Acessibilidade / Reportar erro

‘A MANHÃ É UMA ESPONJA’: UM ESTUDO SOBRE A ENGENHOSIDADE SEMÂNTICA

The Morning is a Sponge: a Study on Semantic Ingenuity

Resumos

O meta-conceito 'metáfora' permite a elaboração de uma hipótese sobre a interpretação de metáforas inovadoras e sua relação com a engenhosidade semântica. Um proferimento é metafórico se, e somente se, ao mesmo tempo, um intérprete atribuir-lhe uma avaliação de ficcionalidade e sua interpretação se fizer através do procedimento semântico de projeção de predicados. Dada essa definição, o artigo procura mostrar que a interpretação de proferimentos metafóricos é função da presença simultânea de restrições advindas de diferentes lugares: restrições sintáticas, semânticas e pragmáticas. São essas restrições que balizam o procedimento de projeção de predicados. Ao final, defenderemos que nesse procedimento de projeção podemos reconhecer uma engenhosidade semântica, que não se confunde com a criatividade sintática tal qual é apresentada por Chomsky. A engenhosidade semântica pode ser melhor percebida na interpretação de metáforas inovadoras. Ela está, no entanto, presente na polissemia. Trata-se da capacidade de construir relações de similaridades.

Literal; Metafórico; Sentido; Avaliação; Criatividade Semântica


A definition of metaphor is presented in the first part of this paper. Roughly speaking, an utterance is metaphorical if at the same time it is judged to be fictional and its interpretation depends on projection. Such a definition allows the distinction between two types of utterances: conventional metaphors and living metaphors. For instance: ‘Maria é um anjo’ (Mary is an angel) and ‘A manhã é uma esponja’ (The morning is a sponge), respectively. The second section proposes a description of the interpretation of living metaphors. It will be argued that there are several layers of constraints with respect to the interpretation of living metaphors. The paper ends presenting the hypothesis of a "semantic" creativity (ingenuity). It will be defended that parallel to a syntactic creativity we need a semantic creativity (ingenuity). Semantic creativity may be better perceived in living metaphors, although it is a necessary operation in language. Without it each use of a lexical item would have to be treated as a different lexical entry and it would be very difficult to explain new uses of a lexical item

Literal; Metaphorical; Meaning; Evaluation; Semantic Criativity


‘A MANHÃ É UMA ESPONJA’: UM ESTUDO SOBRE A ENGENHOSIDADE SEMÂNTICA

(The Morning is a Sponge: a Study on Semantic Ingenuity)

Roberta Pires de OLIVEIRA

(Recém-doutor CNPq/UFSC)

ABSTRACT: A definition of metaphor is presented in the first part of this paper. Roughly speaking, an utterance is metaphorical if at the same time it is judged to be fictional and its interpretation depends on projection. Such a definition allows the distinction between two types of utterances: conventional metaphors and living metaphors. For instance: ‘Maria é um anjo’ (Mary is an angel) and ‘A manhã é uma esponja’ (The morning is a sponge), respectively. The second section proposes a description of the interpretation of living metaphors. It will be argued that there are several layers of constraints with respect to the interpretation of living metaphors. The paper ends presenting the hypothesis of a "semantic" creativity (ingenuity). It will be defended that parallel to a syntactic creativity we need a semantic creativity (ingenuity). Semantic creativity may be better perceived in living metaphors, although it is a necessary operation in language. Without it each use of a lexical item would have to be treated as a different lexical entry and it would be very difficult to explain new uses of a lexical item

RESUMO: O meta-conceito 'metáfora' permite a elaboração de uma hipótese sobre a interpretação de metáforas inovadoras e sua relação com a engenhosidade semântica. Um proferimento é metafórico se, e somente se, ao mesmo tempo, um intérprete atribuir-lhe uma avaliação de ficcionalidade e sua interpretação se fizer através do procedimento semântico de projeção de predicados. Dada essa definição, o artigo procura mostrar que a interpretação de proferimentos metafóricos é função da presença simultânea de restrições advindas de diferentes lugares: restrições sintáticas, semânticas e pragmáticas. São essas restrições que balizam o procedimento de projeção de predicados. Ao final, defenderemos que nesse procedimento de projeção podemos reconhecer uma engenhosidade semântica, que não se confunde com a criatividade sintática tal qual é apresentada por Chomsky. A engenhosidade semântica pode ser melhor percebida na interpretação de metáforas inovadoras. Ela está, no entanto, presente na polissemia. Trata-se da capacidade de construir relações de similaridades.

Key words: Literal; Metaphorical; Meaning; Evaluation; Semantic Criativity.

Palavras-chave: Literal; Metafórico; Sentido; Avaliação; Criatividade Semântica.

0. Introdução

Não iremos aqui demonstrar de maneira exaustiva as razões que nos levaram a adotar a definição de metáfora proposta na primeira seção deste artigo, pois nosso objetivo maior é demonstrar o funcionamento da criatividade semântica. Queremos, assim, não só descrever como se dá a interpretação de metáforas vivas e a que restrições sua interpretação está submetida, mas acima de tudo refletir sobre uma criatividade ou "engenhosidade" semântica, que permite a aprendizagem de usos de um item lexical1 1 O uso do termo ‘engenhosidade’ tem uma dupla função: de um lado distinguir essa capacidade semântica da criatividade sintática, de outro aludir à teoria do engenho formulada pelo Conceptualista. .A escolha por descrever a interpretação de metáforas vivas deve-se ao fato de que nelas a criatividade semântica pode ser mais facilmente apreendida. A meta da segunda parte deste artigo é mostrar como se dá a interpretação de metáforas novas. Cumpre salientar que neste estudo não buscamos reconstruir o que se passa na cabeça do intérprete quando ele se confronta com uma metáfora viva. Deveríamos, se esse fosse nosso objetivo, buscar comprovação na psicologia. Trata-se, antes, de propor uma reconstrução" lógica", no sentido de apresentar um modelo possível que dê conta da interpretação de enunciados nunca antes ouvidos ou lidos. É daí que partirá nossa reflexão sobre a questão da criatividade semântica, a habilidade de "fazer sentido" de enunciados novos, objeto da terceira parte. Finalizaremos apresentando a hipótese de existência de uma engenhosidade semântica, que nos permite compreender não apenas "novos" usos de um mesmo item lexical, mas também a plasticidade de um mesmo item lexical em diferentes contextos de uso.

1. Uma definição de metáfora

A nossa história sobre a metáfora começa, nos meados deste nosso século, com o descaso do Positivismo Lógico2 2 Para uma defesa mais substantiva da noção de ‘metáfora’, remetemos o leitor para Pires de Oliveira (1995). . Lembremos que o Positivismo Lógico desejava fundar o conhecimento científico em bases sólidas e objetivas. É nessa vontade de alcançar a objetividade da ciência que a descrição de teorias científicas passa a ser prioritária. Uma teoria científica estrutura-se, nessa perspectiva, hierarquicamente e como uma rede de sentenças interligadas, isto é, as sentenças teóricas seriam derivadas das sentenças observacionais, cuja verdade, por sua vez, poderia ser aferida através de uma verificação empírica no mundo. Nesse modelo, as metáforas estavam excluídas porque elas não podem ser verificadas, e se elas não são passíveis de verificação, então não podem promover um ganho de conhecimento.

