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A IDENTIFICAÇÃO DO PREFIXO EM DIVERSAS ABORDAGENS LINGÜÍSTICAS

The Identification of Prefixes in Different Linguistic Approaches

Resumos

Este artigo pretende apresentar criticamente as diferentes abordagens referentes aos prefixos, nomeadamente os critérios baseados nos seguintes parâmetros: transformação, produtividade, correspondência entre prefixo e preposição, perspectiva operacional. Após apresentar estes diferentes pontos de vista, concluímos não serem eles suficientes por si sós para identificar o prefixo. É conveniente reconhecer a existência de prefixos típicos, tais como in-, re- e des-, e daqueles não-típicos, como sobre- e contra-, caracterizados por correspondência formal, mas não distribucional com formas livres e/ou por uso braquissêmico.

Radical; Raiz; Prefixo; Sufixo; Distribuição


This paper takes a critical look at the different approaches to prefixes, among them the areas based on the following parameters: transformation, productivity, prefix-preposition correspondence, operative perspective. It is argued that none of them is adequate to identify prefix. It is further argued that it may be convenient to recognise the existence of typical prefixes, such as in-, re- and des-, and of non typical ones, such as sobre- and contra-, characterized by formal, not distributional correspondence to free forms and/or by brachysemic use.

stem; Root; Prefix; Suffix; Distribution


DEBATE

    A IDENTIFICAÇÃO DO PREFIXO EM DIVERSAS ABORDAGENS LINGÜÍSTICAS

    (The Identification of Prefixes in Different Linguistic Approaches)

Paulo Mosânio Teixeira DUARTE

(Universidade Federal do Ceará)

ABSTRACT: This paper takes a critical look at the different approaches to prefixes, among them the areas based on the following parameters: transformation, productivity, prefix-preposition correspondence, operative perspective. It is argued that none of them is adequate to identify prefix. It is further argued that it may be convenient to recognise the existence of typical prefixes, such as in-, re- and des-, and of non typical ones, such as sobre- and contra-, characterized by formal, not distributional correspondence to free forms and/or by brachysemic use.

RESUMO: Este artigo pretende apresentar criticamente as diferentes abordagens referentes aos prefixos, nomeadamente os critérios baseados nos seguintes parâmetros: transformação, produtividade, correspondência entre prefixo e preposição, perspectiva operacional. Após apresentar estes diferentes pontos de vista, concluímos não serem eles suficientes por si sós para identificar o prefixo. É conveniente reconhecer a existência de prefixos típicos, tais como in-, re- e des-, e daqueles não-típicos, como sobre- e contra-, caracterizados por correspondência formal, mas não distribucional com formas livres e/ou por uso braquissêmico.

Key Words: stem; Root; Prefix; Suffix; Distribution.

Palavras-Chave: Radical; Raiz; Prefixo; Sufixo; Distribuição.

0. Introdução

O prefixo tem sido objeto de enfoques os mais diversos, conforme os modelos teóricos vigentes em lingüística e as diferentes abordagens, que determinam objetos distintos. Propusemo-nos então a este trabalho, a fim de sistematizar alguns critérios mais relevantes para a identificação da entidade nominal prefixo. Para tanto, adotamos o seguinte roteiro: a) o critério transformacional; b) o critério da produtividade (em termos de número), nas duas versões: oposição inventário limitado/inventário ilimitado; a formação de palavras em série; c) o critério morfo-semântico; d) o critério baseado na operacionalidade do conceito de raiz.

Esperamos, assim, contribuir para iluminar este setor dos estudos morfológicos, quiçá apontar para uma síntese que ofereça meios para a identificação do elemento prefixal. Esta síntese, apresentada na conclusão, encontra-se delineada em parte, quando, procedendo ao exame das perspectivas acima, mostramos a insuficiência das mesmas. Para superá-la, pautam-nos as seguintes questões: até que ponto são tangíveis, coerentes e estruturais os critérios adotados? Em que medida são estes critérios compatíveis com os dados lingüísticos? Não apreendem entidades cujo comportamento lingüístico assume caráter nitidamente heterogêneo?

1. Os diversos critérios na identificação do prefixo

1.1. O critério transformacional

A caracterização do prefixo, em perspectiva transformacional, já se delineia em Chomsky e Halle (1968). Coerentes com o modelo gerativo-transformacional, que então separava a estrutura profunda da estrutura superficial, postulam que um dado item lexical, cuja classificação categorial é dada sintaticamente, converte-se em prefixo na estrutura de superfície:

É também um fato que prefixos podem ser formados livremente a partir de outros vocábulos (ex.: político-, paralelo-) e neste caso atribuir-lhe-emos a categoria sintática "prefixo" em vez da (e não em adição a) categoria à qual a forma subjacente pertence isoladamente. O vocábulo paralelogramo será representado [N [P para [R lel]R o]P [R gramoR]N , indicando-se que é um nome da forma prefixo-radical, onde o prefixo, por sua vez, consiste de um radical com prefixo não-categorizado para-, estando o segundo em igualdade de condições com mono-, tele-, etc. Esta análise, uma vez mais, parece ser razoavelmente bem motivada em bases sintático-lexicais e é adequada para a fonologia1 1 It is also a fact that prefixes can be formed fairly freely from other words (e.g., politico-, parallelo-) and in this case we will assign them to the syntatic category" prefix" instead of (rather than adition to) the category to which the underlying form belongs in isolation. The word parallelogram will be represented [ Npara [ Slel] So]] P[ Sgram S] N, indicating that is a noun of the form prefix-stem, where the prefix in turn consists of a stem with an uncategorized prefix para-, the latter being on a par with mono-, tele-, and so on. This analisis, once again, seems to be reasonnably well motivated on syntatic lexical grounds and it is appropriate for the phonology. . (1968:100)

A impressão que nos dá é que Chomsky e Halle generalizam a concepção tradicional de que prefixos são afixos que antecedem a raiz. Acontece que ela não capta as intuições dos falantes acerca de formações do tipo N^ Adj ou Adj^ Adj: amor-perfeito, político-partidário, para cujos primeiros elementos a gramática tradicional nunca reconheceu a categoria de prefixo. Por outro lado, desconhece a possibilidade de um constituinte como filo- ocupar ora a posição inicial ora a posição final (ex.: filocomunista, cinéfilo). Isto sem mencionar o fato de que formas iniciais podem funcionar como vocábulos independentes, o que é reconhecido pelos próprios autores.

Chomsky e Halle, na verdade, não tratam prefixos e radicais com base em morfologia lexical. O propósito deles é abordar formações do tipo Pref^ Rad em termos do ciclo transformacional da fonologia inglesa. Acabam assim por não oferecer contribuições práticas para o diferençar formações radico-radicais de formações prefixo-radicais.

