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INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL: RECURSOS E DIFICULDADES DA FAMÍLIA E DE PROFESSORAS

INCLUSIÓN DE ESTUDIANTES CON DISCAPACIDAD INTELECTUAL: RECURSOS Y DIFICULTADES DE FAMILIA Y PROFESORES

RESUMO:

A inclusão educacional tem como princípio que todos os alunos devem aprender juntos, em escolas regulares, independentemente das diferenças. A parceria família-escola é um fator de suma importância para o sucesso da inclusão. O presente estudo teve como objetivo verificar como está ocorrendo o processo de inclusão de alunos com deficiência intelectual, identificando recursos e dificuldades, de acordo com responsáveis e professores. Trata-se de um estudo qualitativo, de corte transversal. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 42 responsáveis e 34 professoras de 44 alunos com diagnóstico de deficiência intelectual matriculados em escolas regulares da rede pública de uma cidade do interior de Minas Gerais. Os dados foram analisados com auxílio do software Iramuteq e a técnica de análise de conteúdo temática. Obtiveram-se cinco classes na análise das entrevistas dos responsáveis: Contexto familiar, recursos e dificuldades dos pais; Relações com a escola, Participação na escola, Dificuldades dos filhos, Percurso do diagnóstico e acompanhamentos; e cinco classes na análise das entrevistas das professoras: Entendimento do Processo de Inclusão, Relação escola-família, Dificuldades no processo de inclusão, Práticas das professoras dentro da sala de aula e Desenvolvimento do aluno. Tais classes compreendem temas relativos às percepções dos participantes. Responsáveis apontaram dificuldades quanto a prestar apoio aos filhos diante das adversidades escolares e, como recurso, o apoio na relação com a escola. As professoras apontaram dificuldades cotidianas no processo de inclusão e problemáticas na parceria família-escola. Através das entrevistas, foi possível prover indicadores de aspectos do processo de inclusão de forma a subsidiar intervenções nesse contexto.

Palavras-chave:
inclusão educacional; deficiência intelectual; pais; professores; escola

RESUMEN:

La inclusión educacional se basa en el principio de que todos los estudiantes deben aprender juntos, en escuelas regulares, independientemente de las diferencias. La asociación familia-escuela es un factor muy importante para el éxito de la inclusión. Este estudio tuvo como objetivo verificar cómo se está produciendo el proceso de inclusión de estudiantes con discapacidad intelectual, identificando recursos y dificultades, según padres y profesores. Se trata de un estudio cualitativo y transversal. Se realizaron entrevistas semiestructuradas a 42 padres y responsables y a 34 maestras de 44 estudiantes diagnosticados con discapacidad intelectual matriculados en escuelas públicas regulares de una ciudad del interior de Minas Gerais. Los datos se analizaron utilizando el software Iramuteq y la técnica de análisis de contenido temático. Se obtuvieron cinco clasificaciones en el análisis de las entrevistas a los responsables: Contexto familiar, recursos y dificultades de los padres; Relaciones con la escuela, Participación escolar, Dificultades de los niños y Ruta de diagnóstico y seguimiento; cinco clasificaciones en el análisis de las entrevistas a los docentes: Comprensión del proceso de inclusión, Relación escuela-familia, Dificultades en el proceso de inclusión, Prácticas de los docentes dentro del aula y Desarrollo estudiantil. Las clasificaciones comprenden temas relacionados a la percepción de los participantes. Los padres señalaron dificultades para brindar apoyo a sus hijos frente a las adversidades escolares y como recurso de apoyo en su relación con la escuela. Los docentes señalaron dificultades cotidianas en el proceso de inclusión y problemas en la alianza familia-escuela. A través de las entrevistas, fue posible brindar indicadores de aspectos del proceso de inclusión para apoyar las intervenciones en este contexto.