É em oposição a essa visão do Positivismo Lógico e já sob a influência de autores como Wittgenstein, que Black (1962)3 3 Publicado pela primeira vez em 1954. escreve seu famoso artigo "Metaphor". O núcleo deste artigo é a hipótese radical de que as metáforas veiculam conhecimento. A metáfora não se traduz para um literal porque, nos diz Black, na sua tradução o aspecto do "evento" promovido apenas via interpretação da metáfora se perde4 4 O termo‘ evento’ deve ser entendido aqui em sentido amplo de referência a fluxo de coisas. . O ato cognitivo, viabilizado apenas pela metáfora, está no fato de que ao interpretar uma sentença metafórica organizamos um evento através da instauração de uma perspectiva. Assim, não dizemos o mesmo quando dizemos:

O modo de apresentarmos o homem velho muda se para alcançá-lo utilizamos a propriedade ‘ser criança’ ou a propriedade ‘ser mentalmente incapaz’. Essa intraduzibilidade da metáfora para uma sentença literal - isto é, uma sentença que possa ser objetivamente confrontada com os fatos do mundo observável - marca seu caráter fortemente epistêmico.

Acrescente-se a essa crítica de Black que há inúmeros casos em que a tradução da sentença metafórica por uma outra literal parece ser simplesmente impossível, ou seja, nesses casos ou interpretamos as sentenças metafóricas sem auxílio de tradução para um literal ou não as interpretamos. Prandi (1992) lista inúmeros exemplos que falseiam a hipótese de que a interpretação da metáfora se dá através de sua tradução para uma sentença literal. Eis um exemplo que, segundo este autor, resiste à tradução, embora ele seja interpretável:

(3) Ma mère est un champ de blé.

Minha mãe é um campo de trigo.

Se para interpretarmos uma sentença metafórica não a traduzimos para uma sentença literal, como é que a interpretamos? Segundo a teoria interacionista, introduzida por Black, o processo de interpretação em (3) depende de vermos a mãe com os óculos de um campo de trigo. É certo que tal definição peca pela vagueza, pela não explicitação de como essa operação de projeção se dá. Neste primeiro artigo, Black se limita a sugerir que a metáfora é um filtro através do qual vemos um evento: imagine que, ao olharmos o céu, colocamos diante de nossos olhos um filtro com riscos. O filtro permite que certas estrelas apareçam ao mesmo tempo em que encobre outras. As lentes organizam uma perspectiva do céu. O mesmo ocorre no caso da metáfora: moldamos uma apresentação da mãe que é filtrada por uma referência ao campo de trigo.

Em seu segundo artigo sobre metáfora, Black (1979) caracteriza melhor o funcionamento da metáfora. Através de um exemplo sobre as diferentes maneiras de concebermos a figura da estrela de David, Black chama atenção para nossa capacidade de" ver A como B"6 6 Há na descrição que Black faz da metáfora uma clara influência do segundo Wittgenstein, em especial da reflexão sobre os jogos de linguagem que o ‘ver’ e o ‘ver como’ estabelecem. Ver Gill (1979). . Ele mostra que a estrela de David pode ser concebida através de diferentes formas: dois triângulos retângulos justapostos, um hexágono regular com um triângulo retângulo em cada uma de suas extremidades ... Isso significa dizer que essa operação de descrição, esse" ver como", não está presente apenas na interpretação de metáforas, está presente até mesmo na nossa percepção de um objeto geométrico tão simples quanto a estrela de David. Mais que isso, que esse "ver como" é necessário para alcançarmos qualquer possibilidade de organizarmos o fluxo de coisas, para descrevermos um evento. É o próprio Black quem chega à conclusão de que esse "ver como" é fundamental para termos um mundo:

I still wish to conted that some metaphors (original ones) enable us to see aspects of reality that the metaphor’s production helps to constitute. But that is no longer surprising if one believes that the world is necessarily a world under a certain description - a world seen from a certain perspective

(Black, 1979:39-40).

São inúmeras as implicações dessa afirmação sobre o "ver como". Talvez a mais séria dentre elas esteja no seu convite ao relativismo, posição bastante frágil. Mas esse é tema para outro artigo. Interessa, aqui, salientar que Black acena com vigor para a possibilidade de dissolvermos a distinção entre literal e metafórico, enquanto dois processos distintos de construção do sentido; daí provavelmente Back falar em sentido metafórico7 7 Para uma discussão ver Pires de Oliveira (1995). . Se mesmo o mundo perceptual é função de uma descrição, na medida em que é sempre visto a partir de uma certa perspectiva, então não é surpreendente que a metáfora, ao apresentar um objeto sob um novo prisma, tenha um papel tão importante no nosso raciocinar e no nosso agir. O que significa que não há essências, no mundo físico ou no mundo das idéias, que possam amparar nosso "dar sentido". Se chegamos a lidar com um conceito genérico como homem não é via apreensão de uma essência comum a todos os homens e mulheres, um generalização, mas pelo estabelecimento de relações de semelhanças e diferenças8 8 Essa hipótese não é fundamentalmente empirista. . Sendo assim, podemos imaginar uma realidade completamente diferente da nossa, mesmo que ambas coexistam no mesmo mundo físico. Essa é a conclusão de Hesse (1987), para quem a linguagem como um todo é metafórica. Outros autores fizeram a mesma afirmação. Indurkhya (1992) não afirma que a linguagem é metafórica, mas mostra que a operação de "projeção" é necessária para a construção de qualquer categoria, inclusive aquelas ligadas à nossa apreensão visual.

Lakoff e Johnson (1980) também defendem que a metáfora, entendida como processo de mapeamento de um domínio alvo num domínio fonte, é responsável pela maior parte do nosso agir e pensar cotidianos. No entanto, a teoria semântico-pragmática proposta pela lingüística cognitiva depende da existência de universais que são apreendidos diretamente através do nosso corpo em interação com o meio. É muito difícil, como mostrou Levinson (1992,1994), afirmar quais seriam essas categorias e esquemas universais. Apenas para exemplificar, pesquisas na área de lingüística antropológica mostram que o esquema CAMINHO (PATH), considerado como um esquema corpóreo cuja apreensão depende exclusivamente do modo como nosso organismo é e de sua relação com o ambiente físico, não é universal.

Para evitarmos uma distinção cognitiva entre dois processos diferentes de formação do sentido, defendemos, na esteira de Black, Hesse e Indurkhya, que esse processo de "ver como" subjaz ao "dar sentido", das categorias básicas às metáforas mais inovadoras. Sem essa operação de agrupar semelhanças no diferente não conseguiríamos apreender os usos mais elementares das palavras. Na mesma direção dos autores indicados, ao invés de dissolver a distinção entre literal e metafórico, buscamos reconstruí-la. A presença da projeção, do" ver como" é necessária para a interpretação de sentenças metafóricas, mas não é suficiente enquanto procedimento de identificação de um enunciado como metafórico. A distinção literal e metafórico não pode ser buscada em processos cognitivos diferentes, mas se delimita por expressar duas atitudes distintas de avaliação por parte dos intérpretes.

A necessidade da distinção entre diferentes julgamentos da relação entre linguagem e mundo não é meramente teórica, antes busca recuperar uma intuição dos falantes. Não a intuição de aceitabilidade ou de gramaticalidade de sentenças, mas de avaliação dos usos da linguagem. Essa intuição pode ser verificada através de alguns testes. Por exemplo, a inserção de uma frase "como se" pode mostrar que há uma diferença entre usos literais e usos metafóricos. Considere os seguintes exemplos:

(4) Fomos jantar na (casa da) Cris.

(5) Este texto me tomou uma manhã de trabalho.

(6) A manhã é uma esponja.

Não é difícil argumentar que as sentenças acima são metafóricas. Mas essa afirmação nos parece inadequada, porque passa por cima da avaliação que os falantes fazem da relação entre os usos da linguagem e o mundo. Se inserirmos a frase" como se", obtemos:

(4’) ? Fomos jantar como se fosse na Cris.

