Open-access Atuação anticíclica das agências de fomento no período 2013-2020: uma avaliação das evidências operacionais

Anti-cyclical performance of public funding agencies in the period of 2013-2020: an evaluation of operational evidences

Resumo

As denominadas Agências de Fomento (AF) constituem-se, no Brasil, em instrumento complementar destinado ao financiamento público, sobretudo às pequenas empresas. Este artigo tem como objetivo avaliar a atuação dessas agências no período de 2013 a 2020, tendo como referência as normas e dados disponibilizados pelo Banco Central. Nesse sentido, o artigo contempla a organização e a análise dos dados disponíveis, incluindo a avaliação da distribuição regional, abrangência e disponibilidade de crédito (potencial e efetivo) pelas agências. Buscou-se ainda examinar o comportamento das agências em função dos ciclos econômicos, particularmente em momentos de queda ou de elevação do nível de atividade econômica medida pelo PIB.

Palavras-chave:
Agências públicas de financiamento; Oferta de crédito para pequenas empresas; Crédito e ciclos econômicos

Abstract

The so-called Financing Agencies are, in Brazil, a complementary instrument for public funding, particularly for small companies. This article aims to evaluate the performance of these Agencies between 2013 and 2020, based on the norms and data provided by the Central Bank of Brazil. In this sense, the analysis includes, in addition to the organization of available data, an evaluation in terms of regional distribution, coverage and availability of credit (potential and effective) by the Agencies. We also sought to assess the behavior of the Agencies in terms of economic cycles, particularly in times of decline or rise in the level of economic activity measured by GDP.

JEL: E59, L38, O16.

Keywords:
Public financing agencies; Credit supply for small businesses; Credit and economic cycles

1 Introdução

Uma das principais questões relacionadas ao desenvolvimento econômico, não apenas em seus aspectos gerais, mas também distributivos, refere-se à disponibilidade de financiamento para os vários segmentos do setor produtivo, sobretudo considerando as restrições de crédito observadas em países menos desenvolvidos. Dentre tais segmentos, destacam-se empresas de pequeno porte que, na concorrência com os grandes empreendimentos, tendem a encontrar dificuldades na obtenção de crédito privado, principalmente em situações de recessão ou baixo crescimento econômico, restando ao setor público suprir tal carência. Nestas situações, espera-se que a disponibilidade de financiamento possa ter efeitos positivos na economia, considerando que, no agregado, as pequenas empresas são as que mais empregam mão de obra. Além disso, trata-se de um instrumento nas mãos do Estado que pode ser utilizado como estímulo à economia, particularmente em momentos de elevação do desemprego, podendo inclusive privilegiar os investimentos produtivos.

No Brasil, as micro e pequenas empresas vêm sendo beneficiadas pelas denominadas Agências de Fomento (AF), cujas atuações ganharam impulso a partir da reformulação das normas do Banco Central (Resolução 2.828, de 2001). Este artigo tem como objetivo avaliar o comportamento das AF, tendo como referência as determinações normativas e dados disponibilizados pelo Banco Central. Nesse sentido, buscou-se organizar esses dados de forma a permitir a avaliação da atuação, abrangência e disponibilidade de crédito pelas agências.

O artigo está dividido em três seções, além desta introdução e das considerações finais. Na seção 2, são apresentados os aspectos gerais em torno da atuação das AF entre 2012 e 2020, período de referência da análise. Na seção 3, será considerada a atuação das agências segundo modalidade e volume de crédito, bem como avaliação a partir do indicador de capacidade potencial de crédito (ICPC), cujo objetivo é a avaliação da capacidade de atendimento das AF em termos de volume potencial por empresa privada. Na última, será realizada avaliação das ações das AF em função do comportamento dos ciclos econômicos, particularmente em momentos de queda ou de elevação do nível de atividade econômica medida pelo PIB. Todos os dados utilizados na análise foram extraídos do sistema IF.Data do Banco Central do Brasil, que disponibiliza informações selecionadas das instituições financeiras de crédito. Os indicadores a serem utilizados, além de outros aspectos metodológicos, serão detalhados ao longo do texto.

2 Origem, objetivo e abrangência das agências de fomento

As Agências de Fomento (AF) surgiram no país no contexto da reestruturação do segmento bancário nacional, a partir do Programa de Incentivo à Redução da Presença do Setor Público na Atividade Financeira, criado no ano de 1996. Em 2001, a constituição e funcionamento das AF foram regulamentados pelo Banco Central do Brasil (BCB), com base na Resolução 2.828, de 30 de março de 2001 (BCB, 2001). Segundo a referida resolução, as AF têm como objeto social “financiar capital fixo e de giro associado a projetos na Unidade da Federação onde tenham sede” (BCB, 2001, art. I). A resolução estabelece ainda que as AF devem ser constituídas sob a forma de sociedade anônima de capital fechado e ter seu funcionamento subordinado às regras do Banco Central do Brasil.

Entre os potenciais beneficiários do financiamento (operações ativas) das AF estão projetos de infraestrutura, profissionais liberais e micro e pequenas empresas. Indústria, comércio, agronegócio, turismo e informática são exemplos de áreas que podem ser fomentadas. Ademais, as AF podem inclusive abrir linhas de crédito para municípios de seu estado, voltadas para projetos de interesse da população (BCB, 2022a).

No tocante à sua criação, cada unidade de federação pode constituir uma única agência, que ficará sob o controle do ente federativo onde tenha sede. A expressão Agência de Fomento, acrescida da indicação da Unidade da Federação controladora, deve constar obrigatoriamente da denominação social da instituição. A supervisão de suas atividades é feita pelo Banco Central (BCB, 2022a).

No que se refere às suas obrigações, as AF, além de recursos próprios, em operações passivas, só podem empregar recursos provenientes de fundos e programas oficiais, dos orçamentos federal, estaduais e municipais, de organismos e instituições financeiras nacionais e internacionais de desenvolvimento, sendo vedada a captação de recursos junto ao público. Adicionalmente, estas instituições devem constituir e manter, permanentemente, fundo de liquidez equivalente, no mínimo, a 10% do valor de suas obrigações, a ser integralmente aplicado em títulos públicos federais (BCB, 2001, art. 6). A despeito da nova regulamentação, as AF atuam desde a década de 1990 (sendo a primeira criada no início dos anos 1970). Atualmente, o Brasil conta com 16 agências de fomento, conforme apresentado no Quadro 1.