Em bases diferentes das de Chomsky e Halle, já que encampa teses da Semântica Gerativa, situa-se a proposta de Guilbert (1975), a qual representa, de forma significativa, as concepções transformacionais levadas às últimas conseqüências. Atestamo-lo por esta passagem abaixo, que elucida o modo como Guilbert encara a relação entre léxico e gramática:

A diferença entre os dois modos de realização, o frasal e o lexical, situa-se principalmente no ponto de chegada das transformações. A realização sintática do discurso consiste na sucessão de elementos sintagmáticos autônomos, reconhecidos entre todos os falantes de uma mesma língua como palavras ou unidades de significação no bojo dos esquemas sintáticos de frases simples ou complexas. A realização lexical, ao contrário, se traduz por uma seqüência específica de elementos de construção sob a forma de uma seqüência de fonemas soldados, cuja contraparte gráfica é uma seqüência de grafemas coalescentes ou uma seqüência de elementos distintos reunidos por um hífen, à qual corresponde uma unidade de sentido, ou ainda uma seqüência de elementos autônomos sem outro liame aparente que não a significação global. Mas o processo único diferencial entre os dois esquemas, um sintático e o outro lexical, permite ligar a significação menos à forma construída que à própria construção. Todo segmento de frase pode funcionar lexicalmente, dado que resulta da transformação de uma frase. O intercâmbio entre a realização sintática e a realização lexical não é tão somente o resultado de uma equivalência semântica, mas ele se produz em virtude da unidade profunda a partir de uma frase de base comum. Inversamente, a partir de uma realização sintagmática frasal, pode-se retornar a um esquema lexical conjunto, em virtude desta mesma unidade profunda2 2 La diffèrence entre les deux modes de réalisation, le phrastique et le lexical, se situe principalement au point d'arrivée des transformations. La réalisation syntaxique du discours consiste dans la succession d'éléments syntagmatiques autonomes reconnus chez tous les locuteurs d'une même langue comme des mots ou unités de signification dans le cadre des schémas syntaxiques de phrases simples ou complexes. La réalisation lexicale, au contraire, se traduit par une séquence spécifique d'éléments de construction sous la forme d'une suite de phonèmes soudés dont la contre-partie graphique est une séquence des graphèmes coalescents ou une séquence de segments disjoints réunis par un trait d'union, à laquelle correspond une unité de sens, ou encore une séquence d'éléments autonomes sans autre lien apparent que la signification globale. Mais le processus unique différencié entre deux schémas, l'un syntaxique, l'autre lexical permet de lier la signification moins à la forme construite qu’à la construction même. Tout segment de phrase peut fonctionner lexicalement du moment qu'il résulte de la transformation d'une phrase. L'interchangeabilité entre la réalisation syntaxique et la réalisation lexicale n'est plus seulement le résultat d'une équivalence sémantique, mais elle se produit en vertu de l'unité profonde à partir d'une phrase de base commune. À l'inverse, à partir d'une réalisation syntagmatique phrastique, on peut revenir à un schéma lexical conjoint em vertu de cette même unité profonde. . (1975:130)

Desta tese resulta logicamente que a unidade fundamental do processo sintático permite considerar a derivação como um processo único do qual a sufixação, a prefixação e a composição, segundo a terminologia tradicional, são apenas formas diferentes.

Deste modo, um substantivo como fragilidade, no sintagma a fragilidade do copo, teria como frase de base o copo é frágil. Pelo mecanismo transformacional, Guilbert procura explicar a relação entre o adjetivo e o substantivo derivado. Além disto, retoma antigas teses sobre a sufixação, ao caracterizá-la como um processo transcategorizador, que se vale de morfemas mais nitidamente aglutinados à base. Muda, porém, o suporte teórico.

O morfema prefixal, por sua vez, se caracterizaria por maior separabilidade, representando destarte um elemento de construção mais autônomo. Guilbert toma como exemplos neologismos franceses prefixalmente formados (com anti- e super-, por exemplo), cujos afixos, depois de algum tempo, refletiam autonomia na escrita, pois passavam a ligar-se à base através de hífen.

Guilbert aprofunda sua investigação sobre o processo de adjunção prefixal, opondo-o ao processo composicional nestes termos:

  • No primeiro, o elemento afixal, considerado ao nível da frase de base, não constitui jamais um dos elementos da relação predicativa, o sujeito ou o predicado; aparece sob a forma da preposição ou de um equivalente sintático, o advérbio. Exemplo: período antes do (período) romântico ® período pré-romântico.

  • A composição resulta de uma frase de base na qual os dois termos da formação composta aparecem sob a forma dos retrocitados elementos, que têm relação predicativa. Exemplo: o sofá que é cama ® sofá-cama.

Coerente com a teoria que abraçou, Guilbert estende o fenômeno da parassíntese, fazendo-o abranger formações tradicionalmente tidas como prefixais, a exemplo de intramuscular, supra-orbital e extracurricular, provenientes respectivamente da intra + músculo + ar, supra + órbita + al e extra + currículo + ar. A justificativa é sintática: um adjetivo como intramuscular, por exemplo, no sintagma injeção intramuscular, seria a versão lexical e condensada de dentro do músculo. Para Guilbert, não seria aceitável associar a referida formação diretamente ao adjetivo muscular, por causa do diverso contexto sintático que o engendra.

Estamos concorde com algumas colocações de Guilbert, entre as quais a de que os prefixos tendem a uma autonomia que os sufixos não ostentam. Isto não se reflete apenas na escrita, pelo uso do hífen, a exemplo de pré-operatório, ou pela ausência do referido sinal gráfico, em algumas formações vistas por nós, como mini escola. O elemento prefixal, em contexto propício, pode ser separado do adjetivo, como é de constatar-se em exame pré- e pós-operatório. Há casos em que a coordenação chega a ocorrer entre prefixo e item lexical vernáculo, como se vê em micro e pequenas empresas. Podem acontecer inclusive empregos isolados do prefixo por toda a unidade léxica. Usa-se, assim, o micro em vez de o microcomputador.

É difícil, todavia, aceitar a concepção tradicional do léxico nos termos em que a põe Guilbert. Cabe aqui nos referir ao célebre trabalho de Chomsky (1970), a propósito do comportamento dos dois tipos nominais do inglês: os gerundivos e os derivados. Chomsky observou que não era possível o tratamento nominal para os nominais derivados em virtude do seguinte: a) a regularidade e a produtividade dos nominais gerundivos, que não ocorrem com os nominais derivados; b) o comportamento verbal dos nominais gerundivos, que aceitam auxiliares e advérbios, por oposição ao nominais derivados, que aceitam plurais e adjetivações; c) a regularidade, na correspondência semântica, entre verbo e gerundivo, o que não ocorre entre verbo e nominal derivado; d) a não-existência, em alguns casos, de paralelo entre verbo e nominal derivado, o que implica a postulação de verbos teóricos ad hoc, caso se pretenda manter a base transformacional.

Foi em virtude do reconhecimento do extremo poderio que representavam as transformações que surgiram as reações consubstanciadas nas várias hipóteses lexicalistas: a de Halle (1973), a de Jackendoff (1975), a de Aronoff (1976), as mais conhecidas entre nós, que não tratam especificamente dos meios de identificação dos prefixos, mas de modelos para a estruturação do léxico3 3 Jackendoff (1975: 653-55) atém-se a exemplos que constituem formas herdadas: persist, transfer, precede, e conclui que, na maior parte das vezes, prefixos e radicais não carreiam informação semântica, o que é questionável. Aronoff (1976: 11-5) também se detém em formas herdadas do latim e não nos fornece subsídios para a identificação do prefixo. . A propósito, existe um bom apanhado crítico de Basílio (1980) e Corbin (1987), sobre os citados modelos, mas não nos referiremos a eles aqui, devido ao risco de digressão4 4 Corbin (1987) faz inclusive um levantamento maior e mais sistemático no domínio da morfologia lexicalista, considerando modelos não-estratificados, que tratam niveladamente da regularidades e irregularidades (Jackendoff, Aronoff, Selkirk e Lieber), e os estratificados, que propõem uma hierarquização entre os níveis das regras e os das exceções (Halle, Allen). Tratar deles aqui foge aos objetivos do nosso trabalho. .

A concepção transformacional do léxico hoje se encontra superada (cf. Basílio, 1980). Ela não dá conta dos processos lexicais sub-regulares nem de fenômenos como extensão e restrição semânticas. Se a hipótese transformacional explica algumas formações, deixa de explicar inúmeras outras ou traz complicações descritivas. Exemplifiquemos:

Para período pré-romântico, poder-se-iam postular os sintagmas de base período antes do (período) romântico ou período antes do romantismo. No primeiro caso, admitir-se-ia apagamento do substantivo. Já no segundo, suprimir-se-ia o sufixo -ismo substituído ad hoc por -ico. Qual interpretação adotar? Em luta antifascista, apagar-se-ia o substantivo no sintagma contra o regime fascista ou se consideraria uma regra de truncamento do sufixo -ismo para posterior introdução do sufixo -ista?

