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Estratégia de localização bancária: teoria e evidência empírica aplicada ao estado de Minas Gerais

Bank location strategy: theory and empirical evidence applied to the state of Minas Gerais

Resumos

A moeda e os bancos, na abordagem pós-keynesiana, desempenham um papel central na determinação do emprego e produto, notadamente, em nível regional. Em função disso, o artigo tem por objetivo contribuir para a compreensão, tanto da estratégia de localização dos serviços bancários como do padrão de distribuição das agências bancárias no estado de Minas Gerais. Em princípio, havia fortes indícios de que a localização bancária dependia não apenas de fatores econômicos. O modelo desenvolvido e os resultados encontrados na análise econométrica espacial demonstraram que existe certa dependência espacial na estratégia de localização dos bancos, ou seja, os bancos consideram em sua análise a presença ou não de agências nos municípios onde pretendem se localizar. Ademais, o padrão de distribuição das agências no estado de Minas Gerais está sendo explicado também por fatores macroeconômicos, políticos e regulamentares.

Bancos; Localização; Moeda; Econometria espacial; Minas Gerais


Considering the Post Keynesian framework, money is a key element to determine output and employment, both aggregate and at a regional level. This paper aims to contribute to the understanding of both the localization strategy of banking services as well as the distribution pattern of branches in the state of Minas Gerais. There was strong evidence showing that the bank's location does not depend solely on economic issues. Conclusions highlight a spatial dependence in the location strategy of banks. In addition, the location pattern of the branches in the state of Minas Gerais can be explained by macroeconomic, political and regulatory issues.

Banks; Location strategy; Currency; Spatial econometrics; Minas Gerais


Estratégia de localização bancária: teoria e evidência empírica aplicada ao estado de Minas Gerais

Bank location strategy: theory and empirical evidence applied to the state of Minas Gerais

Guilherme Jonas Costa da SilvaI; Frederico G. Jayme Jr.II

IProfessor do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Uberlândia, MG, Brasil. E-mail: guilhermejonas@yahoo.com.br

IIProfessor do Cedeplar (Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais) e do Departamento de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil. E-mail: gonzaga@cedeplar.ufmg.br

RESUMO

A moeda e os bancos, na abordagem pós-keynesiana, desempenham um papel central na determinação do emprego e produto, notadamente, em nível regional. Em função disso, o artigo tem por objetivo contribuir para a compreensão, tanto da estratégia de localização dos serviços bancários como do padrão de distribuição das agências bancárias no estado de Minas Gerais. Em princípio, havia fortes indícios de que a localização bancária dependia não apenas de fatores econômicos. O modelo desenvolvido e os resultados encontrados na análise econométrica espacial demonstraram que existe certa dependência espacial na estratégia de localização dos bancos, ou seja, os bancos consideram em sua análise a presença ou não de agências nos municípios onde pretendem se localizar. Ademais, o padrão de distribuição das agências no estado de Minas Gerais está sendo explicado também por fatores macroeconômicos, políticos e regulamentares.

Palavras-chave: Bancos; Localização; Moeda; Econometria espacial; Minas Gerais.

ABSTRACT

Considering the Post Keynesian framework, money is a key element to determine output and employment, both aggregate and at a regional level. This paper aims to contribute to the understanding of both the localization strategy of banking services as well as the distribution pattern of branches in the state of Minas Gerais. There was strong evidence showing that the bank's location does not depend solely on economic issues. Conclusions highlight a spatial dependence in the location strategy of banks. In addition, the location pattern of the branches in the state of Minas Gerais can be explained by macroeconomic, political and regulatory issues.

Keywords: Banks; Location strategy; Currency; Spatial econometrics; Minas Gerais. JEL C21, G21, R12.

Introdução

A localização bancária é parte importante na estratégia de inserção dos bancos num determinado mercado. A literatura tradicional de competição espacial sustenta a tese de que essa estratégia é crucial para o sucesso dos bancos, em termos de market share e rentabilidade, bem como para a dinâmica econômica da região a qual o mesmo pretende se localizar, em função do papel central da moeda em uma economia capitalista.

O objetivo do presente artigo é contribuir para a compreensão da estratégia de localização dos serviços bancários, tendo como ponto de partida o fato de que a moeda e os bancos exercem papel fundamental na determinação do produto e emprego e, portanto, não pode ser negligenciada a nível regional. A hipótese inicial é que há certa dependência na estratégia de localização bancária, ou seja, o banco observa a presença ou não de agências nos municípios onde pretende se localizar, bem como a existência de concorrentes nos municípios vizinhos. A segunda hipótese que será testada é a de que a localização bancária depende de outros fatores, mais especificamente, dos fatores políticos e regulamentares. Aparentemente, os fatores políticos são fundamentais para a compreensão do padrão locacional das agências bancárias, da própria dinâmica da moeda e da acumulação no espaço. Além disso, acredita-se que os fatores regulamentares sejam importantes para a discussão, pelo fato dos bancos definirem ex-ante uma meta de crescimento do número de agências em uma determinada área geográfica, com base no potencial de retorno esperado da região. As informações sobre o potencial de mercado são obtidas a partir dos dados fornecidos pelos correspondentes bancários.

Recentemente, tem-se observado ainda um processo crescente de concentração das agências bancárias, o que tem causado grande preocupação aos planejadores governamentais, pois acentua o problema da desigualdade regional no país e, em particular, no estado que será objeto de estudo, Minas Gerais.

A última hipótese testada é que, quanto maior a concentração de renda em determinado município ou região, maior será o mercado consumidor potencial e a competição nesse espaço geográfico. Para testar essa hipótese, criam-se dois regimes espaciais, sendo o primeiro correspondente à Região Metropolitana de Belo Horizonte e o segundo às demais regiões do estado de Minas Gerais.

Em função das semelhanças entre a firma industrial e bancária, o artigo se propôs a desenvolver uma teoria e um modelo a partir da literatura tradicional de localização industrial e competição espacial, incluindo a literatura sobre moeda e território, fundamentalmente de inspiração keynesiana e que se dedica à moeda papel fundamental no processo de concentração regional. Com efeito, pretende-se demonstrar que a estratégia locacional dos bancos depende de fatores que afetam diretamente o lucro esperado em cada região ou município.

Para atingir os objetivos e testar as hipóteses lançadas, o artigo está dividido em seis seções, incluindo esta introdução. A primeira seção discute a relevância da moeda no espaço, tendo como base extensa a literatura keynesiana sobre o tema. A segunda seção se incumbe de apresentar os fundamentos teóricos da concorrência em nível espacial, ao passo que a terceira seção apresenta um modelo de competição bancária que será testado para o estado de Minas Gerais. Na quarta seção é desenvolvida a teoria da localização bancária, onde serão definidas as variáveis do modelo, inclusive as exógenas. Na seção seguinte, a metodologia utilizada, a base de dados e os resultados empíricos são discutidos. Por fim, apresentam-se as considerações finais.

1 Moeda e desenvolvimento regional: aspectos teóricos de um debate fundamental 1 1 Este item se beneficiou fortemente de Romero e Jayme Jr. (2012).

A literatura sobre economia regional dá escasso destaque à moeda, sendo os fluxos monetários resultado das diferenças de desenvolvimento entre regiões, e não seus determinantes. Originalmente pensava-se em reproduzir modelos macroeconômicos nacionais em âmbito regional, o que mostrou-se insuficiente, tanto teórica quanto empiricamente. Richardson (1973) e Rodrigues-Fuentes (1998) explicam esta negligência do papel da moeda com três fatores principais: (i) o fato da corrente principal em economia considerar a moeda como neutra no longo prazo, não explicando impactos na economia real em nível regional; (ii) a ausência de instrumentos de política monetária intra-regionais; (iii) e o fato das economias regionais serem extremamente abertas.

Ao tomar a moeda como neutra, mesmo que somente no longo prazo, a corrente principal em economia assume que a renda e o emprego são determinados apenas por variáveis reais. A moeda somente facilitaria as trocas e o ajuste de preços. Os bancos, por exercerem apenas funções de intermediação financeiras, facilitando o contato entre poupadores e investidores, seriam também considerados neutros. Para os novos-keynesianos e autores do "novo consenso", por outro lado, o sistema bancário afetaria as variáveis reais em âmbito regional devido a falhas de mercado, fruto de informação imperfeita ou assimétrica, ou por custos de transação. Para pós-keynesianos, por outro lado, tanto a moeda como os bancos são não neutros, o que os torna parte integrante do processo econômico.

