanismos para examinar a lógica descrita em (2), além de um alternativo, (4), que poderia falsear a explicação.
Mecanismo 1 – Prefeitos demandam mais recursos: O primeiro mecanismo consistente com a minha teoria passa por prefeituras solicitando mais recursos discricionários aos ministérios alinhados. De saída, é necessário entender que obter esses recursos é uma tarefa complexa para as prefeituras brasileiras, especialmente para as menores. No caso de transferências voluntárias (a mais conhecida forma de acessar esses bens), isso engloba redigir planos de trabalho descrevendo o objeto do convênio, os recursos necessários, o cronograma de trabalho e a justificativa para o investimento, tudo de acordo com a legislação que disciplina e regula essas transferências ( Tribunal de Contas da União, 2013TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. (2013), Convênios e outros repasses. Brasília, Tribunal de Contas da União (TCU). ). Durante a avaliação dos pedidos, além disso, outros documentos e informações às vezes precisam ser prestadas, motivo pelo qual muitas demandas nunca são atendidas. Nesse ponto, ter um ministro correligionário pode incentivar a demanda por recursos ao reduzir a complexidade da burocracia envolvida. Prefeitos podem dialogar com ministros ou auxiliares próximos, por exemplo, ou ainda receberem melhor orientação da burocracia ministerial ou de parlamentares do partido. Adicionalmente, prefeitos podem solicitar para que correligionários intercedam por eles sempre que necessário, delegando assim a tarefa de obter investimento para atores em melhor posição. Em qualquer um dos casos, o alinhamento partidário daria vantagens informacionais aos prefeitos, incentivando-os a demandar mais recursos.
Mecanismo 2 – Parlamentares demandam mais recursos: Dentro de certos limites, parlamentares podem levar melhorias a municípios remanejando gastos por meio de emendas ao orçamento ( Figueiredo e Limongi, 2008FIGUEIREDO, Argelina; LIMONGI, Fernando. (2008), Política orçamentária no presidencialismo de coalizão. Rio de Janeiro, FGV Editora. ). Ainda que normalmente desconsiderado pela literatura, boa parte dessas emendas destinadas a municípios são implementadas por meio de transferências voluntárias e, assim, dependem que prefeituras produzam planos de trabalho e sigam as normativas de cada ministério para recebê-las. Se parlamentares alocarem mais emendas para prefeituras e ministérios alinhados antecipando facilidade na liberação de recursos e na reivindicação de crédito (Baião et al. , 2017; Samuels, 2003SAMUELS, David. (2003), Ambition, Federalism and Legislative Politics in Brazil. Cambridge, Cambridge University Press. , cap. 6), o efeito do alinhamento ministerial resultaria dessa intermediação de recursos. Como sabido, a liberação de emendas parlamentares é complexa, envolvendo normalmente barganhas entre executivo – que condiciona recursos em troca de apoio – e legislativo, contenções fiscais e, depois de 2015, da imposição do empenho das emendas parlamentares. De qualquer forma, o ponto a reter aqui é que, caso parlamentares atuem como intermediadores, emendas orçamentárias seriam um veículo partidário de transferências discricionárias.
Para reforçar, o primeiro mecanismo sustenta que prefeitos direcionam suas demandas distributivas preferencialmente para ministérios alinhados por conta de vantagens informacionais. Já o segundo propõe que parlamentares adotem estratégia similar, apresentando mais emendas para ministérios e prefeituras de correligionários. Tendo suporte empírico, ambos forneceriam indícios de que (1) leva a (3), em parte por causa da vantagem informacional que políticos de um mesmo partido usufruem ao ocupar ministérios. Finalmente, se o viés alocativo existir e for decorrente mais da ação direta dos ministros do que por conta dos mecanismos anteriores, isso retiraria suporte do meu argumento. Uma forma de testar essa possibilidade, exibida no caminho (4) do modelo causal, é por meio do mecanismo seguinte.
Mecanismo 3 – Ministros manipulam a avaliação técnica: Ministros normalmente indicam nomes de confiança para atuar em suas pastas ( Lopez e Praça, 2015LOPEZ, Félix; PRAÇA, Sérgio. (2015), “Critérios e lógicas de nomeação para o alto escalão da burocracia federal brasileira”, in Félix Lopez. (org.), Cargos de confiança no presidencialismo de coalizão brasileiro. Brasília, IPEA, pp. 107-138. ). Com isso, eles delegam para agentes confiáveis prerrogativas de avaliação e de monitoramento de repasses, especialmente quando nomeiam aliados para cargos de ordenamento de despesas. Se essas nomeações forem usadas para interferir na implementação de recursos de suas pastas, isso se refletiria em governos locais de correligionários do ministro tendo menos pedidos recusados por motivos técnicos e/ou jurídicos. Nesse caso, seria mais por iniciativa dos ministros, e menos pela articulação dos partidos, que o viés alocativo ocorreria.
É necessário notar que todos esses mecanismos especificam apenas caminhos distributivos entre níveis nacional e local, sem consideração às dinâmicas estaduais, incluindo influência de governadores e de assembleias estaduais no repasse de recursos federais. Como deve ter ficado nítido pela discussão deste artigo, isso é antes uma tentativa de isolar analiticamente os efeitos da política nacional que incidem na local. De qualquer forma, como o alinhamento e seus mecanismos podem ser plausivelmente aplicados para o nível estadual, além de ser conhecida a influência de governadores na política nacional, a análise que segue deve ser tomada como um primeiro passo para entendermos como partidos operam a distribuição política de recursos em um caso relevante como o do governo central brasileiro.
Desenho de pesquisa
Dados e mensuração
Recursos discricionários
Os recursos que analiso são as Transferências Voluntárias da União (TVU). Especificamente, esses são distribuídos por meio de contratos, compostos principalmente por convênios e contratos de repasse, firmados entre um órgão do governo federal (concedente), que assume o compromisso de liberar uma determinada quantia de recursos, e um governo subnacional ou entidade sem fins-lucrativos (convenente), responsável por executá-la de acordo com algumas normas ( Tribunal de Contas da União, 2013TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. (2013), Convênios e outros repasses. Brasília, Tribunal de Contas da União (TCU). ). Exemplos dessa modalidade de investimento incluem pavimentação de ruas, aquisição de veículos e máquinas, reformas em instalações públicas, criação de praças, entre inúmeros outros.
Por definição, TVU não são de execução obrigatória. As propostas de convênios passam por avaliação técnica e jurídica antes de serem celebradas, e como o empenho e liberação de recursos fica a cargo do Executivo, a possibilidade de interferência política nas suas alocações é patente. Exatamente por isso, TVU são o objeto principal de muitos estudos sobre o tema no Brasil ( Bueno, 2018BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. ; Bugarin e Marciniuk, 2017BUGARIN, Mauricio; MARCINIUK, Fernanda. (2017), “Strategic Partisan Transfers in a Fiscal Federation: Evidence from a New Brazilian Database”. Journal of Applied Economics, v. 20, n. 2, pp. 211-239. ; Ferreira e Bugarin, 2007FERREIRA, Ivan; BUGARIN, Mauricio. (2007), “Transferências voluntárias e ciclo político-orçamentário no federalismo fiscal brasileiro”. Revista Brasileira de Economia, v. 61, n. 3, pp. 271-300. ; Nunes, 2013NUNES, Felipe. (2013), “Core Voters or Local Allies? Presidential Discretionary Spending in Centralized and Decentralized Systems in Latin America”. SSRN. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=2278719> ou <http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2278719>
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).
