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Entre utopias desejáveis e realidades possíveis: noções de bem viver na atualidade

RESUMO

Os modos de populações indígenas da América Latina de conceber as relações do ser humano com os demais seres e espécies e o ambiente preservaram visões de mundo, valores e práticas sociais que têm inspirado e sido incorporadas nas discussões atuais sobre noções de bem viver. Neste artigo, reunimos e articulamos noções de bem viver em quatro matrizes principais: a matriz das visões de mundo indígenas; a matriz do pensamento utópico latino-americanista; a matriz estatal; e a matriz socioambiental. Tais matrizes guardam entre si aspectos convergentes, formando um núcleo comum emulador de novas propostas filosóficas, econômicas e políticas, enquanto alternativas ao modelo de vida, trabalho e relação com o ambiente produzido pelo capitalismo neoliberal.

PALAVRAS-CHAVE:
Bem viver; Qualidade de vida; Povos indígenas; Colonialismo

ABSTRACT

The ways that indigenous populations of Latin America conceive the relations of the human beings with other beings and species and the environment preserved worldviews, values and social practices that have inspired and have been incorporated in the current discussions regarding notions of good living. In this article, we gather and articulate the notions of good living in four main matrices: the matrix of indigenous worldviews; the matrix of the Latin Americanist utopic thought; the state matrix; and the socioenvironmental matrix. Such matrices keep convergent aspects among themselves, forming a common nucleus that emulates new philosophical, economic and political proposals, as alternatives to the model of life, work and relationship with the environment produced by neoliberal capitalism.

KEYWORDS:
Good living; Quality of life; Indigenous peoples; Colonialism

Introdução

Os modos das populações indígenas da América Latina de conceber as relações do ser humano com os demais seres e espécies e o ambiente preservaram visões de mundo, valores e práticas sociais que têm inspirado e sido incorporados nas discussões atuais sobre as noções de bem viver, enquanto alternativas ao modelo de vida, trabalho e relação com o ambiente, produzido pelo capitalismo neoliberal.

Segundo Quijano (1991QUIJANO, A. Colonialidad y Modernidad/Racionalidad. Perú Indígena, v.13, n.29, p.11-20, 1991.; 2000), o capitalismo teve sua origem no colonialismo, processo histórico de exploração e dominação promovido por Estados europeus na África, Ásia e nas Américas. O colonialismo teve início no século XV. E, para estudiosos desse processo histórico, como Wolfe (1999WOLFE, P. Settler Colonialism and the Transformation of Anthropology: The Politics and Poetics of an Ethnographic Event. London: Cassell, 1999.), Veracini (2013VERACINI, L. Settler Colonialism: Career of a Concept. The Journal of Imperial and Commonwealth History, v.41, n.2, p.313-33, 2013.) e Mandani (2015), perdura até os dias atuais através do que denominam como settler colonialism, ou “colonialismo de povoamento”, cuja principal característica é a ocupação de territórios indígenas e de comunidades tradicionais, em especial de América Latina, África e Oceania, e a expulsão de suas populações e substituição por outras, enquanto forças de trabalho, para o avanço de monoculturas, extração de minérios, criação de gado, e demais modalidades de exploração econômica. Tal processo histórico moldou o mundo moderno e o capitalismo neoliberal vigente ao estabelecer um novo padrão de poder mundial, a colonialidade. Como fenômeno social, a colonialidade abarca um sistema de estruturação de pensamentos, sentimentos e ações de hierarquização dos não europeus, para além da gestão dos corpos escravizados ou dos sistemas econômicos e geopolíticos produzidos pelo colonialismo. Ou seja, refere-se às condições de permanência das relações de sujeição ao poder colonial (Frias, 2019FRIAS, R. R. Metamorfoses identitárias de lideranças religiosas não iorubás inspiradas no convívio com lideranças religiosas iorubas. São Paulo, 2019 Tese (Doutorado) - Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo.).

Os debates sobre colonialidade ganham fôlego na América Latina a partir do final dos anos 1990 e início dos anos 2000 em decorrência da maior penetração do capitalismo neoliberal no continente e do agravamento das desigualdades sociais na região. É nesse momento, impulsionado pelas eleições de Evo Morales na Bolívia (2005) e Rafael Correa no Equador (2006) e, consequentemente, pela reformulação da Constituição Federal em ambos os países, que a discussão sobre as noções de bem viver passa a adquirir maior visibilidade na atualidade.

Neste artigo, partindo da concepção de heterogeneidade histórico-estrutural proposta por Quijano (1991QUIJANO, A. Colonialidad y Modernidad/Racionalidad. Perú Indígena, v.13, n.29, p.11-20, 1991.), reunimos e articulamos as noções de bem viver em quatro matrizes principais: a matriz das visões de mundo indígenas; a matriz do pensamento utópico latinoamericanista; a matriz estatal; e a matriz socioambiental. Isso porque, como explica Quijano (1991, p.12):

A ideia de totalidade histórica exclui a possibilidade de que uma única lógica presida a constituição e o processo histórico de uma totalidade social concreta, já que essa é historicamente heterogênea e só pode estar integrada por várias e diversas lógicas. Elas se articulam e certamente produzem uma estrutura e se ordenam em torno de uma lógica de conjunto. Nesse sentido, formam uma lógica de continuidade, porém, ao mesmo tempo, no mesmo movimento, não podem deixar de ser diversas e descontínuas.

Nesse sentido, noções de bem viver conformam uma categoria historicamente heterogênea e formada por diversas lógicas. Ao nos determos nas quatro matrizes principais do desenvolvimento de noções de bem viver buscamos sinalizar para uma lógica de conjunto em que distintas matrizes operam em convergência e descontinuidades múltiplas. A compreensão dos caminhos do bem viver exige que se acolha essa sua complexidade.

A matriz das visões de mundo indígenas

No idioma de povos aymara da Bolívia, é a expressão suma qamaña que articula aproximações às noções de bem viver, em que suma significa “bom” e qamaña significa “habitar, se relacionar”. Tal expressão pode ser compreendida como “conviver bem”, no sentido de respeito e complementaridade entre os seres humanos e desses com a natureza (Choquehuanca Céspedes, 2010; Albó, 2011ALBÓ, X. Suma qamaña = Convivir bien? Cómo medirlo? In: FARAH, I.; VASAPOLLO, L. (Coord.) Vivir bien: Paradigma no capitalista. La Paz: Bolivia, Universidad Mayor de San Andrés (Cidesumsa), 2011, 437p.). O suma qamaña aponta para um modo de conduzir a vida com equilíbrio e em complementaridade: “com os outros membros da natureza, da sociedade e com nós mesmos” (Yampara, 2014_______. El viaje del Jaqui a la Qamaña. In: QUINTERO, P. (Coord.) Crisis civilizatoria, desarrollo y buen vivir. Buenos Aires: Duke University/Ediciones del Signo, 2014. p.193-99., p.199). Desse modo, a busca pelo bem-estar individual e coletivo envolveria também o trabalho como uma realização comunitária em um contexto de reciprocidade (Siqueira, 2020SIQUEIRA, G. C. Noções de bem viver latino-americanas na perspectiva da psicologia: uma revisão de escopo. São Paulo, 2020. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) - Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo.).