Ao que foi dito supra, acrescente-se a crítica de Bessa (1978: 105), para quem as frases de base guilbertianas parecem estruturas ad hoc, isto é, não se adequam ao nível de análise do francês. A frase de base da qual Guilbert deriva o item lexical francês présalaire, S |salaire| est avant le salaire, se comporta como uma estrutura intermediária noutro possível conjunto de transformações.

Lembremos também que a tese de Guilbert não dá conta de compostos cujos componentes padecem de opacidade semântica, a exemplo de mesa-redonda e quadro negro. Tampouco explica por que há prefixos que não correspondem semanticamente a preposições, como pseudo- ou tri-.

A despeito das objeções contra as teses transformacionalistas, há quem as adote em versão heterodoxa. É o caso de Dubois e Lagane (1973), que, sem serem transformacionalistas stricto sensu, explicam a formação de palavras em termos que evocam o transformacionalismo5 5 Dubois e Lagane (1973) dedicam dois capítulos ao estudo de formação de palavras: o 48°, relativo à sufixação, incluída na derivação, e o 49°, dedicado à prefixação e à composição. Há semelhanças entre o pensamento dos dois autores e o de Guilbert, pois: a) é empregado o princípio da transformação; b) por este princípio, o sufixo é transcategorizador; c) pelo mesmo princípio, o prefixo se origina de uma preposição. O mecanismo de formação dos compostos, muito sumário, deixa muito a desejar. .

A não-adoção da transformação, em qualquer de suas versões, não implica a incidência no erro de considerar o léxico antagônico por completo à gramática. Estudando-se lexicologia sem o devido conhecimento das categorias primárias (as partes do discurso) e as secundárias (gênero, número, aspecto, tempo), e sem apelo ao contexto frasal, para depreender-se o sentido de um item lexical ou de um elemento afixal, faz-se uma investigação parcial e portanto desprovida de caráter científico.

1.2. Propostas baseadas no critério da produtividade

1.2.1 Critério baseado na oposição inventário limitado/inventário ilimitado

Martinet (1973) e Pottier (1962) lançam mão da estatística na investigação do processo de criação lexical. Concebem a produtividade em termos de número, diferentemente de Aronoff (1976), que a formula estruturalmente, considerando as características morfológicas das bases, a coerência semântica e o bloqueio.

Martinet funda sua teoria nas unidades de primeira articulação a que chama monemas, divididos em gramaticais (ou morfemas) e lexicais (ou lexemas). Eis como os caracteriza:

Lexicais são os monemas que pertencem a inventários ilimitados; gramaticais, os que nas posições consideradas, alternam com um número relativamente restrito de outros monemas. (1973:121)

Os afixos são considerados lexemas, conforme se deduz da passagem abaixo:

Poderia hesitar-se em incluir os afixos entre os lexemas, a pretexto de que em geral eles não são objecto de artigo próprio nos dicionários. Mas isso seria dar excessiva importância a uma tradição nem sempre respeitada, e mais vale referirmo-nos à realidade lingüística, que em última análise determina o comportamento dos lexicógrafos. Consiste o ponto em saber se devem ou não incluir-se os afixos entre as modalidades. Serviu-nos acima de critério para distinguir lexemas e morfemas o carácter ilimitado dos inventários destes últimos, e naturalmente convém ver se o mesmo se aplica aqui. Precisemos que não se trata de saber se é ou não possível contar exactamente os monemas susceptíveis de aparecerem em dado contexto, mas sim se o monema pertence a uma série aberta (que hoje talvez comporte um número reduzido de unidades, mas susceptível de aumentar) ou a uma série fechada tal que o número dos elementos que comporta não possa variar sem que daí resulte uma reorganização estrutural: não se procura saber quantos sufixos há em português susceptíveis, como -inho, de formar substantivos a partir de substantivos tradicionais, porque eles constituem um sistema suficientemente elástico para a cada passo poder aparecer novo sufixo do mesmo tipo sem lhes afetar o valor nem os empregos. Inteiramente diverso é o caso de sistemas como os do número ou do artigo em português, em cada um dos quais há apenas duas unidades opostas, de modo que, em caso de necessidade, se tem forçosamente de escolher entre singular e plural, entre definido e indefinido. Num casos destes, qualquer unidade nova teria de arranjar lugar à custa das unidades tradicionais. Implica isso que, uma vez realizadas as condições determinantes do emprego de certo tipo de modalidade, o locutor deve necessariamente escolher entre certo número de monemas: pode falar-se em português dum cruzamento de ruas, sem artigo antes de ruas; mas se se quiser valorizar na mensagem a noção de rua, empregar-se-á necessariamente a rua ou uma rua. Parece pois haver interesse em ver os afixos como um tipo particular de lexemas (1973: 137-8).

O discurso martinetiano, quanto ao caráter lexemático dos afixos, não permanece unívoco. Noutra passagem, em tom menos radical, assevera:

Semanticamente pode resumir-se isso (isto é, a oposição entre modalidades e afixos) dizendo que o carácter dos afixos é mais central, menos marginal, que o das modalidades, donde decorre como corolário, no plano formal, que no grupo formado de lexema, afixos e modalidades, os afixos são geralmente mais centrais (quer dizer: contactam com o lexema) e as modalidades mais periféricas (isto é, separadas dos lexemas pelos afixos). Em resumo, a dificuldade que se apresenta em lingüística geral para distinguir os afixos das modalidades resulta do facto de lexemas e morfemas representarem dois pólos que não excluem a existência de elementos intermédios, de especificidade maior que a das modalidades e a dos monemas funcionais, mas menor que a especificidade média dos lexemas (1973:139)

Pottier, partindo também de uma fundamentação estatística, chega a resultados diferentes dos de Martinet. Ele reconhece a classe dos lexemas e formantes, sobre os quais se exprime nestes termos:

Baseando-se nas possibilidades combinatórias no interior de uma mesma classe de morfemas, distinguimos os lexemas, que pertencem a uma categoria com um grande número de variáveis (p. ex.: a partir de cinco mil em francês), e os formantes ou morfemas que pertencem a uma categoria com pequeno número de variáveis facilmente determinável (p. ex.: abaixo de cem)6 6 En nous fondant sur les possibilités combinatoires à l'intérieur d'une même classe de morphèmes, nous distinguons les lexèmes ou morphèmes appartenant à une catégorie à grand nombre de variables (p. ex.: à partir de 5.000 en français), et les formants ou morphèmes appartenant à une catégorie à petit nombre de variables facilement déterminable (par ex., au-dessous de 100). .(1962:95)

Como se vê, Pottier se apóia em dados de maior precisão numérica que os de Martinet. Recorre ao princípio estatístico porque rejeita a tradicional divisão entre vocábulos de conteúdo nocional e vocábulos vazios deste conteúdo.

Uma vez estabelecida a distinção entre lexemas e formantes, conclui pela inclusão dos prefixos entre estes últimos. Seriam, pois, de natureza gramatical.

Parece-nos pouco convincente a posição de Pottier. Martinet é que oferece um ponto de vista mais ponderado, tomando-se naturalmente como referência a última passagem citada. Assiste razão a Galery (1969), que se reporta à inserção do prefixo ora no léxico, ora na gramática, conforme os enfoques7 7 Para ilustrar a afirmação de Galery, citamos Lhorach (1981: 48), que, baseado nas idéias de Hjelmslev, oferece um quadro referente ao plano do conteúdo, do qual emergem as formas derivativas como pleremas marginais, por oposição aos centrais, que são os radicais; as marcas categoriais do verbo (morfemas extensos) e as do nome (morfemas intensos), pertencem à gramática. :

Embora a classificação de Pottier nos pareça mais concreta e objetiva, é preciso admitir que os prefixos se acham de tal modo no limite entre léxico e a gramática, que variam de um para outro campo conforme o ponto de vista de que são considerados, ainda por lingüistas de orientação semelhante. (1969:32)

Se tomarmos, por exemplo, em consideração, a oposição entre inventário ilimitado e inventário limitado, que não é o mesmo que série fechada, conforme lucidamente esclarece Galery, os prefixos serão postos fora do domínio do léxico. Cremos todavia que, considerando o traço série aberta X série fechada, o prefixo ficaria mais realisticamente situado no domínio entre léxico e a gramática. Enquanto o número de artigos, por exemplo, não dá sinais de crescimento, o número de prefixos tende a aumentar, embora não em igualdade de condições com as unidades lexemáticas. Cumpre acrescentar que lexemas e afixos têm em comum o fato de se combinarem para formar novas unidades no léxico.