(5’) ? Este texto, é como se ele tivesse tomado uma manhã de trabalho.

(6’) A manhã, é como se ela fosse uma esponja.

Note que (4’) e (5’) não têm as mesmas implicações do que (4) e (5). Já (6’) é uma das implicaturas sugeridas por (6). A inconsistência presente em (6), criada pela aproximação de esponja e manhã, leva o intérprete a imaginar que seu interlocutor está falando hipoteticamente. Essa suposição é explicitada por (6’). Em (4) e (5) não há inconsistência e a inserção da frase "como se" hipotetiza o que é afirmado em (4) e (5).

Uma sentença é avaliada literalmente se o intérprete acredita que o locutor está descrevendo como as coisas são. Não se pense aqui em verdade como cotejamento direto entre linguagem e o mundo. Trata-se, sim, da avaliação de que o outro usa as palavras com seu sentido sistemático e se refere a um mundo que é compartilhado. A avaliação de ficcionalidade depende do intérprete atribuir ao locutor o desejo de re-descrever a realidade. Caímos aqui num ponto extremamente complicado, que não será defendido de forma exaustiva. Apontamos, apenas, que o julgamento de literalidade deve preceder àquele de ficcionalidade. Há indícios de que as crianças partem de uma postura que atribui aos adultos o estabelecimento da ordem das coisas como elas são - uma ordem estabelecida pela linguagem - e só posteriormente percebem as metáforas, as ironias9 9 Ver, sobre a questão, Winner (1988). . O brincar conscientemente de faz-de-conta depende, pois, da criança já estar minimamente situada com relação a uma realidade.

De qualquer maneira, do ponto de vista do adulto, sentenças julgadas literais são investidas por uma crença de que elas estabelecem uma relação direta entre mundo e linguagem. Que isso seja uma ilusão daquele que fala uma língua é uma outra questão. As sentenças literais podem ser chamadas de ficcionais por um observador de fora daquela realidade. A metáfora é fruto da avaliação do intérprete de que se trata da possibilidade de uma outra relação entre mundo e linguagem que não a que estabelecemos na realidade10 10 Ver o tratamento de metáfora a partir da semântica de mundos possíveis realizada por Hintikka (1994). . Note que não são apenas as metáforas que são investidas de ficcionalidade. Há todo um raciocinar que depende dessa capacidade de pensar aquilo que não é, mas poderia ser. Considere, por exemplo, raciocínios do tipo "se eu fosse o presidente...". É saber que se está raciocinando hipoteticamente que caracteriza a atribuição de metaforicidade a um enunciado.

A título de exemplo, consideremos um caso limite:

(7) O cérebro/mente é um computador.

Embora Boyd (1979) e Psylyshyn (1979) compartilhem muitas crenças e conhecimentos, disputam a metaforicidade da sentença (7). Boyd defende uma leitura metafórica, porque, para ele, há uma fronteira real entre as categorias Mente e Computador, ainda que possamos aprender muito hipotetizando um mundo em que organizamos nossa compreensão da mente através de semelhanças com o funcionamento do computador. Mente e computador formam, para Psylyshyn, uma única categoria, daí sua literalidade: "for me the notion of computation stands in the same relation to cognition as geometry does to mechanics: It is not a metaphor but part of a literal description of the cognitive activity" (Psylyshyn, 1979:557). Como "ver como" é fundamental para a construção do sentido, não é surpreendente que haja disputas com relação à metaforicidade de um determinado enunciado.

O julgamento de literalidade ou metaforicidade, assim como a própria interpretação, é guiado pela combinação de uma série de parâmetros: o conhecimento da língua, o conhecimento de mundo, a referência a um tópico conversacional, o conhecimento sobre as condições da enunciação, o conhecimento mútuo entre os interlocutores... Um intérprete atribui a outro intérprete toda uma gama de crenças e conhecimentos. Não há necessidade de uma coincidência estrita entre as teorias do falante e do intérprete. Para nossas interações no mundo, o melhor é que haja sempre um trabalho de interpretação, uma defasagem entre as teorias que os intérpretes se atribuem.11 11 Creio estar aqui reproduzindo, em grande parte, o modelo de interpretação desenvolvido por Davidson (1986).

Note que a hipótese da presença necessária de um julgamento de literalidade ou ficcionalidade relaciona-se ao modo como os intérpretes concebem a relação entre linguagem e mundo e como eles a atribuem ao seu interlocutor. Duas considerações parecem ser importantes: em primeiro lugar, a idéia da avaliação permite que sentenças, cuja interpretação é sistemática, ainda sejam vistas como metafóricas. Esse é o caso de:

Isso significa que a metáfora não é necessariamente não-convencional. Em segundo lugar, essa avaliação certamente depende do sentido dos termos de forma que o uso sistemático de um termo pode apagar qualquer traço de metaforicidade. É o caso clássico da chamada catacrese, e também de sentenças como (9 (9) Carlos é um cachorro. ):

‘Ser cachorro’ em (9 (9) Carlos é um cachorro. ) pode não fazer referência a cachorro; nesse caso trata-se de uma ambigüidade lexical e (9 (9) Carlos é um cachorro. ) não é metafórica. Voltaremos a esse tópico na última sessão deste artigo.

Ao lado de metáforas convencionais, há as metáforas vivas, que não têm interpretação sistemática. Eis alguns exemplos:

(10) Arquitetura é música congelada.

A questão mais importante, suscitada pelas metáforas vivas, refere-se à possibilidade de descrever como se dá a sua interpretação. Responder a essa questão permite refletirmos sobre como interpretamos enunciados nunca antes ouvidos ou lidos, como estendemos nosso vocabulário. Busca-se, pois, descrever a engenhosidade semântica que todos nós temos.

2. A interpretação de metáforas vivas

Partimos, pois, da seguinte definição de metáfora: um enunciado é metafórico se e somente se ao mesmo tempo ele for investido por um julgamento de ficcionalidade e sua interpretação depender do processo cognitivo de projeção.

Como é que interpretamos metáforas vivas? Vamos mostrar que a interpretação de uma metáfora viva sofre diferentes restrições: restrições sintáticas, semânticas e contextuais. A impossibilidade de lidar simultaneamente com essas restrições não deve ser vista como um sinal de que a interpretação ocorre por etapas. A hipótese, que nos parece mais plausível, é que um mesmo objeto lingüístico, digamos uma metáfora viva, pode ser visto simultaneamente por vários" processadores".

2.1. A restrição da forma

É lugar comum nos estudos sobre a metáfora a afirmação de que as metáforas não estão sujeitas a restrições sintáticas, porque são um fenômeno puramente semântico e/ou pragmático. Essa crença aparece em Barnden (1993):" metaphor is not to be identified with any particular syntactic forms in language. Metaphor is a matter of meaning and context" (1993:520). Barnden filia-se à lingüística cognitiva que entende metáfora como mapeamento de domínios, uma operação cognitiva que se reflete na linguagem.

Se admitimos que a presença de um julgamento de ficcionalidade é decisivo para tomarmos um enunciado como metafórico, observamos que nem todas as combinações sintáticas são possíveis enquanto estruturadoras de sentenças metafóricas. Mesmo sem admitir um julgamento de ficcionalidade, a análise de sentenças metafóricas mostra que a sintaxe limita o leque de interpretações possíveis. Com relação às combinações sintáticas, verificamos, em nosso estudo, que o foco da metáfora não pode ocupar qualquer posição sintática.12 12 Ver Pires de Oliveira (1995). O termo ‘foco’ foi introduzido por Black (1962).