Quadro 1
Agências de fomento

Cabe observar que algumas das instituições foram originalmente instituídas como bancos de desenvolvimento para somente anos depois assumirem a atual configuração de agências de fomento. São os casos, por exemplo, da Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S.A., cujas origens remontam a 1973, com a criação do Banco de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina S.A. (Badesc); da Agência de Fomento/RS, originalmente instituída em 1973 como Banco de Desenvolvimento do Estado do Rio Grande do Sul S.A. (Badesul); e da Agência de Fomento do Estado da Bahia S.A. (Desenbahia), sucessora do Banco de Desenvolvimento da Bahia (Bandeb), criado em 1966 e transformado, em 1970, no Banco de Desenvolvimento do Estado da Bahia (Desenbanco).

Com relação à distribuição regional das agências de fomento, tem-se a configuração apresentada na Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição regional das agências de fomento

Apesar de estarem presentes em todo o território nacional, percebe-se, a partir da Tabela 1, uma maior concentração das AF nas regiões Nordeste e Norte. Juntas, estas duas regiões agregam nove instituições, ou 56,3% do total de instituições dessa natureza, sendo cinco (ou 31,3%), no Nordeste e quatro ou (25%), na região Norte. Já as regiões Sul e Sudeste contam com cinco instituições, ou 31,3% do total, sendo três, ou 18,8% do total, na região Sul e duas ou 12,5%, na região Sudeste. No caso da região Centro-Oeste, encontram-se apenas duas instituições, ou 12,5% do total. Com relação ao número de agências de fomento, segundo a quantidade de estados que compõem cada região, a região Sul apresenta a maior proporção, com 100,0% dos estados tendo uma agência de fomento (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná), seguida pela região Norte, com 57,1% (ou cinco estados de um total de sete), Nordeste, com 55,6% (ou cinco estados de um total de nove), Centro-Oeste e Sudeste com 50,0% cada (ou dois estados de um total de quatro).

O ambiente operacional das agências de fomento é estrategicamente controlado pelo respectivo estado que estabelece sua estrutura organizacional, física e tecnológica, fluxos de informações e sistema de gestão. Trata-se, como destacou Ribeiro (2004, p.6), de instituições como “[...] sistemas abertos, portanto, interagem com os diversos sistemas externos, como o mercado, a sociedade, clientes, indivíduos, agentes repassadores de recursos, entre outros”.

Cabe observar que as agências de fomento integram o chamado Sistema Nacional de Fomento (SNF), composto por bancos públicos federais, bancos de desenvolvimento controlados por estados da federação, bancos cooperativos, bancos públicos comerciais estaduais com carteira de

desenvolvimento e agências de fomento, além da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Sebrae (ABDE, 2022).

As Agências de Fomento, assim como as demais instituições financeiras, são classificadas pelo Banco Central do Brasil com base na Resolução nº 4.553, de 30 de janeiro de 2017, que “estabelece a segmentação do conjunto das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil para fins de aplicação proporcional da regulação prudencial” (BCB, 2017). A referida resolução prevê cinco segmentos de porte, de S1 a S5, expressos pela razão entre o valor da Exposição Total (ou o valor do Ativo Total, a depender do caso) e o valor corrente do PIB do Brasil a preços de mercado, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Adotando tais critérios, todas as 16 agências de fomento brasileiras estão classificadas no segmento S4, o qual é composto pelas instituições de porte inferior a 0,1% do PIB.

3 Atuação das agências de fomento no período 2012-2020

Esta e a próxima seção têm como objetivo avaliar a atuação das agências de fomento considerando o período de 2012 a 2020. Os dados para realização da referida pesquisa foram extraídos do sistema IF.Data - que apresenta dados selecionados de instituições financeiras, disponibilizado pelo Banco Central do Brasil (Brasil, 2022b). O Banco Central, por meio do referido sistema, divulga trimestralmente informações das instituições financeiras que autoriza a funcionar e que estejam em operação normal. Os relatórios utilizados na presente pesquisa referem-se a: i) informações contábeis e de capital; ii) informações de crédito; e iii) demonstração de resultado. Os arquivos com os respectivos dados encontram-se disponíveis no repositório eletrônico IF.Data para download, em formato "csv". Uma vez baixados, os arquivos de interesse foram transformados para o formato de planilha eletrônica (MS Excel) para posterior tabulação e análise dos dados. O período abarcado pela presente pesquisa compreende os anos de 2012 a 2020. Contudo, cabe ressalvar que algumas informações, em especial aquelas contidas no Relatório do Sistema de Informação de Crédito (SCR), intitulado “Carteira de crédito ativa Pessoa Jurídica - modalidade e prazo de vencimento”, base para diversas análises efetuadas ao longo do presente artigo, são somente disponibilizadas a partir do ano de 2012. Assim, nos cálculos de variação de valores entre períodos [(V(Pn)-V(Pn-1))/ V(Pn)], (cf. Tabelas 9 e 12, o primeiro período considerado diz respeito ao ano de 2013 em relação a 2012 e, assim, sucessivamente.

Com relação às modalidades de crédito disponibilizadas pelas agências de fomento para pessoa jurídica, objetos de análise pelo presente estudo, elas seguem a classificação utilizada pelo Banco Central do Brasil e referem-se a: (i) Financiamento de infraestrutura / desenvolvimento / projeto e outros créditos; (ii) Investimento; (iii) Capital de giro; (iv) Rural e agroindustrial; e (v) Outros créditos. Por oportuno, cabe mencionar que algumas modalidades de crédito se desdobram em submodalidades, conforme apresentado no Quadro 2.

Quadro 2
Modalidades e submodalidades de crédito oferecidas por agências de fomento, segundo classificação do Banco Central do Brasil

3.1 Análise da atuação das agências de fomento segundo modalidades de crédito selecionadas

Na Tabela 2, é apresentado o volume total de crédito disponibilizado pelo conjunto das 16 Agências de Fomento no período compreendido entre 2012 e 2020, segundo modalidades de crédito selecionadas.