A literatura pós-keynesiana aborda tanto a oferta quanto a demanda de crédito, considerando-as interdependentes e ambas afetadas pela preferência pela liquidez. Com relação aos bancos, a preferência pela liquidez elevada, fruto da incerteza econômica, afeta negativamente sua disposição em ofertar crédito. Pelo lado da demanda, influencia na determinação do portfólio do público através da demanda por ativos mais líquidos, bem como a demanda por crédito. Além disso, ao motivar decisões de portfólio com prazos de vencimento mais curtos, elevada preferência pela liquidez do público acaba reforçando as restrições de crédito, visto que os bancos buscarão ajustar seu passivo e ativo, reduzindo o prazo do crédito concedido.

Utilizando-se de tal referencial, Dow (1982; 1987) desenvolveu modelos nos quais o sistema financeiro, juntamente com o lado real da economia, pôde gerar padrões de desenvolvimento regional desiguais. Ainda que com igual base monetária, quanto mais otimistas fossem as expectativas dos agentes sobre os preços dos ativos na determinada região, algumas economias possuiriam multiplicadores mais elevados. Dessa forma, mais líquidos seriam os mercados locais desses ativos, resultando em maior grau de desenvolvimento financeiro e melhores resultados comerciais.

Devido ao alto risco de default dos empresários na periferia; à mudança da eficiência marginal do investimento (que é afetada pelas maiores taxas de juros e menor montante de crédito disponibilizado); e à maior incerteza quanto à obtenção de renda pelo público, a preferência pela liquidez da região periférica acabaria sendo mais elevada. Em contrapartida, por apresentar menor incerteza econômica e menor volatilidade, a região central mostraria características inversas, quais sejam a baixa preferência pela liquidez e maior dinamismo econômico, com ativos mais líquidos e mais elevado multiplicador bancário.

Por outro lado, aproveitando-se da teoria da causação circular cumulativa de Myrdal (1957), Dow (1987) argumenta que um dos setores da economia central que usufrui de ganhos de escala e de aglomeração é o setor financeiro. Segundo a autora, os ganhos de escala geram concentração espacial dos escritórios financeiros nos centros, dificultando a concessão de crédito na periferia e reduzindo o investimento nessa região em detrimento do centro. Ocorre, assim, uma separação do local do investimento e captação, do local de controle e decisão. Numa região atrasada, uma vez que tanto a oferta quanto a demanda por crédito são baixas devido ao menor desenvolvimento, a escassez de crédito reforça o atraso, criando um ciclo vicioso de causação circular cumulativa.

Por todos esses fatores, é possível que certas configurações de sistema financeiro colaborem para a ampliação das disparidades entre centro e periferia, ao invés de mitigá-las. Bancos nacionais emprestam menos para a periferia, dada sua estrutura econômica e o baixo controle sobre suas filiais. Bancos regionais ou locais, que sejam específicos da periferia, preferem manter maior nível de reservas e restringir os empréstimos, ficando em desvantagem relativa, motivando assim a concentração bancária no centro (Crocco et al., 2006). Por outro lado, o menor prazo dos depósitos na periferia, fruto da maior preferência pela liquidez do público, leva os bancos a diminuir o prazo de seus empréstimos para compatibilizar seu ativo e passivo, disponibilizando menos recursos de longo prazo para a região. Tal quadro dificulta a atividade inovativa, já escassa na região, comprometendo ainda mais o processo de desenvolvimento da mesma. Como grandes bancos privados nacionais e bancos internacionais mantêm pouca ou nenhuma atividade nas regiões mais atrasadas, reforça-se o processo de concentração bancária no centro.

Tal referencial teórico indica que regiões com elevada preferência pela liquidez e baixo acesso bancário poderão sofrer restrições de crédito por parte do sistema bancário, o que dificultaria seu desenvolvimento, gerando assim um ciclo vicioso.

O dinamismo econômico, por aumentar as possibilidades de ganhos para produtores e bancos, diminui o risco de perdas e, assim, influencia diretamente o nível de preferência pela liquidez, motivando elevação na disponibilidade de crédito. Regiões com maior dinamismo apresentam baixa preferência pela liquidez, melhores expectativas para investimento e menores riscos inerentes. Tais fatores fazem com que os bancos possuam menor preferência pela liquidez, o que significa mais crédito a menores taxas e, ainda, maior propensão a empréstimos de longo prazo.

Em uma região periférica, onde a economia é volátil e pouco dinâmica, o aumento da concessão de crédito pode ter impactos profundos sobre seu desempenho econômico. A elevação do investimento fruto do crédito proporciona o aumento da produção, fazendo crescer a economia da região, aumentando o emprego e gerando renda. A maior oferta de moeda e o maior otimismo com as condições econômicas, aos poucos, faz diminuir a preferência pela liquidez do público, elevando-se a opção por ativos menos líquidos e reduzindo a retenção de moeda. Com isso, é beneficiado o financiamento da atividade inovativa. A elevação da demanda agregada, por outro lado, aumenta o otimismo dos produtores quanto à realização dos lucros e incentiva nova rodada de investimento, aumento da produção, emprego e renda. Gradativamente, portanto, cai a incerteza na região, eleva-se o dinamismo e reduz-se a preferência pela liquidez criando, assim, um ciclo virtuoso de causação circular cumulativa (Myrdal, 1957). É acelerado, então, o processo de crescimento.

Neste contexto, em função do papel central da moeda em uma economia capitalista, que: tanto a estratégia de localização dos serviços bancários como do padrão de distribuição das agências bancárias devem ser compreendidas.

2 Localização nos modelos de competição espacial: os fundamentos teóricos e os avanços recentes

Inicialmente, pretende-se aproximar a teoria da localização da firma bancária com a literatura de competição espacial desenvolvida originalmente por Hotelling (1929). A abordagem de Hotelling será de crucial importância para estabelecer o mecanismo pelo qual o processo de decisão de localização das firmas (industrial e bancária) ocorre.

A literatura dos modelos de competição espacial tem sido classificada em duas categorias: os modelos de localização com competição de Bertrand e aqueles com competição de Cournot. Essa literatura parece apropriada para o caso específico do setor bancário por depender fundamentalmente da natureza do produto ou dos serviços financeiros oferecidos pelas firmas. Na teoria da localização industrial parecia haver um consenso de que as firmas competiam em preços, sendo a dispersão a melhor opção para as empresas. O trabalho seminal nessa perspectiva teórica foi desenvolvido por Neven (1987). Entretanto, recentemente alguns trabalhos começaram a apresentar evidências que não ratificaram os resultados dessa literatura. Assim começou a surgir um movimento no sentido de mostrar que a escolha da localização pode se dar num contexto de competição de Cournot (quantidades), já que a tecnologia das firmas de alguns setores era praticamente a mesma.

O trabalho pioneiro foi desenvolvido por Hamilton, Thisse e Weskamp (1989). Os autores analisaram o problema num contexto de competição de Cournot, no qual a estratégia de localização e a escolha das quantidades se dão no modelo da cidade linear.

O debate sobre os modelos de localização num contexto de competição de Bertrand e Cournot durante praticamente toda a década de 1990 era o mesmo, qual seja, sob competição de Bertrand o melhor resultado para as firmas é a dispersão, ao passo que no contexto de competição de Cournot as firmas preferem se aglomerar. Pal (1998) deu um novo fôlego à discussão ao demonstrar que, em equilíbrio, tanto os modelos de competição de Bertrand quanto os de Cournot geraram resultados idênticos em termos de localização, ou seja, as firmas tendem a se localizar equidistantemente uma das outras no círculo unitário de Salop (1979).

Matsushima (2001) contestou este resultado ao generalizar a discussão, o autor demonstrou que o resultado demonstrado por Pal (1998) pode não ocorrer no caso em que se consideram N firmas. Com efeito, o autor diz que metade das firmas se localiza no centro da cidade e uma outra metade tem incentivo a se localizar em algum dos extremos da cidade.