Palabras clave:
inclusión educativa; discapacidad intelectual; padres; maestros; escuela

ABSTRACT:

Educational inclusion is based on the principle that all students should learn together, in regular schools, regardless of their differences. The family-school partnership is an important factor associated with the success of inclusion. This study aimed to verify how the inclusion process of students with intellectual disabilities occurs, by identifying resources and difficulties, according to information provided by parents and teachers. This is a qualitative and cross-sectional study. Semi-structured interviews were done with 42 parents and 34 teachers of 44 students diagnosed with intellectual disabilities enrolled in regular public schools in a city in the interior of Minas Gerais. The data were analyzed in the Iramuteq software. Five classes were obtained by the parents’ interview: Family context, resources and parents' difficulties; Relationships with the school; Participation in schooling; Children's difficulty; and Path of diagnosis and follow-ups. Likewise, five classes in the analysis of the teachers' information: Understanding the inclusion process; School-family relationship; Difficulties in the inclusion process; Teachers' practices within the classroom; and Student development. The classes comprise themes related to the perception of participants. Parents pointed out difficulties in providing support to their children in the face of school adversities and as resource support in their relationship with the school. The teachers pointed out daily difficulties in the inclusion process and problems in the family-school partnership. It was possible to provide indicators of aspects of the inclusion process to provide subsidiary functions in this context.

Keywords:
educational inclusion; intellectual disability; parents; teachers; school

INTRODUÇÃO

A inclusão educacional tem como princípio fundamental que todos os indivíduos devem aprender juntos em escolas regulares, independentemente das dificuldades e das diferenças (Unesco, 1994Unesco(1994). Declaração de Salamanca sobre princípios, política e práticas na área das necessidades educativas especiais. Unesco.). No Brasil, tem-se a modalidade de ensino Educação Especial, que perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, garantindo a educação de alunos com deficiências, transtorno do espectro autista e altas habilidades/superdotação no sistema regular de ensino (Brasil, 1996Brasil (1996). Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
, 2008). Portanto, o termo “Inclusão Educacional” tem sentido amplo, político e social, enquanto o termo “Educação Especial” demarca a modalidade de educação. O presente estudo centra-se na modalidade de Educação Especial, a partir da perspectiva da Educação Inclusiva.

A história brasileira da educação das pessoas com deficiência nas escolas regulares ganhou maior visibilidade ao final da década de 1980 e início dos anos 90, por meio da assinatura de declarações internacionais e do estabelecimento de diretrizes, políticas públicas e leis nacionais. Em 1988, a Constituição Federal (Brasil, 1988 Brasil(1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Senado.) e, em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Brasil, 1990Brasil (1990). Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências.) - garantiram a todos os cidadãos e, especificamente, às crianças e aos adolescentes, a igualdade de direito e permanência na escola. No ano de 1994, a Declaração de Salamanca, sobre “Princípios, políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais”, postulou que os alunos com deficiência devem aprender em sistema inclusivo (Unesco, 1994Unesco(1994). Declaração de Salamanca sobre princípios, política e práticas na área das necessidades educativas especiais. Unesco.). Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - Lei nº 9.394 - foi publicada, tratando no capítulo V sobre a Educação Especial na rede regular de ensino (Brasil, 1996Brasil (1996). Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm.
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).

Já no século XXI, em 2008, foi editada a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, tendo como objetivo o acesso, a participação e a aprendizagem dos estudantes com deficiências nas escolas regulares, garantindo: o atendimento educacional especializado (AEE); a formação de professores e demais profissionais da educação; a participação da família e da comunidade; a acessibilidade arquitetônica, nos transportes, nas comunicações e na informação; além da articulação e implementação de políticas públicas (Brasil, 2008Brasil (2008). Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. MEC/SEESP.). Ressalta-se que o AEE tem como função organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade para a plena participação dos estudantes, considerando suas necessidades específicas, com o intuito de complementar e/ou suplementar a formação, articulando-se com a proposta pedagógica do ensino comum (Brasil, 2008). Em 2015, foi promulgada a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, Lei nº 13.146/2015, a qual enfatiza a educação em sistema inclusivo para todos os níveis e aprendizados, de forma a alcançar o máximo de desenvolvimento possível (Brasil, 2015Brasil(2015). Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).).

Observa-se que a Educação Especial está alinhada à perspectiva da educação inclusiva ao conceber que na escola cada aluno seja atendido de acordo com suas necessidades e dificuldades, com recursos e metodologias que proporcionem seu desenvolvimento e aprendizado (Miranda, 2001Miranda, M. J. C. (2001). Educação, deficiência e inclusão no município de Maringá. [Dissertação de Mestrado não publicada]. Universidade Estadual de Maringá.), compreendendo que a inclusão educacional traz em seu âmago a aceitação às diferenças, a transformação do sistema de ensino, a capacitação de professores, a cooperação entre alunos e, principalmente, o respeito à dignidade (Moreira, 2006Moreira M. (2006). A inclusão do deficiente auditivo usuário de implante coclear: um olhar familiar à luz da legislação. Construindo o Serviço Social, (16), 59-87.).