Mas voltemos a Pottier, cuja teoria interessa em particular, pois serviu de ponto de partida para vários estudos. Ele chegou a uma tipologia prefixal, que apresentamos a seguir:

  • Zona 1: morfemas gramaticais semi-autônomos, de natureza quantitativa:

    multimilionário, super-homem, bidimensional.

  • Zona 2: morfemas gramaticais quantitativos integrados, como

    in- negativo, em

    indescritível e

    re

    -, em

    refazer.

  • Zona 3: morfemas gramaticais autônomos, que correspondem aos relatores:

    sobrecarregar, encaixar, desmontar.

As demais zonas concernem aos morfemas lexicais (Zona 4) e sufixais (Zona 5: os de aspecto e formulação do processo, Zona 6, os de grau e Zona 7, os sufixos de concordância).

Ficamos por entender por que des- é correspondente a um relator. Será simplesmente por questões de conteúdo, em virtude da noção de "em sentido contrário", carreada pelo prefixo no verbo desmontar? A prevalecerem as bases semânticas, podemos enquadrar na Zona 3 exemplos como superpor e interpor, porque os morfemas iniciais equivalem a relatores, no plano do conteúdo. Indagamos também como seriam tratadas as formações em que os elementos iniciais equivalentes a relatores têm valor quantitativo, a exemplo de sobrevalorização. A demasiada intromissão de considerações semânticas perturba a exposição segura da doutrina de Pottier.

É de destacar-se também uma premissa inteiramente descabida, segundo a qual Pottier diferencia o prefixo do sufixo, nos seguintes termos: o primeiro estabelece subordinação e o segundo, coordenação (1962:11). Para ele, uma formação como belíssimo equivale a belo, belo. Admitindo como verdadeira semelhante tese, é impossível explicar satisfatoriamente formações como superfeliz e ultra-rápido, em que os elementos iniciais configuram superlativo. O quadro de Pottier reflete perfeitamente a fragilidade de uma teoria cujo suporte é a produtividade, aliada a considerações de ordem semântica um tanto inconsistentes.

Terminemos esta secção, procedendo a um comentário geral sobre o critério ora em tela, comum aos autores aqui estudados. Ele deve ser meio auxiliar e não essencial para a identificação das unidades lingüísticas. É um instrumento ancilar e exterior. Como bem assinala Bessa (1986), em sua tese doutoral:

O critério da produtividade, em nosso entendimento, se presta, por exemplo, para aferir a vitalidade das regras de formação de palavras, sendo essa vitalidade refletida pela freqüência dos elementos formativos nos outputs das regras. Adotando-se o critério da produtividade, poderíamos, igualmente, dizer que o elemento porta-, em porta-bandeira, se comporta como prefixo, porque recorre em número razoável de palavras do mesmo tipo. Esse exemplo poderá parecer absurdo, como, para nós, parece absurdo aferir a natureza lexical de um elemento por sua produtividade. Mas serve para evidenciar a inadequação de um critério, que revela características exteriores às propriedades estruturais dos elementos lingüísticos. (1986:225).

Por último, mencionamos a seguinte ressalva crítica, feita por Basílio (1991), em conclusão a um estudo sobre fronteiras lexicais, na qual investe contra o critério da produtividade, na versão da formação em série:

É importante ressaltar, ao concluir este estudo, que aspectos como produtividade - refletidos em critérios como a ocorrência numa lista fixa de elementos disponíveis ou a alternativa da possibilidade de "formação em série" - não servem para decidir a questão prefixo/forma de composição, já que qualquer formação regular tem potencial indeterminado de recorrência e a freqüência de uso, portanto, não pode se constituir em critério sólido de caracterização de unidades e fronteiras lexicais. (1991:73)

A produtividade, diga-se de passagem, é vista sob ângulos diversos dos que referimos até aqui (cf. Corbin, 1987: 176). Jackendoff (1975), por exemplo, junta o critério da regularidade dos derivados construídos e o critério da quantidade. Aronoff (1976), por sua vez, estabelece três parâmetros para a ‘mensuração’ da produtividade: a) condições morfológicas sobre a operação de regras produtivas; b) coerência semântica; c) o fenômeno do bloqueio, que impede a existência de uma forma teoricamente possível, em virtude da existência de uma outra com a mesma função que a forma teoricamente possível exerceria. O certo é que, pelo menos para nós, a noção de produtividade, em termos de mero inventário, não resulta eficaz para um tratamento adequado dos elementos lingüísticos8 8 Há todavia quem descarte a noção de produtividade, como Corbin (1987: 177), por confusa e polissêmica. A autora julga por bem conservar somente a oposição entre processos morfológicos (afixação e conversão), cujas produções não atestadas, não contrariando as restrições lingüísticas impostas à aplicação de cada um, são lacunas acidentais, e aqueles que não podem servir senão para descrever produções atestadas. .

1.2.2. O critério da formação em série

Não obstante a fragilidade do critério da produtividade, ele é adotado em diferentes versões, como esta de Galery:

Ao contrário de MARTINET, porém, não achamos econômico considerar que "os monemas que formam o composto existem fora de compostos: dos que entram nos derivados, há um que só existe em derivados - o tradicionalmente chamado afixo ". Acreditamos que pouco importa que um elemento exista ou não como forma livre (ou dependente). É prefixo tudo aquilo que se comporta como prefixo, isto é, que entra num número razoável de palavras, como elemento formador. Assim, entre- e contra- são prefixos, do mesmo modo que in- e re-, porque servem para formar numerosas palavras, ao contrário, por exemplo, de vaga, que só aparece em vagalume, talvez na etimologia popular vagamundo, e em mais dois ou três compostos pouco usados. Por conseguinte, um radical pode transformar-se em prefixo, em muitas formações. É o caso de certos elementos eruditos que passam à lingua comum e se tornam produtivos - como auto- e talvez tele-, comportando-se como afixos. (1969:35-6)

Sandmann (1989) adota também a produtividade, em termos de número, como critério. Para ele, prefixos e sufixos são formas presas, através das quais se podem formar palavras em série. Contudo, estabelece outros parâmetros, que merecem consideração à parte.

  • Prefixos se unem a um radical na condição de adjuntos adnominais ou adverbiais; constituem o determinante da palavra complexa engendrada e não mudam a classe da palavra da base.

  • Os sufixos, com exceção dos indicadores de grau, mudam a classe da palavra a que se adjungem; ao fazê-lo, constituem-se no determinado do produto da formação de palavras.

Para o autor, prefixação e sufixação se opõem nestes termos: a primeira tem função primordialmente semântica e a segunda, função principalmente sintática.

Procedamos à análise, item a item. Admitir que re- ou pre-, em rever e prever, por exemplo, assume função (que é da sintaxe) de adjuntos adverbiais, só faz sentido se, ao procedermos à conversão sintática, verificarmos a equivalência no plano do conteúdo. As mesmas formas podem inclusive assumir valores distintos, conforme sua ocorrência em outros contextos: re-,em releitura, significa "nova"; pré-, em pré-estréia, significa "anterior". Em recorrendo ao plano do conteúdo, podemos dizer que o sufixo de grau, presente em belíssimo, também equivale a um adjunto adverbial de intensidade, no caso, "muito". Seu valor semântico equivale inclusive ao de prefixos intensivos, como super-, em superbelo.