Em sua descrição da estrutura lingüística de uma sentença metafórica, Black argumenta que uma sentença metafórica compreende uma estrutura literal na qual um elemento "estranho" a essa estrutura é inserido. Embora seja impossível explicitar os critérios necessários e suficientes para classificar um enunciado como metafórico, há, diz-nos Black, algumas estratégias, por exemplo, rupturas gramaticais ou ontológicas. Em nosso estudo (1995), entendemos por" foco" o elemento prontamente identificado pelo intérprete como convidando para uma leitura metafórica, porque ele introduz uma inconsistência. Nossa definição não restringue o termo ‘foco’ ao nível da sentença, mas admite que a determinação do foco pode ser contextualmente motivada. A sentença abaixo, por exemplo, pode comportar uma leitura metafórica:

(12) Uma tempestade está a caminho.

Imagine que ela foi pronunciada num momento em que de fato uma tempestade estava se formando. Olhando a tempestade pela janela, um empresário diz (12) para sua fiel secretária, momentos antes de uma reunião com o líder do sindicato dos empregados e ambos sabem que a reunião será uma tempestade.

Na abordagem proposta pela lingüística cognitiva podemos falar em preposições metafóricas, como no exemplo (4) acima, porque em foi deslocado do espaço para o social. No entanto, considerar metafóricos enunciados investidos por ficcionalidade implica em considerar que não há exemplos de sentenças metafóricas cujo foco esteja na preposição, na conjunção ou no determinante. Cumpre dizer que o foco da metáfora pode estar no sintagma preposicional, mas ocupará sempre a posição do nome, nunca a posição da preposição. Como por exemplo em:

em que o foco está em gente.

Além dessa restrição com relação à posição em que o foco da sentença metafórica ocorre, nosso estudo mostrou que os focos estão predominantemente em posição de núcleo do sintagma nominal ou do sintagma verbal. São raros os casos em que o foco está na posição de núcleo do sintagma adjetival e mais raros ainda os casos de foco na posição de advérbio. Casos de foco no advérbio só foram encontrados em textos literários e eles constituem um caso limite à própria definição de metáfora apresentada, no sentido de que podem ser descritos como usos não-sistemáticos, investidos de ficcionalidade, mas sem a presença da operação de projeção.

Há, parece-nos, uma boa razão para essa restrição com relação à posição do foco nas sentenças metafóricas. Nossa hipótese refere-se ao fato de que a possibilidade de metaforizar está ligada a maneiras de apresentar um evento, a formas de descrevê-lo. Isto é, a metáfora impõe uma relação de descrição, mesmo que essa descrição seja feita na clave da ficcionalidade. São os nomes e os verbos, as classes lexicais que descrevem eventos e objetos. São eles as categorias conceituais, que desenham apresentações de um mundo. Daí a predominância das metáforas centralizadas nestas classes. Parece-nos interessante traçar aqui um paralelo com a distinção elaborada por Wilson (1996) entre categorias conceituais e categorias de processamento (procedural category). As categorias de processamento indicam modos de processamento, no sentido de que elas contêm informações que restringuem as inferências, sem ter conteúdo cognitivo. Os focos de sentenças metafóricas devem estar em categorias conceituais.

Qualquer que seja a explicação, não é verdade que a metáfora ocorre em qualquer combinação sintática. Voltemos, agora, à questão mais interessante: qual é a contribuição da estrutura sintática à interpretação de metáforas vivas? A hipótese levantada por Lamiroy (1987) é que uma sentença metafórica exibe uma estrutura sintática mais rígida; ela é resistente a transformações sintáticas. Quanto mais rígida a estrutura sintática, maior a liberdade semântica, porque a rigidez sintática provê uma interpretação mínima para a sentença. É essa nossa hipótese sobre o papel da sintaxe na interpretação de metáforas vivas. Considere o seguinte exemplo:

(14) Os outros empinavam insultos. (Guimarães Rosa)

Há indícios de que essa sentença deve ser lida metaforicamente, dentre eles a presença de insultos como objeto do verbo empinar, uma inconsistência gramatical. A rigidez da estrutura sintática em (14) pode ser verificada pela impossibilidade da passiva:

A passiva, no entanto, é possível em sentenças em que o verbo empinar toma um objeto costumeiro:

A questão é descrever como (14) seria interpretada, supondo que o intérprete estivesse disposto a interpretá-la. Nossa hipótese é de que a interpretação de uma sentença metafórica vem da contribuição de diversos fatores, dentre eles a sintaxe. O fato de que verbo empinar instaurar uma certa estruturação sintática direciona a interpretação da sentença.

Considere o exemplo em (10), esponja vem antecedida pelo artigo indefinido uma, o que significa dizer que se trata de uma" small clause". Ser uma small clause impulsiona o intérprete a privilegiar uma interpretação atributiva, ou seja, ‘ser uma esponja’ funciona como uma predicação sobre a manhã. Certas interpretações de (10) são, pois, bloqueadas pela própria sintaxe da sentença. Por exemplo, uma leitura de identidade estrita entre esponja e manhã está bloqueada13 13 Sobre a distinção entre duas estruturas possíveis com o verbo ‘ser’, ver Tamba-Mecz (1981). . A sintaxe contribui, portanto, para a interpretação de metáforas vivas no sentido de prover lugares que por estarem preenchidos já atribuem aos itens lexicais que os preenchem certas propriedades, rechaçando certas interpretações. Só que essa não pode ser toda a história da interpretação de metáforas vivas.

2.2. A restrição do sentido

Antes de mais nada, uma palavra rápida sobre ‘sentido’. Toda vez que falamos em semântica nos defrontamos com o problema do ‘sentido’. Como bem lembra Putnam (1975), ao contrário da gerativa, que conseguiu estabelecer uma noção científica de sintaxe, a semântica está em situação precária, porque se baseia num conceito pré-científico de sentido. E estamos longe de um acordo mínimo sobre o que é‘ sentido’. Embora este seja um tema de prioridade para quem se propõe a descrever a interpretação de metáforas vivas, assumiremos uma posição teoricamente leve. Entendemos que um item lexical, quando inserido numa sentença, dá uma contribuição relativamente sistemática à sentença, no sentido de que o intérprete tende a atribuir a ele essa contribuição sistemática, ao mesmo tempo em que o falante espera que o intérprete atribua essa sistematicidade ao item lexical. Em outros termos, se eu acredito que você sabe português, creio que ao dizer "O gato está em cima do capacho" você atribui a gato uma contribuição similar àquela que você atribui a gato em "Gato faz miau". Enquanto locutor, eu conto com esse conhecimento seu. Não importa que eu e você tenhamos teorias distintas sobre gatos ou sobre como usamos gato, desde que no momento em que eu pronuncie "O gato está em cima do capacho", com a intenção que você atribua as minhas palavras seu sentido sistemático, você cumpra as minhas expectativas14 14 Reporto-me novamente ao trabalho de Davidson. . Nada impede, obviamente, que você resolva romper nosso pacto de damas. Essa contribuição sistemática envolve tanto conhecimentos de natureza mais propriamente lingüística, quanto aqueles de caráter mais enciclopédico.

Se a sintaxe baliza minimamente a interpretação de metáforas vivas, ela não é suficiente para o intérprete chegar a uma interpretação mais plena. Nosso conhecimento semântico desempenha um papel fundamental na interpretação de metáforas vivas. Na metáfora está presente o processo de projeção: certas propriedades atribuídas a um evento são projetadas em outro evento, resultando um feixe de similaridades. Lakoff e Johnson (1980) também partem da hipótese de que é esse o funcionamento da metáfora. No entanto, a lingüística cognitiva afirma que as metáforas são de textura aberta (open-ended), não estando esse mapeamento sujeito a restrições. Procuraremos mostrar que a operação de projeção é balizada por uma estrutura dos eventos e por parâmetros de ordem semântica/pragmática.