Ao pensar na educação de alunos com deficiência intelectual, faz-se necessária uma ação pedagógica adequada ao atendimento das necessidades educacionais específicas; torna-se importante, além do conhecimento sobre o processo de ensino-aprendizagem, o conhecimento das concepções da deficiência, com o intuito de traçar estratégias educacionais pertinentes (Lopes & Marquezine, 2012Lopes, E., & Marquezine, M. C. (2012). Sala de recursos no processo de inclusão do aluno com deficiência intelectual na percepção dos professores. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(3), 487-506.). A Associação Americana de Deficiência Intelectual e do Desenvolvimento (AAIDD) propõe uma concepção multidimensional, funcional e bioecológica, entendendo-a como uma deficiência caracterizada por limitações significativas na função intelectual e no comportamento adaptativo, que é composto por habilidades sociais e práticas (AAIDD, 2010American Association of Intellectual and Developmental Disability - AAIDD. (2010). Intellectual disability: definition, classification, and systems of supports (11th ed).). A literatura aponta que, além do desenvolvimento cognitivo e da aprendizagem formal, devem ser desenvolvidas outras formas de saber no alunado, estimular o desenvolvimento afetivo e social, respeitando-se a forma específica como cada um lida com o aprendizado (Santos, 2012Santos, D. C. O. (2012). Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência intelectual. Educação e Pesquisa, 38(4), 935-948.; Batista & Enumo, 2004Batista, M. W., & Enumo, S. R. F. (2004). Inclusão escolar e deficiência mental: análise da interação social entre companheiros. Estudos de Psicologia, 9(1), 101-111.).

Faz-se importante destacar que a educação inclusiva implica uma mudança da perspectiva educacional, devendo atingir todos os elementos escolares (Unesco, 1994; Brasil, 2008; Carvalho, 2019Carvalho, R. E. (2019). Educação Inclusiva: com os pingos nos “is”. (13ª ed). Mediação.). Assim, alunos, família, professores, gestores e outros profissionais envolvidos devem ter uma ação conjunta, o que constitui um importante recurso. Estudos sinalizam a importância da relação família-escola para a inclusão educacional, através de uma valorização e participação ativa dos pais/responsáveis, de um trabalho colaborativo no dia a dia e de uma comunicação eficaz com troca de informações (Borges, Gualda & Cia, 2011Borges, L., Gualda, D. S., & Cia, F. (2011). O papel do professor na relação com as famílias de crianças pré escolares incluídas. Congresso Brasileiro multidisciplinar de educação especial, 6. - encontro da Associação Brasileira de pesquisadores em educação especial, 7.; Christovam & Cia, 2013Christovam, A. C. C., & Cia, F. (2013). O Envolvimento parental na visão de pais e professores de alunos com necessidades educacionais especiais. Revista Brasileira de Educação Especial, 19(4), 563-581.; Brandão & Ferreira, 2013Brandão, M. T., & Ferreira, M. (2013). Inclusão de crianças com necessidades educativas especiais na educação infantil. Revista brasileira de educação especial, 19(4), 487-502.; Benitez & Domeniconi, 2012Benitez, P., & Domeniconi, C. (2012). Verbalizações de familiares durante aprendizagem de leitura e escrita por deficientes intelectuais. Estudos de Psicologia, 29(4), 553-562.; Vilaronga & Mendes, 2014Vilaronga, C. A. R., & Mendes, E. G. (2014). Ensino colaborativo para o apoio à inclusão escolar: práticas colaborativas entre os professores. Revista Brasileira de Educação, 95(239), 139-151.). Família e escola são fontes educacionais distintas, complementares e essenciais na transmissão de conhecimento e auxílio ao desenvolvimento, em que a parceria compartilhada e as estratégias conjuntas beneficiam o processo educativo (Dessen & Polonia, 2007Dessen, M. A., & Polonia, A. C. (2007). A família e a escola como contextos de desenvolvimento humano. Paidéia, 17(36), 21-32.; Marturano & Elias, 2016Marturano, E. M., & Elias, L. C. S. (2016). Família, dificuldades no aprendizado e problemas de comportamento em escolares. Educar em Revista, 59, 123-139.).