As noções de determinado e determinante deixam de ser gramaticais para serem semânticas. De um prisma nocional, em desejoso, a idéia principal se sediaria no sufixo e não no radical. Em prever, por sua vez, a noção determinada se encontra no radical. Morficamente, contudo, em qualquer caso, o determinado coincide com o radical primário ou raiz.

Quanto ao propalado caráter não transcategorizador do prefixo, reconhecemos que ele apresenta tamanha saliência, que parece inquestionável. Chama-nos porém a atenção uma observação de Bessa (1978:102) a propósito de um exemplo: antitanque (sinônimo de anticarro, arma, obstáculo, mina, empregados contra carros de combate). A base pertence à classe do nome, e a forma derivada, à classe do adjetivo.

Alves (1990: 24-5), que também usa o critério da formação em série, observa o citado fenômeno e aduz vários exemplos de passagem de substantivo para adjetivo.

A solução deste problema é complexa e não nos ateremos à questão senão en passant. Uma saída é o zero sufixal, mais exatamente o uso do morfema zero (ou morfe zero, já que a ausência significativa é do plano da expressão). Porém, pelo artifício cômodo e ad hoc que representa, tem sido alvo de críticas por parte de eminentes lingüistas como Gleason (s/d: 80) e Elson e Pickett (1973: 67-8).

Corbin (1987: 121-39), em longa exposição sobre a parassíntese, lança luzes sobre o problema. Propõe um tratamento alternativo para a formação parassintética, com base em três exigências: a) dar conta da identidade formal entre o adjetivo prefixado e o adjetivo não-prefixado (antituberculoso/tuberculoso); b) dar conta da identidade semântica entre o adjetivo prefixado e o adjetivo não-prefixado (antituberculoso/ antituberculose); c) não aplicar senão um afixo por vez.

Examina duas hipóteses: a) sufixação seguida de prefixação; b) prefixação seguida de sufixação. A primeira não obedece à exigência b) e a segunda não se aplica à exigência a). Postula então um Princípio de Cópia:

Seja X uma base pertencente à categoria lexical C, Y e Z dois derivados, ambos pertencentes à categoria lexical C’ (onde C ¹ C’), tal que a estrutura deles seja a seguinte (p e s designam respectivamente um prefixo e um sufixo):

Y = [[X]C (s)af ]

Z = [[(p)af [X]C ] (s)af ]

A seqüência superficial Xs de Z é estritamente idêntica a Y. (Corbin, 1987: 136)

Fica para um outro trabalho o exame mais detido da proposta de Corbin. Voltemos à análise da proposta de Sandmann.

Quanto ao sufixo, há que se fazer alguns reparos. Primeiro: existem, conforme já salientado, sufixos não-transcategorizadores, que não apenas os de grau, a exemplos de -edo, em arvoredo, -ado, em mestrado e consulado. Segundo: Sandmann lança mão de meios equivocados para manter incólume a premissa de que o sufixo muda a classe da palavra. Assim, em marmeleiro, postula que o afixo final -eiro, por fazer da fruta uma árvore, muda a subclasse da palavra, embora não lhe mude a classe. O modo de conduzir a argumentação é confuso, uma vez que opõe classe, conceito gramatical, a subclasse, conceito de ordem semântica. É notório que a classe permanece a mesma em ambos os casos, tanto na base derivante quanto na base derivada. Seria bom saber como o conceito de subclasse explicaria formações do tipo livraria, arvoredo, consulado, sapateiro. Não se trata de exceções quaisquer, mas de casos que devem ser considerados, devido a sua extensão.

Como vimos, Sandmann não recorre apenas ao critério da formação em série, mas também estabelece critérios adicionais para o distinguir prefixo de sufixo. Por conta destes parâmetros suplementares, chega a reconhecer a classe dos prefixóides, que configuram semiderivação. Caracterizam-se por assumir identidade formal com preposições e advérbios, não obstante diferenças quanto à distribuição. Falaremos disto a propósito do critério operacional de Basílio.

1.3. O critério semântico-gramatical de Câmara Jr.

Um dos estudiosos que exerceu notável influência no pensamento de Câmara Jr. (1977) foi Vendryès, que cunhou os termos semantema e morfema, sendo o primeiro relacionado com os elementos lingüísticos que exprimem idéias e representações, e o segundo, concernente aos elementos que expressam relações entre idéias (1950: 85)9 9 Parece-nos que os termos com que Vendryès estabelece a diferença entre os dois tipos de significação não são felizes. Preposições como contra, sobre ou sob operam relações entre idéias, mas também apresentam contornos semânticos, nítidos por sinal, se comparados aos das preposições de, em, por. Destaque-se ainda que o fato de estabelecer relação entre idéias não impede que os morfemas também apresentem idéias, oriundas da relação. . Dentre os morfemas, para Vendryès, se destacam os afixos, ao lado das desinências, dos morfemas de alternância e de posição. Em outras palavras, o ponto de partida é a oposição entre significação lexical e significação gramatical, dicotomia acatada por outros autores. Foi tão considerável a influência de Vendryès, que serviu de subsídio para que Câmara Jr. construísse uma concepção semântica de palavra (como vocábulo constituído de semantema) e elaborasse, em parte, sua teoria das espécies de vocábulo.

O lingüista patrício distinguia duas classes de forma mínima: a primeira, relativa à representação lingüística do mundo dos objetos, sendo nele contemplado não apenas o mundo exterior, com seus fenômenos e coisas, mas também o mundo interior de sensações, volições e idéias; a segunda, referente às categorias levadas em conta no sistema lingüístico. Em síntese, o autor reconhecia o semantema e o morfema, embora destacasse, e com razão, que a dicotomia pode induzir a julgar que apenas o primeiro tem valor significativo.

Diferentemente todavia do seu mestre Vendryès, Câmara Jr. classificou os prefixos como semantemas subsidiários e não como morfemas. Advém daí uma aporia: se as preposições são definidas como vocábulos que servem de morfemas de relação, conforme o verbete Preposição, no Dicionário de Filologia e Gramática, de que modo é possível identificar nos prefixos, cuja natureza seria a mesma da preposição, valor semantemático? Além disto, como é possível, numa teoria lingüística que pretende ser geral, dar-se conta de prefixos que ostentam comportamento gramatical? Estes não se acham presentes somente em línguas indo-européias, mas em outras, ditas exóticas, como o iorubá.

Não é compreensível igualmente generalizar a oposição entre prefixo e sufixo, atribuindo-se a este último a condição de entidade desprovida de conteúdo, ou, quando muito, menos provida de sentido que os prefixos. A propósito disto, vale a pena nos referirmos a Sandmann, que contesta as afirmações de Bechara e Rocha Lima, conforme as quais os sufixos são assemânticos. Ele mostra que, do ponto de vista nocional, sufixos (pelo menos alguns) exibem nítido valor semantemático. Para tanto, compara as séries alemã e francesa de formações vocabulares e verifica que os sufixos franceses correspondem, semanticamente, a radicais alemães. Eis a exemplificação (1989:31):

Alemão Francês Português Aschen.becher cendr.ier (cinzeiro) Feuer.wehr.mann pomp.ier (bombeiro) Seil.bahn funicul.aire (funicular) Schlaf.saal dort.oir (dormitório) Wasch.becken lav.oir (lavatório) Kirsch.baum ceris.ier (cerejeira)

Câmara Jr. não se apóia simplesmente na doutrina semântica de Vendryès, cujo fundamento é a noção de semantema. Recorre a um outro parâmetro para a identificação do prefixo: este seria variante da preposição, sob o aspecto de forma presa. O autor recorre ao critério da correspondência entre prefixo e preposição, a qual é pautada no plano da expressão, no que difere de outros, como Pottier, já citado, e Barbosa (1981), discípula deste último, que recorrem à substância do conteúdo. Contudo, em nota de pé de página, chama a atenção para o fato de faltar, em alguns casos, a forma prepositiva correspondente ao prefixo.