Tabela 2
Volume de crédito disponibilizado pelas agências de fomento no período 2012-2020, segundo modalidades de crédito

Pela análise da Tabela 2, observa-se que, de um montante de, aproximadamente, R$ 67 bilhões para o período considerado, a modalidade de crédito Financiamento de Infraestrutura / Desenvolvimento / Projeto e Outros créditos respondeu por 49,4% do volume total de crédito disponibilizado pelas AF no período compreendido entre 2012 e 2020. Na segunda posição, tem-se a modalidade Investimento, respondendo por 44,0% do volume total. Juntas, estas duas modalidades respondem por 93,4% do volume total de crédito disponibilizado pelas AF no período em análise. Na terceira posição, com participação mais modesta do que as anteriores, tem-se a modalidade Rural e agroindustrial, respondendo por 4,0% do total. Na quinta posição, tem-se a modalidade Capital de giro, com 2,2% volume do total. E na sexta posição, a modalidade Outros créditos, respondendo por 0,3% do total. Ou seja, apesar das várias possibilidades de aplicação dos recursos pelas AF, a evolução indica prioridade na formação de capital fixo.

Na Tabela 3 é apresentado o volume de crédito total disponibilizado por cada uma das agências de fomento no período 2012-2020, segundo modalidade de crédito.

Tabela 3
Volume de crédito disponibilizado pelas agências de fomento no período 2012-2020, segundo agências de fomento e modalidade de crédito

Observa-se uma significativa concentração na oferta de crédito por algumas AF. Ou seja, quatro AF, dos estados do RS, SP, PR e SC, respondem por 84,6% do volume de crédito total disponibilizado no período em análise. Complementarmente, as demais 12 AF, respondem por

somente 15,4% da oferta total. Ou seja, aplicando-se o Princípio de Pareto1, tem-se que 25% das AF respondem por 84,6% da oferta total de crédito e 75% das AF respondem pelos restantes 15,4%. É possível observar ainda uma maior concentração em duas modalidades de crédito, quais sejam: Financiamento de Infraestrutura / Desenvolvimento / Projeto e Outros Créditos e em Investimento, respondendo por 49,4% e 44%, respectivamente. Ambas as modalidades respondem por 93,4% do crédito total disponibilizado pelas AF no período.

Na Tabela 4, é apresentada a participação relativa do volume de crédito disponibilizado por cada uma das agências de fomento no período 2012-2020, segundo modalidades de crédito.

Tabela 4
Participação relativa do volume de crédito disponibilizado por agência de fomento no período 2012-2020, segundo modalidades de crédito

Observa-se, de maneira geral, maior concentração da oferta de crédito nas modalidades Financiamento de Infraestrutura / Desenvolvimento / Projeto e Outros Créditos e Investimento. Para 11 AF, essas duas modalidades representam de 76%, como no caso da BA, a 100%, como no caso do RJ, da oferta de crédito. Exceções são os casos de RR, no qual 94% do crédito disponibilizado referese à modalidade Capital de giro, assim como TO e PE, com 74,1% e 63,2%, respectivamente. O caso de GO apresenta uma distribuição mais uniforme entre três modalidades: Financiamento, Investimento e Capital de giro. Também digno de nota é o baixo volume de crédito disponibilizado para a modalidade Rural e agroindustrial. Nesse caso, a BA é o maior ofertante dessa modalidade, representando 20,8% do total. O segundo maior ofertante dessa modalidade é o RS, com 5,9%, seguido por RN, com 4,3%, e SC, com 2,0%.

3.2 Magnitude comparada da oferta de crédito das agências de fomento em relação a outras instituições financeiras

Com a finalidade de proporcionar um parâmetro da representatividade do crédito para pessoa jurídica disponibilizada pelas agências de fomento, apresenta-se, na Tabela 5, o volume de crédito, segundo modalidades selecionadas, disponibilizado por instituições financeiras públicas e sua respectiva participação relativa e acumulada no ano de 2020.

Tabela 5
Volume de crédito disponibilizado por instituições financeiras públicas selecionadas e respectiva participação relativa e acumulada no ano de 2020

Verifica-se que o BNDES, em 2020, respondeu por 40% do volume de crédito disponibilizado para pessoa jurídica nas modalidades selecionadas, seguido pelo Banco do Brasil, com 29,8%, e Caixa, com 23,8%. Juntas, as três instituições financeiras públicas responderam por 93,8% do volume total de crédito disponibilizado no ano de 2020, nas modalidades indicadas. Por sua vez, o conjunto das agências de fomento respondeu por 0,9% do total.

A fim de promover a comparação entre o volume de crédito disponibilizado por instituições financeiras públicas e instituições financeiras privadas para pessoa jurídica, apresenta-se, na Tabela 6, o volume de crédito disponibilizado para pessoa jurídica, distribuído por modalidades de crédito selecionadas, segundo o tipo de controle da instituição financeira para o ano de 2020.

Tabela 6
Volume de crédito disponibilizado para pessoa jurídica por modalidade de crédito por tipo de controle da instituição financeira (2020)

De maneira geral, observa-se que as instituições financeiras privadas, responderam por 49,8% o volume de crédito nas modalidades selecionadas em 2020, enquanto as instituições financeiras úblicas, por 50,2%.

Na Tabela 7, encontra-se a participação dos bancos públicos e das agências de fomento na ferta total de crédito para pessoa jurídica, segundo modalidades selecionadas, para o ano de 2020.

Tabela 7
Volume de crédito disponibilizado para pessoa jurídica por modalidade de crédito por bancos públicos e agências de fomento (2020)

Considerando os dados apresentados pela Tabela 7, tem-se que a participação das AF no volume total de crédito pessoa jurídica, nas modalidades selecionadas, no ano de 2020, foi de 0,9%, conforme dados já apresentados na Tabela 5, com uma tabulação ligeiramente diversa.

3.3 Indicador de Capacidade Potencial de Crédito (ICPC)

Na Tabela 8, é apresentado o Indicador de Capacidade Potencial de Crédito (ICPC) como proxy da capacidade de atendimento (ou de cobertura) das AF em termos de volume de crédito potencial por empresa privada ativa na Unidade da Federação sede da agência de fomento. O ICPC é calculado dividindo-se o valor médio anual do crédito disponibilizado pelas agências de fomento no período 2012-2020 pelo número médio de empresas privadas presentes nas respectivas Unidades da Federação (UF) sede das agências de fomento, no mesmo período. O ICPC proporciona uma ideia da importância relativa da AF, em termos de volume de crédito potencial, caso todas as empresas privadas da respectiva UF tomassem empréstimo.