No que se refere à atuação da família, é necessário o entendimento de diferentes questões, tanto subjetivas quanto objetivas. A forma como as famílias vão lidar com a inclusão escolar de seus filhos depende de vários aspectos, como a história de vida, o apoio da rede social, as habilidades de comunicação, os recursos próprios, entre outros. É importante que os profissionais da educação envolvidos no processo de inclusão estejam atentos às expectativas e aos anseios das famílias, para que possam auxiliá-las e realizar intervenções conjuntas (Luiz & Nascimento, 2012Luiz, F. M. R, & Nascimento, L. C. (2012). Inclusão escolar de crianças com síndrome de down: experiências contadas pelas famílias. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(1), 127-140.). Há de se considerar que as famílias encontram muitas dificuldades em suas vivências, que perpassam questões afetivas e concretas, como pouca informação sobre o diagnóstico e direitos dos filhos em relação à escola, dificuldades em lidar com adaptações necessárias, idas constantes a médicos e acompanhamentos, adversidades em conciliar trabalho e suporte ao filho, falta de apoio, dentre outras - questões estas que vão interferir nas dinâmicas do processo de inclusão educacional (Cerqueira, Alves & Aguiar, 2016Cerqueira, M. M. F., Alves, R. O., & Aguiar, M. G. G. (2016). Experiências vividas por mães de crianças com deficiência intelectual nos itinerários terapêuticos. Ciência & Saúde Coletiva, 21(10), 3223-3232.; Rosário & Silva, 2016Rosário, H. R. M. F., & Silva, S. S. C. (2016). Estratégias adotadas pelos pais na vivência da escolarização de filhos adultos e crianças com deficiência. Revista de Enfermagem Referência, ser IV(11), 51-59.).

A atuação de professores, por sua vez, é outro elemento essencial. A formação inicial e continuada é apontada na literatura como central, a fim de que esses profissionais possam promover transformações e efetivar a inclusão (Matos & Mendes, 2015Matos, S. N., & Mendes, E. G. (2015). Demandas de Professores Decorrentes da Inclusão Escolar. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(1), 9-22.; Silveira, Enumo & Rosa, 2012Silveira, K. A., Enumo, S. R. F., & Rosa, E. M. (2012). Concepções de professores sobre inclusão escolar e interações em ambiente inclusivo: Uma revisão da literatura. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(4), 695-708.; Tavares, Santos & Freitas, 2016Tavares, L. M. F. L., Santos, L. M. M., & Freitas, M. N. C. (2016). A Educação Inclusiva: Um estudo sobre a formação docente. Revista Brasileira de Educação Especial, 22(4), 527-542.; Vilaronga & Mendes, 2014Vilaronga, C. A. R., & Mendes, E. G. (2014). Ensino colaborativo para o apoio à inclusão escolar: práticas colaborativas entre os professores. Revista Brasileira de Educação, 95(239), 139-151.). Contudo, várias são as dificuldades que os professores encontram, como a falta de apoio institucional, a pouca interação com professores da sala de recursos, a falta de materiais e tecnologia assistiva (Silveira et al., 2012), além de problemáticas na formação que vão impactar nas concepções e na prática da educação inclusiva (Garcia, 2013Garcia, R. M. C. (2013). Política de educação especial na perspectiva inclusiva e a formação docente no Brasil. Revista Brasileira de Educação, 18(52), 101-119.; Kassar, 2014Kassar, M. C. M (2014). A formação de professores para a educação inclusiva e os possíveis impactos na escolarização de alunos com deficiências. Cadernos CEDES [online], 34(93), 207-224.; Silva & Carvalho, 2017Silva, N. C., & Carvalho, B. G. E. (2017). Compreendendo o Processo de Inclusão Escolar no Brasil na Perspectiva dos Professores: uma Revisão Integrativa. Revista Brasileira de Educação Especial, 23(2), 293-308.). Entende-se que os professores necessitam, em sua atuação, do apoio de profissionais especializados, da família e de toda a comunidade escolar (Matos & Mendes, 2015Matos, S. N., & Mendes, E. G. (2015). Demandas de Professores Decorrentes da Inclusão Escolar. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(1), 9-22.; Sant’Ana, 2005Sant'Ana, I. M. (2005). Educação inclusiva: concepções de professores e diretores. Psicologia em Estudo, 10(2), 227-234.).

