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Percepções da equipe de enfermagem sobre cuidados de crianças e adolescentes internados com transtornos mentaisa a Artigo extraído de projeto de pesquisa Percepção da equipe de enfermagem sobre o cuidado de crianças e adolescentes internados com transtornos mentais. Coordenado pela Dra. Vanessa Pellegrino Toledo. Faculdade de Enfermagem. Universidade Estadual de Campinas, ano de 2021.

Percepciones del equipo de enfermería sobre la atención a niños y adolescentes hospitalizados con trastornos mentales

Resumo

Objetivo

conhecer as percepções da equipe de enfermagem ante o cuidado de crianças e adolescentes com transtornos mentais internados.

Método

estudo qualitativo fenomenológico social cuja coleta de dados foi realizada com 12 membros das equipes de enfermagem por meio de entrevista fenomenológica.

Resultados

“Motivos porque” descritos em duas categorias: a percepção da equipe de enfermagem em face dos cuidados prestados e ações e cuidados da equipe de enfermagem da criança com transtornos mentais. “Motivos para” expressos na categoria: a recuperação da criança com transtorno mental e o seu retorno para casa.

Conclusões e Implicações para a prática

a possibilidade do estabelecimento da relação face a face entre equipe, família e criança como forma de apreender a situação biográfica e o acervo de conhecimento dos sujeitos envolvidos e, então, entender as suas reais necessidades e demandas promovem um cuidado integral. Através da fenomenologia social de Alfred Schutz, traz-se como implicação para a prática a possibilidade de compreender a percepção da equipe de enfermagem sobre a relevância da relação face a face no cuidado de crianças e adolescentes com transtornos mentais.

Palavras-chave:
Assistência Integral à Saúde; Cuidados de Enfermagem; Equipe de Enfermagem; Hospitalização; Transtornos Mentais

Resumen

Objetivo

conocer las percepciones del equipo de enfermería sobre los cuidados prestados a los niños y adolescentes hospitalizados con trastornos mentales.

Método

estudio cualitativo fenomenológico social cuya recogida de datos se realizó con 12 miembros de los equipos de enfermería mediante entrevista fenomenológica.

Resultados

“Motivos-por qué” se describen en dos categorías: la percepción del equipo de enfermería ante los cuidados prestados y las acciones y cuidados del equipo de enfermería del niño con trastornos mentales. “Motivos-para” expresadas en la categoría: la recuperación del niño con trastorno mental y su regreso a casa.

Conclusiones e Implicaciones para la práctica

La posibilidad de establecer una relación cara a cara entre el equipo, la familia y el niño como una forma de aprehender la situación biográfica y el cuerpo de conocimiento de los sujetos involucrados y luego comprender sus necesidades y demandas reales, promueve la atención integral. A través de la fenomenología social de Alfred Schutz, aporta como implicaciones para la práctica la posibilidad de entender la percepción del equipo de enfermería sobre la relevancia de la relación cara a cara en el cuidado de niños y adolescentes con trastornos mentales.

Palabras clave:
Atención de Enfermería; Atención Integral de Salud; Grupo de Enfermería; Hospitalización; Trastornos Mentales

Abstract

Objective

to know the perceptions of the nursing team about the care of hospitalized children and adolescents with mental disorders.

Method

social phenomenological qualitative study whose data collection was carried out with 12 members of the nursing teams by means of phenomenological interviews.

Results

“Reasons why” described in two categories: the perception of the nursing team in view of the care provided and actions and care of the nursing team of the child with mental disorders. “Reasons for” expressed in the category: the recovery of the child with mental disorder and his return home.

Conclusions and Implications for practice

The possibility of establishing a face-to-face relationship between the team, the family, and the child to apprehend the biographical situation and the body of knowledge of the subjects involved, and then understand their real needs and demands promotes comprehensive care. Through Alfred Schutz's social phenomenology, it brings as implications for practice the possibility of understanding the perception of the nursing staff about the relevance of the face-to-face relationship in caring for children and adolescents with mental disorders.

Keywords:
Comprehensive Health Care; Nursing Care; Nursing, Team; Hospitalization; Mental Disorders