Em outra obra (1976), no capítulo sobre ampliação e renovação lexical, alude explicitamente ao prefixo como elemento de composição. Valendo-se de uma perspectiva pancrônica, fala das antigas partículas adverbiais, que culminaram na formação do microssistema prefixal. Refere-se em seguida à redução do sistema de preposições no latim vulgar, que alterou a notável simetria entre preposição e prefixo. Partículas que funcionavam como conectivos preposicionais passaram a ter comportamento puramente prefixal. Reconhece assim o autor, em português, de modo realístico, três grupos de formas:

  • as que funcionam como preposições e prefixos;

  • as que são variantes eruditas das preposições;

  • as que são exclusivamente prefixos.

O pensamento de Câmara Jr., lamentavelmente, não se mantém coerente. Se atentarmos para o verbete Prefixo, do Dicionário de Filologia e Gramática, veremos que o autor persevera na idéia de que o afixo inicial é variante presa das formas dependentes chamadas preposições. E mais: atribui a ele o poder de acrescentar uma significação externa à palavra a que se adjunge, sendo por isso classificável como elemento de composição.

Para nós, é inegável que há prefixos correspondentes a preposições, e isto não requer investigação diacrônica, como deseja Freitas (1981: 115). Tal correspondência, porém, leva em conta aspectos de forma e sentido, mas não de função. Os prefixos não podem ser, pois, categorizados como preposições, uma vez que não ostentam o caráter de morfema relacional. Sandmann (1989: 105-14) é de parecer semelhante: enquadra os elementos correspondentes às preposições (no plano da expressão, bem entendido) entre os prefixóides.

1.4. Propostas baseadas na operacionalidade do conceito de raiz

1.4.1 A proposta de Nida

Nida (1949:83-4), na perspectiva distribucionalista, estabeleceu os conceitos de determinante e determinado a partir de critérios formais. Apoiava-se nos conceitos de:

  • raiz x não-raiz;

  • raiz x radical: sendo este último formado quer de um núcleo, consistindo de uma ou mais raízes, quer de um núcleo mais quaisquer outros morfemas não-raízes (afixos derivacionais, por exemplo), exceto os de natureza flexional;

  • núcleo x não-núcleo: sendo o primeiro constante de raiz ou combinação de raízes; o restante é não-núcleo;

  • núcleo x periferia: o primeiro consiste de um núcleo ou o contém, podendo também constituir o ponto de partida (head) para uma construção subordinada endocêntrica; o segundo usualmente consta de uma não-raiz e está sempre exterior ao constituinte nuclear.

Os conceitos de núcleo e periferia levam ao de constituintes imediatos, no interior da lexia. Eles determinam que se obedeça à ordem de expansão dos radicais. Uma análise como des + cobr + i + ment + o, por exemplo, não seria exemplar, mas sim

descobriment (N) + o (P)

descobr (i) N + ment (P)

des (P) + cobr (N)

Segue-se como corolário que os conceitos de núcleo e periferia são relativos. Deste modo, pode haver mais de um núcleo e de uma periferia.

De acordo com a noção de constituintes imediatos, os afixos são elementos determinantes em relação ao radical, que é o elemento nuclear. Quem adota o ponto de vista semântico pode chegar a resultados diferentes. Assim, em saleiro, que se converte sintaticamente em recipiente para sal, o sufixo carreia a noção mais importante e, por isto, é o determinado. Já em prever, que se desdobra em ver com antecedência, o prefixo é o determinante. Os fundamentos semânticos, neste último caso, conduzem ao mesmo resultado do princípio dos constituintes imediatos.

Admitindo os conceitos de núcleo e periferia, nos termos de Nida, simplificamos a descrição, porque, em qualquer caso, os afixos constituem elementos de natureza periférica. Sempre que possível, é bom transpor os conceitos e procedimentos da morfologia flexional para o âmbito dos estudos lexicológicos, o que não implica fechar os olhos à especificidade destes (nunca é demais lembrar que no setor lexicológico não reinam, com a perfeição desejada, regras, com a "mecânica" da morfologia flexional).

Os estudos de Nida são, porém, ainda preliminares, mesmo vagos, com respeito à identificação da raiz e dos afixos. O lingüista norte-americano, por exemplo, mistura fatos de língua e contingência de discurso, sincronia e diacronia, ao asseverar não ser sempre fácil distinguir raízes de não raízes. Exemplifica-se o primeiro caso com -ism, que Nida afirma ser não-raiz em fatalism e comunism, e raiz em uma frase como I'm disgusted with all these isms (Estou aborrecido com todos estes ismos). Ilustra-se o segundo caso com like, que Nida considera ser raiz que se tornou não-raiz, através da forma presa -ly.

Não vemos dificuldade alguma em classificar o primeiro exemplo entre os casos de conversão (ou de derivação imprópria da gramática tradicional). O segundo ainda é mais simples: -ly é sincronicamente sufixo.

Nida dá como exemplo de raiz o elemento cran (de cranberry). O lingüista tem-no como raiz porque ocuparia a posição própria de raiz. Bessa (1986:235) detecta aí dois problemas: a) imprestabilidade de cran como morfema de ocorrência única, já que aparece, segundo testemunho de Akmajian e outros (apud Bessa, 1986:233) em outros itens lexicais: cranicot, cranprune, o que evidencia não mais ser cran caso de hápax legómena; b) a extensão indevida do conceito de raiz a elementos de ocorrência única.

A proposta de Basílio surge então para aclarar e reparar pontos obscuros da de Nida. Outros autores, aqui citados, nada mais fizeram senão perseverar na mesma trilha por ela indicada.

1.4.2. A proposta de Basílio e seus desdobramentos

Analisando o conceito tradicional de raiz, segundo o qual ela é a parte da palavra que contém o significado principal, Basílio (1974:6) conclui que os critérios para definir o que é principal e o que é acessório, na análise vocabular, esbarram em aporias. Em mesas, por exemplo, não há dúvida de que mesa contém o significado básico enquanto -s apresenta um significado acessório. Já em cigarreira, o significado principal estaria no sufixo.

Realmente os gramáticos tradicionais não oferecem parâmetros para definir o que é essencial e o que é acessório em análise mórfica. Arriscamos, todavia, hipotetizar que os gramáticos não se apóiam nas noções de determinante e determinado em bases semânticas, como faz Sandmann (1989), para diferenciar prefixos e sufixos. Eles se referem somente ao significado que se mantém constante, por exemplo na série livraria - livreiro - livreto. Por vezes, o significado se encontra conotado, mas a conotação decorre de um significado fundamental. Isto ocorre no verbo latino deflorare, cuja raiz se liga formal e conotativamente ao de flos, floris, "flor".

Basílio aduz os seguintes critérios operacionais:10 10 Houve quem propusesse critérios para a identificação da raiz e do radical em outras bases alternativas, a exemplo de Macambira (1978:1).Num primeiro momento, o autor encara a raiz à luz da proposta tradicional, segundo a qual é o elemento irredutível e comum a todas as palavras duma família. É, como se nota facilmente, uma definição relacionada a uma outra, à página 2, e que remonta à concepção de Saussure (1977: 216), um tanto abstrata, conforme a qual a raiz é o elemento em que o sentido comum a todas as palavras aparentadas atinge o máximo de abstração e generalidade. À página 8, no entanto, vai além e arrola as preposições (ex.: contra), as conjunções (ex.: mas) e as interjeições (ex.: oh!) como vocábulos inflexivos constituídos de raiz e sufixo zero. Não nos dá todavia maiores delineamentos. Na verdade, o conceito de raiz, subjacente aos exemplos, não se funda em uma tomada de posição coerente. Antes, contraria o conceito de cognação, adotado pelo autor. Isto sem falar no emprego abusivo do zero, que é problemático em morfologia.