Embora a hipótese da projeção tenha já uma longa história nos estudos da metáfora, ela só foi formalizada recentemente por Indurkhya (1992). No modelo proposto por Indurkhya, a projeção se dá entre dois planos hierarquicamente ordenados: o plano do "evento" e o plano da "conceitualização". As aspas são para indicar que um plano de conceitualização pode funcionar como evento para outro plano de conceitualização hierarquicamente superior. Além do mais, nas metáforas, projeções não convencionalizadas para Indurkhya, há sempre dois eventos: a conceitualização instanciada por um evento é projetada no evento-alvo. Por conceitualização, Indurkhya entende uma rede de predicados interligados que são instanciados por um item lexical e que organizam uma visão do evento.15 15 Para um desenvolvimento completo da formalização, remeto o leitor para Indurkhya (1992), em especial o capítulo 6.

Vejamos, novamente, a sentença em (10). A estrutura de projeção pode ser esquematizada como abaixo:

A flecha pontilhada indica projeção convencionalizada, enquanto que a cheia indica projeção nova.

A hipótese é que o foco esponja instancia uma série de predicados interligados, como: ‘absorve algo’, ‘limpa algo’,‘ custa algo’, ‘é feita de algo’, ‘é uma esponja’ ... Digamos que até aqui não tenhamos tantos problemas, o que certamente não é verdade. A questão que se coloca é: que predicados instanciados por esponja organizarão nossa compreensão da manhã? O primeiro passo é descartar aquelas projeções que são impossíveis, e está aí outra restrição. A projeção de alguns predicados está bloqueada pela própria estrutura projetiva, no sentido de que o evento que está sendo descrito, o evento-alvo, impõe uma ordem na rede conceitual instanciada por esponja. Assim, ‘custar (x, y)’ não será projetado em manhã, porque nosso conhecimento sobre manhãs impede que as vejamos como algo que possa custar. É por essa mesma razão que ‘ser feito de esqueleto marinho (x)’ é bloqueado. De forma que a projeção é restrita por nosso conhecimento sobre o domínio alvo. Não é, pois, qualquer predicado que pode ser instanciado e projetado na interpretação de uma metáfora viva.

Mesmo levando-se em consideração essa restrição, há ainda inúmeras interpretações disparadas pela projeção de esponja em manhã. Eis algumas delas:

(17) A manhã absorve algo.

Deixamos o objeto vazio de propósito, mas é evidente que seu preenchimento aumentaria ainda mais as possibilidades de interpretação da metáfora. Tomando apenas (17), poderíamos ter:

Nosso problema agora é: como delimitar essa gama de interpretações? Afinal quando alguém faz uma metáfora deseja (tem a intenção) que seu intérprete chegue a uma certa interpretação, que haja uma convergência de interpretações. O intérprete, por sua vez, crê que aquele que disse uma metáfora foi relevante, quis dizer algo que pode ser alcançado mesmo que de forma imprecisa. Se dispomos apenas da sintaxe e da semântica, chegamos a um leque enorme de interpretações. Embora essa situação seja bastante comum em trabalhos sobre metáfora, que insistem em descrever metáforas fora de contexto de uso, não nos parece ser a situação prototípica de interpretação de metáforas vivas.

Com relação ao exemplo (14), em que insultos é argumento de empinar, falar de estrutura de projeção ainda não resolve nosso problema, porque, apenas com a sentença, não conseguimos saber a que a sentença se refere e, portanto, não somos capazes de montar a estrutura projetiva.

2.3. A restrição do contexto

O leitor já deve estar desconfiado de que nossa abordagem, ao menos até aqui, tratava as sentenças como entidades autônomas, isto é, cuja interpretação pode ser alcançada sem referência a um contexto de proferimento da sentença. A interpretação da sentença envolveria exclusivamente a combinação de elementos lingüísticos, sem qualquer alusão a um contexto particular. No entanto, a interpretação mínima de uma sentença só se instaura mediante a presença um contexto" por falta". Assim, a sentença abaixo, tomada isoladamente, instaura por falta um contexto de proferimento que direciona uma interpretação:

(24) Está nevando.

Em seu contexto por falta, (24) aponta para um ato de enunciação em que está nevando. Nesse contexto mínimo, ela pede uma avaliação de literalidade. Naturalmente, se permitimos em nossa análise abarcar mais informação contextual, sua interpretação pode se alterar consideravelmente, embora seu sentido, enquanto intenção semântica - intenção de que o intérprete atribua às palavras sua contribuição sistemática - permaneça o mesmo. Entramos aqui, de novo, num terrreno de batalhas. Contentamo-nos em mostrar que ao dizer (24) o falante pretende que seu intérprete atribua as palavras em (24) seu sentido sistemático. Claro que o falante pode pretender outras coisas além do intérprete compreender sua "intenção semântica".16 16 Também essa noção vem de Davidson. Se, por exemplo, planejamos ir esquiar e nós dois sabemos disso, então o fato de você me dizer (24), e dado o princípio de relevância conversacional, posso inferir que você está me convidando para irmos esquiar.

A princípio nada impede que (24) seja interpretada metaforicamente. Imagine que ela é dita no momento em que ao passearmos por um bosque em plena outono europeu, florzinhas brancas começam a cair. Nesse contexto, a leitura preferencial, dado que os intérpretes sabem que de fato não está nevando e que o intérprete tem razões para supor que o falante está sendo relevante, é metafórica. Nesse caso, nevar instaura uma série de predicados que são projetados na situação que está sendo descrita. Esse seria um caso de metáfora viva.

A sentença (25 (25) O imperador comeu um pedaço de mim 17 ) abaixo pede, em seu contexto" por falta", uma interpretação metafórica:

Não há aqui ruptura das regras gramaticais do português, mas uma violação de uma norma culturalmente aceita: é um interdito, ao menos na nossa cultura, comermos pedaços de outros humanos. É a atribuição dessa crença ao locutor suposto que nos leva a rechaçar uma interpretação literal. Se, no entanto, locutor e intérprete sabem que o imperador é antropófago, há um privilégio da interpretação literal.

Assim, uma sentença isolada instaura um contexto por falta. Foi esse contexto por falta que nos levou a atribuir a (10) uma leitura metafórica. Notamos, no entanto, que nesse contexto mínimo a interpretação da sentença (10) é de textura aberta, pois ela dá lugar a inúmeras leituras, sem que possamos privilegiar um conjunto delas. Isso se dá porque, no contexto mínimo, dispomos apenas de informações sintáticas e semânticas veiculadas apenas pela sentença. Se ampliarmos nosso leque de informações, de modo que a sentença seja inserida num contexto mais amplo, então o espectro de interpretações possíveis se reduzirá. Em outros termos, a interpretação de uma metáfora viva é balizada por informações contextuais, que, nesse sentido, funcionam restringindo o leque de interpretações possíveis.