INTRODUÇÃO

As situações vividas pelo indivíduo ao longo de sua vida, principalmente no período infanto juvenil, podem conduzir a desfechos que prejudiquem sua saúde mental.11 Carneiro ES, Souza AIJ, Pina JC, Rumor PCF, Gevaerd TC, Cicéron MY. Abordagem da equipe de saúde nos agravos de saúde mental de crianças e adolescentes hospitalizados. Rev. Soc. Bras. Enferm. Ped. 2018 jun;18(1):7-14. http://dx.doi.org/10.31508/1676-3793201800002.
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Nessa perspectiva, um estudo epidemiológico global de prevalência dos transtornos mentais em crianças e adolescentes sinaliza que dentre os transtornos mentais mais frequentes da infância evidenciam-se os quadros de ansiedade e atenção. No início da adolescência, têm-se os transtornos de conduta, e no final, os de humor têm maior tendência a se apresentarem.22 Merikangas KR, Nakamura EF, Kessler RC. Epidemiology of mental disorders in children and adolescents. Dialogues Clin Neurosci. 2009;11(1):7-20. http://dx.doi.org/10.31887/DCNS.2009.11.1/krmerikangas. PMid:19432384.
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Tal cenário epidemiológico mundial mostra a necessidade de atenção voltada a este público. Em um estudo realizado no Brasil, evidencia-se uma maior frequência de transtornos mentais em adolescentes filhos de mães com depressão crônica e em condições socioeconômicas menos favoráveis,33 Fatori D, Brentani A, Grisi SJFE, Miguel EC, Graeff-Martins AS. Prevalência de problemas de saúde mental na infância na atenção primária. Cien Saude Colet. 2018 set;23(9):3013-20. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018239.25332016. PMid:30281738.
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além de outra pesquisa da realidade brasileira que demonstra alta prevalência de crianças e adolescentes atendidas pelos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS), principalmente, na Atenção Primária em Saúde (APS), mas que requerem atenção especializada, apontando a necessidade de encaminhamento para cuidado e acompanhamento, melhorando seu prognóstico.44 La Maison C, Munhoz TN, Santos IS, Anselmi L, Barros FC, Matijasevich A. Prevalence and risk factors of psychiatric disorders in early adolescence: 2004 Pelotas (Brazil) birth cohort. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2018 jul;53(7):685-97. http://dx.doi.org/10.1007/s00127-018-1516-z. PMid:29654332.
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No âmbito do SUS, a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) estrutura-se para além da Atenção Primária em saúde com os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e leitos de psiquiatria em hospitais gerais, sendo recursos disponíveis para o cuidado agudo e crônico do transtorno mental.55 Fernandes ADSA, Matsukura TS, Lussi IAO, Ferigato SH, Morato GG. Reflexões sobre a atenção psicossocial no campo da saúde mental infantojuvenil. Cad. Bras. Ter. Ocup. 2020 jun;28(2):725-40. http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoARF1870.
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A atenção hospitalar de crianças e adolescentes com transtornos mentais pode ocorrer em unidades de internação pediátricas ou psiquiátricas por meio de leitos organizados para receber este público.55 Fernandes ADSA, Matsukura TS, Lussi IAO, Ferigato SH, Morato GG. Reflexões sobre a atenção psicossocial no campo da saúde mental infantojuvenil. Cad. Bras. Ter. Ocup. 2020 jun;28(2):725-40. http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoARF1870.
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Sobre esse aspecto, estudos apontam que a estrutura física para cuidar de crianças e adolescentes junto aos adultos com transtornos mentais em uma mesma unidade é uma problemática desafiadora vivenciada pelas equipes de saúde.66 Bossato HR, Loyola CMD, Oliveira RMP. Desafios do cuidado de enfermagem na reabilitação psicossocial: um estudo sob a perspectiva construcionista. Rev Bras Enferm. 2021 maio;74(Supl. 3):e20200408. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0408. PMid:34076196.
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Além da estrutura física, outros desafios são vivenciados ao cuidar da criança e do adolescente com transtornos mentais. Observa-se que o processo de trabalho da equipe de enfermagem nos Centros de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil (CAPSij) é marcado pelo descompasso entre o conhecimento teórico e a prática que realizam, referindo que o cuidado é prestado com base na perspectiva biológica, com enfoque em procedimentos técnicos e marcada pelo conhecimento de outro profissional, o qual aponta a ação a ser executada.77 Delfini G, Toledo VP, Garcia APRF. Processo de trabalho da equipe de enfermagem em Centros de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil. Rev Esc Enferm USP. 2021 jul;55:e03775. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020044403775. PMid:34346970.
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Outro desafio da enfermagem na ação de cuidar é a persistência da visão manicomial com saberes e práticas tradicionais que remontam estritamente aos cuidados básicos, à postura vigilante e punitiva, ao abandono e à violência praticada, pautados em uma estrutura central hospitalocêntrica com preconceitos e resistência para prestar assistência integral à saúde da criança e do adolescente com transtornos mentais, apresentando estoque de conhecimento intrínseco em saúde mental insuficiente assim como dificuldade de identificar e diferenciar os tipos de transtornos mentais.66 Bossato HR, Loyola CMD, Oliveira RMP. Desafios do cuidado de enfermagem na reabilitação psicossocial: um estudo sob a perspectiva construcionista. Rev Bras Enferm. 2021 maio;74(Supl. 3):e20200408. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0408. PMid:34076196.
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,88 Lack CW, Green AL. Mood disorders in children and adolescents. J Pediatr Nurs. 2009 out;24(1):13-25. http://dx.doi.org/10.1016/j.pedn.2008.04.007. PMid:19159832.
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,99 Delaney KR. Nursing in child psychiatric milieus: what nurses do. An update. J Child Adolesc Psychiatr Nurs. 2017 nov;30(4):201-8. http://dx.doi.org/10.1111/jcap.12204. PMid:30129239.
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De acordo com Schutz, define-se como estoque de conhecimento todas as memórias e vivências de um sujeito, elementos estes que são buscados diante do desconhecido.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p.

Nesse sentido, estudos com equipes de enfermagem demonstram que é necessário desenvolver uma relação empática, respeitosa e compreensiva com quem será cuidado, envolvendo a família no tratamento e identificando estratégias que permitam cuidar mais adequadamente dentro de uma relação terapêutica com o outro, tais como atividades ocupacionais, grupos terapêuticos e a utilização do brincar como estratégia de cuidado.88 Lack CW, Green AL. Mood disorders in children and adolescents. J Pediatr Nurs. 2009 out;24(1):13-25. http://dx.doi.org/10.1016/j.pedn.2008.04.007. PMid:19159832.
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,99 Delaney KR. Nursing in child psychiatric milieus: what nurses do. An update. J Child Adolesc Psychiatr Nurs. 2017 nov;30(4):201-8. http://dx.doi.org/10.1111/jcap.12204. PMid:30129239.
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,1111 Delaney KR. Child psychiatric nursing: shaping a future vision of our work with children. J Child Adolesc Psychiatr Nurs. 2020 fev;33(1):5-6. http://dx.doi.org/10.1111/jcap.12264. PMid:32011758.
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As experiências e vivências das equipes de enfermagem demonstram que é preciso explorar o campo de cuidado das crianças e adolescentes com transtornos mentais, pois o conhecimento da realidade do outro possibilita pensar em novas formas e ações de como cuidar.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. Para isso, é necessário, juntamente, revisitar as nuances da visão manicomial presentes no cuidar e promover maior busca por estoque de conhecimento com a criança e o adolescente, aproximando-se do seu mundo vida e de suas experiências.66 Bossato HR, Loyola CMD, Oliveira RMP. Desafios do cuidado de enfermagem na reabilitação psicossocial: um estudo sob a perspectiva construcionista. Rev Bras Enferm. 2021 maio;74(Supl. 3):e20200408. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0408. PMid:34076196.
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,1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. Assim como, ante a realidade epidemiológica vivida33 Fatori D, Brentani A, Grisi SJFE, Miguel EC, Graeff-Martins AS. Prevalência de problemas de saúde mental na infância na atenção primária. Cien Saude Colet. 2018 set;23(9):3013-20. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018239.25332016. PMid:30281738.
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,44 La Maison C, Munhoz TN, Santos IS, Anselmi L, Barros FC, Matijasevich A. Prevalence and risk factors of psychiatric disorders in early adolescence: 2004 Pelotas (Brazil) birth cohort. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2018 jul;53(7):685-97. http://dx.doi.org/10.1007/s00127-018-1516-z. PMid:29654332.
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e as lacunas existentes na produção científica para o cuidado, faz-se necessário desenvolver mais pesquisas científicas que ampliem e desvelem os fenômenos.