Os dados das TVU feitas pelos ministérios vêm do portal do Portal da Transparência, mantido pelo Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União. Operacionalmente, tomo os valores de cada convênio pelas datas de suas propostas, agregando-os por ano. Assim, após a eleição de um prefeito em 1996, a partir de 1997 é possível saber quanto um determinado município i efetivamente recebeu no ano t do ministério j , até 2016. Como alguns ministérios transferem poucos recursos para municípios, e como outros tiveram orçamentos pequenos ou existência curtas no período de interesse, analiso apenas pastas que transferiram a municípios quantias maiores que R$ 100 milhões – o que resulta em 17 ministérios que celebraram convênios entre 1997 e 2016 com prefeituras, mas que concentraram 97% de todos as transferências discricionárias feitas aos municípios no período, mais de R$ 127 bilhões. Mesmo sem englobar todos os ministérios existentes no período, portanto, a análise que segue é representativa do governo central como um todo.
A decisão de usar dados de liberação, e não os empenhados, é justificada. Por ser o executivo quem empenha e libera transferências voluntárias, qualquer influência ministerial no repasse delas precisa ocorrer nos dois momentos para que a estratégia seja efetiva. De qualquer forma, utilizo complementarmente microdados do Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse (SICONV) sobre origem, avaliação e empenho de todos os convênios celebrados a partir de 2008. Por último, obtive dados sobre a população dos municípios a partir dos censos de 1990, 2000 e 2010 realizados pelo IBGE.
Eleições locais e filiação de prefeitos
Do TSE obtive dados sobre o desempenho eleitoral e filiação partidária dos prefeitos eleitos nas eleições de 1996, 2000, 2004, 2008 e 2012. Por não estarem integralmente disponíveis os dados de 1996, para esse pleito coletei os dados necessários por meio de web scraping do serviço de divulgação de resultados. Um detalhe importante é que foram excluídas eleições sucedidas por outras complementares, realizadas fora dos períodos eleitorais, por conta da anulação dos pleitos originais. Contabilizados esses recortes, a amostra analisada abrange 27209 eleições em 5564 municípios diferentes. PMDB (21%), PSDB (15%) e PP (10%) elegeram a maior parte dos prefeitos nesses contextos, enquanto que o PT, partido que ocupou a Presidência entre 2003 e 2016, elegeu cerca de 7%.
Filiação partidária de ministros
Quanto à filiação partidária dos ministros, dados foram extraídos a partir de outro trabalho ( Meireles, 2018MEIRELES, Fernando. (2018), “Oversized Government Coalitions in Latin America”. Brazilian Political Science Review [online], v. 10, n. 3, pp. 1-31. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1981-38212016000300001>
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). Ao todo, a amostra compreende 116 ministros únicos, filiados a 14 partidos diferentes (sem contar ministros sem filiação), que permaneceram 758 dias em seus cargos, em média.
Variáveis
A variável dependente indica o total ajustado pelo Índice de Preços do Consumidor Amplo (IPCA) recebido pelo município i no ano t pela pasta j , que também é mensurado de outras formas para testar a sensibilidade dos resultados (i.e., per capita, log, dummy ). Por sua vez, seja partido uma variável categórica, onde partidoit indica a filiação partidária do prefeito de i no ano t , e partidojt a filiação do ministro de j , o indicador de tratamento do alinhamento entre prefeituras e ministérios é definido como:
Quando um determinado prefeito é correligionário de um ministro em um ano qualquer, portanto, considero o par alinhado – o que chamo de alinhamento ministerial ou de alinhamento partidário. Por uma questão de indisponibilidade de dados sobre as migrações partidárias de prefeitos no Brasil, o indicador de tratamento toma suas filiações como fixas ao longo de seus mandatos. Note-se, contudo, que essa operacionalização é parcimoniosa por trabalhar contra a hipótese alternativa: se prefeitos alinhados que migram tendem a receber menos repasses, e se prefeitos não alinhados que tornam-se alinhados recebem mais, não levar em conta mudanças de filiação enviesaria para baixo o efeito do alinhamento caso ele seja, como esperado, positivo.
Estratégia de identificação: diferença-em-diferenças
Com o indicador de tratamento, o exame da possibilidade de prefeituras receberem mais recursos de ministérios alinhados poderia ser feito com uma simples tabulação. Se municípios são beneficiados por pastas alinhadas, na média, teríamos evidências para corroborar a expectativa teórica. Tal exercício, contudo, possivelmente retornaria estimativas enviesadas. Isso ocorreria, dentre outras razões, se eleitores selecionassem prefeitos de partidos no governo federal justamente na expectativa de receber mais recursos. Outra possibilidade, ministros poderiam privilegiar municípios com mais eleitores de seus partidos, os quais naturalmente elegeriam prefeitos alinhados. O ponto geral é o mesmo: na presença de variáveis omitidas e viés de seleção, a estimativa do efeito do alinhamento ministerial é enviesada.
Para contornar esse problema, aproveito uma fonte de variação exógena no alinhamento ministerial ao longo do tempo. Especificamente, como ministros são nomeados e demitidos por razões largamente exógenas aos prefeitos – isto é, por questões relacionadas ao governo nacional –, exploro mudanças anuais na filiação de ministros que ocorrem no meio dos mandatos municipais para estimar o efeito do alinhamento com um desenho de diferença-em-diferenças (DiD). A ideia central consiste em comparar (i) a diferença de quanto recebeu um município que mudou seu status de alinhamento porque ministérios trocaram de comando partidário no meio do mandato municipal (ii) vis-à-vis outros municípios que permaneceram com o mesmo status de alinhamento ao longo de todo o mandato.
Para tornar mais palpável a estratégia, considere-se o seguinte exemplo, ilustrado pelo Gráfico 1 . Entre 2010 e 2011, o estado de Roraima possuía apenas um município, Mucajaí, destacado em cinza no mapa do topo à esquerda, cujo prefeito entre 2009 e 2012 pertencia ao PMDB. Dessa maneira, em 2010, só esse município era alinhado ao ministério da Integração, comandado naquele ano por Geddel Vieira Lima e João Santana, ambos filiados ao PMDB da Bahia. Com a posse da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em janeiro de 2011, a Integração passou ao comando de Fernando Bezerra Coelho, político pernambucano à época filiado ao PSB. Como resultado, Mucajaí deixou de ser alinhado com a Integração, enquanto que Normandia, governado por um prefeito do PSB, passou a ser alinhado. Para todos os demais municípios, as trocas na Integração não alteraram seus status de não alinhamento.