Para Huanacuni Mamani (2015, p.56), suma qamaña expressa uma proposta de “ação e essência comunitária”, na qual a complementaridade com as diversas expressões da vida e da realidade são o fio condutor. Nessa direção, tem sido considerado um lócus de realização do suma qamaña o ayllu, isto é, as comunidades campesinas andinas que são unidas por laços de parentesco e trabalho comunitário e configuram a célula básica da organização social da vida indígena nos Andes. Contudo, Huanacuni Mamani (2010) assevera que a associação imediata entre suma qamaña e o ayllu precisa ser relativizada. Para o autor as sociedades humanas são caracterizadas por conflitos sociais e, ao recorrer à vida nos ayllus como expressão do suma qamaña, é importante levar em conta o contexto e a profundidade das relações sociais nessas comunidades, indo além das categorias antropológicas clássicas como reciprocidade ou dádiva. Isso mostra que a compreensão de noções de bem viver não pode ser fixada em conceituações abstratas, tendo em vista se tratar de uma realidade que se materializa no presente, em que se articulam visões de mundo e processos históricos.

Além do suma qamaña, o termo pacha no idioma aymara também é considerado central para uma aproximação com as noções de bem viver. Tal termo expressa uma unidade de dimensões: “doble fuerza o energía con espíritu” (Yampara, 2008YAMPARA, S. Empresa Ayllu ó Ayllu Qamaña? In: MEDINA, J. (Coord.) Suma Qamaña: la comprensión Indígena de la vida buena. La Paz: GPI, 2008. p.137-47., p.74). De acordo com Huanacuni Mamani (2010, p.22), pacha: “es la capacidad de participar activamente en el universo, sumergirse y estar en él”. Além disso, outros termos importantes para aproximação com as noções de bem viver são Pachamama, Pachakama e Pachacuti. Sobre Pachamama e Pachakama,Fuscaldo e Urquidi (2015FUSCALDO, B.; URQUIDI, V. O Buen Vivir e os saberes ancestrais frente ao neoextrativismo do século XXI. Pólis Revista Latinoamericana, v.40, p.1-17, 2015., p.8) explicam:

A PachaKama ou Pachatata é a força cósmica, que vem do céu. Já a Pachamama é a força telúrica, que vem da terra. As duas convergem no processo da vida, gerando as diferentes formas de existência - cada qual uma ponte, uma síntese destas duas energias - que se relacionam através do Ayni, o princípio de complementaridade [...]. Dentro da filosofia aymara, estas diferentes formas de existência, todas elas, orgânicas e inorgânicas, são possuidoras de vida. A vida, por sua vez, corresponde a uma totalidade do visível - existências compreendidas no âmbito das forças telúricas, a Pachamama - e do invisível - aquelas que se referem ao âmbito da energia cósmica, a Pachakama.

O termo Pachacuti, por sua vez, indica uma reviravolta capaz de estabelecer o mundo em um novo lugar. Por isso, é comum ser utilizado para designar a própria concepção de tempo, como algo que se dá entre a espera e o acontecimento de um novo processo. Isso porque historicamente atribui-se ao Pachacuti a insurreição dos povos indígenas contra o poder colonial espanhol na segunda metade do século XVIII. Tal levante, conhecido como “cerco a La Paz”, quando a cidade foi cercada por indígenas e mantida isolada durante meses, integra o imaginário coletivo, podendo ser evocado sempre que necessário como uma forma de alimentar novas possibilidades de ação política.

Já no idioma de povos quéchua no Equador, cuja parte significativa do território se encontra na selva amazônica, a expressão que permite uma aproximação às noções de bem viver é sumak kawsay, em que sumak significa “bom” ou “boa” e kawsay significa “vida”. Assim, sumak kawsay pode ser compreendido como um modo específico de existência e convivência guiado por uma noção de “boa vida”, na qual a relação entre os humanos e demais seres estabelece uma “comunidade cósmica” (Yampara, 2014_______. El viaje del Jaqui a la Qamaña. In: QUINTERO, P. (Coord.) Crisis civilizatoria, desarrollo y buen vivir. Buenos Aires: Duke University/Ediciones del Signo, 2014. p.193-99.).

Outra expressão importante no idioma quéchua para uma aproximação com as noções de bem viver é Kawsak Sacha. Utilizada originalmente pelo povo amazônico de Sarayaku, Kawsak Sacha passou a designar no Equador a união de conhecimentos xamânicos em articulação com o movimento social indígena e com atores políticos do Estado Plurinacional do país. Tal expressão, que traduzida para o espanhol significa “selva viviente”, indica que a floresta é vida, local de convívio de seres diversos que estabelecem relações de interdependência e de cosmopolítica. Como explica Ghirotto Santos (2016, p.10):

Kawsak Sacha é o reconhecimento de que a floresta é feita inteiramente de seres e das relações de comunicação estabelecidas entre si. Esses seres, desde as menores plantas até os mais supremos que protegem a floresta, são pessoas (runas) que habitam as cachoeiras, as lagoas, os pântanos, as montanhas e os rios. Estes seres vivem em comunidade (llakta) e desenvolvem sua vida de maneira semelhante ao ser humano: jaguares, cachoeiras, árvores etc. são dotados de intencionalidade e subjetividade - uma cosmopolítica agenciada por humanos, não humanos e extra-humanos, milenarmente exercida nas comunidades indígenas, mas que se estende, agora, à comunidade política na forma Estado plurinacional (e internacional). Em síntese, a Selva Vivente é um telar ecológico; o mundo natural é também um mundo social.