Em 2003, Matsumura e Matsushima introduziram alguns elementos novos e interessantes à discussão da escolha locacional. O modelo considera um duopólio misto – uma firma pública (maximiza bem-estar) e uma privada (maximiza lucro) - com produtos diferenciados2 2 O primeiro trabalho a introduzir o duopólio misto foi desenvolvido por Cremer, Marchand e Thisse (1991), mas o trabalho considerava um mercado de bens homogêneo. . No modelo apresentado pelos autores, a firma privada que maximiza lucro quer se localizar no meio da cidade linear devido à busca pelo market share (efeito market share), bem como deseja se localizar distante do seu oponente para suavizar a competição de preços por razões estratégicas (efeito estratégia). Por outro lado, a firma pública maximizadora de bem-estar quer minimizar os custos de transportes para os consumidores, por isso se localizar a uma distância adequada do seu oponente.

O debate atual tem se voltado para uma cidade mais realista, no plano (x,y). Maldonado, Valverde e Escalona (2005) desenvolveram um modelo de competição (duopólio) de Cournot numa cidade circular bidimensional (Figura 1), com vistas a avaliar os resultados seminais de Hotelling (1929) para uma definição de território econômico ampla e mais realista. Essa cidade consiste de uma circunferência e todos os pontos no interior da cidade, no qual as firmas têm custo zero e a demanda do mercado é simetricamente linear por suposto. Ademais, os custos de transportes são quadráticos no intuito de assegurar a existência de equilíbrio. Para surpresa dos autores, a principal conclusão do artigo foi a de que no jogo localização-quantidade, há um único equilíbrio de Nash no subjogo perfeito, em que ambas as firmas se localizam no centro do círculo. Evidentemente, a localização das firmas no espaço econômico (seja qual for a localização) depende de uma série de fatores que estão implícitos nos modelos, já que cada ponto (x,y) tem um conjunto de informações.


Os modelos de competição espacial aplicados ao setor bancário seguem a mesma linha de raciocínio dos modelos tradicionais de Hotelling. Os principais trabalhos dessa literatura foram os desenvolvidos por Chiappori, Perez-Castrillo e Verdier (1995) e Freixas e Rochet (1997). O raciocínio de construção desses modelos é muito simples, ainda que os cálculos sejam muitas vezes complicados. A idéia é que a localização das firmas concorrentes e o custo de transporte nessa análise são considerados pelo banco, sendo este último diretamente proporcional ao quadrado da distância coberta. Isto porque é uma variável decisiva para o sucesso da estratégia de localização bancária. Geralmente, este custo é atenuado quando há algum tipo de concorrência no setor bancário, seja no volume ou nas condições de empréstimos.

O artigo de Chiappori, Perez-Castrillo e Verdier (1995) é importante pela riqueza de detalhes da atividade financeira. O primeiro aspecto interessante enfatizado é o fato dos bancos competirem via preços (taxa de juros) e não possuírem poder de mercado. Assim, introduz-se o elemento diferenciação de produtos dos bancos para incorporar a abordagem dentro do modelo de Salop (1979) de uma economia circular com as famílias uniformemente distribuídas. O segundo ponto a ser enfatizado no artigo é o fato dos serviços oferecidos por cada banco possuir um alcance diferente. Os bancos coletam depósitos e emprestam a uma parcela da população simultaneamente, sendo as taxas de juros dos depósitos (empréstimos) decisivas nesse processo, ainda que estejam intimamente relacionadas e dependam da regulação governamental do setor bancário. Por fim, uma última particularidade do modelo é a grande ênfase dada ao papel da política monetária (taxa básica de juros), cujos efeitos sobre a quantidade total de crédito ofertada na economia são notórios.

Os resultados observados por Chiappori, Perez-Castrillo e Verdier (1995) mostram que as taxas de juros dos depósitos e dos empréstimos dependem da taxa de juros vigente no mercado interbancário. Assim, perceberam a eficiência de tal ferramenta (sensibilidade da taxa de juros dos empréstimos a taxa básica de juros) nesse processo de transmissão da política monetária. Ademais, o trabalho demonstrou que quanto maior o número de bancos concorrentes, menor será a taxa de juros dos empréstimos. Os autores destacam ainda os ganhos de escala de um aumento no volume de empréstimos, que reduz a taxa de juros cobrada pelos bancos. Como é usual nesses tipos de modelos, o número de firmas, no equilíbrio, é negativamente relacionado aos custos fixos de instalação e positivamente relacionado aos custos de transporte. A interpretação desse resultado é que quanto maiores os custos de transportes, resultado do elevado poder de monopólio de cada banco, mais elevados serão os lucros para um número fixo de bancos, o que gera incentivos adicionais para os bancos entrarem no mercado.

3 Um modelo de localização e competição espacial no setor bancário

A revisão teórica dos modelos de competição espacial surpreendentemente mostrou que os resultados no espaço unidimensional são válidos para uma ampla e mais realista definição de território econômico capturado em espaços bidimensionais (como municípios, estados ou regiões). Assim, sem perda de generalidade, será desenvolvido um modelo espacial unidimensional aplicado ao setor bancário. A estrutura do modelo que será apresentada é uma versão adaptada daquelas já desenvolvidas pela literatura de competição espacial, tal como apresentado por Freixas e Rochet (1997), com alguns elementos introduzidos por Matsumura e Matsushima (2003).

Seguindo Freixas e Rochet (1997), suponha que existam bancos, localizados simetricamente no círculo de Salop. Assuma que é a taxa de juros dos depósitos oferecida por um banco i; é a taxa de juros dos empréstimos oferecida por um banco ; é a taxa de juros dos depósitos oferecida pelos bancos concorrentes (banco ou banco ); e é a taxa de juros dos empréstimos oferecida pelos bancos concorrentes. Os depositantes estão localizados a uma distância do banco e são indiferentes entre e (ou ) se:

(1.1)

onde: é o custo de transação; é a distância em relação aos detentores dos depósitos à vista; são os depósitos à vista; e é o número de bancos.

Similarmente, o tomador de empréstimos a uma distância do banco é indiferente entre e (ou ):

(1.2)

onde: é o custo de transação; é a distância em relação aos tomadores de empréstimos; e é são os empréstimos bancários.

Que dá a seguinte oferta de depósitos e a demanda por empréstimos :

(1.1')

(1.2')

A teoria afirma que os bancos de varejo tenderão a se localizar próximo a regiões mais populosas, já que estes são os potenciais fornecedores de insumos (depósitos à vista - DV) e consumidores do produto (empréstimos bancários - L). Adicionalmente, esses bancos observam os fatores renda e distribuição espacial da renda. Isto posto, pode-se inferir das equações (1.1') e (1.2') que a oferta de depósitos e a demanda por empréstimos têm uma relação significativa com algumas variáveis macroeconômico-espaciais, como o produto da economia, distribuição de renda e a população das regiões3 3 Conforme defendido pela literatura pós-keynesiana. .

Freixas e Rochet (1997) apresentam as diversas variações do modelo de Monti-Klein, desde o modelo de concorrência monopolística, até as versões mais estudadas pela literatura de competição espacial, quais sejam a oligopolista e a de competição perfeita. Por conveniência, apresenta-se apenas a versão oligopolista, já que parece ser uma descrição mais exata do comportamento do setor bancário no Brasil. Nessa versão do modelo, novas hipóteses são sugeridas e outras relaxadas:

· Será relaxada a hipótese de independência dos empréstimos em relação aos depósitos;

· Assume-se a hipótese de que as taxa de juros dos empréstimos (e dos depósitos) não dependem dos volumes de recursos administrados pelos bancos, para evitar uma não-linearidade no modelo;

· Assume-se que o volume total de empréstimos (V) feito pelo sistema bancário, , pode ser igual ao volume total de depósitos (DV), sob certas condições;

· O volume de depósitos depende de fatores macroeconômicos, como renda, distribuição de renda, concentração de renda e população.

Supõe-se, ademais, que a firma bancária tenha um comportamento similar ao de uma firma industrial, tal como apresentado por Matsumura e Matsushima (2003) no modelo de duopólio misto. Nesse caso, os bancos públicos e privados considerariam nas suas análises o custo operacional como uma função do volume de empréstimos e depósitos administrados pelo banco . Além disso, os bancos públicos consideram o custo social da exclusão financeira. A concentração das firmas bancárias tem causado preocupações aos planejadores governamentais, pois provoca agravamento do problema das diferenças regionais, indesejável sob os aspectos político e social.