Tabela 8
Capacidade de atendimento (ou de cobertura) das AF em termos de volume de crédito potencial por empresa privada na UF sede da AF (2012-2020)

Os dados para construção do ICPC foram obtidos junto à base eletrônica de dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), disponibilizada pelo Ministério do Trabalho e Previdência, denominada Sistema DardoWeb (Brasil, 2022). Para tanto, no ambiente de pesquisa do Sistema, na opção de definição de tabelas “Estabelecimento”, selecionou-se a variável “Natureza Jurídica Especial do Estabelecimento” e, em seguida, a categoria “Empresa Privada”, dentre outras sete categorias disponíveis.

Pela análise da Tabela 8, observa-se que cinco AF apresentam a maior oferta potencial de crédito por empresa, iniciando-se pelo RS com, aproximadamente, R$ 8,9 mil, seguido por PR, com R$ 4,6 mil, SC, com R$ 4,4 mil, AM e BA com, aproximadamente, R$ 3,6 mil cada. A menor oferta potencial por empresa refere-se às AF do PI, RR, RN, AL, PE e MT, com valores variando de R$ 115, como no caso do PI, a R$ 288, como no caso do MT. Com valores entre R$ 377 e R$ 1,5 mil, têm-se as AF de TO, AP, RJ, GO e SP. Ou seja, ainda que se considere o maior valor observado (R$ 8,9 mil), o mesmo é, todavia, bastante modesto para fazer frente às necessidades de crédito da maior parte das empresas.

4 Variação do comportamento das agências de fomento no período 2013-2020

Na Tabela 9, é apresentada a variação percentual anual média do volume de crédito disponibilizado pelas AF no período 2013-2020 por modalidade de crédito2. Para o cálculo da variação média anual utilizou-se a mesma fórmula descrita na seção 3. O objetivo da análise dos dados apresentados nesta tabela consiste em identificar variações anuais positivas ou negativas no volume de crédito, disponibilizado, segundo modalidades, pelo conjunto das AF.

Tabela 9
Variação percentual anual média do volume de crédito disponibilizado pelas AF no período 2013-2020 por modalidade de crédito

Iniciando-se a análise pela modalidade Financiamento, que representa 49,4% do total de crédito disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 (cf. Tabelas 2 e 3), observa-se que a maior variação positiva se refere a PE, com 114,1%, sendo que a variação negativa mais expressiva se refere a TO, com uma retração de 59,5%. A variação média observada para a modalidade no período é de 20,8%.

Com relação à modalidade Investimento, que representa 44,0% do total de crédito disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 (cf. Tabelas 2 e 3), verifica-se que a maior variação positiva se refere ao PI, com 1.303,2%, sendo que a variação negativa mais expressiva se refere a RR, com uma retração de 54,8%. A variação média observada para a modalidade no período é de 105,6%.

Por seu turno, para a modalidade Capital de Giro, que representa 2,2 % do total de crédito disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 (cf. Tabelas 2 e 3), verifica-se a maior variação positiva em AL, com 842,5%, sendo que a variação negativa mais expressiva está em AP, com uma retração de 68,1%. A variação média observada para a modalidade no período é de 152,5%.

No que tange à modalidade Rural e Agroindustrial, que representa 4,0% do total de crédito disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 (cf. Tabelas 2 e 3), com apenas cinco AF efetuando operações com essa modalidade, verificam-se apenas retrações, que se situam entre -3,9% a -52,6%. A variação média observada para a modalidade no período é de -20,4%.

No que diz respeito à modalidade Outros Créditos, que representa apenas 0,3% do total de crédito disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 (cf. Tabelas 2 e 3), verifica-se a maior variação positiva no AM, com 17.765,3%, sendo que a variação negativa mais expressiva está em GO, com uma retração de 100%. A variação média observada para a modalidade no período é de 1.595%.

Realizando-se uma análise mais agregada, considerando-se a soma dos volumes de crédito de todas as modalidades referidas, tem-se a maior variação positiva em PE, com 583,7%, enquanto a variação negativa ou retração mais expressiva ocorre no AM, com 15,4%. A variação média observada para o conjunto das modalidades no período é de 57,7%.

Na Tabela 10, é apresentada a comparação entre volume total de recursos disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 e a variação média anual total para a modalidade de crédito Financiamento no período 2013-2020. Os dados apresentados na Tabela 10 cotejam a magnitude das variações percentuais observadas no volume de crédito disponibilizado, elencadas na Tabela 9, com os valores absolutos disponibilizados pela AF, apresentados na Tabela 3.

Tabela 10
Comparação entre volume total de recursos disponibilizado e variação média anual total para a modalidade de crédito Financiamento (2013-2020)

A análise da modalidade de crédito Financiamento, que representa 49,4% do total de crédito disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 (cf. Tabelas 2 e 3), mostra que os maiores crescimentos relativos na oferta dessa modalidade se referem a PE, com 114,1%, seguido por MT, com 75,6%, AL, com 71,8%, e PR, com 44,6%. Ainda que tais índices sejam expressivos em termos relativos, quando a análise se baseia no volume de recursos disponibilizado para a modalidade, conforme dados apresentados na Tabela 10, verifica-se que o montante mais significativo entre essas quatro AF é aportado pelo PR, que ocupa a quinta posição em termos de volume de recursos disponibilizados, destinando R$ 1,6 bilhão no período para Financiamento, representando 5,3% do total da referida modalidade. MT, com um volume bem mais modesto de recursos, comparativamente, ocupa a nona posição em termos de volume de recursos, destinando no período, cerca de R$ 152 milhões ou 0,5% do total da modalidade, seguido por PE, que ocupa a décima posição em termos de volume de recursos, com um aporte de R$ 32,4 milhões, representando 0,1% do total da modalidade. Por sua vez, AL ocupa a décima segunda posição em termos de aporte de recursos, com um total de R$ 24 milhões no período em referência.