Um modelo formal para se descrever a contribuição de informações contextuais para a interpretação pode ser encontrado em Sperber e Wilson (1986). Faremos aqui uma descrição informal. A sentença (10) aparece no conto" Partida do audaz navegante" de Guimarães Rosa. Ela é imediatamente precedida pelo seguinte fragmento:

"Na manhã de um dia em que...chuviscava. Tanto chove, que me gela. Só ouvira o rumorejo da chuvinha".(1972:117)

O leitor desse conto sabe que havia chovido muito antes do amanhecer-esponja. Nesse contexto, há uma convergência de interpretações, de tal sorte que algumas são excluídas. A sentença abaixo, por exemplo, não é uma interpretação de (10) no contexto descrito acima, embora ela possa ser uma interpretação de (10) em seu contexto mínimo:

Assim, o contexto em que a sentença metafórica se encontra também delimita o leque de interpretações na medida em que indica que predicados serão instanciados na projeção. Note que falamos acima de ‘apagar (x,y)’ e‘ absorver (x, y)’ como candidatos a serem projetados em manhã. No contexto em que (10) ocorre, será ‘absorver (x, y)’ o predicado instanciado, porque o intérprete sabe que se trata de uma manhã ensolarada após vários dias de chuva. Mais que isso, o leitor sabe que ‘y’ refere-se à água da chuva. Nesse caso, o único predicado consistente com o evento descrito é ‘absorver (x, y)’.

Apresso-me em dizer que a descrição dos vários fatores que intervêm na interpretação de uma metáfora viva não esgota o que a metáfora faz. A metáfora nos coloca numa situação de "sensibilidade" que a descrição do processo de interpretação não consegue alcançar. É nesse sentido que Davidson (1984) tem razão: a metáfora aponta uma semelhança no mundo, e embora possamos circunscrever essa semelhança não é possível dizê-la, apenas apontá-la.

A título de terminar essa seção sobre a interpretação de metáforas vivas, proponho que analisemos mais detalhadamente a interpretação da sentença (14). Vimos que nesse exemplo não era sequer possível estabelecer a estrutura projetiva apenas com informações sintáticas e semânticas. Para começarmos nossa análise precisamos, pois, saber a que a sentença se refere: o narrador está descrevendo a situação de um homem no alto de uma palmeira, e de outros embaixo insultando-o. Dada essa informação contextual, então é possível descrevermos a estrutura projetiva e apontar o feixe de semelhanças que está sendo focalizado pelo locutor:

Empinar instancia predicados como: ‘levantar algo para o alto’. Esse predicado é projetado na ação de insultar alguém no alto de uma palmeira. É o modo como vemos esse evento que é organizado pelo uso de empinar: assim, há um esforço físico nesse empinar, as cabeças estão direcionadas para cima, há algo ligando aquele que insulta ao insulto. De novo, e de forma mais aguda que em (10), não há como dizer o feixe de semelhanças que a metáfora aponta.

3. A engenhosidade semântica

Chomsky corretamente chamou nossa atenção para o fato de que a linguagem não é mera repetição. Produzimos e compreendemos sentenças que nunca antes ouvimos. Dessa perspectiva, uma teoria lingüística deve tentar dar conta dessa criatividade que, no caso da gramática gerativa, pode ser entendida como uma criatividade sintática, isto é, a partir de um conjunto finito de elementos e de um número mínimo e finito de regras de combinação podemos chegar via recursividade a um conjunto infinito de sentenças. É por essa razão que o objetivo da lingüística não pode ser a mera descrição de usos da linguagem, mas a apreensão das regras de construção, que permitem a recursividade. Se há aqueles que não aceitam o modelo de linguagem proposto pela sintaxe gerativa, parece-me difícil negar que Chomsky, ao falar dessa criatividade, não tenha tocado num ponto fundamental para qualquer teoria lingüística. Acreditamos que, além da criatividade sintática, deveríamos tentar entender uma criatividade semântica, que para diferenciar da sintática chamaremos de engenhosidade semântica.

Se propomos descrever uma engenhosidade semântica é porque acreditamos que o objetivo maior de uma teoria semântica não pode ser descrever a interpretação de sentenças, como fizemos acima, mas partindo dessa descrição refletir sobre os procedimentos que permitem a interpretação de sentenças novas e a estabilização de novas sistemáticas de uso. Não creio que esse tópico tenha sido explicitamente discutido, embora ele apareça tematizado em diversos autores como, por exemplo, Peirce (1960) e a noção de ‘abdução. Davidson (1996) também fala da necessidade, para a elaboração de uma linguagem, do conceito de" similaridade", mas toma esse conceito como primitivo.

Antes de uma definirmos essa engenhosidade semântica, cumpre mostrar a necessidade de propormos a sua existência. Considere os seguintes pares de sentença:

(27) a. Comprei um livro. (objeto físico) b. Vendi os direitos autorais do meu livro. (abstrato) (28) a. Pulou pela janela. (o espaço na parede) b. Fechou a janela. (a veneziana)18 18 Veja Nunberg (1979) para uma série de exemplos como (23) e (24) e uma discussão a respeito do conceito de polissemia. (29) a. Chamou o pai. (biológico) b. Einstein é o pai da física. (criador) (30) a. A Terra gira em torno do Sol. (objeto físico) b. Julieta é o sol. (propriedade) (31) a. Comprei uma esponja. (objeto físico) b. A manhã é uma esponja. (propriedade)

Os exemplos acima colocam a seguinte questão: em cada uma das sentenças em cada par, o item lexical destacado tem um uso mais ou menos distinto dependendo da sentença em que ele aparece. Assim, livro em (27.a) tem um sentido um pouco diferente de livro em (27.b), esponja em (31.a) difere de esponja em (31.b). Se para cada uso específico de um termo fizéssemos corresponder, na teoria semântica que desejamos construir, um único item lexical, então nossa teoria semântica enfrentaria pelo menos três problemas graves: em primeiro lugar, falar uma língua se tornaria algo praticamente impossível, uma vez que a cada novo uso deveria corresponder um novo item lexical; em segundo lugar, nossa teoria semântica seria incapaz de capturar a semelhança entre os usos dos termos nos pares acima, já que cada item lexical estaria isolado. Finalmente, não teríamos como explicar nossa capacidade de interpretar e produzir sentenças como (31.b), sentenças nunca antes encontradas. A solução que propomos é procurar descrever uma engenhosidade semântica, que, de um lado, permite que um mesmo item lexical abrigue usos semelhantes, e, por outro, explica como interpretamos um uso inovador, como é o caso de esponja em (31.b).

Antes de passar a discutir mais detalhadamente em que consiste essa engenhosidade semântica, cumpre dizer que não estamos falando prioritariamente de um procedimento de categorização, mas da aprendizagem dos usos possíveis de um mesmo item lexical e de sua produtividade, entendida aqui como capacidade de, dado um certo conhecimento, gerar outros conhecimentos. Vale acrescentar que também afastamos a questão da metaforicidade ou literalidade dos exemplos acima, uma vez que essa distinção depende da avaliação que um intérprete faz. Estamos interessados na capacidade de aprender novos usos de um mesmo item lexical.

O que seria essa engenhosidade semântica? A engenhosidade semântica caracteriza-se por ser a utilização de um item lexical para descrever eventos distintos instituindo entre eles relações de similaridades relevantes. Isso significa que, a partir de um conjunto relativamente estável de itens lexicais, podemos gerar um número infinito de descrições. A operação de projeção garante essa engenhosidade semântica, o "ver A como B" institui entre A e B relações de similaridades relevantes. Assim, ao etiquetarmos eventos distintos sob um mesmo rótulo, instituímos entre eles um feixe de similaridades relevantes. Já foi apontado, por vários autores, que os eventos são sempre semelhantes em algum aspecto, isto é, que não haveria a princípio eventos mais semelhantes uns aos outros de forma que a semelhança seria saliente por si. O ato cognitivo propiciado pela operação de projeção está exatamente em focalizarmos similaridades que são relevantes entre eventos semelhantes. À cristalização de um feixe de similaridades corresponde inevitavelmente o desprezo, por um lado, pelas diferenças entre os eventos e, por outro, as possíveis semelhanças com outros eventos. Instaura-se, pois, uma ordem. Essa ordem pode ser desfeita, aperfeiçoada, estendida,... Dada uma ordem mínima, que é gerada pela capacidade de traçarmos similaridades no diferente, podemos continuar projetando similaridades infinitamente. Em alguns casos, essa projeção será acompanhada por uma avaliação de literalidade, em outros pela de ficcionalidade.