Para introduzir o custo social dos serviços bancários, inclui-se na função custo do banco a desutilidade representada pela locomoção do cliente para o estabelecimento bancário para que os produtos ou serviços específicos sejam adquiridos. A hipótese que se pretende testar é que, quanto maior a concentração de renda no município ou região em questão, maior é a pressão social para que os bancos públicos abram ao menos uma agência bancária nas regiões financeiramente excluídas. Por outro lado, quanto maior a distribuição de renda no município ou região, menor o lucro esperado pelos bancos e, portanto, menor será o estímulo para que os bancos públicos abram uma agência bancária.

Para desenvolver o modelo, são necessárias algumas hipóteses adicionais, quais sejam: i) o banco (i, ou ) está localizado em ; ii) cada consumidor obtém um excedente igual a quando adquire o produto/serviço do banco (i, ou ); e iii) os consumidores têm demandas unitárias, isto é, cada um consome uma ou nenhuma unidade do produto/serviço do banco (i, ou ). Assim, o custo de vida é dado por que incorre num custo de transporte dado pela expressão .

Do exposto, a nova expressão da função lucro do banco i leva em consideração os fatores exógenos , o lucro operacional e o custo total :

(1.3)

onde:

= fatores exógenos, notadamente, os fatores políticos e regulamentares;

= lucros operacionais;

, sendo o custo social assumido pelo banco5 5 Refere-se ao fato dos bancos, geralmente públicos, abrirem agências em municípios ou regiões com renda média baixa, basicamente para inserir a população local no circuito financeiro. Com isso, reduz-se a onerosa exclusão financeira de parte significativa da população de uma região ou país. e o custos de transação do banco;

= participação do setor público no banco.

No primeiro estágio, um banco escolhe sua localização e o outro escolherá a melhor alternativa após observar seu rival . No segundo estágio, cada banco i escolherá seu preço simultaneamente. Por simplicidade, assume-se também que os bancos têm diferentes localizações. As demandas adicionais da estratégia de localização do banco , , e a demanda do banco 0 ( ou ), , são dadas por:

e (1.4)

Assim, substituindo (1.1') e (1.2') em (1.3), após manipulações algébricas, pode-se demonstrar que se , o lucro esperado pelo banco em será:

(1.5)

Se , o lucro esperado pelo banco em será:

(1.6)

onde: t é uma medida de desigualdade de distribuição de renda na região , , de modo que . Esse índice será um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade de renda (no qual todos têm a mesma renda) e 1 corresponde à completa desigualdade (no qual uma pessoa tem toda a renda). Portanto, quando maior a desigualdade, assume-se que o custo social da inserção do banco naquela região será menor, já que estará cumprindo plenamente a sua função social, ou seja, conceder crédito rural ou micro crédito, por exemplo, a custos reduzidos; é o custo de transporte dos recursos pelos bancos; é o custo de transação dos recursos administrados pelos bancos i em j; o representa a taxa de juros no mercado interbancário (money market rate), determinada exogenamente pelas autoridades monetárias.

O modelo sinaliza que a decisão de localização (ou de entrada) dos bancos em um determinado mercado depende de uma série de fatores que influenciam diretamente o volume de depósitos/empréstimos dos bancos, dentre os quais se destacam: os macroeconômicos (população, renda, concentração de renda e distribuição de renda); estruturais, microeconômicos e espaciais (número de concorrentes, taxas de juros dos depósitos e dos empréstimos, autocorrelação espacial6 6 Este é um termo da econometria espacial, para designar o grau de associação espacial das estratégias locacionais. , etc.); e políticos e regulamentares (contrapartidas dadas pelos municípios e estratégia de crescimento dos bancos). A partir da avaliação do lucro esperado em determinadas regiões, os bancos públicos e privados têm condições de decidir a melhor estratégia naquele momento. Quando o lucro esperado pelo banco i numa determinada região j estiver muito elevado para um número fixo de bancos (n), os executivos concluem que há incentivos a entrada do banco (abertura de uma agência) naquele mercado, dependendo da estratégia de expansão e de competição traçada pelos mesmos7 7 Por conveniência metodológica, optou-se por apresentar separadamente o modelo matemático da teoria da localização bancária. .

4 A nova teoria da localização bancária

Essa seção pretende redefinir a teoria da localização bancária a partir da literatura competição espacial e da tradicional teoria da localização industrial [Losch (1954); North (1955); Isard (1956); Christaller (1966), Leme (1982), entre outros]. Mais especificamente, pretende-se adaptar essas teorias com vistas a definir alguns critérios que contribuam para a compreensão da estratégia de localização dos serviços bancários numa determinada região. A construção teórica que se pretende desenvolver é possível porque a teoria da localização industrial é bastante geral e facilmente aplicável ao caso da firma bancária. Obtendo-se os dados existentes do perfil dos clientes do próprio banco, combinado com as informações do mercado local, é possível modelar o potencial de retorno sócio-econômico da abertura de um banco (ou uma nova agência). Com as variáveis espaciais, econômicas e demográficas apropriadas, as informações sobre o volume (e o tempo) de movimentação, além de uma análise cuidadosa da competitividade do setor, torna-se possível: i) alcançar os melhores clientes; ii) desviar o negócio de seus concorrentes; e iii) descobrir novos (e mais rentáveis) mercados.

A partir do trabalho de Leme (1982), pode-se extrair alguns aspectos relevantes para a teoria proposta neste trabalho e avançar em outros ainda não debatidos pela literatura, como o papel dos fatores espaciais, políticos e regulamentares. Em princípio, o conjunto de fatores que concorrem para explicar a estratégia locacional ótima dos serviços bancários são os fatores espaciais (estruturais ou microeconômicos); os fatores macroeconômicos; os fatores regulamentares e políticos.

4.1 Fatores microeconômicos-espaciais

Definem-se tradicionalmente os fatores espaciais como aqueles relacionados ao mercado em que se pretende atuar, por isso também são conhecidos como fatores microeconômico-espaciais. A análise desses fatores está fundamentada no trabalho desenvolvido por Leme (1982). Esses fatores dizem respeito às condições de mercado e podem ser sumarizados nas condições de oferta e demanda dos produtos e serviços que os bancos pretendem oferecer. Assim, de acordo com essa definição, os bancos devem avaliar criteriosamente os fatores, que estão discriminados a seguir:

· Quantas agências bancárias existem nesse mercado e se os seus preços e produtos são competitivos;

· Informações dos clientes locais [o perfil (quem são), as maiores demandas (onde estão), número de contas correntes, volume de depósitos e aplicações, etc. (área e dimensão do mercado)];

· Identificação das inovações mais exigidas pelos clientes no produto e no processo (Quais produtos e serviços o mercado demanda e em que quantidade).

4.2 Fatores macroeconômicos

O contexto macro-regional no qual o banco pretende se inserir é parte fundamental da estratégia, visto que estes influenciam diretamente a demanda esperada naquele mercado. Martin (1999) apresenta uma tese simples, qual seja, a de que as firmas bancárias, que oferecem os serviços financeiros básicos, tendem a se localizar próximo aos potenciais detentores de poupança (população). Sicsú e Crocco (2006) apresentaram outros fatores macroeconômicos que podem explicar a estratégia de localização das agências bancárias, quais sejam os fatores renda e distribuição de renda. A importância da renda se deve à possibilidade de captar um maior volume de insumo e vender uma quantidade maior de produto nas regiões onde o tamanho da renda é maior. A distribuição espacial da renda pode incentivar a abertura de um maior número de agências, com o intuito de capturar um maior número de clientes. Isto posto, pode-se afirmar que os fatores macroeconômicos principais são: população, renda e distribuição de renda.

4.3 Fatores políticos e regulamentares

Para finalizar apresentam-se os fatores exógenos que determinam a estratégia de localização dos bancos, notadamente, os fatores políticos e regulamentares8 8 Inspirado em Leme (1982). . Os fatores regulamentares serão definidos como a estratégia do banco referente ao número de agências bancárias que cada região receberá em um determinado período.