No idioma de povos guarani no Brasil, a expressão que permite aproximação às noções de bem viver é teko porã, em que teko significa “ser, estado de vida, condição” e porã significa “bonito” (Siqueira, 2020SIQUEIRA, G. C. Noções de bem viver latino-americanas na perspectiva da psicologia: uma revisão de escopo. São Paulo, 2020. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) - Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo.). O teko porã, enquanto um “estado de vida bonito”, reflete, por conseguinte, o modo de estar no mundo que orienta esses povos. Para Meliá (2015MELIÀ, B. El buen vivir se aprende. Sinéctica, n.45, p.1-12, 2015., p.8) no teko porã encontramos:

Um modo de ser, um bom estado de vida, é um bem viver e um viver bem, mais sentido do que filosofado. É um estado de ventura, de alegria e de satisfação; um estado feliz e prazeroso, pacífico e tranquilo. Há um bem viver quando existe harmonia com a natureza e com os membros da comunidade, quando existe alimentação suficiente, saúde e tranquilidade. É também identidade cultural plenamente vivenciada e livre de ameaças… O bem viver que um território proporciona - e necessita - se manifesta em um tipo de economia que os guaranis definiram como jopói, que é apenas a versão da economia de reciprocidade tão difundida em todo o mundo e desde os primeiros tempos da humanidade.

De acordo com Chamorro (2011CHAMORRO, G. A arte da palavra cantada na etnia kaiowa. Bulletin-Société suisse des américanistes, n.73, p.43-58, 2011.), o teko porã abrange a presença das divindades, nas plantas, nas águas, nas pedras. Todos os seres na natureza têm alma, vida própria e estabelecem relações com outros seres protetores, no sentido de uma cosmopolítica. Além dessa dimensão espiritual, o teko porã também abrange o cuidado com a terra, com as relações humanas e com a saúde. Por isso, é considerado central para orientar a relação desses povos com a vida.

Nos últimos anos o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) tem ocupado um importante papel na difusão de conhecimentos sobre os modos de vida indígenas na América Latina e sua aproximação às noções de bem viver discutidas na atualidade. Organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em sua prática junto aos povos indígenas, o Cimi assumiu como objetivo geral apoiar: “projetos de vida dos povos indígenas, denunciando as estruturas de dominação, violência e injustiça; praticando o diálogo intercultural, inter-religioso e ecumênico; oferecendo suporte às alianças desses povos entre si e com os setores populares” (Conselho Indigenista Missionário, 2015, p.1). É nesse contexto de organização indígena e popular - alinhado ao debate na América Latina acerca da missão e objetivos da ação pastoral - que o tema do bem viver passa a ganhar mais destaque no Brasil.

Em 2015, o Jornal Porantim do Cimi produziu a cartilha “O bem viver Indígena e o Futuro da Humanidade”, que reúne depoimentos de lideranças indígenas (kreyê, tupinambá, kanamari, dentre outros) de várias regiões do país. Os depoimentos dessas lideranças indicam que as similaridades nas noções de bem viver indígenas vão para além do modo de viver, estando presentes nas formas de lutar contra as injustiças e explorações que se perpetuam em toda a América Latina, como exemplificado na fala de Kurá Kanamari, liderança indígena no Amazonas (Jornal Porantim, 2015, p.3): “Estamos lutando para viver com nossa cultura, falar nossa língua, comer o peixe pescado na hora, sentir o cheiro da floresta, isso é o bem viver! Não é bem viver estar à beira da estrada, passar fome, sem a nossa terra, que é a nossa mãe”.

Em 2016 o Cimi (2016) produziu o documentário “Bem viver - um novo caminho”, trazendo mais depoimentos de lideranças indígenas sobre o tema. Tais depoimentos expressam com frequência a associação entre bem viver e felicidade, como na fala de Zenilda Xukuru do Ororubá: “O bem viver para nós é … o que é ser feliz pensando no coletivo” (3m11s). Também aparecem, com frequência, ideias acerca de viver em equilíbrio e respeito com as pessoas e com a natureza, como exemplificado pelas falas da liderança Kurã Karamari: “Para nós amizade entre todos, o respeito, a boa convivência na festa, na saúde” (3m48s), e da liderança Marcus Xukuru: “O bem viver é também pensar a ocupação do espaço territorial de acordo com os valores da Mãe Terra, respeitando a terra, cultivando a terra sem agrotóxicos, buscando consenso e construindo para o coletivo” (5m44s).

Nessa direção, é importante destacar a realização da 2º Marcha das Mulheres Indígenas no Brasil, entre os dias 7 e 11 de setembro de 2021. Tal Marcha intitulada “Mulheres Originárias, Reflorestando Mentes para a Cura da Terra” reuniu na capital federal do país cerca de 6 mil pessoas, e seu título expressa a preocupação dos movimentos de mulheres indígenas com a defesa e proteção da natureza com vistas à construção do bem viver.

A matriz do pensamento utópico latino-americanista

É no contexto da formação do “Novo Mundo” e construção de um projeto distinto do que até então havia sido produzido na Europa que a América emerge como território entre utopias desejáveis e realidades possíveis. Tais utopias acompanham diferentes momentos e processos próprios à história do continente, alimentando esperanças de um mundo melhor, capaz de garantir a sobrevivência da espécie humana e de todos os outros seres (Dussel, 2018_______. Siete hipótesis para una estética de la liberación. Revista PRAXIS, n.77, p.1-37, 2018.). Elas têm sua origem em diversos grupos, dentre os quais destacam-se as missões jesuíticas que vislumbravam no “Novo Mundo” uma “Terra sem males” (Meliá, 2015MELIÀ, B. El buen vivir se aprende. Sinéctica, n.45, p.1-12, 2015.). Estão também representadas nas ideias defendidas por líderes e idealizadores de uma América unida, por exemplo, na obra de Felipe Guamán Poma de Ayala (1534-1615), cronista e intelectual de origem inca, que clamava por uma ordem social mais justa, já no início do século XVII. Por isso, Quijano (2012_______. Bien Vivir: Entre el desarrollo y la des/colonialidad del poder. Viento Sur, n.122, p.46-46, 2012., p.46) afirma que: “Bien vivir es, probablemente, la formulación más antigua en la resistencia indígena contra la colonialidad del poder. Fue, notablemente, acuñada en el Virreinato del Perú, por nada menos que Guamán Poma de Ayala, aproximadamente en 1615, en su ‘Nueva crónica y buen gobierno’”.

A crônica de Guamán Poma de Ayala, escrita parte em espanhol e parte em quéchua, reivindicava mudanças governamentais e denunciava a forma violenta de exploração dos povos indígenas pela administração colonial do vice-reino do Peru. É uma obra escrita desde uma compreensão de mundo advinda da “periferia” e com base nas vivências de diferentes povos indígenas do continente, servindo assim como referência e fonte de inspiração para o desenvolvimento de um pensamento próprio latino-americanista (Ortiz Fernández, 2009).