Abstratamente podemos dizer que a engenhosidade semântica funciona como a projeção de um item lexical utilizado para designar um evento1 em um evento2. Entre evento1 e evento2 um feixe de similaridades relevantes se estabelece. Não se trata aqui de uma operação de indução ou generalização, porque não são as igualdades entre o evento1 e o evento2 que são destacadas, mas de uma hipótese de que esses eventos devem instituir um feixe de similaridades porque são designados pelo mesmo item lexical. O que significa dizer, por um lado, que os mesmos eventos podem ser vistos como diferentes desde que eles sejam nomeados diferentemente, e, por outro, que se o mesmo item lexical for utilizado para designar um evento3 então esse feixe de similaridades irá certamente se alterar. Note que a aplicação sistemática de um item lexical a diferentes eventos gera diferentes relações de similaridade unindo os eventos. É difícil não lembrar da descrição que Wittgenstein (1990) faz do termo ‘jogo’, com a ressalva de que além dos jogos que Wittgenstein inclui, gostaríamos também de incluir o jogo político, o jogo amoroso,... Um item lexical não se refere diretamente a um objeto no mundo, mas instancia uma rede de similaridades que é atualizada no contexto. Por atualizada entendemos que certos predicados serão salientados, ao passo que outros serão relegados a segundo plano. Assim, livro não significa livro, mas quando é utilizado com relação ao objeto concreto, salienta-se uma rede de similaridades que não é a mesma que quando livro é usado com relação ao produto intelectual, e não é a mesma que quando livro é usado com relação à natureza, como em Galileu.

Nossa descrição da interpretação de uma metáfora viva procurou capturar como se dá esse procedimento de traçar similaridades relevantes, dado que o intérprete já tem um conhecimento razoável da língua e do mundo. Uma estória parecida pode ser contada sobre como aprendemos a usar palavras de uma língua e de como essa aprendizagem da língua é uma aprendizagem de mundo. A situação de interpretação radical, em que o intérprete não sabe absolutamente nada sobre a língua estrangeira e não pode contar com a ajuda de um tradutor, pode exemplificar esse aprender usar a língua e aprender o mundo. Digamos que nosso intérprete radical tenha apontado para o pé e tenha ouvido. Em outra circunstâncias, ele aponta para o pé de uma outra pessoa e ouve pé. É apenas o uso sistemático de pé em situações diversas que pode levar nosso intérprete a hipotetizar que esses vários eventos são tomados como estruturando similaridades relevantes: o fato de estar se referindo à parte inferior dos membros inferiores. Quanto maior sua prática na comunidade, maior sua exposição à diversidade de usos de um mesmo item lexical. A palavra é utilizada numa série de eventos diferentes, mas semelhantes, de tal sorte que após diversas práticas lingüísticas, um intérprete saiba que pode se referir: a uma parte do corpo de alguns animais (outros animais terão pata), a uma parte de alguns móveis (mesas, cadeiras, geladeiras), a algumas árvores frutíferas (pé de jabuticaba), a algumas hortaliças (pé de alface), a certos locais (pé da montanha). Não há necessidade de haver um traço em comum unindo os eventos e nem uma propriedade única costurando todos os usos do item lexical. É preciso que um intérprete seja capaz de estabelecer relações de similaridades entre eventos e entre os usos do mesmo item lexical. É essa a engenhosidade semântica: ver semelhanças entre eventos, também entre eventos lingüísticos.

O leitor terá certamente notado que os exemplos de (27) a (31) formam uma gradação. Não há como negar que muito provavelmente os pares de sentenças em (27) e (28) seriam tratados como comportando o mesmo item lexical, livro e janela respectivamente. Entretanto, aparentemente nada impediria que essas diferenças fossem tomadas como relevantes numa outra língua, isto é, que outra língua marcasse a diferença em cada par através de itens lexicais diferentes ou que o lingüista tratasse esses usos como itens distintos. Em (29) já se coloca mais claramente a possibilidade de termos dois itens lexicais: pai1, biológico e pai2, criador. Finalmente em (30) e (31) há claramente uma diferença entre um uso literal do item lexical e um uso metafórico do mesmo item.

Vale a pena relembrar aqui que a existência de um sentido metafórico foi objeto de disputa entre Black (1962), que defendeu a existência de sentido metafórico, e Davidson (1984), que se recusou a aceitar a existência de sentidos metafóricos.19 19 Para uma apresentação do debate entre Black e Davidson sobre a existência de sentido metafórico, ver Pires de Oliveira (1993). Black, quando fala de sentido metafórico, está falando de um novo contexto de uso para o termo. Isto certamente não é negado por Davidson, que quer defender que os itens lexicais em sentenças metafóricas têm seu sentido "costumeiro". É essa posição que nos parece correta, principalmente se nosso objeto de reflexão são as metáforas vivas. Como o leitor certamente terá notado, nossa descrição de (10) não fez uso de um sentido especial de esponja, mas de seu sentido sistemático ou costumeiro. O que acontece na interpretação, seja de metáforas vivas seja de enunciados absolutamente sistemáticos, é a instauração de similaridades relevantes. No entanto, é certamente curioso que, e eis aí outro ponto escorregadio das metáforas, o uso sistemático de um termo num certo contexto, pode estender o campo de uso do termo, de tal sorte que esse novo uso passa a ser incorporado na polissemia do termo, de tal sorte que se impõe uma nova sistemática de uso. Esse parece ser o caso de pai em (29.b), que tem uma interpretação sistemática, mas que continua a ser avaliado metaforicamente. No caso de em pé de alface há não apenas uma sistematização do uso, mas também uma desmetaforização do uso (se é que um dia ele foi avaliado metaforicamente). No caso de pé de alface, de boca da garrafa, parece fácil justificar o processo de desmetaforização: trata-se de casos de catacrese. Provavelmente é essa mesma razão que nos leva a dizer que revolução em revolução científica não é investido de metaforicidade. Prandi (1992) argumenta nesse mesmo sentido.

Nossa proposta é que em nenhum dos exemplos acima há necessidade de postular dois itens lexicais. Trata-se de usos sistemáticos que se assemelham. A determinação de um feixe de similaridades relevantes é função do contexto em que o item lexical ocorre: livro em (27.b) é precisado por sua combinação com outros termos, da mesma forma esponja em (31.b). Assim, na interpretação de metáforas vivas, é o sentido costumeiro dos itens lexicais, combinado com uma série de parâmetros, que permite o estabelecimento de similaridades relevantes. Estamos sempre fazendo uso dessa engenhosidade semântica que permite uma plasticidade dos itens lexicais, que, por sua vez, possibilita compreendermos enunciados nunca antes ouvidos.