Apesar dos evidentes benefícios da educação inclusiva, dos avanços dos últimos anos e das bases legais (nacionais e internacionais), o que se observa, ainda, é uma grande contradição entre o que está determinado e o que realmente ocorre na prática (Borges & Campos, 2018Borges, A. A. P., & Campos, R. H. F. (2018). A escolarização de alunos com deficiência em Minas Gerais: das Classes Especiais à Educação Inclusiva. Revista Brasileira de Educação Especial, 24(spe), 69-84.; Gomes & Souza, 2012Gomes, C., & Souza, V. L. T. (2012). Psicologia e inclusão escolar: reflexões sobre o processo de subjetivação de professores. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(3), 588-603.; Tavares et al., 2016Tavares, L. M. F. L., Santos, L. M. M., & Freitas, M. N. C. (2016). A Educação Inclusiva: Um estudo sobre a formação docente. Revista Brasileira de Educação Especial, 22(4), 527-542.). Embora exista um aumento das matrículas de alunos com deficiência nas escolas (Rebelo & Kassar, 2018Rebelo, A. S., & Kassar, M. M. (2018). Indicadores educacionais de matriculas de alunos com deficiência no Brasil (1974-2014). Estudos em Avaliação Educacional, 29(70), 276-307.), com uma grande concentração nos anos iniciais do Ensino Fundamental, há ainda um baixo número de matrículas no Ensino Médio, o que mostra a evasão presente nesse percurso (Meletti & Ribeiro, 2014Meletti, S. M. F., & Ribeiro, K. (2014). Indicadores Educacionais sobre a Educação Especial no Brasil. Cadernos CEDES, 34(93), 175-189.). Assim, emerge uma série de questionamentos sobre o processo de inclusão, envolvendo processos de aprendizagem, avaliação, estruturação curricular, didática, suporte especializado, gestão escolar e acessibilidade das escolas (Rahme, Ferreira & Neves, 2019Rahme, M. M. F., Ferreira, C. M. R. J, & Neves, L. R. (2019). Sobre Educação, Política e Singularidade. Educação & Realidade, 44(1), 1-13.). Sabe-se que a educação inclusiva esbarra nas relações, atitudes e crenças dos envolvidos, nas falhas de capacitação profissional, na falta ou inexistência de materiais e recursos, na estrutura física e arquitetônica - além do que envolve a organização institucional das escolas, o sistema educacional, as leis e políticas públicas. Essas questões e outras dificuldades vivenciadas por professores, gestores, pais e alunos acabam por limitar e amordaçar a proposta de inclusão (Carvalho, 2019Carvalho, R. E. (2019). Educação Inclusiva: com os pingos nos “is”. (13ª ed). Mediação.; Gomes & Souza, 2012; Santos, 2012Santos, D. C. O. (2012). Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência intelectual. Educação e Pesquisa, 38(4), 935-948.; Santos & Martins, 2015Santos, T. C. C., & Martins, L. A. R. (2015). Práticas de Professores Frente ao Aluno com Deficiência Intelectual em Classe Regular. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(3), 395-408.).

Nesse cenário, são relevantes os estudos que busquem compreender o processo de inclusão educacional de forma integral e na perspectiva de diferentes atores envolvidos, buscando entender, além das dificuldades vivenciadas, os recursos que esses atores encontram para o enfrentamento das adversidades. Cabe ressaltar que recursos e dificuldades são aspectos e/ou processos (concretos, subjetivos e relacionais) que atuam de forma a promover ou dificultar o processo de inclusão. Destaca-se a influência do contexto, salientando que as dificuldades podem atuar como fatores de risco ao desenvolvimento, os quais estão diretamente relacionados com o ambiente e a maneira pela qual as pessoas nele se comportam (Rutter, 1999Rutter, M. (1999). Resilience concepts and findings: implications for family therapy. Journal of Family Therapy, 21, 119-144.; Lisboa & Koller, 2011Lisboa, C., & Koller, S. H. (2011). O microssistema escolar e os processos proximais: exemplos de investigações científicas e intervenções práticas. In: Koller, S. H. (Org.), Ecologia do desenvolvimento humano: pesquisa e intervenção no Brasil. Casa do Psicólogo.). Nos anos escolares, tanto a família como a escola são contextos em que atuam mecanismos de risco e proteção para trajetórias desenvolvimentais (Marturano & Elias, 2016Marturano, E. M., & Elias, L. C. S. (2016). Família, dificuldades no aprendizado e problemas de comportamento em escolares. Educar em Revista, 59, 123-139.). Assim, o presente trabalho buscou verificar como está ocorrendo o processo de inclusão de alunos com deficiência intelectual, identificando recursos e dificuldades, de acordo com responsáveis e professores.