Originário das lutas de independência no continente, o chamado pensamento latino-americanista surge no final do século XVII. Apesar de conhecer inúmeras revoltas durante seus três primeiros séculos, é somente com Simon Bolívar (1783-1830) - líder militar e político que lutou pela independência de diversos países e defendeu a ideia da América Latina como uma grande e unificada potência - que tem início o desenvolvimento sistemático de um pensamento propriamente continental. Chamado de El Libertador, em contraposição à alcunha de El Conquistador dada ao colonizador espanhol Hernán Cortés (1485-1547), a visão de um povo unificado e original era uma das principais inspirações de Bolívar (2019, p.412):

Es imposible asignar con propiedad, a qué familia humana pertenecemos. La mayor parte del indígena se ha aniquilado, el Europeo se ha mezclado con el Americano y con el Africano, y este se ha mezclado con el Indio y con el Europeo. Nacidos todos del seno de una misma Madre, nuestros padres diferentes en origen y en sangre, son extranjeros, y todos se difieren visiblemente en la epidermis: esta desemejanza trae un reato de la mayor trascendencia.

Na obra de José Martí (1853-1895), pensador e herói da independência cubana, também encontramos elementos importantes para formação de um pensamento latino-americanista. Martí defendia uma união continental das nações constituintes da América Latina, denominada “Nuestra América”. O centro de seu ideal político e humanista consiste na valorização da autoctonia, compreendida como características políticas, culturais e econômicas próprias à região e à especificidade histórica da “Nuestra América”. Martí também propôs um projeto civilizatório alternativo ao capitalismo, amparado na valorização da cultura autóctone e na superação da dualidade ser humano/ambiente.

A luta por reconhecimento, respeito e valorização dos modos de vida das populações indígenas, aliada à luta pela independência política e econômica dos países do continente constituem-se na base de formação do pensamento latino-americanista. Essa base propiciará também o surgimento, no interior da Igreja católica latino-americana, de uma Teologia da Libertação, atenta aos processos históricos que levaram ao empobrecimento de populações do continente e comprometida com a luta contra a opressão e a miséria (Gutierrez, 2000GUTIERREZ, G. Teologia da Libertação - Perspectivas. São Paulo: Loyola, 2000.). Tal teologia influenciará, posteriormente, a criação de uma Filosofia, uma Sociologia, uma Psicologia e uma Pedagogia também dedicadas à transformação social na América Latina, cujos principais formuladores e núcleo central de ideias destacamos, ainda que brevemente, a seguir.

O argentino, naturalizado mexicano, Enrique Dussel é reconhecido como um dos principais formuladores da Filosofia da Libertação, movimento de proposição e problematização de uma filosofia latino-americana, empenhada na compreensão das relações entre opressão e liberdade, como “gênese histórico-ideológica” (Dussel, 1977, p.8) dos objetos e fenômenos da realidade social na região. Nas palavras do autor, trata-se de uma filosofia “pós-moderna, popular, feminista, da juventude, dos oprimidos, dos condenados da terra, condenados do mundo e da história” (ibidem, p.7). Uma filosofia, parafraseando Jaar (2012JAAR, A. Outras pessoas pensam. Lamento das imagens, 2012. Disponível em: <https://issuu.com/sescsp/docs/alfredo_jaar_-_lamento_das_imagens>. Acesso em: 1 mar. 2022.
https://issuu.com/sescsp/docs/alfredo_ja...
), dedicada a desmascarar a fraude epistemológica que permitiu ao pensamento filosófico produzido desde a Europa tornar compatíveis, ao mesmo tempo, o iluminismo e a escravidão.

Outra intelectual importante dedicada à produção de uma filosofia desde a perspectiva latino-americana foi a brasileira Lélia Gonzalez (1935-1994). Ela cunhou o termo “Améfrica Ladina”, valorizando e retomando assim a presença e contribuição dos povos indígenas e africanos na construção das especificidades históricas que caracterizam a “Nuestra América”; e cuja herança plural não encontrava expressão no termo América Latina, visto que esse sublinhava apenas a latinidade do continente e, por conseguinte, somente seus vínculos com a Europa, impedindo assim uma análise adequada da realidade social dos objetos e fenômenos da região (Gonzalez, 1988).

O colombiano Orlando Fals Borda (1925-2008), por sua vez, desenvolveu uma Sociologia da Libertação, baseada na crítica acerca das concepções de ciência universal oriundas do Norte Global e aplicadas ipsis litteris na América Latina, desconsiderando suas especificidades regionais e locais, contribuindo para a manutenção do jugo ao pensamento social europeu e, posteriormente, ao norte-americano. Fals Borda (1970) defende uma ciência própria à América Latina, capaz de combinar produção de conhecimento e ação intelectual militante, com vistas a mover o eixo das estruturas de poder e transformar as condições de vida da população do continente. Uma ciência, em última instância, comprometida com a defesa dos direitos humanos e a promoção de uma democracia econômica, social e política (Butzke; Mantovaneli Jr.; Theis, 2016BUTZKE, L.; MANTOVANELI JÚNIOR, O.; THEIS, I. M. Afinal, desenvolvimento regional serve para quê? Redes (St. Cruz Sul, Online), v.21, n.3, p.306-18, 2016.).

Formulada inicialmente pelo espanhol, radicado em El Salvador, Ignácio Martín-Baró (1942-1989), a Psicologia da Libertação nasce especialmente voltada à compreensão das condições de vida das maiorias pobres e oprimidas na América Latina e pela necessidade de reconstrução teórica e prática da Psicologia, enquanto ciência e profissão, com vistas a dar conta dessa tarefa (Guzzo, 2016GUZZO, R. S. L. A (des)igualdade social e a Psicologia: uma perspectiva para o debate sobre a pobreza. In: XIMENES, V. M. et al. (Org.). Implicações psicossociais da pobreza: diversidades e resistências. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2016. 405p.). Partindo de uma crítica à ideia de universalidade do comportamento humano oriunda das psicologias tradicionais, Martín-Baró (1986) elabora uma Psicologia centrada em fomentar o protagonismo das pessoas oprimidas nos processos de transformação social, para superar imposições de subalternidade, na luta contra as desigualdades sociais. Uma psicología, segundo ele, voltada para: “rescatar aquellos aspectos que sirvieron ayer y que servirán hoy para la liberación” (ibidem, p.223).