Generalizando essa intuição para todos os municípios e para todos os ministérios na amostra, identifico o efeito causal médio do alinhamento ministerial comparando o quanto municípios como Mucajaí e Normandia receberam de determinado ministério quando eram e quando não eram alinhados – e, mais importante, essa diferença é comparada em relação ao grupo de municípios que não mudaram de alinhamento durante o mandato municipal, que serve como contrafactual. Fazendo isso, diferenças que podem ou não ser observadas entre municípios alinhados e não alinhados por mandato – caso, por exemplo, da capacidade dos prefeitos de obterem recursos do governo federal, da pobreza da população, entre outros –, além de diferenças ao longo do tempo comuns a ambos os grupos, são eliminadas. Como municípios podem se alinhar mais de uma vez a cada um dos 17 ministérios analisados entre 1997 e 2016, operacionalizo o desenho da seguinte forma:
onde Yijt indica o total recebido pelo município i no ano t pelo ministério j . Central para o desenho, α são efeitos-fixos para município-ministério-mandato que anulam diferenças médias de transferências recebidas entre mandatos municipais em relação a um mesmo ministério; em outras palavras, são eles que fixam as filiações partidárias de prefeitos, o que permite usar apenas mudanças na filiação de ministros para estimar o efeito do alinhamento ministerial. Por sua vez, δ absorve choques anuais na quantia transferida por cada ministério, como um aumento de seus orçamentos de investimentos, por exemplo. A estimativa de Alinhadoitj , , indica o efeito causal médio do alinhamento partidário entre prefeitos e ministros sobre o montante que os primeiros recebem dos ministérios.
Como em qualquer estratégia similar, o desenho só alcança identificação se um pressuposto principal for satisfeito: o de que os municípios alinhados teriam recebido quantias similares a dos não alinhados caso perdessem o alinhamento, algo conhecido como common trends assumption . Violações desse pressuposto ocorreriam, por exemplo, caso municípios que se tornaram alinhados já estivessem recebendo mais recursos de um ou mais ministérios antes do alinhamento; se eleitores municipais antecipassem mudanças partidárias no gabinete e já elegessem antes disso prefeitos que se tornariam alinhados; ou, menos plausível, se alguns prefeitos influírem na indicação de ministros alinhados. Em qualquer um desses cenários, municípios alinhados e não alinhados não estariam seguindo trajetórias semelhantes antes do tratamento, invalidando o desenho.
Em última instância, não é possível provar que o pressuposto do desenho DiD se aplica ou não – isso implicaria observar um mesmo município simultaneamente sendo e não sendo alinhado. Para dar maiores garantias de que essas potenciais fontes de endogeneidade não influem nos meus resultados, entretanto, adoto dois procedimentos. Primeiro, ofereço evidências diretas que reforçam a validade do desenho ao longo da apresentação dos resultados. Segundo, aproveitando que municípios na minha amostra são observados em cada ano em relação a múltiplos ministérios, também adoto uma versão mais robusta do desenho DiD, chamado de triple-differences (DDD).
No lugar de apenas comparar unidades que mudaram de alinhamento, o DDD avança ao adicionar uma nova camada de comparação: dentro de um mesmo município. Por exemplo, enquanto Normandia alinha-se com a Integração em 2011, ele permanece não alinhado com o ministério do Turismo tanto em 2010 quanto em 2011, como indica o Gráfico 1 . Assim, essa diferença de status na Integração é comparada dentro do mesmo município em relação ao ministério do Turismo, e essas diferenças, por fim, são comparadas às diferenças entre outros municípios e ministérios com diferentes status de alinhamento – como Mucajaí e como todos os outros que permaneceram com status de alinhamento inalterados. Implemento esse desenho de DDD com equações da seguinte forma:
onde γ são efeitos-fixos para ano-município, que removem diferenças nas quantias recebidas por um município de diferentes ministérios em um mesmo ano. Dessa forma, seguindo o exemplo anterior do estado de Roraima, apenas diferenças de alinhamento dentro de um mesmo município são consideradas, mantendo fixas características no nível dos municípios que variam ao longo do tempo – como a propensão do governo nacional de repassar mais recursos a um determinado município a partir de múltiplos ministérios simultaneamente.
Especialmente com esse último desenho, as possibilidades de endogeneidade ficam limitadas quando se considera a dinâmica das mudanças partidárias no gabinete. Como mostra uma considerável literatura, a formação e a manutenção de coalizões responde principalmente aos incentivos de presidentes e líderes partidários que, por sua vez, são influenciados pelas eleições nacionais, pela posição ideológica dos partidos, pelas regras que regem o processo legislativo federal e por fatores conjunturais como crises econômicas ( Cheibub, 2007CHEIBUB, José. (2007), Presidentialism, Parliamentarism, and Democracy. Cambridge, Cambridge University Press. ; Freudenreich, 2016FREUDENREICH, Johannes. (2016), “The Formation of Cabinet Coalitions in Presidential Systems”. Latin American Politics and Society, v. 58, n. 4, pp. 80-102. ; Martinez-Gallardo, 2012MARTINEZ-GALLARDO, Cecília. (2012), “Out of the Cabinet: What Drives Defections from the Government in Presidential Systems?”. Comparative Political Studies, v. 45, n. 1, pp. 62-90. ; Meireles, 2016; Camerlo e Perez-Linan, 2015CAMERLO, Marcelo; PÉREZ-LIÑÁN, Anibal. (2015), “Minister Turnover, Critical Events, and the Electoral Calendar in Presidential Democracies”. The Journal of Politics, v. 77, n. 3, pp. 608-619. ). Por outro lado, menções à influência de atores locais nesses processos são escassas e, além disso, pouco plausíveis quando se leva em conta a fragmentação territorial e de representação legislativa no país. Em resumo, há razões teóricas mais que suficientes para considerar que trocas partidárias no comando dos ministérios fogem ao controle dos prefeitos no Brasil. Adicionalmente, apresento adiante resultados de um teste que reforça esse ponto.
Para além de outras vantagens, a validade externa do desenho que emprego merece um último comentário. Entre eleições municipais, mudanças nos gabinetes nacionais ocorrem com frequência. Por essa razão, 99% dos municípios brasileiros foram alinhados com pelo menos um ministério por razões ligadas apenas às trocas no gabinete no meio dos mandatos municipais. Conforme indica o Gráfico 2 , além disso, há bastante variação no alinhamento no meio dos mandatos dos prefeitos em cada ministério na minha amostra. Isso tudo sugere que os efeitos do alinhamento ministerial que reporto a seguir podem ser generalizados para a quase totalidade dos municípios brasileiros e, avançando em relação a outros trabalhos, em um período de 20 anos após a redemocratização.
: Percentual de municípios que mudaram de alinhamento partidário com cada ministério durante os mandatos municipais*
O efeito do alinhamento ministerial
Resultados gerais
Municípios recebem mais recursos de ministérios comandados pelos partidos de seus prefeitos? Os dados da Tabela 1 indicam que sim. A título de benchmark , para facilitar a compreensão dos achados, o modelo 1 reporta as estimativas de um modelo MQO simples que sugere que prefeituras alinhadas a um determinado ministério recebem, de um único órgão superior, mais de 3 reais per capita a mais que prefeituras não alinhadas, em média. Não é de se esperar que tal MQO estivesse livre de problemas em sua especificação mais simples, mas o resultado ilustra o potencial de viés envolvido na estimação do efeito do alinhamento partidário entre ministérios e prefeituras.