MÉTODO

Participantes

Participaram 42 responsáveis e 34 professoras de 44 alunos com diagnóstico de deficiência intelectual, matriculados no Ensino Fundamental I, em 14 escolas regulares da rede pública de ensino de uma cidade do interior de Minas Gerais. Quanto aos responsáveis, 40 eram mães, um pai e uma avó; a média de idade foi de 34,25 anos (DP= 6,59); 42 (85%) possuíam Ensino Fundamental incompleto; 42,85% declararam estarem empregados no momento, e 45,24% situavam-se na classe D-E com renda familiar média de R$708,19 (segundo critério Brasil de classificação econômica). Informa-se que duas mães tinham dois filhos com diagnóstico de deficiência intelectual.

Quanto às professoras participantes, 12 lecionavam em escolas municipais, 21 em escolas estaduais e uma nas duas redes. Destas, 67,5% tinham formação em Pedagogia; 44,12% tinham especialização em educação inclusiva; 47,09% pertenciam à classe B2, com renda média domiciliar de R$5.363,19 (de acordo com critério Brasil de classificação econômica); a média de idade foi de 42 anos (DP =9,15), com tempo médio de profissão de 16,27 anos (DP= 7,68). Nove professoras tinham mais de um aluno com deficiência intelectual em sala.

Quanto aos alunos, contavam-se 30 meninos (68,18%) e 14 meninas (31,82%), com média de idade de 9,68 anos (DP= 1,62). Quatro alunos frequentavam o 1º. ano, cinco o 2º. ano, 11 o 3º. ano, 15 o 4º. ano e nove o 5º. ano; desses, 17 (38,64%) estudavam em escolas municipais, e 27 (61,36%) em escolas estaduais. Quanto ao diagnóstico, 24 (54,55%) apresentavam diagnóstico de deficiência intelectual leve, 7 (15,90%) moderado, 3 (6,82%) grave, 2 (4,55%) profundo e 9 (20,45%) apresentavam diagnóstico de deficiência intelectual não especificado.

Instrumentos

Professoras e responsáveis responderam a uma entrevista semiestruturada, a um questionário para levantar as variáveis sociodemográficas e ao Questionário Critério Brasil (ABEP, 2018Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa - ABEP. (2018). Critério de Classificação Econômica Brasil. ABEP.http://www.abep.org/criterio-brasil.
http://www.abep.org/criterio-brasil...
). A entrevista semiestruturada, segundo Tavares (2007Tavares, M. (2007). A entrevista clínica. In J. A. Cunha (Org.). Psicodiagnóstico-V. Artmed.), consiste em um roteiro com perguntas sugeridas em sequência, o qual possibilita maior confiabilidade, pois o entrevistador tem em mãos os meios necessários para obter a informação que precisa e atingir seus objetivos, sem limitar, contudo, o informante.

A entrevista com responsáveis foi composta por perguntas que objetivavam compreender como eles vivenciavam e o que entendiam do processo de inclusão, bem como identificar recursos e dificuldades, compreender a relação com a escola e o desenvolvimento do filho no que se refere ao progresso escolar. Quanto à entrevista com as professoras, esta foi composta por perguntas que buscavam compreender o entendimento sobre processo de inclusão e as maneiras de lidar com a inclusão no dia a dia, e ainda os recursos e as dificuldades encontradas.

Aspectos éticos

Em conformidade com a legislação ética, o projeto foi submetido e aprovado no Comitê de Ética da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, tendo sido aprovado com o CAAE: 86636918.9.0000.5407.

Procedimento de coleta de dados

Os dados foram coletados em uma cidade de porte médio do interior de Minas Gerais, em cinco escolas municipais e nove estaduais. Inicialmente, foi realizado contato com os diretores dessas escolas para realizar um levantamento de possíveis participantes. Na sequência, foram realizados os respectivos contatos (pais por telefone, e professores presencialmente); após o aceite, foi agendado individualmente o dia e horário para conceder explicações sobre o estudo, apresentar o TCLE e realizar a entrevista. Os encontros ocorreram nas escolas, em salas apropriadas, com duração aproximada de cinquenta minutos.