Portanto, a enfermagem se faz presente no cuidado das crianças e adolescentes com transtornos mentais e tem importante papel que pode ser desempenhado no acompanhamento e na reabilitação psicossocial, sendo necessário apropriar-se de como cuidar e compreender como está sendo realizado o cuidado.77 Delfini G, Toledo VP, Garcia APRF. Processo de trabalho da equipe de enfermagem em Centros de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil. Rev Esc Enferm USP. 2021 jul;55:e03775. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2020044403775. PMid:34346970.
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Na intenção de ampliar as perspectivas sobre o cuidado, essa pesquisa objetiva conhecer as percepções da equipe de enfermagem em face do cuidado de crianças e adolescentes com transtornos mentais internados nas unidades de internação de pediatria e psiquiatria de um hospital universitário do interior paulista.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa qualitativa apoiada na fenomenologia social de Alfred Schütz.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. O método qualitativo considera que o sujeito de pesquisa é humano, vive permeado de sua cultura e está em constante transformação, possibilitando ao pesquisador compreender seus pensamentos e reações ao vivenciar uma experiência.1212 Egy EY. O lugar do qualitativo na pesquisa em Enfermagem. Acta Paul Enferm. 2020 maio;33:e-EDT20200002. http://dx.doi.org/10.37689/acta-ape/2020EDT0002.
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Em Alfred Schütz, a fenomenologia social se fundamenta em entender a ação social do sujeito contido em seu mundo vida, e que se orienta por suas ações e relações intersubjetivas face a face, a partir do seu estoque de conhecimento, conforme comentado acima, e pela biografia de vida, que de acordo com o autor, trata-se de tudo que já foi vivido e, assim, torna-se parte fundamental do composição cultural e social de cada sujeito.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p.

A ação social de Schütz diz respeito a uma conduta humana intencional, carregada e acompanhada de vivências conscientes, dirigidas a outrem. O autor nomeia a vida cotidiana das pessoas como mundo vida, que é traduzido pelo local no qual o sujeito vive junto aos seus semelhantes, sendo intersubjetivo e cultural, relacionando-se através de motivos para e motivos porquê. As relações intersubjetivas ou relações sociais correspondem às interações entre sujeitos, nas quais para cada ação há uma reação, portadora de outra ação.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p.

Justifica-se a escolha deste método, pois este estudo objetiva conhecer as percepções da equipe de enfermagem (sujeitos) em face do cuidado (ação social) de crianças e adolescentes com transtornos mentais (relação intersubjetiva) hospitalizados (mundo vida) conforme a teoria.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. O estudo foi desenvolvido nas enfermarias de pediatria e psiquiatria de um hospital universitário localizado em um município do interior do estado de São Paulo, Brasil, e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob parecer n.º 4429514 no dia 30 de novembro de 2020.

Participaram deste estudo doze profissionais da equipe de enfermagem, dentre os quais cinco da unidade de internação de psiquiatria (dois enfermeiros e três técnicos de enfermagem) e sete da unidade pediátrica (dois enfermeiros e cinco técnicos de enfermagem). O número de participantes não corresponde ao total de profissionais das equipes dos distintos períodos de cada unidade de internação. Nenhum profissional convidado negou participar da pesquisa assim como não houve exclusões a partir dos critérios estabelecidos. Os critérios de inclusão foram: ser membro da equipe de enfermagem; estar presente nas enfermarias no momento da coleta de dados; e já ter realizado algum tipo de atendimento e/ou procedimento com crianças e adolescentes portadores de transtornos mentais. Os critérios de exclusão foram: estar de férias e/ou afastado no período em que a coleta de dados foi realizada; e não ter cuidado de crianças e adolescentes com transtorno mental.

Para a obtenção de acesso dos participantes, utilizou-se o método bola de neve, no qual um entrevistado indica o próximo e, assim, sucessivamente, sendo que o informante-chave foi o enfermeiro que estava responsável pela equipe no momento da coleta de dados. Para garantir o anonimato deles, nomeou-se S para os indivíduos “sementes”, os primeiros indivíduos de cada enfermaria, e F para os “filhos”, os demais participantes.1313 Leighton K, Kardong-Edgren S, Schneidereith T, Foisy-Doll C. Using social media and snowball sampling as an alternative recruitment strategy for research. Clin Simul Nurs. 2021 jun;55:37-42. http://dx.doi.org/10.1016/j.ecns.2021.03.006.
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A coleta de dados ocorreu no período do dia quatro ao dia dezessete de fevereiro de 2021, em uma sala reservada em cada unidade, de forma presencial, utilizando a entrevista fenomenológica, que se trata de uma abordagem cujo objetivo é captar a maneira como as pessoas vivem, experienciam e atribuem significados aos fenômenos do mundo,1414 Silva RV, Oliveira WF. O método fenomenológico nas pesquisas em saúde no Brasil: uma análise de produção científica. Trab Educ Saúde. 2018 dez;16(3):1421-41. http://dx.doi.org/10.1590/1981-7746-sol00162.
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através de duas questões norteadoras: “Você já cuidou de alguma criança com transtorno mental na enfermaria? Como foi esse cuidado? O que você espera com sua ação?”. As duas primeiras questões suscitam no entrevistado experiências passadas, as quais fundamentam como ele realiza e entende o seu cuidado (motivos por que).1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. Já a última indagação remeteu o entrevistado ao seu futuro, fazendo com que ele idealize possibilidades após seu cuidado (motivos para).1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. As entrevistas foram gravadas em áudio digital e transcritas posteriormente, com tempo médio de duração de dez minutos. Foi utilizada a letra E como forma de codificar a palavra entrevista, seguida do número da entrevista realizada. Encerrou-se a coleta de dados quando as inquietações da pesquisadora foram respondidas, uma vez que não surgiram temas novos nas entrevistas e alcançou-se a saturação teórica dos significados atribuídos ao fenômeno.1515 Hennink MM, Kaiser BN, Marconi VC. Code saturation versus meaning saturation: how many interviews are enough? Qual Health Res. 2017 mar;27(4):591-608. http://dx.doi.org/10.1177/1049732316665344. PMid:27670770.
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Na organização e análise os dados, primeiramente, realizou-se uma leitura cuidadosa das entrevistas para compreensão do sentido global do fenômeno.1616 Lopes PF, Melo LL, Moreno V, Toledo VP. Embracement of the person with mental illness at an emergency hospital service: a qualitative research. Rev Bras Enferm. 2020 mar;73(2):e20180671. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0671. PMid:32159694.
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,1717 Jesus MCP, Capalbo C, Merighi MAB, Oliveira DM, Tocantins FR, Rodrigues BMRD et al. A fenomenologia social de Alfred Schütz e sua contribuição para a enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(3):736-41. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420130000300030. PMid:24601154.
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Em seguida, foi feita uma releitura para identificação dos aspectos mais relevantes e significativos referentes às percepções da equipe em face dos seus cuidados, os quais, posteriormente, foram agrupados em unidades de significados, que englobam a essência da vivência comum a todos os indivíduos e podem ser expressos por uma palavra, frase ou comportamento. Finalmente, a partir da síntese das unidades de significados, construíram-se as categorias.1717 Jesus MCP, Capalbo C, Merighi MAB, Oliveira DM, Tocantins FR, Rodrigues BMRD et al. A fenomenologia social de Alfred Schütz e sua contribuição para a enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(3):736-41. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420130000300030. PMid:24601154.
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RESULTADOS

A partir da “relação-nós”, construída na relação face a face da pesquisadora com os seus entrevistados, formaram-se três categorias concretas, sendo que as duas primeiras expressam o estoque de conhecimento dos sujeitos entrevistados e suas experiências passadas, e a terceira categoria, construída a partir dos objetivos, expectativas e motivações, expressa os “motivos para”, pelos quais os profissionais de saúde realizam seus cuidados.