(Recebido em 01/11/96. Aprovado em 17/01/97)

  • BARNDEN, J.A. (1993) Belief in Metaphor: Taking Commonsense Psychology Seriously.: Computational Intelligence, 8, 3: 520-52.
  • BLACK, M. (1962) Metaphor. In: Models and Metaphors: 25-47. New York: Ithaca.
  • ___________(1979) More about Metaphor. In: ORTONY, A. (ed.) Metaphor and Thought 19-45. Cambridge: Cambridge University Press.
  • BOYD, R. (1979) Metaphor and Theory Change: What is a Metaphor a Metaphor for? In: ORTONY, A. (ed.) Metaphor and Thought 356-408. Cambridge: Cambridge University Press.
  • COHEN, L.J. & A. MARGALIT (1972) The Role of Inductive Reasoning in the Interpretation of Metaphor. In: DAVIDSON, D. & HARMAN, G. (eds.) Semantics of Natural Language 722-40. Amsterdam: Reidel.
  • DAVIDSON, D. (1984) What Metaphors Mean. In: Inquiries into Truth and Interpretation 245-64. Oxford: Claredon.
  • _______________(1986) A Nice Derangment of Epitaphs. In: LEPORE, E. (ed.) Truth and Interpretation. Perspectives on the Philosophy of Donald Davidson 434-45. Oxford: Basil Blackwell.
  • _______________(1993) Reply to Oliver Scholz. In: STOECKER, R. (ed.) Reflecting Davidson 172-74. Berlin: Walter de Gruyter.
  • GILL, J.H. (1979) Wittgenstein and Metaphor. Philosophy and Phenomenologial Research, 12, 2: 272-84.
  • HESSE, M. (1987) Tropical Talk: The Myth of the Literal. The Aritotelian Society, supplementary 61: 297-311.
  • HINTIKKA, J. (1994) Aspects of Metaphor Amsterdam: Kluwer.
  • INDURKHYA, B. (1992) Metaphor and Cognition: an Interactionist Approach Dordrecht: Kluwer.
  • LAKOFF, G. & M. JOHNSON (1980) Metaphors We Live By Chicago: Chicago University Press.
  • LAMIROY, B. (1987) Les verbes de mouvement: emplois figuré et extensions métaphoriques. Langue Française, 76: 41-58.
  • LEVINSON, S.C. (1992) Primer for the Field Investigations of Spatial Descriptions and Conception.. Pragmatics, 2, 1: 5-47.
  • ________________(1994) Vision, Shape and Linguistic Description: Tzeltal Body-Part Terminology and Object Description. Linguistics, 32: 791-855.
  • LOEWENBERG, I. (1981) Identifying Metaphors. In: JOHNSON, M. (ed.) Philosophical Perspectives on Metaphor 154-81. Minneapolis: Minnesota Press.
  • NUNBERG, G.D. (1979) The Non-Uniqueness of Semantic Solutions: Polysemy. Linguistics and Philosophy, 13: 143-84.
  • PIRES DE OLIVEIRA, R. (1993) Mary is an angel: Max Black and Donald Davidsons debate about metaphorical meaning. In: Annals of the Third International Conference in Cognitive Linguistics
  • _______________________(1995) The Language-game of Metaphor. Metaphorhood: ist Grammar and Pragmatics Tese de Doutorado năo publicada. Katholieke Universiteit Leuven.
  • PRANDI, M. (1992) Grammaire philosophique des tropes Paris: Les Editions de Minuit.
  • PSYLYSHYN, Z.W. (1979) Metaphorical Imprecision and the" Top-Down" Research Strategy. In: ORTONY, A. (ed.) Metaphor and Thought 420-38. London: Cambridge University Press.
  • PUTNAM, H. (1995) The Meaning of Meaning". In: Mind, Language and Reality Cambridge: Cambridge University Press. Primeira ediçăo 1975.
  • SPERBER, D. & D. WILSON (1986) Relevance: Communication and Cognition Oxford: Basil Blackwell.
  • TAMBA-MECZ, I. (1981) Le sens figuré. Vers une theórie de lenonciation figurative Paris: Presses Universitaires de France.
  • WINNER, E. (1988) The Point of Words. Childrens Understanding of Metaphor and Irony Cambridge: Harvard University Press.
  • (1)
    O velho é um bebê.
  • (2)
    O velho é mentalmente incapaz.
    5 5 O exemplo é originalmente de Cohen e Margalit (1972): The old man is a baby. Os autores defendem que (2) é a interpretação da metáfora (1).
  • (8)
    Maria é um anjo.
  • (9)
    Carlos é um cachorro.
  • (11)

    A manhã é uma esponja.
  • (13)

    Sortido assim ramo de gente. (Guimarães Rosa)
  • (15)

    * Insultos eram empinados.
  • (16)

    Pipas eram empinadas.
  • (18)

    A manhã limpa algo.
  • (19)

    A manhã apaga algo.
  • (20)

    A manhã absorve a escuridão.
  • (21)

    A manhã absorve o cansaço do dia anterior.
  • (22)

    A manhã absorve as lembranças.
  • (23)

    É pela manhã que absorvermos mais conhecimentos.
  • (25)

    O imperador comeu um pedaço de mim
    17 17 O exemplo foi retirado de Loewenberb (1981). No original: I was a morsel for a monarch.
  • (26)

    A manhã absorve a escuridão da noite.
  • 1
    O uso do termo ‘engenhosidade’ tem uma dupla função: de um lado distinguir essa capacidade semântica da criatividade sintática, de outro aludir à teoria do engenho formulada pelo Conceptualista.
  • 2
    Para uma defesa mais substantiva da noção de ‘metáfora’, remetemos o leitor para Pires de Oliveira (1995).
  • 3
    Publicado pela primeira vez em 1954.
  • 4
    O termo‘ evento’ deve ser entendido aqui em sentido amplo de referência a fluxo de coisas.
  • 5
    O exemplo é originalmente de Cohen e Margalit (1972): The old man is a baby. Os autores defendem que (2) é a interpretação da metáfora (1).
  • 6
    Há na descrição que Black faz da metáfora uma clara influência do segundo Wittgenstein, em especial da reflexão sobre os jogos de linguagem que o ‘ver’ e o ‘ver como’ estabelecem. Ver Gill (1979).
  • 7
    Para uma discussão ver Pires de Oliveira (1995).
  • 8
    Essa hipótese não é fundamentalmente empirista.
  • 9
    Ver, sobre a questão, Winner (1988).
  • 10
    Ver o tratamento de metáfora a partir da semântica de mundos possíveis realizada por Hintikka (1994).
  • 11
    Creio estar aqui reproduzindo, em grande parte, o modelo de interpretação desenvolvido por Davidson (1986).
  • 12
    Ver Pires de Oliveira (1995).
  • 13
    Sobre a distinção entre duas estruturas possíveis com o verbo ‘ser’, ver Tamba-Mecz (1981).
  • 14
    Reporto-me novamente ao trabalho de Davidson.
  • 15
    Para um desenvolvimento completo da formalização, remeto o leitor para Indurkhya (1992), em especial o capítulo 6.
  • 16
    Também essa noção vem de Davidson.
  • 17
    O exemplo foi retirado de Loewenberb (1981). No original: I was a morsel for a monarch.
  • 18
    Veja Nunberg (1979) para uma série de exemplos como (23) e (24) e uma discussão a respeito do conceito de polissemia.
  • 19
    Para uma apresentação do debate entre Black e Davidson sobre a existência de sentido metafórico, ver Pires de Oliveira (1993).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 1998
    • Data do Fascículo
      Ago 1997

    Histórico

    • Recebido
      01 Nov 1996
    • Aceito
      17 Jan 1997
    Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP PUC-SP - LAEL, Rua Monte Alegre 984, 4B-02, São Paulo, SP 05014-001, Brasil, Tel.: +55 11 3670-8374 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: delta@pucsp.br