Por fim, temos o brasileiro Paulo Freire (1921-1997), responsável pelo desenvolvimento da Pedagogia da Libertação, alicerçada numa relação de ensino-aprendizagem como “prática da liberdade” (Freire, 1981), porque promotora de consciência acerca das situações concretas da realidade social, a exemplo da miséria material e afetiva presente nas relações humanas em contextos de opressão e desigualdades. Trata-se, segundo o autor, de uma: “Pedagogia que faça da opressão e de suas causas objeto de reflexão dos oprimidos” (Freire, 1967, p.43). Desse modo, a educação pode tornar-se libertadora e promotora de emancipação, compreendida enquanto capacidade do ser humano conduzir com autonomia e reciprocidade o próprio trajeto histórico como sujeito de desejo e direitos, porquanto ele possa ser limitado por situações concretas da realidade social que o oprime, permanece irredutível sua potência em termos de pensamento, ação e desejo, para transformar o modo como enfrenta tais situações e sua capacidade de modificá-las. Nesse sentido, a educação é um movimento de ação-reflexão-ação mediado pela realidade social, que necessita ser conhecida e transformada.

No pensamento latino-americanista encontramos um conjunto de ideias, enraizadas nas especificidades locais e regionais da América Latina como “Novo Mundo”, “Terra sem males”, “Nuestra América” e “Améfrica Ladina”. Tais ideias são tomadas como referências de movimentos de libertação da dependência e jugo ao pensamento social europeu e norte-americano, ao mesmo tempo que expressam a heterogeneidade atávica presente nas noções de bem viver.

A matriz estatal

As noções de bem viver foram incorporadas na atualidade por partidos políticos de países da América Latina, com destaque para o Equador e a Bolívia, os quais alçaram o debate do tema ao cenário internacional. A chegada ao poder do Movimiento al Socialismo (MAS), de Evo Morales na Bolívia em 2006, e da Alianza PAIS (Patria Altiva y Soberana), de Rafael Correa no Equador em 2007, promovendo a aprovação de novas constituições federativas nos dois países, permitiu a incorporação de noções de bem viver, notadamente de povos andinos e amazônicos, no plano das leis e das instituições governamentais desses países.

Na Constituição de 2008 do Equador, por exemplo, foram incorporadas referências às raízes milenares de povos indígenas, à natureza como um ser vivente (Pachamama), às diversas formas de religiosidade e espiritualidade, bem como à heterogeneidade de culturas presentes no território, como exemplifica o trecho da carta magna do país reproduzido a seguir:

Apelando a la sabiduría de todas las culturas que nos enriquecen como sociedad, como herederos de las luchas sociales de liberación frente a todas las formas de dominación y colonialismo, y con un profundo compromiso con el presente y el futuro, decidimos construir una nueva forma de convivencia ciudadana, en diversidad y armonía con la naturaleza, para alcanzar el buen vivir, el sumak kawsay. (Ecuador, 2008, p.1)

Na Constituição Política do Estado Plurinacional da Bolívia, por sua vez, há também alusões diretas às noções de bem viver. Logo em seu preâmbulo estão registradas intenções de se estabelecer uma sociedade mais igualitária, com respeito a diversidade étnica e cultural que forma o povo boliviano:

Un Estado basado en el respeto e igualdad entre todos, con principios de soberanía, dignidad, complementariedad, solidaridad, armonía y equidad en la distribución y redistribución del producto social, donde predomine la búsqueda del vivir bien; con respeto a la pluralidad económica, social, jurídica, política y cultural de los habitantes de esta tierra; en convivencia colectiva con acceso al agua, trabajo, educación, salud y vivienda para todos. Dejamos en el pasado el Estado colonial, republicano y neoliberal. Asumimos el reto histórico de construir colectivamente el Estado Unitario Social de Derecho Plurinacional Comunitario, que integra y articula los propósitos de avanzar hacia una Bolivia democrática, productiva, portadora e inspiradora de la paz, comprometida con el desarrollo integral y con la libre determinación de los pueblos. (Bolívia, 2009, p.1)

Ambas as Constituições propõem um novo pacto de convivência, com propostas de mudanças estruturais nos modos de produzir, consumir e organizar a vida, oferecendo diretrizes a partir das quais a economia, a política e a sociedade deveriam se organizar.

De acordo com Cubillo-Guevara (2016), quando representantes do partido indigenista Pachakutik propuseram a incorporação do sumak kawsay na Constituição equatoriana, os representantes oficiais do partido Alianza PAÍS, liderados pelo presidente da Assembleia Constituinte, Alberto Acosta, aceitaram o termo, traduzido como “buen vivir”, na medida em que, ao ser um termo pouco discutido, poderia ser preenchido de conteúdo através de um processo participativo. Assim, a Assembleia Constituinte do Equador, sob a presidência de Alberto Acosta, converteu-se em um fórum de reflexão sobre noções de bem viver.

O grande número de intelectuais equatorianos, latino-americanos e de outras nacionalidades envolvidos na Assembleia propiciou que a noção de bem viver constitucional equatoriana incorporasse várias vertentes teóricas, notadamente:

  • As teorias da colonialidade, de denúncia do racismo estrutural em sociedades latino-americanas e suas propostas de decolonialidade do poder e do saber (Quijano, 2000_______. Colonialidad del poder, eurocentrismo y América Latina. In: LANDER, E. (Org.) La colonialidad del saber: eurocentrismo y ciencias sociales. Buenos Aires: Clacso, 2000. p.122-51.);

  • As teorias da dependência, de denúncia das desigualdades sociais derivadas da inserção internacional das economias latino-americanas (Fals Borda, 1970);

  • As teorias da libertação, de denúncia e resistência ao jugo do pensamento social europeu e norte-americano e de engajamento das ciências humanas no combate às desigualdades sociais (Dussel, 1977DUSSEL, E. Filosofia da Libertação. São Paulo: Loyola, 1977.; Freire, 1981_______. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.; Martín-Baró, 1986; Gonzalez, 1988GONZALEZ, L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro (Rio de Janeiro), n.92/93, p.69-82, 1988.).

Além disso, o debate constituinte também inspirou reflexões acerca da transformação dos sistemas socioeconômicos latino-americanos em sistemas socioeconômicos pós-capitalistas, ou seja, em economias com mercado, mas não para o mercado, nas quais os arranjos produtivos locais e a solidariedade desempenham um papel central (Coraggio, 2007CORAGGIO, J. L. La economía social y la búsqueda de un programa socialista para el siglo XXI. Foro, n.62, p.37-54, 2007.). Como destacado por Cubillo-Guevara, Hidalgo-Capitán e Domínguez-Gómez (2014), o pós-capitalismo era o objetivo final do emprego de noções de bem viver presentes na Assembleia Constituinte.