Os “motivos porque” foram descritos em duas categorias: a percepção da equipe de enfermagem em face dos cuidados prestados e ações e cuidados da equipe de enfermagem à criança com transtornos mentais. Os “motivos para” foram expressos na categoria: a recuperação da criança com transtorno mental e o seu retorno para casa.

A percepção da equipe de enfermagem em face dos cuidados prestados

Durante as entrevistas, os participantes relataram que os tipos de transtornos apresentados pelas crianças são distintos dos adultos, pois se confundem em relação ao que é a doença mental, o que é a falta de limite e o que é o modo de vida da criança e/ou adolescente.

Então aí a gente já tem uma diferença no tipo de transtorno que a gente interna, basicamente de adolescente para adulto. (S1)

Porque tem aquela questão, do que que é a doença, do que que é a falta de limite, para eles... Isso confunde muito a gente. (E2)

A gente acaba, às vezes, até confundindo se é um transtorno mental ou se é um modo de vida das crianças. (E9)

Além disso, referiram que os cuidados com esse público requerem paciência, afeto e carinho, identificando que uma atitude vocacional como a de ter dom é necessária para lidar com os transtornos mentais.

A gente tem que ter paciência, principalmente com criança. (E7)

A criança depende de um certo afeto. Ela precisa te conhecer para poder pegar a confiança em você, para poder conseguir as coisas para poder cuidar melhor. (E1)

Eu acho que a gente tem aquele carinho a mais quando é uma criança. (E2)

Não é nem experiência, é mais acho que o dom, aquela coisa assim de lidar muito com pacientes com transtornos mentais. (E8)

A equipe de enfermagem também associou este cuidado a aspectos positivos, como sendo gratificante observar a melhora dos pacientes, além do aprendizado obtido.

É gratificante você cuidar e depois você ver a pessoa. Qualquer uma que esteja melhorando, principalmente uma criança. (E1)

A gente vai aprendendo a lidar com eles. Cada um a gente precisa saber lidar de uma forma particular, cada um é único ali. (E7)

Todavia, relataram percepções negativas sobre o cuidado, tais como: dificuldade em cuidar por se tratar de um transtorno mental; frustração por não cuidar das situações que levam ao quadro agudo e mistura dos papéis assumidos pela equipe.

Porque é um quadro mental mesmo, então tem essas dificuldades. Aqui não é uma pediatria específica de psiquiatria. (S2)

É meio frustrante porque a gente está envolvido no controle do quadro agudo dele, mas as questões que fizeram emergir essa situação, que levou a um quadro agudo, não é a gente que maneja. (S1)

A gente coloca no lugar do filho da gente e tudo, é mais complicado porque daí mistura tudo, você fica com dó, você acaba cuidando como mãe, só que tem que ter o limite. (E2)

Um outro aspecto citado pelos participantes foi a influência e o envolvimento da família nos cuidados de enfermagem, visto que a criança nunca interna sozinha, podendo este ser um desafio para o cuidar, interrogando o quão terapêutico pode ser a presença da família no processo de hospitalização, podendo prolongar ou diminuir o tempo de hospitalização do paciente.

Porque eles não internam sozinhos, geralmente é uma internação da família. Aí a família acaba reforçando alguns sintomas assim mais reativo, mais provocativo. As vezes a gente fica pensando em quão terapêutico é a presença da família, mas ao mesmo tempo a gente esquece que é para esse lar, para esse meio que a criança vai voltar. (S1)

A gente também tem abordagem com a família, a gente envolve também os pais no cuidado. (E7)

As mães interferem muito nas condutas médicas, na conduta da enfermagem... acaba interferindo até no tratamento da criança mesmo, acaba protelando [...] A aceitação da mãe...O tratamento seria diminuído aí no tempo de tratamento. (E9)

Ações e cuidados da equipe de enfermagem à criança com transtornos mentais

Para os entrevistados, o cuidado prestado se configurou como cuidados básicos de enfermagem. Além disso, avaliaram que o contexto do serviço inviabiliza o trabalho autônomo da enfermagem de tal forma que o cuidado se pauta em prescrições médicas e de outros profissionais. A falta de autonomia é acentuada pela ausência de seguimento pré e pós-internação hospitalar.

Todos os cuidados. Medicação via oral, medicação na veia, trocar fralda, dar banho, todos os cuidados básicos de enfermagem...instalação de cateter de O2 [oxigênio], tudo não é? (E5)

As nossas intervenções aqui são muito medicamentosas. Porque eu posso advogar e posso pensar numa assistência de enfermagem mais autônoma, ao mesmo tempo dentro de um contexto interprofissional, mas que isso é inviável para a realidade do serviço que a gente tem. [...] E aí algumas intervenções acabam sendo que o outro profissional prescreveu. (S1)

Você não acompanha depois e você também não acompanhou o antes. Então naquele momento ali é cumprir o que o médico está esperando. (E9)

Quando tem o trabalho da terapeuta junto, ela monta um trabalho e passa para gente o que é para ser feito. (E4)

Para executar as intervenções, os profissionais observam mais o comportamento dos pacientes e falam menos, para elaborar uma forma de abordagem. A escuta e a conversa pautadas em técnica de comunicação foram apontadas como estratégias de cuidado.

Então, eu tento observar para identificar qual a melhor abordagem. Porque dependendo, se é uma questão mais agressiva, eu tento observar mais, falar menos. É uma estratégia assim, você tem que criar uma estratégia para a abordagem […] a melhor forma de abordar. (E5)

De poder estar se escutando o que a pessoa tem para falar, sentar do lado, ficar conversando... eu acho que a escuta ali é o mínimo que pode ser feito. (E4)

A gente já entra no quarto dando bom dia, se apresentando, falando que a gente vai cuidar dele, vou ver sinais, ‘eu posso colocar o termômetro? Tudo você tem que ficar falando para eles. Olho no olho com eles. Encarando mesmo, e mostrando o que você vai fazer com eles. [...] Mas tudo assim, com um preparo antes. (E7)

No seu cotidiano, os profissionais da equipe de enfermagem entrevistados ofertam brincadeiras, música, dança e desenhos para as crianças com a finalidade de passar o tempo.