As maiores retrações observadas referem-se a TO, com 59,5% no período, seguido por AM, com 27,3%, e pelo RS, com 10,1%. Nesse conjunto de AF, cabe destaque para o RS, que, embora tenha apresentado uma retração de 10,1% em termos absolutos, ou seja, em volume de recursos disponibilizados, mantém posição significativa, na medida em que ocupa a primeira posição nesse quesito, com o aporte de R$ 16,4 bilhões, representando 55,6% do total da modalidade. AM, com um aporte total de R$ 543 milhões, e TO, com R$ 4 milhões, ocupam, respectivamente, a sétima e oitava posições em termos de volume de recursos disponibilizados no período. Em síntese, para o conjunto das AF, o crescimento médio observado para essa modalidade de crédito é de 20,8%.

Na Tabela 11, é apresentada a comparação entre volume total de recursos disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 e a variação média anual total para a modalidade de crédito Investimento no período 2013-2020. Os dados apresentados na Tabela 11 cotejam a magnitude das variações percentuais observadas no volume de crédito disponibilizado, elencadas na Tabela 9, com os valores absolutos disponibilizados pela AF, apresentados na Tabela 3.

Tabela 11
Comparação entre volume total de recursos disponibilizados e variação média anual total para a modalidade de crédito Investimento (2013-2020)

Com relação à modalidade de crédito Investimento, que representa 44% do total de crédito disponibilizado pelas AF no período 2012-2020 (cf. Tabelas 2 e 3), verifica-se que o PI responde pela maior expansão dessa modalidade de crédito no período 2012-2021, com 1.303,2%. Não obstante o expressivo incremento percentual observado, em termos absolutos, ou seja, em volume de recursos propriamente dito, o PI destina, no total, R$ 7,8 milhões para a modalidade em referência, representando somente 0,03% do total da modalidade, ocupando a décima quarta posição. O segundo maior incremento relativo é apresentado por TO, com um aumento médio no período de 168,1%. Em termos de volume de recursos disponibilizado, TO ocupa a décima primeira posição, com um aporte de R$ 18,5 milhões no período, representando 0,07% do total da modalidade, levando-o a ocupar a décima posição. Por sua vez, PE ocupa a terceira posição no que diz respeito ao incremento no período, com 110,5%. Em termos de volume de recursos, PE ocupa a décima primeira posição, sendo responsável pelo aporte de R$ 17,8 milhões ou 0,07% do total da modalidade.

No que tange à retração de crédito na modalidade Investimento, tem-se que a maior retração observada se refere a RR, com 54,8%. Nesse caso, especificamente, cabe observar que RR disponibilizou recursos nessa modalidade apenas nos anos de 2014 e 2015, ainda assim bastante modestos, perfazendo, no total, apenas R$ 8 mil. Por esse motivo, RR ocupa a décima sexta posição em termos de volume de crédito disponibilizado na referida modalidade de crédito. A segunda maior retração refere-se à AL, com 22,1%. Nesse caso, para tal modalidade, há registros de aportes (decrescentes) de recursos apenas nos anos de 2018, 2019 e 2020, fazendo com que AL ocupe a décima quinta posição em termos de volume de recursos disponibilizados, com R$ 4 milhões ou 0,02% do total da modalidade. Em seguida têm-se MT, com a terceira maior retração relativa, com 4,4%. Em termos absolutos, ou seja, em volume de recursos disponibilizados, MT ocupa a décima terceira posição, com o aporte de, aproximadamente, R$ 10,3 milhões, representando 0,04% do total da modalidade. Ainda, com relação à retração, cabe menção a SC, na quarta posição. Embora apresente uma retração relativamente menor do que as anteriores (4,4%), em termos absolutos, ou seja, em volume de recursos disponibilizados, essa retração é significativa, já que, nesse aspecto, SC ocupa a terceira posição, com o aporte de, aproximadamente, R$ 4,5 bilhões, representando 16,9% do total da modalidade. Ou seja, ainda que comparativamente às três outras AF a retração percentual verificada possa ser considerada pouco expressiva, em valores absolutos o decréscimo é bastante significativo. Em síntese, para o conjunto das AF, o crescimento médio observado para essa modalidade de crédito é de 105,6%.

4.1 Análise do comportamento anual anticíclico ou pró-cíclico das agências de fomento no período 2013-2020

Como princípio geral, espera-se que as agências de fomento busquem reduzir as desigualdades regionais, setoriais e sociais a partir do acesso ao crédito, considerando que atuam na lacuna deixada pelas instituições financeiras privadas que disponibilizam crédito para regiões mais desenvolvidas e com menor risco, colocando em segundo plano os projetos de promoção do desenvolvimento regional e seus retornos sociais (Horn; Feil, 2019). Esta seção tem como objetivo avaliar a atuação das AF quanto à oferta de crédito no período 2012-2020 de modo a caracterizar o comportamento dessas instituições como anticíclico ou pró-cíclico. Para tanto, a lógica adjacente adotada considera se a variação no volume de crédito disponibilizado pela AF, em relação ao ano anterior, seguiu tendência oposta ou semelhante ao ciclo econômico do período, representada pela variação percentual (negativa ou positiva) do PIB. De acordo com a análise, se a variação do PIB foi negativa e a variação no volume de crédito disponibilizado pela AF foi positiva, considera-se que o comportamento da AF foi anticíclico. O mesmo critério aplica-se caso a variação do PIB tenha sido positiva e a variação no volume de crédito, negativa. Por sua vez, se a variação do PIB e do volume de crédito disponibilizado pelas AF forem ambas positivas ou ambas negativas, o comportamento das AF pode ser considerado pró-cíclico.

No Quadro 3, tem-se a representação esquemática do comportamento anticíclico ou prócíclico das agências de fomento em função da variação percentual do PIB e da oferta de crédito. As células em vermelho, consoante com a orientação das setas, em sentidos semelhantes, indicam comportamento pró-cíclico da AF e, em verde, consoante com a orientação das setas, em sentidos opostos, comportamento anticíclico.

Quadro 3
Representação do comportamento anticíclico ou pró-cíclico das AF em função da variação percentual do PIB e da oferta de crédito

Na Tabela 12, é apresentada a variação percentual anual do PIB e do volume de recursos para o conjunto das modalidades de crédito selecionadas (financiamento, investimento, capital de giro, rural e agroindustrial e outros créditos) segundo agências de fomento e tipo de comportamento das instituições (pró-cíclico ou anticíclico). Para o cálculo da variação média anual utilizou-se a fórmula 1, conforme segue:

Tabela 12
Variação percentual anual do PIB, do volume de recursos para o conjunto das modalidades de crédito e tipo de comportamento (pró-cíclico ou anticíclico) por AF no período 2013-2020

(1) ( V n V n 1 V n 1 ) × 100 %

Onde:

Vn = valor período atual

Vn-1 = valor período anterior

Para o cálculo da média:

Se valor Vn= zero, considera-se o referido período;

Se valor Vn = NI ou - não é considerado para o cálculo da média

A atualização monetária dos valores para dezembro de 2020, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), seguiu procedimento descrito em IBGE (2022).