Procedimento de análise de dados

Inicialmente as entrevistas foram transcritas na íntegra e transpostas para o software Iramuteq - Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (Ratinaud, 2009Ratinaud, P. (2009). IRAMUTEQ: Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires [Computer software]. http://www.iramuteq.org
http://www.iramuteq.org...
). Trata-se de um software de fonte aberta, licenciado por GNU GPL (v2), utilizando o ambiente estatístico do software R. O Iramuteq realiza análise de dados textuais, através da análise lexical, ou seja, possibilita que se empreguem cálculos estatísticos sobre variáveis essencialmente qualitativas (Lahlou, 1994Lahlou, S. (1994). L'analyse lexicale. Variances, (3),13-24.). Assim, é possível analisar as características estruturais e de conteúdo dos textos com base no vocabulário utilizado (Salem, 1986Salem, A. (1986). Segments répétés et analyse statistique des données textuelles. Histoire & Mesure, 1(2), 5-28.); identificam-se tendências, regularidades e padrões de associações (entre palavras, expressões e conceitos), reduzindo o material e organizando o aglomerado de dados (Leblanc, 2015Leblanc, J.-M. (2015). Proposition de protocole pour l'analyse des données textuelles: pour une démarche expérimentale en lexicométrie. Nouvelles perspectives en sciences sociales (NPSS), 11(1), 25-63.). Trabalha-se com o conceito de “corpus”, “textos” e “segmentos de textos”; no caso de entrevistas, o “corpus” é o conjunto de todas as entrevistas; o “texto” corresponde a cada entrevista em separado; e os “segmentos de textos” são partes do texto (divididos pelo próprio software). Ao inserir um corpus no software, ele deve ter um aproveitamento de 75% para ser considerado apto (Camargo & Justo, 2013Camargo, B. V., & Justo, A. M. (2013). IRAMUTEQ: Um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em Psicologia, 21, 513-518. http://dx.doi.org/10.9788/ TP2013.2-16.
https://doi.org/10.9788/ TP2013.2-16...
).

O Iramuteq realiza diferentes tipos de análises. Neste trabalho, será apresentada a análise denominada Classificação Hierárquica Descendente (CHD) ou “Método Reinert”. A CHD realiza análises de agrupamentos sobre os segmentos de texto; estes são classificados em função do vocabulário - formas reduzidas (palavras lematizadas/raiz das palavras) (Camargo & Justo, 2013Camargo, B. V., & Justo, A. M. (2013). IRAMUTEQ: Um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em Psicologia, 21, 513-518. http://dx.doi.org/10.9788/ TP2013.2-16.
https://doi.org/10.9788/ TP2013.2-16...
; Salviati, 2017Salviati, M. E. (2017). Manual do Aplicativo Iramuteq (versão 0.7 Alpha 2 e R Versão 3.2.3). Planaltina. http://iramuteq.org/documentation/fichiers/manual-do-aplicativo-iramuteq-par-maria-elisabeth-salviati.
http://iramuteq.org/documentation/fichie...
). Portanto, as classes são formadas pelos segmentos de textos e pelas palavras, as quais são significantemente associadas com a classe, através de cálculos do qui-quadrado tendo significância p<0,05 e X² > 3,80 (Salviati, 2017Salviati, M. E. (2017). Manual do Aplicativo Iramuteq (versão 0.7 Alpha 2 e R Versão 3.2.3). Planaltina. http://iramuteq.org/documentation/fichiers/manual-do-aplicativo-iramuteq-par-maria-elisabeth-salviati.
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; Camargo & Justo, 2013Camargo, B. V., & Justo, A. M. (2013). IRAMUTEQ: Um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em Psicologia, 21, 513-518. http://dx.doi.org/10.9788/ TP2013.2-16.
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). Visa que se obtenham classes estáveis e definitivas dos segmentos de texto que, ao mesmo tempo, apresentam vocabulário semelhante entre si e diferentes das demais (Camargo & Justo, 2013Carvalho, R. E. (2019). Educação Inclusiva: com os pingos nos “is”. (13ª ed). Mediação.). O programa apresenta um dendograma, com o esquema hierárquico das classes, que ilustra a relação entre elas e apresenta a lista de palavras lematizadas (formas reduzidas).