A gente vai tentando arrumar atividades para a criança ir fazendo. Brinca. Coloca música do celular. Vou colocando, vou brincando, às vezes vou dançando junto com eles, para tentar passar um pouquinho do tempo. [...] Coloco desenho do meu celular para eles irem assistindo. (E4)

Quando dá tempo, a gente brinca, joga... têm uns jogos aqui na enfermaria, a gente joga, eles pintam. (E1)

A recuperação da criança com transtorno mental e o seu retorno para casa

Os profissionais entrevistados têm como expectativa uma infraestrutura apropriada para receber a criança e o adolescente, separada do espaço dos adultos, avaliando o risco de uma enfermaria mista. E, além disso, consideram que a criança necessita frequentar espaços adequados para o desenvolvimento de seu cuidado, tal como uma brinquedoteca.

Acho que isso era essencial para eles, ter um espaço separado do adulto que eu acho que isso aí é bem prejudicial para eles. Eu acho que não é legal a criança ficar no mesmo espaço que o adulto. (E4)

Acho que o ideal seria ter um lugar separado, não é? Para internar, principalmente criança, porque quando vem criança para cá é complicado, porque com esse monte de adulto aqui, não é? [...] Tipo, muitos querem ir lá na pediatria, na brinquedoteca, mas é uma luta, não é? Porque eles não querem deixar. (E2)

Os sujeitos participantes identificam a necessidade de apoio psicológico e de ter uma equipe mais preparada como forma de melhorar a assistência. Além disso, ambicionam a presença de um profissional que passe segurança para a equipe, sobre o que eles podem fazer, como abordar e como agir, de tal forma que isso reduzisse o tempo de tratamento do paciente.

Acho que a gente deveria ter um apoio psicológico aqui pra gente dar uma assistência melhor pro paciente. Eu acho que se tivesse uma equipe mais preparada, no sentido de ajudar, de maneira profissional esses pacientes, acho que ajudaria nesse tratamento [...] Então eu acho assim, que se tivesse alguém que passasse essa segurança pra gente, do que a gente pode fazer, de como fazer, de dar uma ideia, ‘ai, ela age desse jeito, se você abordar dessa forma, ela vai entender’, eu acho que seria muito compensador pra gente e pros próprios pacientes mesmo, porque o tratamento duraria menos tempo, né? (E9)

E por fim, os entrevistados esperam a aceitação dos cuidados de enfermagem por parte de seus pacientes e que as expectativas terapêuticas sejam respondidas: a reinserção do paciente na sociedade e família.

Tem que ter uma explicação, porque nem sempre eles vão aceitar assim de boa quando é criança. (E2)

A reinserção no meio social. [...] Uma resposta positiva sobre o seu cuidado, sobre o tratamento em si da criança. A gente espera isso, que ele seja reinserido na sociedade, a família também. (E7)