Conforme procedimento adotado, as células em verde na Tabela 12 indicam comportamento anticíclico da AF correspondente e as células em vermelho, comportamento pró-cíclico. As células alaranjadas indicam comportamento simétrico das AF correspondentes, as quais apresentaram frequências iguais ao longo da série histórica no tocante ao comportamento anticíclico e pró-cíclico observado. Ou seja, quatro dos oito anos da série apresentaram comportamento pró-cíclico e os demais, anticíclico.

Os dados apresentados na Tabela 12 são analisados segundo duas perspectivas distintas. A primeira delas refere-se à análise desagregada, considerando a variação percentual anual do PIB e da oferta de crédito ano a ano (ou por exercício operacional) por agência de fomento (análise vertical). A síntese dessa análise se encontra na última linha da Tabela 12, que consolida o comportamento predominante do conjunto das AF em cada ano da série histórica. A segunda perspectiva considera a frequência do comportamento predominante observado das AF ao longo da série histórica (análise horizontal). A síntese dessa análise está representada pela última coluna da Tabela 12, que evidencia o comportamento consolidado predominante das AF ao longo da série histórica analisada.

Ambas as perspectivas de análise são realizadas verificando-se o sentido (positivo ou negativo) da variação do PIB entre dois anos consecutivos da série histórica e o respectivo sentido (positivo ou negativo) da variação na oferta do crédito pelas AF, conforme lógica apresentada no Quadro 3. Para facilitar a compreensão do procedimento adotado, a análise vertical é conduzida por meio das colunas da Tabela 12, comparando a variação do PIB com a variação do volume de crédito ofertado por cada AF. Essa perspectiva de análise toma como referência cada ano especificamente, considerado também como exercício operacional, e o respectivo comportamento de cada uma das AF em cada um dos anos da série histórica considerada. Por sua vez, a análise horizontal segue a mesma lógica da análise vertical (verificação do sentido positivo ou negativo da variação do PIB e do sentido positivo ou negativo da variação na oferta do crédito pelas AF), mas desta vez, considerando cada uma das AF em cada ano da série histórica considerada.

Análise vertical: principais evidências

Com o objetivo de facilitar a interpretação dos dados e a análise dos resultados, foram extraídas as linhas 18 a 23, juntamente com os respectivos anos da série histórica, da Tabela 12. Esse procedimento resultou na Tabela 13, que apresenta uma síntese consolidada do comportamento predominante do conjunto das AF em cada ano da série histórica, abrangendo o período de 2013 a 2020.

Tabela 13
Síntese do comportamento do conjunto das agências de fomento em cada ano do período 2013-2020

Para o conjunto das AF, tem-se que, em quatro anos (2017, 2018, 2019 e 2020) da série histórica, a maioria delas, em percentuais variando entre 75%, 66,7% e 62,5% das AF, apresentou comportamento predominantemente anticíclico. Em outros três anos (2014, 2015 e 2016), o comportamento predominante observado foi pró-cíclico, em percentuais variando entre 66,7% e 53,3% das AF. Em apenas um ano (2013), o comportamento foi indefinido, sendo que metade das AF apresentou comportamento pró-cíclico e a outra metade, anticíclico.

Análise horizontal: principais evidências

Com o mesmo objetivo, de facilitar a interpretação dos dados e a análise dos resultados, e de maneira semelhante à anterior, a Tabela 14, que apresenta a síntese do comportamento predominante de cada uma das AF ao longo do período 2013-2020, originou-se da extração das colunas 9 a 13, e respectivas AF, da Tabela 12.

Tabela 14
Síntese do comportamento das agências de fomento por análise de frequência no período 2013-2020

Iniciando a análise pela coluna [c] da Tabela 14, tem-se que oito AF apresentaram comportamento predominantemente anticíclico. São elas de RR, AM, PR, SC, GO, RN, BA e TO. Nesse sentido, a AF de RR apresentou comportamento anticíclico em quatro dos cinco anos com dados disponíveis para a referida AF, representando 80% do período total. A segunda maior frequência de comportamento anticíclico refere-se à AF de AM, PR e TO, as três AF atuando dessa forma em seis anos, distintos entre si, dos oito anos da série histórica considerada, representando 75% do período total. As demais AF, quais sejam, BA, GO, RN e SC apresentaram comportamento anticíclico em cinco anos, distintos entre si, dos oito anos da série histórica em análise, representando 62,5% do período total.

Comportamento predominantemente pró-cíclico ao longo do período em análise foi apresentado por quatro AF, a saber, de AP, AL, PI e PE. Nesse sentido, observa-se que a AF de AL atuou dessa forma em três dos sete anos com dados disponíveis para a referida AF, representando 42,9% do período total. A AF do PI atuou de forma pró-cíclica em cinco anos dos oito anos da série histórica em análise, representando 37,5% do período total. Por sua vez, a AF do AP atuou dessa forma em dois dos seis anos com dados disponíveis para a referida AF, representando 33,3% do período total. Por último, tem-se PE, que atuou de forma pró-cíclica em dois dos oito anos da série histórica em análise, representando 25% do período total.

Observou-se, ademais, comportamento misto da AF, ora pró-cíclico, ora anticíclico. São os casos de quatro AF, a saber, de RS, SP, RJ e MT. Todas elas atuaram com comportamento anticíclico em quatro dos oito anos da série histórica em análise, representando 50% do período total, e com comportamento pró-cíclico nos outros quatro anos da série histórica.

4.2 Análise do cruzamento do comportamento anual (anticíclico ou pró-cíclico) das agências de fomento com o resultado obtido (lucro ou prejuízo) no período 2013-2020

Na Tabela 15 é apresentada uma síntese do comportamento observado das AF ano a ano ou por exercício operacional associado à obtenção de lucro ou acúmulo de prejuízo.