Embora sugestiva, essa estimativa não lida com o problema de viés de seleção e de variáveis omitidas na relação entre alinhamento ministerial e transferências. Como é possível observar, o efeito causal médio do alinhamento ministerial estimado com DiD, no modelo 2, e com DDD, no modelo 3, são menores, indicando que uma simples correlação enviesa para cima três vezes mais esse efeito. Tomadas essas estimativas, o efeito do alinhamento ministerial é de cerca de R$ 0,90 per capita anuais, com mínima diferença entre os dois últimos modelos.
Apesar de parecer pequena, a magnitude do efeito encontrado é substantiva. Tomando o modelo 3, o efeito mínimo do alinhamento é quase um quarto a mais que a média recebida via transferências voluntárias pelos municípios não alinhados na amostra. Além disso, considerando que esse valor é referente a apenas um ano para cada ministério individualmente, a depender do partido ocupando a prefeitura esse efeito pode resultar em um retorno ainda maior: tomando um exemplo simples, um município governado pelo PT entre 2009 e 2012 esperaria obter cerca de R$ 23,50 adicionais. Isso tudo sugere que o alinhamento ministerial tem impacto não desprezível sobre as finanças dos municípios.
Apesar de consistentes com o meu argumento, esses resultados poderiam ser decorrentes de endogeneidade, como discutido anteriormente. Examino essa e outras possibilidades com duas modificações no modelo 2 reportado na Tabela 1 . Na primeira, uso uma amostra apenas com municípios que, no período de quatro anos de um mandato municipal, foram governados pelo mesmo partido que governou no mandato anterior; com isso, a possibilidade de seleção endógena de prefeitos é reduzida, embora isso resulte na remoção do mandato de 1997-2000 – o que, cabe destacar, remove quase todos os anos em que o PSDB ocupou a Presidência. Na segunda, incluo apenas municípios que tiveram menos de 10 mil habitantes durante todo o período de análise, os quais dificilmente teriam como influir na nomeação de ministros.
Como mostra a Tabela 2 , em ambos os desenhos, DiD e DDD, os resultados permanecem praticamente inalterados e, além disso, muito próximos entre si – ainda que, com milhares de parâmetros adicionais, o estimador DDD não retorne valores significativos a P-valor < 0.05 quando analisados mandatos apenas de partidos reeleitos. Independentemente disso, esses testes adicionais dão maior suporte à validade do desenho, além de reforçarem que as estratégias de diferença-em-diferenças e de triplas-diferenças retornam resultados similares.
Por fim, investigo o efeito do alinhamento em anos anteriores a ele. A lógica desse teste é simples: o efeito do alinhamento não deve ser detectado antes de um município se alinhar. Desse modo, investigo se o alinhamento em anos anteriores a ele afeta o quanto um município recebe, o que também é chamado de adiantar o tratamento, ou usar leads , na literatura metodológica. Conforme indicado no Gráfico 3 , o resultado desse exame mostra que, em anos que antecedem o alinhamento ministerial, seu efeito não é nem estatisticamente diferente de zero e nem substantivo, apesar das estimativas variarem bastante. Apenas quando municípios passam a ser alinhados, é que o efeito passa a ser substantivo e diferente de zero.
Os resultados gerais, em suma, demonstram que prefeituras recebem mais recursos de ministérios quando prefeito e ministro são correligionários.
Presidentes extraem mais benefícios distributivos?
Para a literatura sobre política distributiva no Brasil, presidentes são considerados os principais atores com poder de influir no orçamento de seus governos. Exatamente por isso, é plausível imaginar que eles poderiam permitir apenas aos ministros de seus partidos alocar mais recursos em prefeituras alinhadas, negligenciando demandas de outros partidos, resultado que é o sugerido por Bueno (2018)BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. , por exemplo. Como também não é incomum que presidentes brasileiros reservem mais ministérios, e os mais importantes, para seus partidos (Pereira et al. , 2016:560), isso se refletiria em menor espaço para que outros partidos extraíssem benefícios distributivos da ocupação de ministérios. Nos dois cenários, o efeito do alinhamento ministerial seria válido apenas para o partido da Presidência. Para examinar essa possibilidade, emprego uma variável indicando se o partido do ministro da pasta j no ano t estava na Presidência (PSDB ou PT) ou não para estimar o seguinte modelo DiD:
Como se percebe, o modelo inclui um termo multiplicativo, β 1, para estimar a magnitude do efeito do alinhamento ministerial entre ministérios controlados pelo partido da Presidência e por membros da coalizão. Com o mesmo termo, também estimo um modelo com a estratégia de DDD.
O Gráfico 4 exibe os resultados. Em todos os casos, conforme indicam as estimativas do efeito marginal do alinhamento, ministros alocam mais recursos para prefeituras de correligionários. De diferença, é possível observar que prefeitos filiados a partidos que ocuparam a Presidência parecem receber mais de ministérios alinhados, cerca de R$ 1,40 contra R$ 0,90. Conforme indica o intervalo de confiança de 95% das estimativas, indicado pelas linhas horizontais, não é possível dizer que o benefício é diferente nos dois casos. Pela melhor evidência disponível, tanto parceiros de coalizão quanto partidos na chefia do governo se beneficiam de forma próxima, ainda que haja a possibilidade de que partidos na Presidência se beneficiem um pouco mais com o alinhamento, consistente com o achado de Bueno (2018)BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. e em com algum contraste com o de Brollo e Nannicini (2012)BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. , que encontram efeitos consistentes apenas no caso do alinhamento entre partidos da coalizão
: Alinhamento ministerial para partidos na Presidência e para membros da coalizão, 1997-2016*
Uma vez que tanto presidentes quanto parceiros de coalizão se beneficiam da distribuição ministerial de recursos, outra questão relacionada é se o efeito do alinhamento é puxado por um ou outro governo. Se isso ocorrer, não poderíamos falar de uma política distributiva da coalizão, mas apenas de decisões particulares de alguns presidentes de delegar poder alocativo. Utilizando a especificação anterior, testo essa expectativa usando um termo multiplicativo entre o indicador de alinhamento e outra variável categórica indicando mandato presidencial, de FHC I a Dilma II (apenas até 2016, ano em que Michel Temer assume a Presidência). Como o Gráfico 5 mostra, esse também não é o caso: de FHC I a Dilma I, com variações, ministros privilegiaram prefeituras alinhadas com mais transferências. Também sugestivo, é possível notar que esse efeito foi maior nas administrações do PT e, também, nos últimos mandatos de Lula e de FHC – o que talvez indique que, com coalizões maiores e heterogêneas, governos recorrem mais à política distributiva. O único caso destoante é o governo em transição Dilma II/ Temer, o que pode tanto ter relação com a crise fiscal no período quanto com o pequeno número de unidades e anos na amostra. Seja como for, esse resultado parcial nulo vale apenas para cerca de um ano e meio dentre vinte. A evidência majoritária indica que partidos destinam mais recursos de ministérios que ocupam para prefeituras comandadas pelos seus membros, independentemente do partido ocupando a Presidência.
Efeito por ministério
Ministérios diferem uns dos outros. Para uns, realizar projetos locais é algo essencial para a consecução de seus objetivos; para outros, nem tanto. Por causa disso, certas pastas contam com mais verbas destinadas a investimentos em municípios do que outras. Partindo dessas constatações, é de se esperar que haja variação no efeito do alinhamento entre ministérios. Se em apenas um ou dois deles esse efeito exista e seja grande, o resultado principal reportado anteriormente não poderia ser generalizado.