DISCUSSÃO

Neste estudo, os participantes apontam que os tipos de transtornos mentais apresentados pelas crianças e adolescentes são diferentes daqueles dos adultos. Entretanto, a depressão e os transtornos de ansiedade aparecem como os distúrbios mentais mais prevalentes em ambas as populações.1818 Vasileva M, Graf RK, Reinelt T, Petermann U, Petermann F. Research review: A meta-analysis of the international prevalence and comorbidity of mental disorders in children between 1 and 7 years. J Child Psychol Psychiatry. 2021 abr;62(4):372-81. http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.13261. PMid:32433792.
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Particularmente, na infância e juventude, evidenciam-se os transtornos mais específicos dessa idade, tais como o de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), os transtornos de conduta ou comportamento e personalidade.1818 Vasileva M, Graf RK, Reinelt T, Petermann U, Petermann F. Research review: A meta-analysis of the international prevalence and comorbidity of mental disorders in children between 1 and 7 years. J Child Psychol Psychiatry. 2021 abr;62(4):372-81. http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.13261. PMid:32433792.
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19 Sá Sousa CM, Mascarenhas MDM, Gomes KRO, Rodrigues MTP, Miranda CES, Frota KMG. Ideação suicida e fatores associados entre escolares adolescentes. Rev Saude Publica. 2020 mar;54:33. http://dx.doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054001637.
http://dx.doi.org/10.11606/s1518-8787.20...
-2020 Guilé JM, Boissel L, Alaux-Cantin S, de La Rivière SG. Borderline personality disorder in adolescents: prevalence, diagnosis, and treatment strategies. Adolesc Health Med Ther. 2018 nov;9:199-210. http://dx.doi.org/10.2147/AHMT.S156565. PMid:30538595.
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Além disso, os participantes desse estudo relataram dificuldade em discernir o que é a doença mental tanto quanto o que é a falta de limite das crianças e adolescentes. Em conformidade com este achado, um estudo com profissionais da saúde da atenção básica apontou a falta de um “olhar diferenciado” como dificuldade para distinção entre o que é próprio do desenvolvimento infantojuvenil e o que tem necessidade de cuidado e intervenção.2121 Teixeira MR, Couto MCV, Delgado PGG. Atenção básica e cuidado colaborativo na atenção psicossocial de crianças e adolescentes: facilitadores e barreiras. Cien Saude Colet. 2017 Jun;22(6):1933-42. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017226.06892016.
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Em seu ciclo normal de desenvolvimento, crianças e adolescentes apresentam uma série de comportamentos que são desafiadores e contestadores e, quando ocorrem de forma esporádica e isolada são considerados esperados para a idade, porém, caso apareçam de forma constante e padronizada, podem ser sugestivos de transtornos mentais.2222 Caspi A, Moffitt TE. All for one and one for all: mental disorders in one dimension. Am J Psychiatry. 2018 set;175(9):831-44. http://dx.doi.org/10.1176/appi.ajp.2018.17121383. PMid:29621902.
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,2323 Martinhago F, Caponi S. Controvérsias sobre o uso do DSM para diagnósticos de transtornos mentais. Physis. 2019 set;29(2):e290213. http://dx.doi.org/10.1590/s0103-73312019290213.
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No contexto do trabalho, a equipe de enfermagem e o paciente projetam suas ações a partir de suas respectivas situações biográficas em conjunto com os seus acervos de conhecimentos, ou seja, os indivíduos agem de maneiras diferentes e específicas de acordo com as suas vivências subjetivas.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. Juntamente, essas experiências e o conhecimento disponibilizado através dos progenitores e educadores articulam-se com o acervo de conhecimento que fica à disposição do sujeito, orientando e motivando as suas ações no mundo da vida.1717 Jesus MCP, Capalbo C, Merighi MAB, Oliveira DM, Tocantins FR, Rodrigues BMRD et al. A fenomenologia social de Alfred Schütz e sua contribuição para a enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(3):736-41. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420130000300030. PMid:24601154.
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Desta forma, o profissional irá compreender o que é o modo de vida da criança e do adolescente, entendendo como os envolvidos na relação se posicionam no mundo da vida.1616 Lopes PF, Melo LL, Moreno V, Toledo VP. Embracement of the person with mental illness at an emergency hospital service: a qualitative research. Rev Bras Enferm. 2020 mar;73(2):e20180671. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0671. PMid:32159694.
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Os entrevistados do estudo também apontaram que a ação de cuidar de crianças e adolescentes com transtornos mentais hospitalizados requer paciência, afeto e carinho, além de dom como atitude vocacional. O desenvolvimento destes sentimentos com os pacientes pediátricos e hebiátricos é recorrente entre os profissionais que lidam com esse público, pois, assim, acreditam que estão contribuindo para a melhora de seus pacientes.2424 Ford K, Dickinson A, Water T, Campbell S, Bray L, Carter B. Child centred care: challenging assumptions and repositioning children and young people. J Pediatr Nurs. 2018 nov;43:e39-43. http://dx.doi.org/10.1016/j.pedn.2018.08.012. PMid:30172421.
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Ressalta-se que as crianças e os adolescentes almejam ser cuidados com respeito, consideração, afeto, acolhimento e reconhecimento de suas especificidades, o que lhes propiciará desenvolver vínculos afetivos, cooperando com o cuidado.2525 Santos PM, Silva LF, Depianti JRB, Cursino EG, Ribeiro CA. Os cuidados de enfermagem na percepção da criança hospitalizada. Rev Bras Enferm. 2016 jul;69(4):646-53. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2016690405i. PMid:27508468.
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,2626 Ribeiro JP, Gomes GC, Santos EO, Pinho LB. Specificities of care to the adolescent crack user assisted in the psychosocial care network. Esc Anna Nery. 2019;23(2):e20180293. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0293.
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Quanto à atitude vocacional, estudos apresentam relatos de trabalhadores da enfermagem nos quais a falta de uma vocação, disposição natural, habilidade e “dom” foram atribuídos às dificuldades para o estabelecimento de uma relação e para a realização do cuidado com a criança e o adolescente com transtorno mental.2727 Alves SR, Santos RP, Yamaguchi MU. Enfermagem em serviços de saúde mental: percepção sobre satisfação profissional e condições de trabalho. R Enferm Cent O Min. 2018 mar;8:e1852. http://dx.doi.org/10.19175/recom.v8i0.1852.
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,2828 Cairo JVF, Freitas THD, Francisco MTR, Lima ALR, Silva LA, Marta CB. Enfermagem em saúde mental: a assistência em um cenário de mudanças. Glob Acad Nurs. 2020 dez;1(3):e56. http://dx.doi.org/10.5935/2675-5602.20200056.
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Os componentes citados anteriormente se aproximam do que uma relação face a face, elaborada por Schutz, precisa para acontecer, visto que é caracterizada pela simultaneidade da presença dos sujeitos envolvidos no mesmo espaço e tempo, de tal forma que um esteja consciente do outro.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p. Também é importante refletir sobre a necessidade de preparo, formação e desenvolvimento de práticas baseadas em evidências científicas das equipes de enfermagem, o que promove a aquisição de conhecimentos e o aprimoramento do cuidado realizado pelo profissional de enfermagem, considerando a complexidade do cuidar em saúde mental e o trabalho em equipe, ambos estruturados pelas práticas humanizadas e multiprofissionais da clínica do cuidado em saúde mental.2929 Tavares CM, Mesquita LM. Sistematização da assistência de enfermagem e clínica ampliada: desafios para o ensino de saúde mental. Enfermagem em Foco. 2020 fev;10(7):121-6. http://dx.doi.org/10.21675/2357-707X.2019.v10.n7.2810.
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Os sujeitos deste estudo associaram o cuidado prestado tanto aos aspectos positivos, tais como gratificante, tranquilo e interessante quanto às percepções negativas, como: difícil; e frustrante por se tratar apenas do quadro agudo. Para este cenário, um estudo evidenciou que a equipe multiprofissional que presta assistência integral à saúde da criança e do adolescente vive experiências difíceis e desafiadoras, pois o diagnóstico de transtorno mental é um fator dificultador, exigindo dos profissionais maior vigilância e atenção com o desconhecimento da história e dos motivos que levaram o paciente a ser hospitalizado, além de serem pontos limitantes para o cuidado.2323 Martinhago F, Caponi S. Controvérsias sobre o uso do DSM para diagnósticos de transtornos mentais. Physis. 2019 set;29(2):e290213. http://dx.doi.org/10.1590/s0103-73312019290213.
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,3030 Rocha MP. Crianças e adolescentes com transtornos mentais hospitalizados: experiência da equipe multidisciplinar [monografia]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2019 [citado 6 jun 2022]. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/197133
https://repositorio.ufsc.br/handle/12345...

