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Antenor Araújo

Entrevista

A cirurgia ortognática é um procedimento consolidado no tratamento de indivíduos com deformidades dentofaciais. O reconhecimento da técnica como um procedimento seguro e previsível foi resultado do trabalho de muitos clínicos e pesquisadores ao redor do mundo. No Brasil, o profissional que mais se destacou nessa tarefa foi o Prof. Antenor Araujo. Ele possui uma ampla experiência com esse tipo de cirurgia e é reconhecido em todo o mundo como um importante difusor do conhecimento na área.

Tive a oportunidade de conhecer um pouco mais o Prof. Antenor fora do ambiente de trabalho, em seu lindo apartamento em Campos do Jordão. Ele é uma pessoa de muito bom gosto e de uma fina e encantadora educação.

Além das conquistas profissionais, o Prof. Antenor angariou vitórias pessoais pela bela família que construiu. Ele é casado com a fonaudióloga Vilma Ferreira Pinto Araujo e tem três filhos: Marcelo, cirurgião bucomaxilofacial; Roberta, produtora de modas; e Adriano, ortodontista. Sou seguro que todos gostarão dessa entrevista.

Jorge Faber

1) O Sr. foi o introdutor da cirurgia ortognática nos moldes modernos no Brasil. Como foi a aceitação da comunidade odontológica dos procedimentos que o Sr. introduziu? Jorge Faber

Retornei dos Estados Unidos em julho de 1978. Já no mesmo mês participei de um Congresso do Colégio Brasileiro em Belo Horizonte, onde tivemos a oportunidade de apresentar todas as mudanças, tanto de planejamento como de técnicas da cirurgia ortognática. A reação da comunidade foi, ao mesmo tempo, de surpresa e expectativa quanto aos resultados a serem conseguidos para o futuro, porém ao mesmo tempo de certeza que estávamos começando uma nova época na Cirurgia Bucomaxilofacial.

2) Naquela época, havia diferença na relação do ortodontista com o cirurgião-bucomaxilofacial, quando comparada à atual, no tratamento das deformidades dentofaciais? Quais eram as diferenças? João Milki Neto

Sem dúvida, as diferenças são enormes, pois naquela época os resultados das "cirurgias ortognáticas" eram tremendamente instáveis e elas eram baseadas, quase unicamente, na experiência do cirurgião, o que colocava os ortodontistas numa atitude extremamente defensiva ao indicar uma cirurgia ortognática, sendo que muitos ortodontistas contra-indicavam as mesmas.

Hoje, porém, o panorama é completamente diferente. Ortodontistas e cirurgiões trabalham lado a lado, conseguindo resultados mais estáveis, com melhor harmonia facial e oclusal.

3) Quais foram os principais avanços que a cirurgia ortognática sofreu nas últimas décadas? Jorge Faber

A cirurgia ortognática sofreu várias fases de evolução. Em primeiro lugar, as técnicas cirúrgicas foram modificadas, dando ênfase à nutrição dos segmentos obtidos durante a cirurgia. Uma nova fase se deu, com relação ao cuidado no planejamento, trabalho que passou a ser realizado de uma forma estreita entre o cirurgião e o ortodontista. Porém, sem dúvida, um dos maiores avanços se deu com a introdução das placas e parafusos, levando as cirurgias a uma fixação rígida, evitando, dessa forma, o bloqueio maxilomandibular. No momento, cuida-se bastante também da estabilidade psicológica do paciente, com relação aos resultados obtidos.

4) Como esses avanços beneficiaram o paciente portador de deformidade dentofacial? Jorge Faber

Sem dúvida, resultados mais estáveis e recuperação pós-operatória mais rápida, possibilitando ao paciente - em um prazo de uma semana - retornar às suas atividades de trabalho ou estudo.

5) A cirurgia ortognática promove grandes alterações na fisionomia de muitos pacientes que se submetem a esse procedimento. Como o Sr. avalia essas transformações do paciente, tanto do ponto de vista da beleza quanto do psicológico? Jorge Faber

A maioria das transformações é sutil, levando as pessoas que convivem com o paciente a não conseguirem determinar exatamente o que foi feito. No entanto, em casos de grandes assimetrias faciais e correções de grandes deformidades, onde o paciente irá sofrer significativas modificações estéticas faciais, ele deve ser muito bem preparado para o resultado a ser obtido. Embora sua face passe a ser muito mais harmoniosa, isso não impede que o paciente leve um tempo para se acostumar com o resultado da cirurgia. O preparo prévio antes da cirurgia e o acompanhamento semanal pós-cirúrgico ajudam bastante a propiciar estabilidade emocional ao paciente.