O Gráfico 6 mostra que esse não é o caso. Como é possível verificar, em pouco mais de metade das pastas analisadas o efeito do alinhamento ministerial é positivo (maior que R$ 0,50 per capita ). Com relação à variação, vale destacar que a ordem dos ministérios apresenta um bom valor de face. No topo, Cidades, Integração Nacional e Saúde são as pastas nas quais partidos obtêm maiores retornos distributivos para seus prefeitos. Como é de amplo conhecimento, as três realizam muitos investimentos locais, especialmente em obras públicas, sendo frequentemente mencionadas como objeto de cobiça pelos partidos brasileiros (ver Power e Mochel, 2008). Ao contrário, em pastas com jurisdições mais específicas e funções menos relacionadas a investimentos em prefeituras, esse efeito não é diferente de zero. Esse é o caso principalmente da Ciência e Tecnologia, Justiça e Cidadania, Meio Ambiente e Defesa – que, por conta de suas atribuições, pouco investem em prefeituras. Em outras pastas, caso do MDS, investimentos locais tendem a ser mais universalistas, o que dificulta que sejam utilizados eleitoralmente pelos partidos. Feitas essas ressalvas, não é possível dizer que um ou outro ministério puxa isoladamente o efeito do alinhamento ministerial. Embora ele não ocorra em todos, o efeito é substantivo em um número razoável de pastas.
Timming do alinhamento ministerial
É mais fácil que eleitores votem em partidos que lhes trouxeram benefícios recentemente do que em outros que fizeram isso há mais tempo. Com base nessa ideia, alguns trabalhos na Economia Política sustentam que investimentos governamentais são influenciados pela proximidade das eleições: quanto mais próximo o momento de ir às urnas, mais governos gastam nessa expectativa. Adaptada para o estudo de transferências intergovernamentais, essa relação é corroborada empiricamente por alguns estudos ( Brollo e Nannicini, 2012BROLLO, Fernanda; NANNICINI, Tommaso. (2012), “Tying Your Enemy’s Hands in Close Races: The Politics of Federal Transfers in Brazil”. American Political Science Review, v. 106, n. 4, pp. 742-761. ; Corvalan et al. , 2018). Aqui, testo essa hipótese como uma forma adicional de explorar meu argumento. A expectativa é a seguinte: se partidos usam seus ministérios para praticar política distributiva esperando obter votos com isso, o melhor momento para fazê-lo é em anos eleitorais.
Os resultados do Gráfico 7 corroboram essa expectativa. Em anos sem eleições, prefeituras alinhadas não recebem quantias significativas nem substantivas de recursos em relação a prefeituras não alinhadas. Em ano de eleição municipal, entretanto, o efeito causal do alinhamento passa para R$ 1,12 per capita ; e praticamente dobra, indo a R$ 2,02, em ano de eleição nacional. Vale ressaltar que esse padrão é intuitivo considerando que, para partidos que ocupam ministérios, a eleição mais importante é nacional. Sem expandir ou manter suas bases eleitorais nas eleições legislativas, esses partidos arriscam perder cadeiras no Congresso e, com isso, influência para negociar ministérios em futuros governos. Desse modo, o melhor momento para prefeitos obterem repasses é precisamente quando seus correligionários estão prestes a disputar assentos na Câmara. Independentemente disso, há suporte nos dados também para afirmar que o alinhamento ministerial é incentivado pelo timming das eleições.
Quantificando o efeito agregado do alinhamento
Se o alinhamento partidário entre ministérios e prefeituras favorece as últimas na obtenção de recursos, disso decorre que algumas localidades receberão mais investimentos apenas por conta da filiação de seus prefeitos. Quantificar a extensão disso, entretanto, não é algo direto. Para tanto, seria necessário identificar quais repasses foram feitos por motivações puramente políticas, o que dispensaria a necessidade de estimar o efeito do alinhamento em primeiro lugar. Isso significa que qualquer exercício de quantificação do efeito agregado do alinhamento sobre a provisão de bens discricionários será sempre uma aproximação.
Ilustrativamente, a aproximação que uso é a descrita por Berman et al. (2017). Utilizando como base o efeito médio do alinhamento exibido no modelo 3 na Tabela 1 , de R$ 0,87 por ano e por ministério, comparo o quanto os estados da federação deixariam de ganhar em um cenário hipotético no qual o efeito do alinhamento fosse nulo. Esse exercício é implementado em duas etapas. Na primeira, tomo o modelo 3 para predizer (1) a quantia recebida pelos municípios-ano-ministério da amostra completa com menos de 50 mil habitantes e, (2), o quanto esses receberiam caso nenhum fosse alinhado, isto é, estabelecendo que todas as ocorrências da variável Alinhadoijt são iguais a zero. Com essas duas predições, na segunda etapa subtraio uma da outra, i.e. (1) - (2), o que resultada em uma medida de quanto municípios alinhados perderiam caso o efeito do alinhamento fosse igual a zero. Feito isso, agrego essa diferença por estado e calculo estatísticas de interesse.
Como dito anteriormente, esse exercício não me permite estimar quanto um estado realmente perderia caso o alinhamento não existisse. O objetivo dele é mais despretensioso: exemplificar como a distribuição dos ministérios e do número de prefeituras controlados por cada partido pode causar desigualdades regionais na alocação de bens. Legendas têm bases eleitorais diferentes umas das outras, com maiores ou menores penetrações em determinadas regiões, e é precisamente essas diferenças que produzem distorções. Das 2790 vezes que municípios elegeram prefeitos filiados ao PP na amostra que uso, por exemplo, 40% delas foram na região Sul; quando analisamos o PSB, 62% delas foram no Nordeste; e, para o PSDB, 44% no Sudeste. Consequentemente, uma vez no controle de ministérios, partidos acabarão espelhando suas penetrações pelo território, premiando mais regiões nas quais têm maior peso eleitoral.
Os mapas temáticos exibidos no Gráfico 8 exemplificam esse fenômeno. Como indicam as cores mais escuras, para alguns estados o efeito médio do alinhamento se traduz em ganhos consideráveis. Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, como é possível visualizar no mapa à esquerda, perderiam cerca de 7% de todas as transferências que receberam caso nenhum de seus municípios tivessem sido alinhados entre 1997 e 2016. Juntamente com os estados do Sul, Bahia e Pará, esses são os maiores beneficiários na comparação. Por conta do menor número de prefeituras alinhadas e menor peso demográfico, por sua vez, estados do Centro-Oeste, Norte e alguns do Nordeste saem perdendo. No mapa à direita, é possível ter uma noção do quanto essas diferenças de arrecadação decorrentes do alinhamento partidário significam em termos concretos: para São Paulo, isso equivale a quase R$ 700 milhões a mais em seus municípios, valor que também é considerável para Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia.