É possível a compreensão dos achados descritos acima com base no entendimento de que o cuidado de enfermagem é uma ação, ou seja, uma atitude humana planejada e realizada pelo indivíduo de forma intencional e que carrega motivos para e por que, posta no mundo da vida, agregado da especificidade técnico-científica, em que o cuidador pauta as suas ações em seu acervo de conhecimentos e em sua situação biográfica. O cuidar profissional também demanda uma relação social específica entre os indivíduos que se envolvem nela, sendo permeada por um contexto social que exprime concepções de saúde e afins díspares. O conjunto desses fatores pode conduzir os sujeitos a terem experiências positivas e negativas quando vivenciam a ação do cuidar.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p.,1717 Jesus MCP, Capalbo C, Merighi MAB, Oliveira DM, Tocantins FR, Rodrigues BMRD et al. A fenomenologia social de Alfred Schütz e sua contribuição para a enfermagem. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(3):736-41. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420130000300030. PMid:24601154.
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,3131 Costa PCP, Rigon AP, Garcia F, Toledo VP. Acolhimento e cuidado de enfermagem: um estudo fenomenológico. Texto Contexto Enferm. 2016;25(1):e4550015. http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072016004550014.
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Quanto à questão de o cuidado ser complicado por convocar a equipe à mistura de papéis assumidos, a literatura aponta que devido a uma construção histórico-social, a enfermagem ainda é associada fortemente à condição feminina e às características consideradas intrínsecas ao papel tradicional da mulher na sociedade, como o desempenho de sua função materna de promoção do cuidado.3232 Rodrigues BC, Lima MF, Maschio No B, Oliveira GL, Corrêa ACP, Higarashi IH. Being a mother and a nurse: issues about gender and overlapping social roles. Rev Rene. 2017 jun;18(1):91-8. http://dx.doi.org/10.15253/2175-6783.2017000100013.
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Estas questões de gênero influenciam e se transferem para o profissional, de modo que o cuidado seja transpassado pela sensibilidade e o envolvimento no sofrimento alheio, despertando-lhe sensações e sentimentos.3232 Rodrigues BC, Lima MF, Maschio No B, Oliveira GL, Corrêa ACP, Higarashi IH. Being a mother and a nurse: issues about gender and overlapping social roles. Rev Rene. 2017 jun;18(1):91-8. http://dx.doi.org/10.15253/2175-6783.2017000100013.
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Outro achado importante da pesquisa se refere à influência da família nos cuidados prestados, visto que a internação da criança é sempre realizada na companhia de seus familiares, os quais também são envolvidos nos cuidados. A família é um sistema complexo que influencia a formação do ser social, emocional e biológico de seus integrantes, desta forma, desempenha papel de extrema importância na situação de hospitalização devido à sua capacidade de garantir a manutenção e proteção ao desenvolvimento saudável da criança e do adolescente, mesmo em um contexto adverso.3333 Smith W. Concept analysis of family-centered care of hospitalized pediatric patients. J Pediatr Nurs. 2018 set;42:57-64. http://dx.doi.org/10.1016/j.pedn.2018.06.014. PMid:30219300.
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Além disso, as crianças e os adolescentes encontram em seus pais ou figuras familiares a força e segurança para passar por esse momento cheio de incertezas e desafios, além de terem seu sofrimento amenizado com a presença deles.3333 Smith W. Concept analysis of family-centered care of hospitalized pediatric patients. J Pediatr Nurs. 2018 set;42:57-64. http://dx.doi.org/10.1016/j.pedn.2018.06.014. PMid:30219300.
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Desta forma, é reconhecido e faz-se imprescindível que a equipe de enfermagem estimule a presença e participação dos pais ou familiares no ambiente hospitalar, promovendo um cuidado centrado na díade criança/família. Uma possibilidade para demarcar o avanço do conhecimento é reconhecer as famílias como participantes diretos no cuidado e no processo saúde-doença desde os serviços até as políticas de saúde, adotando abordagens holísticas da família que melhoram as respostas do paciente, reduzem o estresse e otimizam a experiência vivida pelos familiares. Também se destaca a necessidade de a enfermagem migrar de um modelo centrado no paciente-doença para uma perspectiva de modelo colaborativo de cuidado entre paciente e família com o suporte construído pela relação da enfermagem com as respectivas famílias.3333 Smith W. Concept analysis of family-centered care of hospitalized pediatric patients. J Pediatr Nurs. 2018 set;42:57-64. http://dx.doi.org/10.1016/j.pedn.2018.06.014. PMid:30219300.
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,3434 Moniz ASB, Silva MRS, Fortes DCS, Fagundes JS, Silva ASB. Necessidades das famílias caboverdianas que convivem com o transtorno mental. Esc Anna Nery. 2020;24(2):e20190196. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2019-0196.
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O cuidado da equipe de enfermagem com a criança e o adolescente com transtornos mentais hospitalizado requer ações de cuidado de higiene e conforto, medicação, e, ainda, contenção, quando necessário, para a promoção de um atendimento de excelência.11 Carneiro ES, Souza AIJ, Pina JC, Rumor PCF, Gevaerd TC, Cicéron MY. Abordagem da equipe de saúde nos agravos de saúde mental de crianças e adolescentes hospitalizados. Rev. Soc. Bras. Enferm. Ped. 2018 jun;18(1):7-14. http://dx.doi.org/10.31508/1676-3793201800002.
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Todavia, o trabalho da enfermagem não deve limitar-se a tais atividades, embora o modelo biomédico ainda predomine dentro das instituições hospitalares, promovendo uma assistência pautada em torno de uma hierarquia constituída por manuais, normas, rotinas e pela subordinação do enfermeiro em relação ao médico. Estes fatores limitam o pleno exercício da autonomia pela enfermagem, conduzindo a uma assistência fragmentada, engessada e verticalizada.3535 Balsanelli AP, David DR, Ferrari TG. Nursing leadership and its relationship with the hospital work environment. Acta Paul Enferm. 2018 mar;31(2):187-93. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800027.
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,3636 Strapazzon Bonfada M, Pinno C, Camponogara S. Potencialidades e limites da autonomia do enfermeiro em ambiente hospitalar. Rev Enferm UFPE on line. 2018 ago;12(8):2235-46. http://dx.doi.org/10.5205/1981-8963-v12i8a234915p2235-2246-2018.
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Os profissionais deste estudo dispõem de distintos elementos para sistematizar o cuidado, utilizando estratégias como a observação da criança, a escuta e o diálogo, elementos constituintes da relação face a face, visto que o profissional de enfermagem explica as ações a fim de preparar a criança para o cuidado de enfermagem. Por meio da relação face a face de Schutz, o profissional consegue adentrar o universo infantojuvenil, permitindo com que as crianças e adolescentes se expressem a partir de sua situação biográfica.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p.,3737 Toledo VP, Motobu SN, Garcia APRF. Sistematização da assistência de enfermagem em unidade de internação psiquiátrica. Rev Baiana Enferm. 2015;29(2):172-9. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v29i2.11707.
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,3838 Silva AD, Peres MAA. Acolhimento como tecnologia do cuidado emancipatório em Centros de Atenção Psicossocial. Rev Enferm UERJ. 2021 nov;29(1):e62626. http://dx.doi.org/10.12957/reuerj.2021.62626.
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Jogar um jogo, brincar com a bola, pintar e ver vídeos surgem para os participantes do estudo como formas de passar o tempo das crianças e adolescentes dentro da rotina hospitalar. A literatura aponta que a hospitalização pode ocasionar momentos difíceis e estressantes para as crianças, e que o brincar é uma possibilidade de comunicação efetiva, estabelecimento de vínculo entre a criança e profissional, podendo ser realizado em diversas circunstâncias e ambientes hospitalares.3939 Silva C, Schmidt FM, Grigol AM, Schultz LF. O enfermeiro e a criança: a prática do brincar e do brinquedo terapêutico durante a hospitalização. Semin Cienc Biol Saude. 2020 maio;41(1):95-106. http://dx.doi.org/10.5433/1679-0367.2020v41n1p95.
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,4040 Paula GK, Góes FGB, Silva ACSS, Moraes JRMM, Silva LF, Silva MA. Estratégias lúdicas no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Rev Enferm UFPE on line. 2019 jun;13:e238979. http://dx.doi.org/10.5205/1981-8963.2019.238979.
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Em face do exposto, recomenda-se que o brincar seja considerado uma ação sistematizada do cuidado, buscando seu estoque de conhecimento para facilitar o estabelecimento da relação face a face e o desenvolvimento do cuidado como ação social.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p.