Tabela 15
Síntese da análise do comportamento anual e da obtenção de lucro ou prejuízo das AF

Primeiramente, cabe mencionar a racionalidade empregada para análise da Tabela 15, segundo a qual para o conjunto das 16 AF para o período analisado (2013-2020), compreendendo, portanto, oito anos, tem-se um total de 128 exercícios operacionais distintos (16 AFs x 8 anos cada). Os valores relacionados ao lucro ou prejuízo de cada uma das AF ao longo dos respectivos exercícios anuais foram obtidos junto ao IF.Data, mais especificamente em consulta ao relatório Demonstração de Resultado.

Iniciando-se a análise pelo comportamento anticíclico, constata-se que as AF que apresentaram tal comportamento no período em análise obtiveram lucro nas suas operações em 45 exercícios, representando 66,2% de um total de 68 exercícios em que tal comportamento se verificou, contra prejuízos observados em 23 exercícios, ou 33,8% do total. O lucro total auferido com a atuação anticíclica foi de, aproximadamente, R$ 635 milhões contra prejuízos totais da ordem de R$ 135 milhões. Ou seja, a relação entre lucro obtido e prejuízo foi de 471,1%. Por sua vez, verifica-se que as AF que apresentaram comportamento pró-cíclico no período em análise obtiveram lucro nas suas operações em 36 exercícios, representando 66,7% de um total de 54 exercícios em que tal comportamento se verificou, contra prejuízos observados em 18 exercícios, ou 33,3% do total. O lucro total auferido é de, aproximadamente, R$ 341 milhões contra prejuízos totais da ordem de R$ 109 milhões, representando, cerca de, 32,1% do lucro total do período. A relação entre lucro obtido e prejuízo registrado nesse caso foi de 311,7%. No seu conjunto, as AF, independentemente do comportamento observado, apuraram um lucro de R$ 977,0 milhões, contra um prejuízo de R$ 246,2 milhões. A relação entre prejuízo e lucro é de 25,2% e entre lucro e prejuízo é de 396,9%.

Iniciando-se a análise pelo resultado geral (coluna a), verifica-se que quatro AF responderam por 80,6% do lucro total no período analisado. São elas de PR, com 35,3%, BA, com 16,9%, SC, com 14,4% e SP, com 13,9% do lucro total. As demais 12 AF, responderam por 19,4% do lucro total, com participações variando entre 7,7%, como no caso do RS, e 0,01%, como no caso do PI. No caso de prejuízo, observa-se que duas AF responderam por 72,0% do prejuízo total no período. São elas de RS, que respondeu por 43,4% do prejuízo total do período, seguido por AM, com 28,4%. Outras dez AF, responderam por 28,0% do prejuízo total, com participações que variaram de 8,4%, como no caso de SC, a 0,5%, como no caso do RN. Quatro AF não acusaram prejuízo no período, a saber, as de PR, BA, SP e GO.

Analisando-se o comportamento predominante das AF no período considerado, iniciando-se pela atuação anticíclica (coluna b) associada à obtenção de lucro, observa-se que o PR responde por 39,3% do lucro total, seguido por BA, com 20,2%, e SC, com 13,6%. Juntas, as três AF responderam por 73,2% do lucro total com comportamento anticíclico.

Considerando o comportamento anticíclico com registro de prejuízo, tem-se que três AF responderam por 86,0% do prejuízo total no período. São elas do RS, com 40,3%, seguido por AM, com 30,4%, e SC, com 15,3% do total. As demais oito AF responderam pelos restantes 24,0%, com participações que variaram de 0,1%, como no caso de TO, a 0,9%, como no caso do AP. Seis AF não apresentaram comportamento anticíclico com prejuízo, concomitantemente. São elas do AL, BA, GO, PR, RN e SP.

Com relação ao comportamento pró-cíclico (coluna c) das agências e obtenção de lucro, observa-se que quatro AF responderam por 78,0% do lucro total auferido no período. São elas do PR, respondendo por 28,0%, SP, por 23,2%, SC, por 15,8% e RS, por 11,1%.

Por seu turno, três AF ainda com comportamento pró-cíclico, mas com acúmulo de prejuízo no período em referência responderam por 85,9% do prejuízo total registrado. São elas do RS, respondendo por 48,0%, seguido por AM, respondendo por 29,5%, e PE, por 11,9%. As demais AF (AL, AP, MT, PI, RN, RR e TO) responderam pelos demais 14,1%, com percentuais variando de 0,1%, como no caso de TO, a 6,3%, como no caso do MT. As AF da BA, GO, PR, RJ, SC e SP não apresentaram resultado negativo concomitante à atuação pró-cíclica. As da BA, GO, PR e SP não registraram prejuízo em nenhum exercício operacional da série histórica considerada, seja com atuação anticíclica ou pró-cíclica.

Em síntese, pela análise das Tabelas 15 e 16, pode-se considerar que o comportamento anticíclico das AF se mostrou ainda mais interessante quando se constata a relação entre prejuízo registrado e lucro líquido obtido. No caso do comportamento anticíclico, a relação foi de 21,2%, sendo que para o comportamento anticíclico, essa mesma relação foi em 32,1% (cf. Tabela 15). Analisando-se, ademais, o montante do lucro obtido pelas AF nos exercícios em que apresentaram comportamento anticíclico em relação aos exercícios com comportamento pró-cíclico, tem-se que o lucro foi aproximadamente o dobro, ou seja, R$ 635 milhões contra R$ 341 milhões. Ou seja, o comportamento anticíclico das agências de fomento, além de cumprir o papel institucional a que se propõem, é mais virtuoso em termos de resultados para as próprias AF bem como para a sociedade como um todo.

Tabela 16
Resultado geral, resultado anticíclico e pró-cíclico, por agência de fomento

4.3 Índice de Basileia e Índice de Imobilização

Outros indicadores para o período 2013-2020, tais como o Índice de Basileia e o Índice de Imobilização, denotam a situação favorável das AF. O Índice de Basileia é um conceito internacional, definido pelo Comitê de Basileia, que estabelece uma relação mínima entre o Patrimônio de Referência (PR) e os ativos ponderados pelo Risco (RWA) dos bancos. O valor mínimo exigido pelo

Banco Central para as instituições financeiras, que era de 11% até setembro de 2013, passou, a partir de 2019, para 8% (BCB, 2021, p. 67).