Na verdade, é provável que esses números não cheguem perto do real efeito do alinhamento na provisão de bens. Por assumir que o efeito médio do alinhamento vale igualmente para todos os municípios e ministérios isso descarta, de saída, diferenças importantes. Nas Cidades e Integração, como mostrei anteriormente, o efeito do alinhamento não só é muito maior que R$ 0,87 como, também, seus orçamentos para investimentos são muito maiores do que os de outras pastas. Nos dois casos, PP e PSB, com bases situadas em diferentes regiões, provavelmente levariam mais recursos. Além dessa limitação, o exercício anterior também utiliza apenas variações que ocorrem no alinhamento por conta de mudanças no gabinete, o que desconsidera variações provenientes de eleições locais. O fato de que mesmo com tudo isso os resultados revelam diferenças consideráveis na arrecadação entre estados sugere que o alinhamento tem influência real sobre as desigualdades regionais no país.
Os possíveis efeitos do alinhamento, além disso, não se restringem ao total recebido por cada localidade. Como partidos diferentes ocupam pastas com jurisdições distintas, o alinhamento também é relevante para entendermos como ações do Governo Federal chegam de forma desigual pelo território. Dizendo de outra forma, um partido que ocupa a pasta da Educação terá condições de investir mais em infraestrutura escolar nos municípios que comanda; outro, que controla o Ministério da Saúde, por sua vez, terá mais recursos para criar novas unidades de pronto atendimento; e assim sucessivamente. Aqui também, se os municípios administrados por cada partido estiverem distribuídos desproporcionalmente pelo território, o resultado será aumento na desigualdade na provisão de bens públicos específicos.
Esse ponto é ilustrado pelo exemplo dos municípios governados pelo PMDB, no Gráfico 9 . Em março de 2007, o ex-presidente Lula ofereceu o Ministério da Agricultura ao partido para estreitar os laços com a sua bancada na Câmara. A partir de então, e até o final do governo Dilma, a pasta permaneceu sob o mesmo comando. Usando o procedimento descrito anteriormente, é possível ver que essa estratégia não é sem consequência para os investimentos regionais da pasta. Em cada painel, indicado pelo nome das regiões do país, as linhas reportam a quantia estimada que cada uma arrecadaria ou perderia por mandato municipal sob o pressuposto de que o efeito do alinhamento é constante. Assim como no exemplo anterior, a conclusão principal é nítida: onde o PMDB comandou mais prefeituras, maior a quantia recebida por conta do alinhamento comparado ao mundo contrafactual no qual o PMDB nunca ocupou a Agricultura, como nos casos do Sudeste e do Nordeste.
: Recursos discricionários adicionais preditos pelo alinhamento partidário por região e por mandato: repasses da Agricultura para prefeituras do PMDB*
Robustez
Para examinar se as escolhas de especificação dos modelos e da variável dependente que utilizei alteram meus resultados, realizei alguns testes de robustez, disponibilizados em materiais suplementares. Primeiro, rodei modelos DiD e DDD adicionais com efeitos-fixos para ano-ministério-estado, o que absorve outros tipos de choques nos repasses ministeriais – como os que poderiam decorrer de fatores estaduais. Os resultados desse exercício são similares aos que reportei anteriormente. Segundo, rodei modelos calculando erros com bootstrap , com cluster para os municípios-mandato, para verificar se isso alteraria as inferências que apresentei, novamente com poucas modificações. Terceiro, examinei o efeito do alinhamento sobre: (1) o montante bruto repassado aos municípios pelos ministérios; (2) uma dummy indicando se houve repasse (útil especialmente por conta da presença de zeros na variável dependente original); (3) o total transferido bruto em logaritmo (mais um); e (4) o total transferido per capita em logaritmo (mais um). Apenas no primeiro caso os resultados não atingem significância, o que decorre largamente da enorme variação nos valores integrais. De maneira geral, portanto, esses testes vão ao encontro do que mostrei até aqui.
Mecanismos de distribuição
Partidos transferem mais recursos discricionários de suas pastas para os municípios que governam. Dito isso, não é possível inferir como esse processo ocorre, isto é, como partidos extraem recursos de suas pastas; como selecionam prefeituras a serem beneficiadas; e como escolhem o quanto repassar. Uma vez aceito que presidentes não são os principais responsáveis pela política distributiva do executivo, essas questões ficam em aberto.
Nesta seção, investigo três mecanismos não exaustivos para explicar o efeito do alinhamento ministerial. Conforme discutido anteriormente, dois deles captam a lógica do meu argumento. Para o primeiro, partidos indicam coletivamente um nome para ocupar determinado ministério e governos locais de correligionários passam a direcionar suas demandas específicas por recursos a ele, em parte porque adquirem vantagens informacionais. O segundo mecanismo está relacionado com a atuação direta de parlamentares no processo orçamentário, especificamente com a possibilidade de que suas emendas sejam destinadas simultaneamente a prefeituras e a ministérios de correligionários para aumentar suas chances de empenhar recursos e de reivindicar crédito por eles. Por fim, o terceiro mecanismo parte de outra perspectiva, assumindo que ministros selecionam beneficiários e influem de forma contínua para transferir a eles mais recursos. Para esse mecanismo, partidos não precisariam agir de forma articulada, talvez apenas na indicação de ministros, e a maior parte do viés alocativo seria produzida de cima para baixo, pelo lado da oferta de recursos.
Para distinguir entre esses canais, utilizo microdados sobre todas as propostas de transferências processadas por cada ministério no período entre 2009 e 2016. Divulgadas pelo SICONV, portal de gerenciamento de convênios adotado pelo Governo Federal por exigência do TCU, esses dados contêm informações detalhadas sobre origem, avaliação e empenho de todos os convênios celebrados entre União e entes subnacionais. Com essa fonte, mensuro fatores intermediários no caminho entre alinhamento ministerial e viés partidário na alocação de recursos. Metodologicamente, utilizo o desenho de DDD, mais robusto.
Por essa amostra ser diferente, começo replicando o efeito do alinhamento ministerial sobre os valores empenhados, e não os liberados, por ano e por ministério para cada município. Com isso, é possível examinar se, mesmo utilizando outra fonte de dados mensurada a partir de outra etapa da execução orçamentária dos ministérios, o efeito do alinhamento permanece. Conforme segue na primeira linha da Tabela 3 , o efeito encontrado, de R$ 1,25 per capita , é ligeiramente maior do que o que reportei anteriormente, além de ser consistente com o resultado esperado. Em termos substantivos, além disso, equivale a um aumento de cerca de um terço em relação ao que municípios não alinhados tiveram empenhado.
Os demais resultados dão suporte aos dois mecanismos relacionados ao meu argumento. Quando examinado o total per capita das propostas submetidas pelas prefeituras aos ministérios, indicador que utilizo para mensurar a demanda por repasses de acordo com o mecanismo 1, observa-se que prefeituras alinhadas requerem mais de R$ 15,00 per capita de ministérios alinhados comparadas a prefeituras não alinhadas, um aumento de quase 30%. Como governos locais precisam enviar propostas como requisito para firmar convênios e receber repasses ministeriais, esse resultado sugere que prefeitos alinhados conseguem contornar melhor os entraves e a burocracia envolvida nesse processo – o que está de acordo com a interpretação de que isso ocorre pela conexão com correligionários no nível nacional, que podem tanto interceder pelos políticos locais junto ao Governo Federal quanto orientá-los sobre como obter investimentos. Especificar como essas relações se formam passa muito longe do escopo deste artigo, mas os resultados da Tabela 3 mostram que a proatividade dos prefeitos não é explicada por emendas parlamentares propostas aos seus municípios, um outro caminho para iniciar convênios. Conforme indica a última linha abaixo da aba Mecanismo 1 , mesmo removendo valores associados a emendas, ainda assim prefeituras alinhadas demandam quase R$ 14,00 per capita a mais.