Neste contexto, estudos apontam o ato de brincar como importante ferramenta para criar vínculo entre a equipe de enfermagem e as crianças durante o período de hospitalização, contando com a participação dos profissionais buscando implementar atividades lúdicas para proporcionar bem-estar. Em vista disso, o Brinquedo Terapêutico (BT) é uma tecnologia estruturada utilizada para prestar o cuidado através do planejamento e da sistematização da assistência e, atualmente tem-se difundido enquanto estratégia a ser adotada pelas equipes com a perspectiva de potencializar o cuidado humanizado das crianças. Portanto, sugerimos a utilização de tal ferramenta para possibilitar o cuidado das crianças e adolescentes com transtornos mentais em cenários de hospitalização e realizando acompanhamento em saúde mental.3939 Silva C, Schmidt FM, Grigol AM, Schultz LF. O enfermeiro e a criança: a prática do brincar e do brinquedo terapêutico durante a hospitalização. Semin Cienc Biol Saude. 2020 maio;41(1):95-106. http://dx.doi.org/10.5433/1679-0367.2020v41n1p95.
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,4040 Paula GK, Góes FGB, Silva ACSS, Moraes JRMM, Silva LF, Silva MA. Estratégias lúdicas no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Rev Enferm UFPE on line. 2019 jun;13:e238979. http://dx.doi.org/10.5205/1981-8963.2019.238979.
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Quanto ao alcance de objetivos e expectativas, ao realizar os seus cuidados, os participantes apontam a questão de que deveria haver um lugar separado para a internação das crianças e dos adolescentes, avaliando os riscos que envolvem tais cuidados em uma unidade de internação. Foi identificado que a falta de infraestrutura física adequada e acrescida dos riscos de uma enfermaria mista trazem prejuízos aos cuidados prestados às crianças e adolescentes com transtornos mentais hospitalizados, pois a atuação profissional pode ficar prejudicada devido à sobrecarga emocional e preocupação com a segurança de seus pacientes em decorrência da maior necessidade de vigilância desse público.3030 Rocha MP. Crianças e adolescentes com transtornos mentais hospitalizados: experiência da equipe multidisciplinar [monografia]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2019 [citado 6 jun 2022]. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/197133
https://repositorio.ufsc.br/handle/12345...

A necessidade de supervisão de casos para a explicação do comportamento e manejo enquanto expectativa trazida pelos participantes do estudo corrobora estudo que aponta a falta de habilidade, formação e conhecimento sobre os transtornos mentais infantojuvenis, provocando nos profissionais distintos sentimentos negativos, entendendo que os cuidados não estão sendo prestados de maneira adequada, pois não sabem como agir.3030 Rocha MP. Crianças e adolescentes com transtornos mentais hospitalizados: experiência da equipe multidisciplinar [monografia]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 2019 [citado 6 jun 2022]. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/197133
https://repositorio.ufsc.br/handle/12345...

E, por fim, a equipe de enfermagem almeja que as crianças e adolescentes aceitem seus cuidados, ou seja, é preciso estabelecer-se a relação terapêutica face a face para poder cuidar. A equipe, também tem por ambição a reinserção do paciente na sociedade e na família. Percebe-se que esta motivação para da equipe pode reforçar a importância dessas crianças e adolescentes de circularem por diferentes espaços, ampliando as vivências do seu mundo vida, vinculando-se, desenvolvendo-se e construindo relações pelas quais compreendem e são compreendidos.1010 Schutz A. A construção significativa do mundo social: uma introdução à sociologia compreensiva. Petrópolis: Vozes; 2018. 394 p.

CONSIDERAÇÕES FINAIS E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA

A abordagem teórico-metodológica da fenomenologia social de Alfred Schutz proporcionou conhecer as percepções da equipe de enfermagem sobre o cuidado de crianças e adolescentes com transtornos mentais hospitalizados, suas motivações e o que esperam desta ação.

Ao cuidar, a equipe de enfermagem depara-se com a mistura de papéis pessoais e profissionais, além de dificuldades para manejar as crianças e adolescentes com transtornos mentais. Apontam, também, pontos positivos experienciados a partir da prática e do cuidado com este público. A família é parte do cuidado realizado a criança e ao adolescente com a enfermagem realizando cuidados básicos, mas desejando ter maior espaço para desenvolver seu trabalho de forma autônoma. A equipe espera que o cuidado seja bem recebido pelas crianças e adolescentes, possibilitando sua melhora, recuperação e o retorno à sociedade.

Como implicação para a prática, foi possível compreender a percepção da equipe de enfermagem sobre a relevância da relação face a face no cuidado de crianças e adolescentes com transtornos mentais internados com base na fenomenologia social de Alfred Schutz. Também foram identificadas as expectativas dos profissionais em relação ao cuidar, além dos desafios vividos no período de hospitalização de crianças e adolescentes com transtornos mentais, criando estratégias para garantir o devido cuidado. Enfatiza-se que no cuidado deste público, é preciso também cuidar da família.

O cuidado como ação social, praticado a partir dos acervos biográficos dos profissionais de enfermagem desvelou o mundo vida existente no trabalho desenvolvido ao cuidar de crianças e adolescentes com transtornos mentais hospitalizados. Sugerem-se mais estudos que explorem o cuidado de crianças e adolescentes com transtornos mentais, haja vista a existência de lacunas no conhecimento científico da enfermagem, destacando, também a importância e necessidade do cuidado psiquiátrico e de saúde mental para este público. Entre as limitações do estudo, a pandemia impactou diretamente na coleta de dados, levando um tempo maior para acessar os profissionais, e as unidades apresentavam-se com as equipes desfalcadas devido aos remanejamentos internos para as unidades de cuidado dos pacientes com o novo coronavírus (COVID-19), além das inseguranças dos profissionais da equipe de enfermagem que se fazem presente devido ao alto risco de exposição e contaminação pelo vírus.

  • a
    Artigo extraído de projeto de pesquisa Percepção da equipe de enfermagem sobre o cuidado de crianças e adolescentes internados com transtornos mentais. Coordenado pela Dra. Vanessa Pellegrino Toledo. Faculdade de Enfermagem. Universidade Estadual de Campinas, ano de 2021.

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EDITOR CIENTÍFICO

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2022
  • Aceito
    04 Nov 2022
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