Os fatores políticos podem ser compreendidos como sendo as contrapartidas políticas dadas pelos governos municipais, ou pelas empresas privadas, que influenciam a decisão locacional dos bancos, como a folha de pagamento das instituições públicas ou privadas. Esses fatores podem explicar o padrão de distribuição das agências bancárias, ou a ausência deste, num determinado espaço geográfico (município, estado ou região). Apesar da avaliação bancária ser necessária, no que diz respeito aos retornos esperados com os serviços (ou produtos) bancários oferecidos e da clientela gerada, dependendo da relação entre o banco e o representante local, seja do setor público ou privado, pode ocorrer de uma unidade da federação (município, microrregião, macrorregião, estado) economicamente pouco atrativa ser agraciada com a abertura de agências bancárias em função da contrapartida dada:

· A folha de pagamento da entidade (ou empresa) pública ou privada;

· A folha de pagamento dos servidores públicos municipais;

· Oficialização do banco como agente arrecadador dos tributos municipais.

Empiricamente, este ponto parece ser ainda mais relevante para explicar um determinado padrão de distribuição das agências bancárias em um determinado local ou região.

Aparentemente, os fatores políticos e regulamentares estão relacionados, já que os bancos observam a compatibilidade de suas estratégias internas com as demandas políticas locais. Estas se referem à estratégia de expansão e competição implementadas pelos mesmos. Assim, avaliam-se os fatores internos que estão sumarizados a seguir:

· Estratégia competitiva: geralmente fundamentada nas inovações tecnológicas do banco, mostra a maior ou menor agressividade das políticas internas do banco. A decisão a ser definida é se o banco deseja entrar num mercado para competir, com o intuito de ganhar market share, ou se reforça sua estratégia nos municípios, estados ou regiões em que já está inserido;

· Estratégia orgânica: pode ser de duas formas, expansão orgânica, que define a estratégia (ex-ante) de abertura de novas agências ou a expansão através de fusões e aquisições.

Apesar da recente onda de fusões e aquisições no Brasil e no mundo que torna atraente o debate em torno dessa estratégia de localização bancária, optou-se no presente artigo por discutir teórica e empiricamente apenas a estratégia orgânica de expansão dos serviços bancários, sendo nesse caso a dimensão municipal a unidade escolhida para a análise e a econométrica espacial com a metodologia mais apropriada9 9 Os testes econométricos realizados nas seções seguintes demonstram que há alguma dependência espacial e heterogeneidade espacial nos dados, justificando essa metodologia empírica. . Adicionalmente, pretende-se definir critérios objetivos que justifiquem a abertura das agências, ou seja, que possibilite uma avaliação econométrica e sinalize os principais determinantes da estratégia atual de localização bancária no espaço geográfico em consideração, uma vez que, do ponto de vista logístico, pode haver restrições importantes em alguns locais ou regiões.

O argumento implícito nesse trabalho é o de que as políticas bancárias podem seguir um caminho distinto, e muitas vezes arbitrário, quando os executivos dos bancos definem as estratégias de curto e de longo prazo. Quando a estratégia de longo prazo é escolhida, o banco tende a se localizar em municípios com potencial de retornos futuros ou nos locais onde a presença do banco é forte, esperando que no futuro o município crescerá e gerará retornos significativos. Caso os executivos decidam por adotar uma estratégia de curto prazo, em função de inovações financeiras do seu banco (inovações tecnológicas, novos produtos e formas de ofertá-los), estes tendem a se localizar onde há maior concorrência, cuja rentabilidade de curto prazo é relativamente mais elevada.

Em suma, esses fatores políticos e regulamentares são fundamentais para explicar a exclusão financeira de vários municípios num determinado estado ou mesmo a inserção de alguns bancos nas economias que não são consideradas financeiramente interessantes para os bancos.

Como é pressuposto que a expansão das agências bancárias no Brasil segue a estratégia de crescimento orgânico para atender as demandas locais, acredita-se que os correspondentes bancários (correios, casas lotéricas, farmácias, supermercados, etc) sejam fundamentais para a compreensão dessa estratégia locacional, ao disponibilizar as informações necessárias para os bancos tomarem corretamente suas decisões.

5 Metodologia base de dados e resultados

A econometria espacial, tal como definida por Anselin (1988), é "uma coleção de técnicas que trata das peculiaridades causadas pelo espaço na análise estatística dos modelos regionais". Assim, pretende-se nesse artigo trabalhar empiricamente esses aspectos nos modelos de localização bancária, já que omitir ou desconsiderar esses problemas pode causar viés, ineficiência e inconsistência dos estimadores.

5.1 Metodologia

O pressuposto básico da análise do padrão locacional das agências bancárias é que existe uma natureza multidirecional do padrão de interação, que produz efeitos espaciais. A Econometria Espacial surge como uma forma de controlar os efeitos espaciais: i) heterogeneidade espacial; e ii) autocorrelação (dependência) espacial.

No tocante ao problema da heterogeneidade espacial, Anselin (1988) argumenta que esta se manifesta quando ocorre instabilidade estrutural no espaço, fazendo com que haja diferentes respostas, dependendo da localidade espacial. A conseqüência é a possibilidade de provocar a instabilidade estrutural sobre os resultados da regressão, causando a perda da eficiência e, em alguns casos, estimativas viesadas e inconsistentes.

A heterogeneidade espacial se refere ao fato dos coeficientes e da variância dos erros serem significativamente diferentes no espaço, o que diz respeito a aspectos da estrutura socioeconômica no espaço e as diferentes respostas dos bancos, dependendo da sua localização. Este problema fica visível quando se observa: coeficientes variáveis (mudança estrutural); variância não constante (heterocedasticidade); e as formas funcionais diferentes para determinados subconjuntos de dados. No tocante à mudança estrutural (heterogeneidade nos coeficientes), trata-se o problema geralmente com inclusão de dummies regionais ou pelo método de expansão (coordenadas como variáveis de expansão).

Segundo Almeida (2004) a dependência espacial significa que o valor de uma variável de interesse numa certa região depende do valor dessa variável nas regiões vizinhas j. Assim, a dependência espacial é uma nova variável calculada através da média ponderada dos vizinhos (os elementos da matriz de pesos que não são zero). Esta variável pode ser incorporada na forma de defasagem espacial na variável dependente (forma ), nas variáveis explicativas (forma ) ou na forma de dependência espacial do termo de erro (forma ε).

A dependência espacial será estimada e testada por intermédio do conceito de autocorrelação espacial. O indicador de autocorrelação espacial é a forma estimável da dependência espacial e pode ser calculada por meio do Indicador de Moran (I de Moran ou Moran's I)10 10 Segundo Le Gallo e Ertur (2003) um valor para Iit positivo indica um cluster de valores similares ( high-high ou low-low), caso contrário, um valor negativo indica um cluster de valores dissimilares ( high-low ou low-high). Intuitivamente, a autocorrelação espacial positiva indica que municípios com elevado PIB são vizinhos de outros que também apresentam PIB elevado, esse cluster é denominado high-high. Caso os municípios com baixo PIB sejam vizinhos de municípios que apresentam PIB baixo (ou low-low), a autocorrelação também é dita positiva. Quando os municípios com elevado PIB são vizinhos de outros que apresentam PIB baixo, denomina-se no mapa como high-low), e a autocorrelação é dita negativa. Caso contrário, se os municípios com baixo PIB são vizinhos de municípios que apresentam PIB alto, esse cluster é denominado low-high, novamente a autocorrelação é negativa. . Formalmente, pode ser expressa pela fórmula da covariância:

para (1.12)

onde: e são os valores das observações locais e é a esperança matemática. Intuitivamente, o que se pretende com a análise do indicador de Moran é comparar os valores de na localidade com a média de nas localidades vizinhas:

· e similares = autocorrelação espacial positiva (High-High, Low-Low).

· e dissimilares = autocorrelação espacial negativa (High-Low, Low-High).

Para visualizar a existência de associação linear utiliza-se os Mapas de Autocorrelação Espacial (Moran Scatterplot Map). O Mapa Moran Scatterplot é resultado de uma regressão da defasagem espacial da variável em questão sobre os valores desta variável. A inclinação desta regressão corresponde ao valor do I de Moran e fornece o grau de autocorrelação espacial, ou seja, mostra como em média os valores de determinada variável se relacionam aos valores desta variável na vizinhança.