  • são raízes os elementos mórficos passíveis de ocorrência isolada;

  • são raízes os elementos que servem de base para a formação de derivados.

O critério de número 1, encarado em seus aspectos puramente mecânicos, leva-nos a concluir que contra, em contra-atacar, é raiz (ou radical, no caso), porque pode ser empregado como forma livre. Mas como bem observou Carvalho, em nota de pé de página, a propósito de um exemplo em francês, contredire:

A formulação << plusieurs préfixes fonctionnent comme mots indépendents>> é evidentemente infeliz, porque a identidade material de contre- em contredire e contre- em << agir contre quelqu'un>> não implica identidade significativa (tratando-se pois nos dois casos do mesmo significante em funções diversas) e muito menos que o segundo contre- seja o prefixo em função de preposição. (1973: 548).

Tal parecer é admitido por Sandmann (1989), que, considerando a identidade formal entre certos afixos e preposições, prefere classificar os primeiros como prefixóides, enquadrados no fenômeno da semiderivação. Em suma, os elementos correspondentes a preposições não são raízes, porque estamos falando de funções distintas. No plano lexical contra-, em contra-atacar, não tem o caráter de morfema relacional. Admite também o autor, a partir do confronto entre forma livre e forma prefixada, que bem- e mal-, bem como não-, são prefixoidais.

O segundo critério adotado por Basílio não é novo, pois já se encontra implícito no compêndio da Real Academia Española (1982: 166). Aí se afirma que são raízes os primeiros elementos destacados de cada um dos vocábulos da série: sombr-ero, varie-dad, tard-ío, contr-ario.

As teses de Basílio não deixaram de ter repercussão. Monteiro (1991: 28-30), por exemplo, as admite. Para ele, extra e contra, por serem usados freqüentemente como formas livres na atual sincronia do português, foram promovidos à condição de raiz. Já fizemos comentários a respeito de contra. Quanto a extra, há que objetar-se que, no contexto lexical, ocorre pré-adjetivalmente, a exemplo de extraterrestre e extra-oficial. Isto não ocorre com a forma livre extra.

Monteiro também admite o critério de número 2. Em virtude deste, super- é raiz porque daí resulta superar. Pergunta-se quem tem consciência da relação entre super e superar a não ser o conhecedor da diacronia do português.

No que concerne à coerência, Monteiro deixa a desejar, diferentemente do que ocorre com Basílio. Em um e outro passo, diverge das sugestões da autora, quando sugere que sobre, contra e perante, por serem verdadeiros núcleos de significação, em oposição a outras preposições, como de e a, devem ser raízes. O argumento aí deixa seu cunho operacional e assume caráter semântico11 11 Não é apenas neste pormenor que Monteiro nos lega propostas fluidas. Exemplifiquemo-lo com a seguinte lista dos prefixos que o autor julga verdadeiramente vigentes em português, com seus alomorfes: /a-/ ~ /ad-/ /em-/ ~ /en-/ /ab-/ ~ /abs-/ /in-/ ~ /im-/ ~ /i-/ /cis-/ /ob-/ ~ /o-/ /de-/ ~ /des-/ /ré-/ /dis-/ ~ /di-/ /trans-/ ~ /tras-/ ~ /tra-/ ~ /tre-/ /ex-/ ~ /es-/ ~ /e-/ /a-/ ~ /an-/ A lista está longe de representar em termos quantitativos os prefixos verdadeiramente vigentes em português. Acrescente-se que as alomorfias são objetáveis. O que conduz o autor a dar e- como alomorfe de es-? Por que não distingue adequadamente alografia de alomorfia? É a falta de distinção que o leva a dar como alomorfes em- e en-, ex- e es-. Em que bases empíricas se fundamentou para concluir sobre a produtividade prefixal? É questionável, por exemplo, a produtividade de ab - e sua variante abs -, e de dis -, com o sema de separação. .

É Bessa (1986:236-43) que, acatando os dois critérios de Basílio, oferece-nos balizas mais tangíveis, às quais acrescenta uma terceira: a mobilidade distribucional. Segundo este critério, filo é radical por poder ocupar posições diversas no corpo do vocábulo. Filo aparece na primeira posição, em filocomunista, e na última, em francófilo; fono assume a primeira posição em fonógrafo e a última em hipnofono. Por isto, filo e fono são raízes.

A mobilidade distribucional já era conhecida por outros autores, como Chevalier e outros (s/d: 56-7), que reconheciam, nos exemplos de elementos deslocáveis, fronteiras entre a derivação e a composição. Iorgu e Manoliu (1980:48) também a reconhecem, mas preferem ver nos constituintes deslocáveis pseudoprefixos ou prefixóides.

Dada a importância do assunto para os estudos das formações técnico-científicas, baseadas principalmente em elementos gregos, deixamos para desenvolvê-lo em outro trabalho, quando distinguiremos o que é efetiva existência em vernáculo do que é simples herança ou empréstimo. De antemão, feitas as ressalvas devidas, cremos que é um bom critério para se caracterizar o radical.

2. Conclusão

De todo o exposto, podemos concluir o seguinte, relativamente ao nosso assunto:

  • Não basta simplesmente o critério da posição para caracterizar os prefixos, uma vez que radicais também podem ocupar a primeira posição.

  • O critério transformacional não se presta a identificar os prefixos, conforme argumentação feita na secção pertinente deste trabalho.

  • O critério da produtividade, em suas diferentes versões, não constitui parâmetro para nós, porque é exterior ao fato lingüístico.

  • O critério morfossemântico, de Câmara Jr., sobreleva o valor semântico do prefixo, alçado à condição de semantema subsidiário. Ademais, a afirmação de que os prefixos são variantes presas das formas chamadas preposições é objetável, porque o prefixo e o conectivo preposicional a eles formalmente relacionados ostentam diversos privilégios de ocorrência. Por outro lado, nem sempre tal correspondência se verifica.

  • Quanto aos critérios baseados na operacionalização do conceito de raiz, há que se destacar o seguinte: para nós, não basta haver pura e simples correspondência em forma no contexto vocabular e forma livre ou dependente. Deverão ser levadas em conta diferenças distribucionais entre uma dada forma no enunciado e no vocábulo. Todavia, cremos ser de destaque o terceiro critério, relativo à mobilidade distribucional.

Isto posto, julgamos ser possível caracterizar o prefixo típico como elemento mórfico de posição estritamente inicial, sem correspondência formal com nenhum item léxico e sem possibilidade de constituir base de derivação. Isto se aplica a des- e a re-, por exemplo, mas não a auto, que engendra autismo e autista. Tampouco se aplica a filo, dotado de mobilidade distribucional, a exemplo de filocomunista e cinéfilo.

Constituem elementos de fronteira entre a composição e a derivação as formas iniciais que assumem o seguinte comportamento idiossincrático:

  • Correspondem formalmente a itens lexicais, destes se distinguindo por diferença quanto aos privilégios de ocorrência:

    contra

    - (

    contra

    -

    atacar),

    não- (

    não

    -

    ocorrência

    ),

    mal- (

    malformação).

  • Funcionam por braquissemia:

    vice

    - (em lugar de

    vice

    -

    presidente);

    ex- (em vez de

    ex

    -

    marido);

    intra

    - (em

    intra

    e

    interpartidário), por exemplo.