Tais mudanças constitucionais estão associadas às denominadas Revolução Cidadã, no Equador, e Revolução Nacional Democrática-Indigenista, na Bolívia, e seus compromissos em implementar novos modelos de desenvolvimento voltados para a equidade (Ramírez, 2010RAMÍREZ, R. Socialismo del Sumak Kawsay o biosocialismo republicano. In: Los nuevos retos de América Latina: socialismo y Sumak Kawsay. Quito: Senplades, 2010. v.1, p.55-76.). Elas emanam de processos de resistência de larga duração e reverberações de lutas centenárias, que, na década de 1990, culminam na organização de grupos marginalizados e subalternizados contra o modelo de acumulação capitalista neoliberal e a favor da democracia (Gómez Leyton, 2017).

Rafael Correa elegeu-se presidente do Equador com promessas de fomentar a participação popular nos processos de tomada de decisão governamentais, produzindo uma “Revolução Cidadã” nas estruturas tradicionais de alocação de poder, apoiada na redação de uma nova Constituição que promoveria o sumak kawsay, a plurinacionacionalidade, e que contemplaria os direitos da natureza. Favorecendo, assim, o surgimento de um novo paradigma de desenvolvimento baseado na desmercantilização da natureza.

O plano econômico do primeiro governo Correa (2007-2012) prometia também uma mudança na matriz produtiva do país, reduzindo a extração de recursos naturais como o petróleo e os minérios, e fomentando uma economia com base no bioconhecimento, isto é, na conciliação entre economia e ecologia, e no incremento do turismo sustentável (Ecuador, 2008). De acordo com a Secretaría Nacional de Planificación del Desarollo do Equador (Senplades, 2009), esse modelo, em sua fase inicial, seria apoiado pelo extrativismo, enquanto se executava a transformação das matrizes produtivas do país.

Destarte, contrariamente ao que foi planejado, avaliações do primeiro (2007-2012) e do segundo (2013-2017) governos de Rafael Correa mostraram que, embora tenham ocorrido melhorias nas condições de vida da população equatoriana, em especial no que se refere à redução da pobreza e ampliação do acesso à saúde e educação, houve poucas mudanças estruturais (Siqueira, 2020SIQUEIRA, G. C. Noções de bem viver latino-americanas na perspectiva da psicologia: uma revisão de escopo. São Paulo, 2020. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) - Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo.). O extrativismo e a agricultura moderna de monocultura de exportação, por exemplo, avançaram e quase não houve reforma agrária, o que produziu um distanciamento dos movimentos sociais e indígenas e, até mesmo, a criminalização de seus protestos sociais (Souza; Ribeiro; Travassos, 2021SOUZA, L. S.; RIBEIRO, A. C. S.; TRAVASSOS, L. R. F. C. Buen vivir no Equador: limites, alcance e contradições. Revista Territorialidades, v.1, n.2, p.1-17, 2021.).

Evo Morales elegeu-se presidente da Bolívia pelo partido Movimiento al Socialismo (MAS) com apoio de indígenas, cocaleros e campesinos. Fundado em 1997, o MAS reúne militantes de esquerda, indígenas, camponeses e intelectuais progressistas. Com a chegada de Evo Morales ao governo, o partido retoma princípios da Revolução Nacional ocorrida em 1952 no país, que promoveu maior controle do Estado sobre os recursos naturais e a economia, estabeleceu o sufrágio universal e realizou uma reforma agrária. Desse modo, Evo Morales e o MAS iniciam o governo com a promessa de uma “Revolução Nacional Democrática-Indigenista”, pautada: pela valorização das culturas indígenas e campesinas e sua participação nas instâncias de poder e processos de tomada de decisão governamentais; pela nacionalização da exploração dos recursos naturais; pelo avanço da reforma agrária; pela proteção de segmentos mais vulneráveis da sociedade e na distribuição equitativa de riquezas.

Nessa direção, com a promulgação da Constituição de 2009, a Bolívia passa a ser um Estado Plurinacional que reconhece e incorpora múltiplas etnias indígenas e suas culturas e, por conseguinte, suas noções de bem viver: suma qamanã e sumak kawsay. Como assinala Wolkmer (2013WOLKMER, A. C. Pluralismo crítico e perspectivas para um novo constitucionalismo na América Latina. In: WOLKMER, A. C.; MELO, M. P. (Org.) Constitucionalismo latino - americano: tendências contemporâneas. Curitiba: Juruá, 2013. p.67-89., p.87), o novo estado que surge:

[...] vem com a bandeira macro da pluriculturalidade, plurietnicidade, plurinacionalidade e interculturalidade [...]. Essa nova frente constitucional surge com a finalidade de trabalhar as disparidades provenientes do processo de colonização e encobrimento do outro dentro do país. Para isso, propõe edificar a convivência participativa plurinacional e oficializar a democracia do pluralismo jurídico comunitário.

Contudo, a discrepância entre os novos marcos regulatórios do país, em termos constitucionais e de leis e planos de desenvolvimento, e as mudanças estruturais efetivamente realizadas suscitaram diversas críticas ao governo Evo Morales. Embora ele tenha feito no primeiro mandato (2006-2009) a distribuição de terras de forma coletiva aos camponeses e indígenas, nacionalizado a exploração de petróleo e gás natural e melhorado as condições de vida da população em termos de educação, renda e consumo (Stefanoni, 2010STEFANONI, P. Governo Evo Morales: permanências, mudanças e desafios. Lutas Sociais, São Paulo, n.24, p.115-131, 2010.), foi acusado de transformar o país, a partir do segundo mandato (2010-2014), em um território fértil para o capitalismo neoliberal, ao incentivar e subsidiar a entrada de redes internacionais de alimentos, roupas e eletrodomésticos e de multinacionais dos setores de mineração, petróleo e agronegócio (Miranda, 2019MIRANDA, B. Eleições na Bolívia: o paradoxal sucesso das multinacionais na ‘economia plural’ de Evo Morales. BBC News, 2019. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-50079886>. Acesso em: 1 mar. 2022.
https://www.bbc.com/portuguese/internaci...
).

Segundo Cusicanqui (2015CUSICANQUI, S. R. Violencia e interculturalidad. Paradojas de la etnicidad en la Bolivia de hoy. Telar - Revista del Instituto Interdisciplinario de Estudios Latinoamericanos, n.15, p.49-70, 2015.), o sumak qamanã foi incorporado pelo governo Evo Morales e pelo MAS sem romper com o paradigma desenvolvimentista, seguindo uma lógica extrativista colonial que expulsou comunidades tradicionais de seus territórios e destruiu florestas em prol do agronegócio e da exploração de petróleo e minérios, colocando-se assim como um governo de representação dos indígenas, mas sem realmente reconhecê-los.