O Indicador Local de Associação Espacial (LISA = Local Indicators of Spatial Association) é a estatística utilizada para testar a hipótese nula de ausência de associação espacial local. A significância deste indicador para uma variável qualquer no período em consideração, significa dizer que há um cluster persistente a este nível de significância que deve receber maior atenção11 11 O cluster pode ser entendido nessa análise como uma concentração de valores similares em municípios relacionadas entre si numa determinada área geográfica e no qual o LISA é significativo. .

Anselin (1995) sugere que, o Indicador Local de Associação Espacial será qualquer estatística que satisfaça duas exigências:

· Um indicador dá, para cada observação, uma indicação da significância dos clusters espaciais de valores similares em torno das observações de um município ou região;

· O somatório dos LISA's, para todas as observações de um município ou região, é proporcional ao indicador de autocorrelação espacial global.

Formalmente, segundo Le Gallo e Erthur (2003), a estatística local do I de Moran para cada região e ano pode ser apresentada da seguinte forma:

com (1.13)

onde: é a observação de uma variável de interesse na região para o ano ; é a média das observações entre as regiões no ano para a qual a somatória em relação é tal que somente os valores dos vizinhos de são incluídos.

A estatística LISA pode ser interpretada da seguinte forma: valores positivos de significam que existem clusters espaciais com valores similares entre as regiões e seus vizinhos (high-high ou low-low); valores negativos significam que existem clusters espaciais com valores diferentes (high-low ou low-high)12 12 Perobelli, Faria e Ferreira (2006). .

5.2 Análise exploratória e base de dados

A análise exploratória de dados espaciais (AEDE) trata diretamente de efeitos decorrentes da dependência espacial e heterogeneidade espacial. Em outras palavras, o objetivo deste método é descrever a distribuição espacial, analisar os padrões de associação espacial (clusters espaciais), verificar a existência de diferentes regimes espaciais ou outras formas de instabilidade espacial (não-estacionariedade), além de possibilitar identificar observações atípicas (i.e. outliers).

Os dados referentes às movimentações financeiras do setor bancário foram obtidos junto ao LEMTe (Laboratório de Estudos sobre Moeda e Território do Cedeplar/UFMG), tais como: depósitos, empréstimos, poupança, aplicações e ordens de pagamento. As demais variáveis, foram extraídas dos Correios e do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (Ipea).

A Unidade da Federação objeto de análise será Minas Gerais e o período estudado refere-se apenas ao ano de 2000 em função da indisponibilidade de algumas informações extraídas do Ipeadata que são fundamentais para o estudo, tais como número de agências bancárias, aplicações bancárias, depósitos bancários do setor privado e depósitos bancários do setor público. No entanto, acredita-se que para o modelo em questão, o fato dos dados não estarem atualizados não chega a ser um grande problema, já que incorporam o período da reestruturação do setor ocorrida na década de 1990.

As informações do setor bancário no estado de Minas Gerais em 2000 mostraram que havia 1.761 agências, sendo 320 delas localizadas na capital do estado, empregando mais de 15 mil funcionários qualificados. As cidades da região metropolitana, Contagem e Betim, possuem 41 e 14 agências, respectivamente. As cidades de Juiz de Fora e Uberlândia possuem juntas quase 100 agências bancárias. Ipatinga e Governador Valadares também possuem quantidade significativa de agências. Dado que a média de agências bancárias nos municípios do Estado de Minas Gerais foi de 2,06 e o desvio padrão de 11,43, é possível concluir de imediato que há uma elevada desigualdade na distribuição dos serviços bancários. Ademais, pode-se concluir que os municípios da região metropolitana de Belo Horizonte e do Triângulo Mineiro possuem a maior concentração de agências bancárias no Estado, o que aumenta o potencial de crescimento dessas regiões.

Observe na Figura 2 que, mais da metade dos municípios do Estado não possuem agências bancárias, apesar de terem outros canais de pagamentos, como no caso dos correspondentes bancários (por exemplo, correios, casas lotéricas, etc). Entretanto, tomando-se o Banco Postal (Correios) como uma boa proxy para correspondentes bancários, mesmo assim quase 18 % dos municípios do Estado não possuíam agências ou correspondentes bancários em 200013 13 Segundo o BCB (2008), o Banco Postal (Serviço Financeiro Postal Especial) caracteriza-se pela utilização da rede de atendimento da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, para a prestação de serviços bancários básicos, em todo o território nacional. Os Correios atuam como correspondente da instituição financeira contratante. . O padrão de distribuição das agências bancárias de alguma forma segue o comportamento das principais variáveis consideradas na literatura. As Figuras 3 e 4 mostram a distribuição da população e do PIB no estado de Minas Gerais. Note que a Região Metropolitana e do Triângulo Mineiro em alguma medida se destacaram, assim como ocorreu na distribuição das agências bancárias, o que não significa dizer que existe alguma correlação positiva entre as variáveis.




Desde já, alguns resultados podem ser observados nas figuras supracitadas. O primeiro é que a maioria dos municípios financeiramente excluídos possui população não superior a 20.000 habitantes, sinalizando um ponto de corte na estratégia dos bancos. O mesmo se observa com os municípios com PIB inferior a R$ 50 milhões. Apesar de não haver um padrão claro de localização dos serviços bancários pretende-se, com base em critérios geocomparativos (econômicos, espaciais, políticos e regulamentares), fazer uma análise da rentabilidade esperada e do potencial do setor bancário em cada município14 14 A dificuldade de modelar todas as variáveis torna o processo decisório difícil e caro. Por isso, muitas vezes a decisão é tomada, não por critérios técnicos e objetivos, mas pela diretoria do banco com base nas informações disponíveis e em critérios arbitrários. .

As Figuras 6 e 7 apresentam a distribuição espacial dos depósitos bancários públicos e privados, já que parecem ser um bom indicador da importância dos fatores político-regulamentares na decisão locacional das agências bancárias. Nota-se que os municípios com maior número de agências tendem a receber volumes cada vez maiores de recursos, através de depósitos públicos e privados, principalmente porque os bancos passariam a receber recursos, não apenas do próprio município, mas também dos seus vizinhos imediatos que não possuem agências bancárias.



A conclusão preliminar é que a ausência de um padrão claro de distribuição das agências no estado de Minas Gerais pode ser resultado de fatores nunca antes trabalhados pela literatura, como os políticos e os regulamentares. O primeiro desses fatores refere-se às contrapartidas dadas aos bancos pelo setor privado e público, a fim de estimular a abertura de agências bancárias. Os fatores regulamentares, como explicados anteriormente, definem o número de agências bancárias que cada região receberá em um determinado período. Assim, torna-se imprescindível discutir um pouco mais o papel desses fatores na estratégia de localização bancária. Ademais, pode-se averiguar a importância das informações disponibilizadas pelos correspondentes bancários aos bancos. Mais especificamente, quanto maior o potencial do mercado, observado a partir dos dados dos correspondentes bancários, maior será o interesse e o número de agências necessárias para atender a demanda política da região.

5.3 Resultados15 15 Os testes apresentados foram realizados no SpaceStat e visualizados no ArcView GIS 3.2.

Nesta seção, serão apresentadas as estatísticas descritivas (Tabela 2) e na seqüência as estimações propriamente ditas. O Teste de Autocorrelação Espacial Global (I de Moran) é fundamental para uma boa análise exploratória dos dados e sinalizou que a maioria das variáveis estão espacialmente autocorrelacionadas (ver Tabela 3). As exceções foram as variáveis diretamente dependentes da presença do setor bancário para sua efetivação, quais sejam: depósitos à vista dos governos, depósitos à vista do setor privado, poupança, aplicações financeiras e ordens de pagamento.

Para evitar uma análise comparativa exaustiva dos Mapas de Autocorrelação Espacial (Moran Scatterplot Map) de todas as variáveis consideradas no estudo, optou-se por avaliar apenas o mapa da variável de interesse (Bancos – B00). O Mapa de Autocorrelação Espacial é uma regressão da lag espacial da variável em questão sobre os valores desta variável . A inclinação desta regressão corresponde ao valor do I de Moran e fornece o grau de autocorrelação espacial, ou seja, mostra como em média os valores de determinada variável se relacionam aos valores desta variável na vizinhança.