Passando ao segundo mecanismo, os resultados de três modelos apontam que parlamentares têm papel no viés partidário. Em ordem, o total proposto por meio de emendas de ministérios a prefeituras alinhadas é R$ 1,96 per capita , efeito que, embora substantivo, não é diferente de zero. Apresentar e aprovar emendas, contudo, não é garantia de que elas serão empenhadas. Parlamentares de diferentes partidos podem incluir emendas para ministérios e prefeituras comandadas pela mesma legenda, mas o que interessa em última instância é a possibilidade de que o Governo Federal se comprometa a pagar por elas. Na segunda linha da aba Mecanismo 2 , um modelo DDD tendo como variável dependente o valor empenhado das emendas mostra que, nesse caso, o efeito do alinhamento é significativo. Com estimativa de R$ 0,50 per capita , esse efeito causa um aumento de quase 30% no montante oriundo de emendas que uma prefeitura espera ter empenhado por ministérios alinhados.
Nesse sentido, os resultados indicam que, também para parlamentares, o alinhamento entre prefeituras e ministérios importa. Isso vai ao encontro de Batista (2015)BATISTA, Mariana. (2015), “A Conexão Ministerial: governo de coalizão e viés partidário na alocação de emendas parlamentares ao orçamento (2004-2010)”. Revista Ibero-Americana de Estudos Legislativos, v. 4, n. 1, pp. 3-16. e Baião et al. (2018), que sustentam que deputados de partido na coalizão vinculam emendas preferencialmente a ministérios controlados pelos seus partidos, o que poderia facilitar seus pleitos; e de Baião e Couto (2017)BAIÃO, Alexandre; COUTO, Claudio. (2017), “A eficácia do pork barrel: a importância de emendas orçamentárias e prefeitos aliados na eleição de deputados”. Opinião Pública, v. 23, n. 3, pp. 714-753. que mostram que deputados também alocam mais emendas para municípios governados por prefeitos correligionários, o que é condizente com a perspectiva de evitar disputas por credit claiming ( Ames, 2002AMES, Barry. (2002), The Deadlock of Democracy in Brazil. Ann Arbor, University of Michigan Press. ; Samuels, 2003SAMUELS, David. (2003), Ambition, Federalism and Legislative Politics in Brazil. Cambridge, Cambridge University Press. ). Indo um passo adiante, o que meus achados mostram é que ambos os fatores podem ter efeito combinado, revelando uma estratégia partidária para distribuir recursos entre níveis de governo.
Descontados os valores empenhados por meio de emendas do total empenhado, é possível ver que os primeiros não explicam todo o efeito do alinhamento. Conforme o terceiro modelo do Mecanismo 2 , prefeituras alinhadas ainda recebem R$ 0,71 per capita a mais dos ministérios independentemente das emendas direcionadas aos seus municípios – um aumento expressivo, de quase 50%, em relação a prefeituras não alinhadas. Comparado ao peso das emendas, portanto, o acesso direto aos recursos ministeriais é o que parece importar mais para explicar o efeito do alinhamento.
Alternativamente aos dois mecanismos anteriores, é possível que parte do viés partidário seja fruto da atuação direta dos ministros. Como forma de investigar essa possibilidade, examino o efeito do alinhamento sobre três variáveis dependentes: o total per capita proposto por cada prefeitura e rejeitado tecnicamente pelos ministérios, algo que poderia indicar influência política sobre a burocracia; o total per capita de propostas que aguardam análise por parte dos ministérios, que poderiam priorizar estrategicamente as demandas de prefeituras alinhadas; e o montante per capita proposto que não resultou na assinatura de um convênio, principalmente o caso de demandas que, a critério das pastas, não justificavam os investimentos solicitados. Caso haja influência sistemática dos ministros para direcionar recursos, o resultado dessas análises deveria revelar que prefeituras alinhadas sofrem menos impedimentos técnicos, têm menos demandas aguardando análise e menos planos de trabalho não assinados.
Os resultados da Tabela 3 não dão suporte a essas expectativas. Reportados na aba Mecanismo 3 , em dois dos três modelos os efeitos estimados não são diferentes de zero e, além disso, tampouco apresentam os sinais esperados. Em primeiro lugar, o efeito do alinhamento sobre o total per capita rejeitado tecnicamente é igual a R$ 0,04, indicando tanto que poucas demandas são barradas nessa etapa como também que ser ou não correligionário do ministro não faz diferença nesse aspecto. De forma similar, o total demandado por propostas que aguardam análise é maior para prefeituras alinhadas – o que pode decorrer, na verdade, do volume maior que essas solicitam de pastas alinhadas. Apenas no último caso, do total não assinado, o efeito encontrado é significativo e substantivo, mas, novamente, o sinal é o oposto do esperado: prefeituras alinhadas têm cerca de R$ 0,40 per capita a mais, um aumento de 56%, nunca inscritos em convênios. Como no caso anterior, isso é mais consistente com a ideia de que, por demandarem mais recursos, prefeituras alinhadas também têm mais deles não pactuados, rejeitados e aguardando análise – da mesma forma como também têm mais deles empenhados.
Conclusão
Presidentes brasileiros dispõem de numerosos meios para influir na forma com que seus governos distribuem bens públicos. Este artigo mostrou que isso não significa que eles necessariamente exercem essa influência. Quando incentivos legislativos os pressionam, presidentes podem dividir a decisão de onde investir recursos com outros partidos por meio da nomeação de ministros. Como resultado, cada legenda obtém o que precisa para recompensar governos de aliados locais – e a política distributiva do executivo deixa de ser centralizada pelos chefes de governo.
Como visto neste artigo, esse é um retrato adequado de como o governo brasileiro aloca recursos discricionários. Com desenhos de diferença-em-diferenças e dados sobre as transferências discricionárias de ministérios a governos subnacionais entre 1997 e 2016, em um primeiro momento mostrei que o alinhamento partidário entre ministros e prefeitos importa: quando alinhados partidariamente com alguma pasta, municípios recebem, em média, cerca de 25% mais repasses ministeriais. Mesmo concentrado em pastas conhecidas pelas suas atuações localistas, esse efeito é ainda maior em ano de eleições gerais e locais; é maior nos últimos governos do PT e do PSDB; e, se qualquer coisa, é ligeiramente maior para os partidos que ocupam Presidência da República. Mais sugestivo, meus achados mostram que esse efeito do alinhamento ministerial é pervasivo, ocorrendo em praticamente todas as administrações federais no período; em municípios pequenos e em municípios com menos trocas partidárias no comando local; e em municípios governados por parceiros de coalizão no nível nacional.