Outrossim, apesar dos conflitos e contradições inerentes às relações de poder envolvendo partidos, governos e movimentos sociais, a incorporação de noções de bem viver de povos indígenas em marcos regulatórios do Equador e da Bolívia significa um passo importante na construção de novos horizontes políticos na América Latina, ao trazer visibilidade para as cosmovisões desses povos e valorizar sua participação na formação dos estados nacionais do continente.

A matriz socioambiental

As relações sociedade e ambiente têm sido objeto de estudo, sobretudo, das ciências humanas, desde o final do século XIX. No entanto, foi a partir da segunda metade da década de 1980, com a aliança entre movimentos sociais, em especial, indígenas e campesinos da América Latina, África e Ásia, e movimentos ambientalistas do Norte Global, que o paradigma socioambiental emerge como horizonte ético-político com vistas a orientar a construção de sustentabilidade nas relações sociedade e ambiente. Trata-se de um novo paradigma das relações sociedade e ambiente que defende que a conservação da natureza requer um desenvolvimento econômico inclusivo, capaz de incorporar as comunidades tradicionais e seus arranjos produtivos na distribuição dos benefícios advindos da exploração dos recursos naturais.

A noção de socioambientalismo foi gestada no Brasil junto aos movimentos de povos indígenas e comunidades tradicionais, notadamente o movimento dos seringueiros da região Amazônica. Dentre seus pioneiros, destaca-se o nome de Francisco Alves Mendes Filho (1944-1988), mais conhecido como Chico Mendes, seringueiro, liderança sindical nascido no seringal Porto Rico, município de Xapuri no Acre. Trabalhou desde os 11 anos como seringueiro, sendo alfabetizado aos 19 anos por Fernando Euclides Távora, militante comunista que havia participado ativamente no levante comunista de 1935 em sua cidade natal, Fortaleza, e na Revolução de 1952 na Bolívia (Porto-Gonçalves, 2009).

Diante do baixo preço da borracha na década de 1970, muitas terras de floresta no Acre estavam sendo vendidas para pecuaristas do sul. Essa dinâmica gerava expulsão das populações ribeirinhas e extrativistas desses territórios. É nesse contexto que Chico Mendes, militando nas Comunidades Eclesiais de Base (CEB), estrutura um sindicato de trabalhadores na região, realiza processos de alfabetização e educação popular e organiza os famosos “empates” - quando trabalhadores se colocavam entre as árvores impedindo o corte pelas motosserras e o avanço do desmatamento (Porto-Gonçalves, 2009).

Chico Mendes defendia que para os seringueiros o sentido do trabalho não está na terra, e, sim, na mata. Nesse sentido, foi desenvolvendo concepções originais sobre reforma agrária e a luta dos trabalhadores da região. Para o militante, era preciso garantir que o contexto social e cultural específico dos povos da Amazônia fossem mantidos. Em 1985, num encontro nacional de trabalhadores rurais, Chico Mendes apresenta uma proposta de Reserva Extrativista, em que defende que a conservação ambiental não deve separar a pessoa da natureza. Em sua proposta, a Reserva Extrativista funcionaria com cada família tendo seu pedaço de terra para cultivo e, ao mesmo tempo, mantém-se o uso comum da terra e da floresta para toda comunidade, é um ideal comunitário inspirado na cultura dos povos indígenas e no enfrentamento à expulsão dos trabalhadores de seus territórios. Nesse sentido, Chico Mendes foi pioneiro na construção de um ambientalismo articulado com a luta dos trabalhadores e não somente às concepções ecologistas de “preservação da natureza”. Como explica Porto-Gonçalves (2009, p.189): “Chico Mendes vai se tornar um dos maiores próceres do ecossocialismo pela junção da luta contra a devastação com a luta contra a exploração e o capitalismo. Enfim, desenvolvia uma fina percepção holística, recusando tanto um sindicalismo como um ecologismo restrito”.

É nesse contexto que Chico Mendes viabilizou a criação da Aliança dos Povos da Floresta, um movimento que unia seringueiros, castanheiros, pescadores, quebradeiras de coco e populações ribeirinhas, para a criação de estratégias de proteção da floresta. A partir das articulações iniciadas por Chico Mendes desenvolveram-se outras alianças, como refletido no I Encontro das Nações Indígenas do Xingu, em 1989, o qual ficou conhecido como o primeiro Encontro Socioambiental do Brasil, que reuniu mais de 600 representantes de povos indígenas e centenas de socioambientalistas (Porto-Gonçalves, 2009).

O primeiro registro da presença de noções de bem viver nas discussões acerca desse novo paradigma das relações sociedade e ambiente ocorreu em 1992, quando a expressão sumak kawsay foi utilizada pela Organización de los Pueblos Indígenas del Pastaza (Opip) na realização do Plano Amazanga de recuperação, legalização e gestão de territórios indígenas quéchua na região de Pastaza, na Amazônia equatoriana, com vistas a negociações de fundos para proteção da floresta junto a organizações não governamentais europeias (Cubillo-Guevara, 2016). O sumak kawsay emergiu no Plano Amazanga como um modelo de equilíbrio entre povos e o ambiente, frente ao fracasso global das políticas de preservação ambiental.

Inspirados no sumak kawsay, autores como Descola e Pálsson (1996DESCOLA, P.; PÁLSSON, G. Nature and Society. Anthropological Perspectives. London: Routledge, 1996.), Viteri Gualinga (2002) e Escobar (2014ESCOBAR, A. La invención del desarrollo. Popayán: Universidad del Cauca, 2014.), entre outros, contribuíram para proposição de um novo modus operandi da economia capitalista, denominado de “pós-desenvolvimento” (Siqueira, 2020SIQUEIRA, G. C. Noções de bem viver latino-americanas na perspectiva da psicologia: uma revisão de escopo. São Paulo, 2020. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) - Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo.). Partindo da crítica ao paradigma de “desenvolvimento” econômico proveniente do Norte Global, compreendido como expressão de um ideário de dominação política e social, que atribui a América Latina, África e Ásia a condição de regiões “subdesenvolvidas” a serem exploradas, tais autores defendem um modo de desenvolver a economia que respeite os arranjos e a capacidade de produção de commodities de cada povo e região e seja compatível com a conservação da natureza.

A partir dos anos 2000, Alberto Acosta, que à época era membro do Movimiento de Unidad Plurinacional Pachakutik - Nuevo País (MUPP-NP) e acadêmico do Instituto Latinoamericano de Investigaciones Sociales (Ildis), ambos do Equador, passou a discutir o tema do pós-desenvolvimento nos termos apresentados por Viteri Gualinga (2002). Após deixar a presidência da Assembleia Constituinte do Equador, ele tornou-se um dos principais divulgadores das noções de bem viver no âmbito do socioambientalismo.