A Figura 8 revela que o padrão alto-baixo prevaleceu em praticamente todo o estado de Minas Gerais, demonstrando que os municípios pequenos que não possuem agências bancárias se beneficiam dos municípios vizinhos que as possuem para realizar as operações bancárias de rotina. O padrão baixo-baixo também se destacou, principalmente no norte do Estado, ou seja, municípios com poucos ou nenhum banco geralmente têm em sua vizinhança municípios nas mesmas condições de exclusão financeira. Por fim, nota-se ainda que o padrão alto-alto prevaleceu na Região Metropolitana de Belo Horizonte e no Triângulo Mineiro.


A Figura 9 apresenta o Indicador Local de Associação Espacial (LISA) para o Estado de Minas Gerais, que indicou significância apenas nos municípios da Região Metropolitana. Observe que há também um cluster persistente na região do Triângulo Mineiro a este nível de significância que deve receber maior atenção.


As Figuras 10 e 12 apresentam os Mapas de Autocorrelação Espacial das variáveis: depósito à vista do setor público e depósito à vista do setor privado, respectivamente. Os resultados indicam um padrão muito semelhante de associação dessas variáveis selecionadas, ou seja, mostra que prevalece a autocorrelação positiva no estado de Minas Gerais, ou seja, os valores dessas variáveis na maior parte dos municípios do estado se relacionam de forma positiva com os valores desta variável na vizinhança.



O Indicador Local de Associação Espacial (LISA) para as mesmas variáveis, estão apresentado nas Figuras 11 e 13 , demonstram que há uma significância elevada (1%) na Região Metropolitana de Belo Horizonte, o que implica em dizer que há um clusters importante a este nível de significância. No caso das outras grandes regiões do Estado, os resultados divergem, ainda que para a maior parte do estado, a hipótese nula de ausência de associação espacial local não tenha sido rejeitada.

O modelo MQO Espacial sinalizou que praticamente todas as variáveis foram estatisticamente significativas, com exceção dos depósitos à vista dos governos. Entretanto, o depósito à vista realizado pelas empresas privadas foram estatisticamente significativos, demonstrando que, no estado de Minas Gerais, a estratégia de localização dos bancos tem caminhado no sentido de atender principalmente as demandas do setor privado. O nível de renda e o tamanho da população no município foram significativos e, como se supunha, os correspondentes bancários ajudam no processo decisório dos bancos.

Note ainda que a distribuição de renda (que na verdade é 1 menos o coeficiente de Gini, conforme especificado pelo modelo matemático) apresentou coeficiente negativo, demonstrando que uma parcela dos bancos, particularmente os bancos públicos, são utilizados pelos governos para atenuar a exclusão financeira de alguns municípios, o que aparentemente reduz os lucros esperados dos mesmos. Com respeito aos testes realizados, note que o teste Jarque-Bera de normalidade dos erros rejeitou a hipótese nula de que os erros apresentam distribuição normal. Contudo, a amostra é elevada e os coeficientes foram altamente significativos, o que demonstra que os efeitos da não normalidade dos erros não comprometeram os resultados. Os testes de Koenker-Bassett e White para detectar heteroscedasticidade nos erros indicaram que existe esse problema, controlado endogenamente através das especificações apropriadas.

As evidências observadas também são contundentes, o modelo tem algum problema de dependência espacial. O diagnóstico para dependência espacial nos indica que existe um problema de autocorrelação espacial do tipo erro e do tipo lag. Para o artigo, esse resultado é prova de que a econometria tradicional resultaria em conclusões equivocadas, devido principalmente ao viés de omissão. Assim, reforça-se a tese do uso da econometria espacial como método mais apropriado. Essa conclusão da dependência espacial foi extraída das estatísticas de testes supracitadas.

Como os resultados demonstraram que há dependência espacial, endogeneidade e heterocedasticidade, estimou-se o modelo SAR IV (2SLS) com correção do problema da heterocedasticidade16 16 Para fazer a regressão espacial supracitada, deve-se estimar no SpaceStat o modelo de regressão lag espacial com mudança estrutural, definindo-se SAR IV (2SLS) como o mais apropriado, estimando-o com regime espacial (sendo este definido pela dummy DRMBH). Com efeito, controla-se também o viés na amostra proveniente da Mesoregião Metropolitana de Belo Horizonte. . Os resultados observados nessa regressão são esclarecedores. Inicialmente, observe que a variável defasada espacialmente (W_B00) foi significativa e o valor do coeficiente igual a - 0,016, ou seja, a presença de bancos nos vizinhos imediatos afeta negativamente a decisão dos bancos a ingressarem no mercado municipal em questão. No tocante aos correspondentes bancários (CB00), nota-se que foram significativos apenas nos municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte, indicando que os mesmos são importantes na estratégia de localização dos municípios maiores (CB00_1), provavelmente no fornecimento de informações de movimentação bancária e demandas locais reprimidas.

A hipótese de que a distribuição de renda (DIST00) afeta a estratégia de localização também apresentou significância estatística e com o sinal esperado (qual seja, negativo) ratificando a hipótese de que este pode estar representando um custo adicional aos bancos públicos. No tocante às contrapartidas governamentais (DVGOV00_0), aparentemente são importantes apenas para os municípios menores, mostrando que os fatores políticos devem receber uma maior atenção nos estudos que visam entender a estratégia de localização bancária e avaliar o padrão de distribuição das agências bancárias em um determinado estado. Entretanto, os depósitos bancários do setor privado foram significativos para ambas as categorias de municípios, demonstrando que a iniciativa privada tem algum poder de barganha na estratégia locacional dos bancos.

Como esperado, a população (POP00) é uma variável estratégica na avaliação dos executivos do setor bancário, sendo o coeficiente positivo e significativo a 1% para ambas as categorias analisadas. O coeficiente da renda (RENDA00) também foi significativo para os dois casos a 1%. Estes resultados novamente confirmam as hipóteses de Martin (1999), Crocco e Sicsú (2006), respectivamente. Ademais, os resultados das estimações demonstraram que os municípios mineiros localizados dentro e fora da Região Metropolitana devem ser avaliados separadamente, pois têm probabilidades diferentes de serem agraciadas pela abertura de (novas) agências bancárias.

Apesar dos resultados observados na regressão com regime espacial indicar a significância da maioria dos coeficientes, note que quase todos os coeficientes são estáveis pelos testes de instabilidade estrutural apresentados na seqüência, o que indicaria não haver necessidade de incluir a quebra estrutural no modelo. Contudo, optou-se por deixar a quebra estrutural (Mesoregião "Metropolitana de Belo Horizonte") na certeza de que em nada prejudicaria a análise e, principalmente, pelo fato do modelo estimado ter apresentado resultados significativamente melhores.

Para finalizar, estima-se o seguinte modelo de regressão: , com o intuito de saber se o modelo está ou não viesado. Para tanto, deve-se criar w_erro, que é a matriz de peso dos resíduos. Em seguida, extraem-se os resíduos e estima-se a regressão via OLS Espacial, cujo valor foi 0,2244 e o coeficiente mostrou-se significativo, permitindo inferir que o modelo não está viesado.

À guisa de conclusão, o trabalho discutiu a importância central da moeda e dos bancos na determinação do emprego e produto, notadamente, em nível regional. Em função disso, a compreensão tanto da estratégia de localização dos serviços bancários como do padrão de distribuição das agências bancárias no espaço tornam-se necessárias. A análise empírica demonstrou que os correspondentes bancários mostraram-se importantes na estratégia de localização dos municípios maiores (CB00_1), sinalizando os locais com demandas reprimidas. No tocante às contrapartidas governamentais (DVGOV00_0) são fundamentais para os municípios menores, demonstrando que os fatores políticos devem receber uma maior atenção nos estudos que visam entender o padrão de distribuição das agências bancárias e avaliar políticas de inserção financeira no estado, já que a presença destes parece ser fundamental para o crescimento dos municípios menores. Note ainda que os depósitos bancários do setor privado foram significativos para ambas as categorias de municípios, demonstrando que estes têm algum poder de barganha na estratégia locacional dos bancos. Ademais, a população (POP00) e a renda (RENDA00) foram significativos para ambos os regimes espaciais, indicando que devem ser analisados separadamente, e mais, a presença de bancos nos municípios vizinhos afeta negativamente a decisão locacional dos bancos.