O Índice de Imobilização mede o quanto a instituição tem de seu capital próprio investido em ativos imobilizados. Estes ativos, por apresentarem baixa liquidez, restringem a agilidade do banco para honrar com suas obrigações. Sua interpretação é “quanto menor, melhor”.

Tabela 13 Índices de Basileia e de Imobilização selecionados para AF no período 2013-2020
Índice Maior (%) Menor (%) Média (%) Mediana (%)
Basileia 1.424,50 12,18 109,05 55,47
Imobilização 18,80 0,09 4,66 2,95
  • Fonte: Elaboração dos autores com base em BCB (2022b).
  • Com relação ao Índice de Basileia, o maior valor observado refere-se à AF do MT, no ano de 2013, com surpreendentes 1.424,50%. Já o menor valor foi de 12,18%, no caso da AF de SC, também no ano de 2013. A média observada foi de 19,05% e a mediana, de 55,47%. Considerando-se, exclusivamente, os anos de 2019 e 2020, para os quais o Índice de Basileia mínimo exigido pelo Banco Central, a partir de 2019 (Resolução CMN 4.193, de 1º de março de 2013), é de 8%, o menor valor observado foi de 17,95%, verificado para SP, em 2020. Ou seja, mais do que o dobro exigido pelo Banco Central.

    Por sua vez, para o Índice de Imobilização, o maior valor observado refere-se à AF do MT, com 18,80%, no ano de 2018, e o menor valor, de 0,09%, para a AF do PI, no ano de 2013. A média observada foi de 4,66% e a mediana, de 2,95%. Ou seja, os valores expressos pelo Índice de Basiléia e pelo Índice de Imobilização denotam as condições adequadas de operação, de maneira geral, do conjunto das AF.

    5 Considerações finais

    Este artigo teve como objetivo avaliar a atuação das Agências de Financiamento no período 2013-2020, tomando como referências, além das normas sobre esta atuação, os dados disponibilizados pelo Banco Central do Brasil. Tentou-se organizar tais dados de forma a proceder uma avaliação, ainda que preliminar e geral, acerca da atuação, abrangência e disponibilidade de crédito ofertado pelas AF. A partir desta organização e avaliação, algumas evidências podem ser destacadas.

    Em primeiro lugar, deve-se considerar a distribuição regional dos financiamentos. Pode-se perceber que os estados da região Sudeste apresentam a maior cobertura geográfica das agências de fomento, com a presença em todos os três estados da região. Os estados da região Norte apresentam a segunda maior cobertura relativa, com a presença de agências de fomento em quatro dos sete estados da região, seguido pelos estados do Nordeste, com a presença em cinco dos nove estados da região.

    Em segundo, percebe-se a importância do financiamento para os investimentos em relação a outras modalidades de crédito. As modalidades representadas por financiamento e investimento responderam no período 2012-2020 pela maioria absoluta dos desembolsos das agências de fomento no seu conjunto, representando mais de 93% do total. Em uma escala bem mais modesta de desembolso, encontram-se as modalidades de crédito rural e agroindustrial e capital de giro. De todo modo, cada agência de fomento tem suas peculiaridades em termos de perfil de desembolso em função da realidade regional, podendo variar a participação relativa de cada modalidade na composição da sua carteira de crédito.

    Também foi possível avaliar a abrangência dos financiamentos a partir do Índice de Capacidade Potencial de Crédito (ICPC). O cálculo do ICPC, ainda que simule uma situação hipotética, pode ser útil para demostrar a magnitude da capacidade de oferta de crédito das agências de fomento. Ou seja, ao revelar o relativamente modesto montante potencial de crédito por empresa a ser disponibilizado pelas agências de fomento, evidenciou que essas se constituem, necessariamente, em instrumentos complementares de oferta de crédito produtivo.

    Por fim, procurou-se avaliar a gestão das AF comparando a oferta de crédito nos ciclos econômicos. Ao longo do período 2013-2020, analisando-se o comportamento anual das agências de fomento, observou-se frequência de comportamento anticíclico ligeiramente superior ao comportamento pró-cíclico. Ou seja, em quatro anos da série, destacou-se comportamento predominantemente anticíclico das AF em contraposição a outros três anos com comportamento predominantemente pró-cíclico e um ano com comportamento misto, ora pró, ora anticíclico. Analisando-se o comportamento de cada uma das agências ao longo da série histórica, notou-se que metade das AF apresentou comportamento predominantemente anticíclico. Outra parcela, representando cerca de 25% das AF, expressou comportamento predominantemente pró-cíclico, e outra parcela, também de aproximadamente 25%, teve comportamento misto, ora pró, ora anticíclico. Deve-se destacar que, mesmo com atuação anticíclica, a maioria das AF auferiu lucro. Ademais, os Índices de Basileia e de Imobilização permaneceram em níveis adequados, até com certa margem de folga, denotando o acerto da estratégia das instituições ao fomentarem o acesso ao crédito em períodos recessivos ou, mesmo, retraindo-o, em períodos de retomada (ainda que instáveis e breves), bem como a responsabilidade da gestão das mesmas ao manterem os dois índices em níveis adequados.

    É importante destacar que, apesar do baixo valor dos créditos das AF, elas podem cumprir o papel de auxiliar os gestores públicos na destinação dos recursos principalmente em épocas de recessão e ao mesmo tempo servir de instrumento complementar para o financiamento dos investimentos para micro e pequenas empresas. Nesse sentido, buscou-se evidenciar algumas características das AF, tendo também como objetivo estimular novas pesquisas em relação a este importante instrumento de política pública.

    • (1)
      O Princípio de Pareto afirma que para muitos fenômenos, 80% das consequências advêm de 20% das causas. Ou ainda, que 80% dos resultados são derivados de 20% das causas. O princípio surgiu por uma observação econômica, mas pode ser aplicado para as mais diversas áreas ou assuntos. Vilfredo Pareto, economista italiano, o qual, em 1897 publicou um estudo sobre a distribuição de renda e constatou que a distribuição de riqueza não se dava de maneira uniforme, havendo grande concentração (80%) nas mãos de uma pequena parcela da população (20%).
    • Editor Responsável pela Avaliação Carolina Troncoso Baltar

    Bibliografia

    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Mar 2025
    • Data do Fascículo
      2025

    Histórico

    • Recebido
      07 Out 2022
    • Aceito
      04 Nov 2024
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