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  • MARTINET, A. (1973) Elementos de Lingüística Geral. Traduçăo e adaptaçăo de Jorge Morais-Barbosa. Lisboa: Sá da Costa.
  • MONTEIRO, J. L. (1991) Morfologia Portuguesa. Campinas: Pontes.
  • NIDA, E. (1949) Morphology: the Descriptive Analysis of Words. Ann Arbor: The University of Michigan Press.
  • POTTIER, B. (1962) Systématique des Éléments de Relation. Paris: Klincksieck.
  • REAL ACADEMIA ESPAÑOLA (1982) Esbozo de una Nueva Gramática de la Lengua Española. Madrid: Espasa-Calpe.
  • SANDMANN, A. J. (1989) A Formaçăo de Palavras no Portuguęs Brasileiro Contemporâneo Curitiba: Scientia et Labor / Ícone Editora.
  • SAUSSURE, F. de (1977) Curso de Lingüística Geral. Traduçăo de Antônio Chelini, José Paulo Paes e Izidoro Blikstein. Săo Paulo: Cultrix.
  • VENDRYČS, J. (1950) Le Language. Paris: Édition Albin Michel.
  • 1
    It is also a fact that prefixes can be formed fairly freely from other words (e.g.,
    politico-, parallelo-) and in this case we will assign them to the syntatic category" prefix" instead of (rather than adition to) the category to which the underlying form belongs in isolation. The word
    parallelogram will be represented [
    Npara [
    Slel]
    So]]
    P[
    Sgram
    S]
    N, indicating that is a noun of the form prefix-stem, where the prefix in turn consists of a stem with an uncategorized prefix
    para-, the latter being on a par with
    mono-,
    tele-, and so on. This analisis, once again, seems to be reasonnably well motivated on syntatic lexical grounds and it is appropriate for the phonology.
  • 2
    La diffèrence entre les deux modes de réalisation, le phrastique et le lexical, se situe principalement au point d'arrivée des transformations. La réalisation syntaxique du discours consiste dans la succession d'éléments syntagmatiques autonomes reconnus chez tous les locuteurs d'une même langue comme des mots ou unités de signification dans le cadre des schémas syntaxiques de phrases simples ou complexes. La réalisation lexicale, au contraire, se traduit par une séquence spécifique d'éléments de construction sous la forme d'une suite de phonèmes soudés dont la contre-partie graphique est une séquence des graphèmes coalescents ou une séquence de segments disjoints réunis par un trait d'union, à laquelle correspond une unité de sens, ou encore une séquence d'éléments autonomes sans autre lien apparent que la signification globale. Mais le processus unique différencié entre deux schémas, l'un syntaxique, l'autre lexical permet de lier la signification moins à la forme construite qu’à la construction même. Tout segment de phrase peut fonctionner lexicalement du moment qu'il résulte de la transformation d'une phrase. L'interchangeabilité entre la réalisation syntaxique et la réalisation lexicale n'est plus seulement le résultat d'une équivalence sémantique, mais elle se produit en vertu de l'unité profonde à partir d'une phrase de base commune. À l'inverse, à partir d'une réalisation syntagmatique phrastique, on peut revenir à un schéma lexical conjoint em vertu de cette même unité profonde.
  • 3
    Jackendoff (1975: 653-55) atém-se a exemplos que constituem formas herdadas:
    persist, transfer, precede, e conclui que, na maior parte das vezes, prefixos e radicais não carreiam informação semântica, o que é questionável. Aronoff (1976: 11-5) também se detém em formas herdadas do latim e não nos fornece subsídios para a identificação do prefixo.
  • 4
    Corbin (1987) faz inclusive um levantamento maior e mais sistemático no domínio da morfologia lexicalista, considerando modelos não-estratificados, que tratam niveladamente da regularidades e irregularidades (Jackendoff, Aronoff, Selkirk e Lieber), e os estratificados, que propõem uma hierarquização entre os níveis das regras e os das exceções (Halle, Allen). Tratar deles aqui foge aos objetivos do nosso trabalho.
  • 5
    Dubois e Lagane (1973) dedicam dois capítulos ao estudo de formação de palavras: o 48°, relativo à sufixação, incluída na derivação, e o 49°, dedicado à prefixação e à composição. Há semelhanças entre o pensamento dos dois autores e o de Guilbert, pois: a) é empregado o princípio da transformação; b) por este princípio, o sufixo é transcategorizador; c) pelo mesmo princípio, o prefixo se origina de uma preposição. O mecanismo de formação dos compostos, muito sumário, deixa muito a desejar.
  • 6
    En nous fondant sur les possibilités combinatoires à l'intérieur d'une même classe de morphèmes, nous distinguons les
    lexèmes ou morphèmes appartenant à une catégorie à grand nombre de variables (p. ex.: à partir de 5.000 en français), et les
    formants ou morphèmes appartenant à une catégorie à petit nombre de variables facilement déterminable (par ex., au-dessous de 100).
  • 7
    Para ilustrar a afirmação de Galery, citamos Lhorach (1981: 48), que, baseado nas idéias de Hjelmslev, oferece um quadro referente ao plano do conteúdo, do qual emergem as formas derivativas como pleremas marginais, por oposição aos centrais, que são os radicais; as marcas categoriais do verbo (morfemas extensos) e as do nome (morfemas intensos), pertencem à gramática.
  • 8
    Há todavia quem descarte a noção de produtividade, como Corbin (1987: 177), por confusa e polissêmica. A autora julga por bem conservar somente a oposição entre processos morfológicos (afixação e conversão), cujas produções não atestadas, não contrariando as restrições lingüísticas impostas à aplicação de cada um, são lacunas acidentais, e aqueles que não podem servir senão para descrever produções atestadas.
  • 9
    Parece-nos que os termos com que Vendryès estabelece a diferença entre os dois tipos de significação não são felizes. Preposições como
    contra, sobre ou
    sob operam relações entre idéias, mas também apresentam contornos semânticos, nítidos por sinal, se comparados aos das preposições
    de, em, por. Destaque-se ainda que o fato de estabelecer relação entre idéias não impede que os morfemas também apresentem idéias, oriundas da relação.
  • 10
    Houve quem propusesse critérios para a identificação da raiz e do radical em outras bases alternativas, a exemplo de Macambira (1978:1).Num primeiro momento, o autor encara a raiz à luz da proposta tradicional, segundo a qual é o elemento irredutível e comum a todas as palavras duma família. É, como se nota facilmente, uma definição relacionada a uma outra, à página 2, e que remonta à concepção de Saussure (1977: 216), um tanto abstrata, conforme a qual a raiz é o elemento em que o sentido comum a todas as palavras aparentadas atinge o máximo de abstração e generalidade. À página 8, no entanto, vai além e arrola as preposições (ex.: contra), as conjunções (ex.: mas) e as interjeições (ex.: oh!) como vocábulos inflexivos constituídos de raiz e sufixo zero. Não nos dá todavia maiores delineamentos. Na verdade, o conceito de raiz, subjacente aos exemplos, não se funda em uma tomada de posição coerente. Antes, contraria o conceito de cognação, adotado pelo autor. Isto sem falar no emprego abusivo do zero, que é problemático em morfologia.
  • 11
    Não é apenas neste pormenor que Monteiro nos lega propostas fluidas. Exemplifiquemo-lo com a seguinte lista dos prefixos que o autor julga verdadeiramente vigentes em português, com seus alomorfes:
    /a-/ ~ /ad-/ /em-/ ~ /en-/
    /ab-/ ~ /abs-/ /in-/ ~ /im-/ ~ /i-/
    /cis-/ /ob-/ ~ /o-/
    /de-/ ~ /des-/ /ré-/
    /dis-/ ~ /di-/ /trans-/ ~ /tras-/ ~ /tra-/ ~ /tre-/
    /ex-/ ~ /es-/ ~ /e-/ /a-/ ~ /an-/
    A lista está longe de representar em termos quantitativos os prefixos verdadeiramente vigentes em português. Acrescente-se que as alomorfias são objetáveis. O que conduz o autor a dar
    e- como alomorfe de
    es-? Por que não distingue adequadamente alografia de alomorfia? É a falta de distinção que o leva a dar como alomorfes
    em- e
    en-,
    ex- e
    es-.
    Em que bases empíricas se fundamentou para concluir sobre a produtividade prefixal? É questionável, por exemplo, a produtividade de
    ab
    - e sua variante
    abs
    -, e de
    dis
    -, com o sema de separação.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 1998
    • Data do Fascículo
      Fev 1998
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