Considerações finais

A proposta desse trabalho foi avançar na discussão sobre a teoria da localização bancária. Inspirado em Leme (1982), pode-se lançar mão de alguns aspectos relevantes para a teoria proposta e avançar em outros ainda não debatidos em profundidade pela literatura, como os fatores espaciais, políticos e regulamentares. Neste contexto, o papel da moeda na abordagem pós-keynesiana é fundamental. Esta corrente de pensamento econômico tem a moeda como a variável central no funcionamento de uma economia capitalista, sendo capaz de influenciar o ritmo de atividade econômica, tanto no curto quanto no longo-prazo. Ao possuírem a característica de reserva de valor, a moeda e seus substitutos mais imediatos, os ativos financeiros, funcionariam como mecanismo de preservação da riqueza em tempos de incerteza, muito superior aos ativos reais, como bens de capital. Em outras palavras, a liquidez proporcionada pela moeda e ativos financeiros funcionaria como um desestímulo à produção frente à incerteza. Utilizando este arcabouço teórico, é possível analisar as disparidades regionais através de diferenciais de preferência pela liquidez entre regiões. Através do conceito Centro versus Periferia, argumentam que a maior incerteza característica de regiões periféricas, quando comparada com uma região central, determina uma menor disposição do sistema bancário em se instalar e conceder crédito nestas regiões. Isto provocaria, como conseqüência, uma menor dinâmica econômica em tais regiões, como advogado pela teoria da causação circular de Myrdal (1957). Este é o pano de fundo para os resultados encontrados no modelo que foi testado utilizando econometria espacial.

A hipótese básica é a de que os bancos, assim como as firma industriais, decidem a melhor estratégia de localização com base no potencial de mercado e no retorno esperado (ou lucro esperado), tendo a dinâmica da moeda no território, em um contexto de não neutralidade da moeda, como elemento fundamental na localização bancária e no processo de desenvolvimento local. Para avaliar os principais determinantes da estratégia de localização dos bancos, deve-se considerar os fatores que concorreram para explicar tal decisão, quais sejam: macroeconômicos, estruturais, espaciais, regulamentares e políticos.

Os resultados demonstraram que a presença de bancos nos municípios vizinhos afeta negativamente a decisão locacional dos bancos. Os correspondentes bancários foram importantes na estratégia de localização dos municípios maiores, sinalizando os locais com demandas reprimidas.

A hipótese de que as contrapartidas políticas dadas pelos governos afetam positiva e significativamente a estratégia de localização dos bancos foi verificada para os municípios pequenos do estado de Minas Gerais. Em outras palavras, as contrapartidas governamentais, tais como a folha de pagamento e/ou a oficialização do banco como agente arrecadador dos tributos municipais, foram fundamentais para os municípios menores, demonstrando que estes fatores devem receber uma maior atenção nos estudos que visam entender o padrão de distribuição das agências bancárias e avaliar políticas de inserção financeira no estado, já que a presença dos bancos é fundamental para o desenvolvimento dos municípios menores. Note ainda que os depósitos bancários do setor privado também foram significativos para ambas as categorias de municípios, demonstrando que as empresas têm algum poder de barganha na estratégia locacional dos bancos.

As variáveis população e renda apresentaram coeficientes significativos para as duas categorias de municípios estudadas, o que confirma a hipótese da literatura, indicando claramente que as regiões (regimes) espaciais têm probabilidades diferentes de serem beneficiadas com novas agências bancárias.

* Trabalho recebido em 14 de setembro de 2010 e aprovado em 12 de maio de 2012. Gostaríamos de agradecer aos pareceristas anônimos pelos comentários que contribuíram para o aprimoramento do artigo. Naturalmente os erros e omissões são de nossa inteira responsabilidade. Os autores gostariam ainda de agradecer o financiamento do Cnpq e da Fapemig.

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  • ZYSMAN, J. Governments, markets and growth. Ithaca & London: Cornell University Press, 1983. cap. 2, p. 55-95.
  • *
  • 1
    Este item se beneficiou fortemente de Romero e Jayme Jr. (2012).
  • 2
    O primeiro trabalho a introduzir o duopólio misto foi desenvolvido por Cremer, Marchand e Thisse (1991), mas o trabalho considerava um mercado de bens homogêneo.
  • 3
    Conforme defendido pela literatura pós-keynesiana.
  • i
    4 No caso setor bancário, argumenta-se que uma maior (ou menor) distribuição de renda, aumenta (ou diminui) o custo total (de acesso aos bancos) para que os consumidores adquiram os produtos/serviços de um determinado banco (, ou ). Assim, acredita-se que uma maior distribuição de renda gera incentivos adicionais para os bancos públicos abrirem novas agências (bancos) na região em consideração, proporcionando um acesso relativamente mais fácil e barato ao crédito bancário, diminuindo o custo de vida da população. Mais especificamente, no modelo apresentado, o custo adicional é assumido pelos bancos públicos, na certeza de que o retorno (excedente) em termos do bem-estar social (inclusão financeira) mais do que compensará esses custos, por isso o retorno esperado aumenta.
  • 5
    Refere-se ao fato dos bancos, geralmente públicos, abrirem agências em municípios ou regiões com renda média baixa, basicamente para inserir a população local no circuito financeiro. Com isso, reduz-se a onerosa exclusão financeira de parte significativa da população de uma região ou país.
  • 6
    Este é um termo da econometria espacial, para designar o grau de associação espacial das estratégias locacionais.
  • 7
    Por conveniência metodológica, optou-se por apresentar separadamente o modelo matemático da teoria da localização bancária.
  • 8
    Inspirado em Leme (1982).
  • 9
    Os testes econométricos realizados nas seções seguintes demonstram que há alguma dependência espacial e heterogeneidade espacial nos dados, justificando essa metodologia empírica.
  • 10
    Segundo Le Gallo e Ertur (2003) um valor para
    Iit positivo indica um
    cluster de valores similares (
    high-high ou
    low-low), caso contrário, um valor negativo indica um
    cluster de valores dissimilares (
    high-low ou
    low-high). Intuitivamente, a autocorrelação espacial positiva indica que municípios com elevado PIB são vizinhos de outros que também apresentam PIB elevado, esse cluster é denominado
    high-high. Caso os municípios com baixo PIB sejam vizinhos de municípios que apresentam PIB baixo (ou
    low-low), a autocorrelação também é dita positiva. Quando os municípios com elevado PIB são vizinhos de outros que apresentam PIB baixo, denomina-se no mapa como
    high-low), e a autocorrelação é dita negativa. Caso contrário, se os municípios com baixo PIB são vizinhos de municípios que apresentam PIB alto, esse
    cluster é denominado
    low-high, novamente a autocorrelação é negativa.
  • 11
    O
    cluster pode ser entendido nessa análise como uma concentração de valores similares em municípios relacionadas entre si numa determinada área geográfica e no qual o LISA é significativo.
  • 12
    Perobelli, Faria e Ferreira (2006).
  • 13
    Segundo o BCB (2008), o Banco Postal (Serviço Financeiro Postal Especial) caracteriza-se pela utilização da rede de atendimento da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, para a prestação de serviços bancários básicos, em todo o território nacional. Os Correios atuam como correspondente da instituição financeira contratante.
  • 14
    A dificuldade de modelar todas as variáveis torna o processo decisório difícil e caro. Por isso, muitas vezes a decisão é tomada, não por critérios técnicos e objetivos, mas pela diretoria do banco com base nas informações disponíveis e em critérios arbitrários.
  • 15
    Os testes apresentados foram realizados no
    SpaceStat e visualizados no
    ArcView GIS 3.2.
  • 16
    Para fazer a regressão espacial supracitada, deve-se estimar no
    SpaceStat o modelo de regressão
    lag espacial com mudança estrutural, definindo-se SAR IV (2SLS) como o mais apropriado, estimando-o com regime espacial (sendo este definido pela
    dummy DRMBH). Com efeito, controla-se também o viés na amostra proveniente da Mesoregião Metropolitana de Belo Horizonte.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      14 Set 2010
    • Aceito
      12 Maio 2012
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