Em um segundo momento, investiguei os mecanismos usados pelos partidos para alocar recursos. Como a análise das propostas de transferências registradas no SICONV revelou, isso é explicado principalmente pela conexão entre níveis local e nacional dos partidos, que incentiva os primeiros a demandar mais recursos. Como mostraram os dados, prefeituras requerem muito mais repasses, e têm mais emendas empenhadas, de ministérios alinhados. Por outro lado, a evidência de que ministros atuam ostensivamente para manipular os investimentos de suas pastas é nula. Embora casos particulares certamente existam, conhecidos entre por assessores e burocratas, esses parecem ser a minoria.
A principal contribuição deste artigo foi ressaltar a importância da separação de poderes na política distributiva. Como mostram estudos recentes, nos Estados Unidos, presidentes podem interferir diretamente na alocação de recursos de seus governos – especialmente na abertura e fechamento de bases militares e na celebração de acordos comerciais, prerrogativas que lhes são exclusivas ( Hudak, 2014HUDAK, John. (2014), Presidential Pork: White House Influence over the Distribution of Federal Grants. Washington D. C., Brookings Institution Press. ; Krines e Reeves, 2015). No entanto, não se pode perder de vista a diferença central entre esse caso, ou do de países como o Reino Unido (Fouirnaies e Matlu-Eren, 2015), com o frequentemente encontrado na América Latina. Ainda que aqui presidentes normalmente contem com maiores poderes orçamentários, também enfrentam maiores dificuldades na arena legislativa. Se precisarem formar coalizões de governo para obter maioria, dividir ministérios e/ou recursos com parceiros de coalizão pode acabar sendo a forma de concretizar esse acordo. Contrariamente à literatura mais recente sobre o tema (Chaisty et al. , 2018), entretanto, minha análise mostra que presidentes podem dividir os dois simultaneamente, ministérios e recursos.
As implicações disso são várias. Conforme destaquei, a política distributiva da coalizão é capaz de provocar distorções geográficas na provisão de bens públicos; de aprofundar desigualdades regionais; e de criar incentivos para que políticos locais adaptem estrategicamente suas expectativas para demandar certos tipos de investimentos, em momentos específicos, apesar das necessidades e preferências de seus eleitores. Deixar de lado o pressuposto de que presidentes monopolizam as “chaves do cofre”, em suma, ilumina uma série de questões importantes que merecem ser investigadas em maior detalhe por pesquisas futuras, levando em conta também outros tipos de recursos; o papel de ministros não partidários na política distributiva (tanto experts quanto indicações de confiança do ou da Presidente; diferenças alocativas entre órgãos de segundo e terceiro escalões no Executivo; e o papel de outros atores nesse processo, como parlamentares e governadores.
Agradecimento
Agradeço aos comentários e sugestões dos e das revisoras da Dados que contribuíram para o desenvolvimento da versão atual do artigo. Também agradeço a Carlos Ranulfo, Magna Inácio, Felipe Nunes, Manoel Santos, Bruno Reis, Cesar Zucco e Natália Bueno por comentários e sugestões ao longo do desenvolvimento desta investigação. A pesquisa recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (processo: 2021/01393-2).
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Notas
-
1
. Bueno (2018)BUENO, Natalia. (2018), “Bypassing the Enemy: Distributive Politics, Credit Claiming, and Nonstate Organizations in Brazil”. Comparative Political Studies, v. 51, n. 3, pp. 304-340. discute uma estratégia alternativa, que consiste em alocar recursos para Organizações Não Governamentais (ONGs) de municípios governados por rivais, contornando suas tentativas de reivindicar crédito pelos recursos. Existem ainda estudos que argumentam que políticos nacionais alocam recursos em localidades onde possuem apoiadores, mirando em core supporters (Cox, 2009) ou em localidades governadas por aliados para obter a cooperação deles para implementar políticas ( Bohlken, 2018BOHLKEN, Anjali. (2018), “Targeting Ordinary Voters or Political Elites? Why Pork Is Distributed Along Partisan Lines in India”. American Journal of Political Science, v. 62, n. 4, pp. 796-812. ).
-
2
. No original, em inglês: « [...] the president has the last word in the decision process and has many opportunities to influence the geographic allocation of infrastructure transfers ».
-
3
. É conhecida a ideia de que, em alguns casos, presidentes oferecem ministérios de “porteira fechada”, isto é, deixando a critério dos ministros a nomeação dos cargos de segundo e terceiro escalões. Como ressalto adiante, entretanto, meu argumento não depende disso – ao contrário, depende apenas de que ministros, ou seus assessores e congressistas de seus partidos, tenham como facilitar a entrada de demandas de prefeitos aliados em suas respectivas pastas.
-
4
. Disponível em: < https://www.portaltransparencia.gov.br/> . Acesso em: 18/05/2021.
-
5
. A composição dos ministérios analisados pode ser vista em gráficos adiante, na seção de resultados.
-
6
. Disponível em: < https://siconv.com.br/> . Acesso em: 18/05/2021.
-
7
. Disponível em: < https://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores> . Acesso em: 18/05/2021.
-
8
. Para atualizar os dados e checar as nomeações, utilizei como fonte as biografias do CPDOC, quando disponíveis, e dados do Nexus Academic.
-
9
. A série de preços foi extraída do Ipeadata ( http://www.ipeadata.gov.br ), tendo como referência dezembro de 2017. Acesso em: 17/11/2018.
-
10
. Cabe notar, também, que essa unidade para aplicação de efeitos-fixos capta maior variação do que se fossem usados outros no nível dos estados, ou por ano, simplesmente. Nesse sentido, o desenho guarda maior robustez contra efeitos estaduais ou choques ao longo do tempo gerais.
-
11
. Como efeitos-fixos controlam diferenças entre ministros, um dos termos constitutivos pode ser omitido. Em outros modelos nos quais emprego interações, uso o mesmo procedimento.
-
12
. Faço isso para evitar que o peso populacional das grandes metrópoles determine os resultados, que são estimados em um dos testes em reais brutos.
-
13
. Como pode ser deduzido, não calculo intervalos de confiança para as estatísticas agregadas. Para tanto, seria necessário obter a matriz de variância e covariância das predições, o que demanda soluções computacionais custosas considerando que a base principal que utilizo neste artigo tem mais de 1,7 milhões de observações. De qualquer forma, como esse exercício parte da suposição de que o efeito do alinhamento é o mesmo para todas as unidades, calcular um intervalo de confiança não tem muita utilidade.
-
14
. Há que se notar, além disso, que estimar quanto um estado perderia não nos permite inferir qual seria o destino dos recursos não investidos. Para esse exercício, uma opção seria calcular o quanto cada estado perderia na ausência do alinhamento, somar todos esses valores e distribuí-los aleatoriamente entre as localidades – sob o pressuposto de que os recursos seriam destinados igualmente entre o território. De qualquer forma, como meu objetivo aqui é quantificar a importância do alinhamento, e não caracterizar um cenário alternativo de distribuição, não adoto esse procedimento.
-
15
. Disponível em: < https://diariogaucho.clicrbs.com.br/rs/noticia/2008/09/reinhold-stephanes-acredita-que-agricultura-sera-ultimo-setor-afetado-por-crise-norteamericana-2210209.html> . Acesso em: 18/05/2021.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
06 Mar 2023 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
12 Jul 2021 -
Revisado
24 Jan 2022 -
Aceito
7 Abr 2022