Tal perspectiva estrutura-se, especialmente, com base em ações de intelectuais vinculados à crítica do paradigma de um “desenvolvimento” econômico per si, e também aos movimentos sociais indígenas e campesinos latino-americanos alinhados às noções de bem viver enquanto realidade possível (Acosta, 2014ACOSTA, A. O bem viver: uma oportunidade para se imaginar outros mundos. São Paulo: Elefante, 2014.; Gudynas, 2011GUDYNAS, E. Buen vivir: germinando alternativas al desarrollo. América Latina en Movimiento-ALAI, n.462, p.1-20, 2011.; Quijano, 2012_______. Bien Vivir: Entre el desarrollo y la des/colonialidad del poder. Viento Sur, n.122, p.46-46, 2012.; Escobar, 2014ESCOBAR, A. La invención del desarrollo. Popayán: Universidad del Cauca, 2014.). Esses intelectuais rejeitam a ideia de que o “desenvolvimento” econômico proveniente do Norte Global seja uma aspiração planetária. Eles defendem a manutenção e expansão de arranjos produtivos locais de commodities, de maneira que cada comunidade possa assegurar a sustentabilidade ambiental de seus sistemas econômicos como um requisito para perpetuação de seus modos de vida e bem viver (Acosta, 2014), o que se alcançaria por meio do reconhecimento tácito de que a natureza também é um ser vivente, detentora de direitos (Acosta; Martínez, 2011), e da construção de sociedades biocêntricas, na qual o ambiente ocuparia o centro das preocupações dos seus cidadãos (Gudynas, 2011). Por conseguinte, tais sociedades teriam como modelo de “desenvolvimento” econômico o pós-extrativismo (Gudynas, 2011), abandonando, por exemplo, a mineração e a exploração de hidrocarbonetos em larga escala e as monoculturas agrícolas extensivas como a da soja, da cana-de-açúcar e do óleo de palma (Escobar, 2014).

Desse modo, as noções de bem viver são tomadas como horizonte para superação do modelo ocidental globalizado de “desenvolvimento” proveniente do Norte Global e a hegemonia desse modelo de “desenvolvimento” passa a ser denunciada por muitos movimentos socioambientalistas como a causa principal das crises energética, alimentar e climática no mundo contemporâneo. Como diz Acosta (2015_______. El Buen Vivir como alternativa al desarrollo. Algunas reflexiones económicas y no tan económicas. Política y sociedad, v.52, n.2, p.299-330, 2015., p.43): “El pretexto o el alibi de tanta devastación social y ambiental, son el desarrollo y el progreso”.

Além disso, os movimentos socioambientalistas também passam a utilizar noções de bem viver no âmbito jurídico, sobretudo para apoiar os povos indígenas em suas reivindicações de luta por direitos e reconhecimento de seus territórios. Na Bolívia e no Equador, por exemplo, a realização de tais direitos está prevista na Constituição, oferecendo amparo legal em termos locais e criando um precedente jurídico no âmbito internacional para regular e arbitrar reivindicações de populações indígenas com vistas ao acesso, uso e manejo dos territórios e seus recursos naturais.

De fato, porquanto a matriz socioambiental de noções de bem viver alimente atualmente movimentos, políticas e disputas jurídicas ambientais em nível local e global, sua difusão provém matricialmente de movimentos indígenas e campesinos da América Latina, para os quais somente uma convivência mais equilibrada com a natureza, enquanto espaço vital, e alicerçada em arranjos produtivos locais de commodities poderia conduzir a uma sustentabilidade ambiental efetiva. Tais movimentos colocam ênfase no cuidado com o próprio território e no estabelecimento de relações de reciprocidade entre espécies, como forma de construir sociedades nas quais o ser humano se perceba como parte integral e inseparável da natureza. Como afirmam Hidalgo-Capitán e Cubillo-Guevara (2014, p.35), trata-se de uma concepção de mundo “[...] en la que la naturaleza es la medida de todas las cosas y posee un valor intrínseco e independiente de la utilidad que tenga para el ser humano”.

Considerações finais

Os sistemas-mundo, como sistemas sociais baseados na divisão regional e transnacional das forças produtivas no âmbito do capitalismo, e seus limites de pertencimento grupal e regras de legitimação (Wallerstein, 1976WALLERSTEIN, I. A world-system perspective on the social sciences. The British Journal of Sociology, v.27, n.3, p.343-52, 1976.), refletem um campo de lutas entre forças de utopias desejáveis e de realidades possíveis.

Nesse sentido, noções de bem viver podem ser tomadas como fontes para a construção de novos horizontes em direção à continuidade da vida e do espaço vital no planeta Terra, considerando a integração de coletivos humanos em suas especificidades, e nas relações com territórios e demais seres e espécies. Tais noções derivam de processos históricos de larga duração que tecem relações densas entre diferentes construções de memória, resistência e anunciação de sistemas-mundo alternativos. Elas expressam, por conseguinte, uma totalidade histórica formada por lógicas e práticas distintas e emuladoras de novas propostas filosóficas, econômicas e políticas.

Neste artigo, reunimos e articulamos noções de bem viver em torno de quatro matrizes principais. Tais matrizes guardam entre si aspectos convergentes, formando um núcleo comum. Finalizamos apontando aspectos que, do nosso ponto de vista, configuram esse núcleo comum, capaz de articular as diferentes matrizes de noções de bem viver, enquanto alternativas ao modelo de vida, trabalho e relação com o ambiente produzido pelo capitalismo neoliberal:

  • Valorização do caráter igualitário das relações entre seres e espécies; e de uma convivência e existência atreladas ao território e aos ciclos da vida em suas inúmeras formas;

  • Descolonização do conhecimento de modo que as visões de mundo oriundas de saberes tradicionais também possam ser incorporadas na compreensão dos objetos e fenômenos da realidade social e, por conseguinte, na produção do conhecimento considerado válido;

  • Cuidado e atenção aos processos de diálogos entre saberes (tradicionais, técnicos e científicos) e de articulação entre distintas memórias e tradições de pensamento;

  • Desenvolvimento de práticas políticas, econômicas e culturais que estruturem novos projetos civilizatórios em oposição ao projeto civilizatório que deu origem, e alimenta até os dias de hoje, o sistema-mundo moderno colonial capitalista. Nesse sentido se destacam as lutas antirracistas e por igualdade de gênero.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2022
  • Aceito
    15 Maio 2023
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