6) Promover alterações tão profundas como as comentadas requer uma confiança muito grande do paciente no cirurgião. Como se deve proceder para estabelecer esse elo de confiança? Jorge Faber

Normalmente, nosso relacionamento com o paciente começa na primeira consulta e é nela que se estabelece uma empatia entre o cirurgião e o paciente. Nessa mesma consulta, são mostrados resultados de pacientes já operados. A seguir, um estudo é realizado e, por meio de programas de computador, pode-se dar uma boa idéia dos resultados a serem obtidos após a cirurgia. Durante a fase de preparo ortodôntico para a cirurgia, o cirurgião deve manter contato a cada 3 ou 4 meses com o paciente. No entanto, nas vésperas da cirurgia, tais contatos devem ser semanais por, no mínimo, 2 meses, fortalecendo, dessa forma, esse elo de confiança entre o cirurgião e o paciente.

7) Ao longo de sua prática clínica, o Sr. acumulou uma importante bagagem profissional, que o posiciona como uma referência para os cirurgiões, tanto no Brasil como no exterior. Assim, quais conselhos o Sr. daria a um profissional que está no início de sua carreira? João Milki Neto

Sem sombra de dúvida, aconselharia ao jovem que pretende dedicar-se à especialidade de Cirurgia Bucomaxilofacial que buscasse uma boa formação. Hoje as residências com duração mínima de 3 anos de dedicação exclusiva e cerca de 8.000 horas são o melhor caminho para atingir tal objetivo.

8) Existem, em sua opinião, aspectos da formação do cirurgião brasileiro que ainda precisam ser aprimorados? Quais? João Milki Neto

Com o advento das residências em Cirurgia Bucomaxilofacial, eventuais falhas de formação foram praticamente sanadas. Devemos continuar lutando contra "cursos de fim de semana", que dão a falsa impressão de formação ao jovem que quer dedicar-se à nossa especialidade.

9) Qual futuro o Sr. antevê para a Cirurgia Bucomaxilofacial no Brasil? João Milki Neto

A Cirurgia Bucomaxilofacial tem evoluído muito nos últimos anos no Brasil, graças à formação que se vem dando aos jovens que a ela querem se dedicar. Nos diversos estados brasileiros, cursos de extensão, de atualização e de residência vêm sendo realizados, visando sempre a melhor formação de futuros cirurgiões. Tais resultados podem ser observados na qualidade dos trabalhos apresentados em congressos, através de conferências e pôsteres.

10) O Sr. tem uma carreira vitoriosa, mas existe alguma coisa que gostaria de ter feito e que por alguma razão não fez? João Milki Neto

Completo neste ano 40 anos dedicados à Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. Tive a oportunidade, ainda jovem, em 1970, de participar da fundação do Colégio Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. Durante muitos anos me dediquei - como professor - a formar novos cirurgiões. Novamente tive a oportunidade única de estar no lugar certo, na hora certa, na Southwest Medical School em Dallas, onde a cirurgia ortognática estava tendo seu grande desenvolvimento, por professores como Bell, Walker, Sinn, Wolford e Epker.

Trouxe para a América Latina, de uma forma geral, a cirurgia ortognática, tive o reconhecimento do American College of Oral and Maxillofacial Surgeons, em abril de 2004 em Hollywood/Florida, ao receber o prêmio W. Harry Archer, onde lê-se "Em apreciação por seu desprendimento em dividir seus conhecimentos", e por ter dividido nossos conhecimentos com colegas de toda América Latina.

Pessoalmente tenho uma família maravilhosa, que sempre me apoiou e dividiu comigo todos os momentos bons e difíceis de minha carreira.

Continuo minhas atividades como professor na nossa residência, participo ativamente de congressos, ministrando cursos e conferências no Brasil e no exterior, portanto, não poderia querer mais. Quero apenas que Deus me ajude a ter saúde, pois vontade não me falta em continuar lutando pela formação cada vez melhor de nossos cirurgiões bucomaxilofaciais.

João Milki Neto

- Professor do Departamento de CTBMF da Universidade de Brasília.

- Membro titular do Colégio Brasileiro de CTBMF.

- Fellow da Universidade do Texas Southwestern Medical Center (Dallas / EUA).

- Mestre em Ciências da Saúde pela UnB.

- Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (CTBMF) pela FOJOP.

Jorge Faber

- Editor da Revista Dental Press de Ortodontia e Ortopedia Facial.

- Doutor em Biologia – Morfologia pelo Laboratório de Microscopia Eletrônica da UnB.

- Mestre em Ortodontia pela UFRJ.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jun 2008
  • Data do Fascículo
    Out 2007
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