Na interpretação da CHD, é possível nomear e descrever as classes, inferindo qual ideia o corpus textual transmite (Camargo & Justo, 2013Camargo, B. V., & Justo, A. M. (2013). IRAMUTEQ: Um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em Psicologia, 21, 513-518. http://dx.doi.org/10.9788/ TP2013.2-16.
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). Parte-se do princípio da proximidade léxica, em que as palavras usadas em um contexto similar estão associadas ao mesmo mundo léxico e são parte de ideias comuns (Salviati, 2017Salviati, M. E. (2017). Manual do Aplicativo Iramuteq (versão 0.7 Alpha 2 e R Versão 3.2.3). Planaltina. http://iramuteq.org/documentation/fichiers/manual-do-aplicativo-iramuteq-par-maria-elisabeth-salviati.
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). Por essa razão, a CHD é utilizada para identificar temáticas subjacentes a um conjunto de textos (Souza et al., 2020Souza, Y. S. O., Gondim, S. M. G., Carias, I. A., Batista, J. S., & de Machado, K. C. M. (2020). O uso do software Iramuteq na análise de dados de entrevistas. Revista Pesquisas e Práticas Psicossociais, 15(2), 1-19.).

Nesse ponto, com a descrição das classes, a contextualização das palavras e dos segmentos de textos, realiza-se a análise de conteúdo temática (Nascimento & Menandro, 2006Nascimento, A. R. A., & Menandro, P. R. M. (2006). Análise lexical e análise de conteúdo: uma proposta de utilização conjugada. Estudos e pesquisas em psicologia, 6(2), 72-88.). Nessa análise ocorre o desmembramento do texto em categorias, segundo reagrupamentos analógicos (Minayo, 2008Minayo, M. C. S. (2008). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Vozes.). Segundo Nascimento e Menandro (2006), pode-se usar a análise de conteúdo de forma análoga e complementar em todo processo e, principalmente, nas últimas etapas, que Minayo (2008) descreve como: identificar, através de inferências, os núcleos de sentido apontados pelas partes dos textos em cada classe do esquema de classificação e elaborar uma síntese interpretativa, através de uma redação que possa dialogar com os temas criados, com os objetivos, as questões e os pressupostos da pesquisa.

O Iramuteq também fornece uma outra forma de apresentação de dados fornecida pela CHD, que é a Análise Fatorial por Correspondência (AFC), na qual, em plano fatorial, é possível analisar visualmente a distribuição e organização das classes e as palavras mais significativas. Isso permite analisar quais classes complementam e concentram o corpus e quais se distanciam do centro, mostrando certa especificidade.

Justifica-se o uso do software, pois ele permite a análise de um número elevado de material, através do rigor de um amplo número de funcionalidades e ferramentas para análise dos dados textuais. Ressalta-se que o software auxilia o trabalho do pesquisador, mas não tira o protagonismo da nomeação, compreensão e interpretação dos conteúdos (Camargo & Justo, 2013Camargo, B. V., & Justo, A. M. (2013). IRAMUTEQ: Um software gratuito para análise de dados textuais. Temas em Psicologia, 21, 513-518. http://dx.doi.org/10.9788/ TP2013.2-16.
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; Sousa et al., 2020).

RESULTADOS

Os resultados serão apresentados em duas partes: a primeira refere-se às análises das entrevistas com os responsáveis, e a segunda, às análises das entrevistas com professoras.

O processo de inclusão para responsáveis

O corpus geral foi constituído por 42 textos (entrevistas); emergiram 25.159 ocorrências (palavras, formas ou vocábulos); houve separação em 731 segmentos de textos (ST), com aproveitamento de 577 STs (78,93%), o que é considerado satisfatório. Através da Classificação Hierárquica Descendente (CHD), obtiveram-se cinco classes; a partir da análise dos STs e das palavras mais significativas, foi possível interpretar, nomear e dar sentido às classes. A figura 1 apresenta o dendograma obtido:

Figura 1
Dendograma da Classificação Hierárquica Descendente (CHD) do corpus textual da entrevista dos responsáveis

Através da Figura 1, observa-se a divisão nas cinco classes, a porcentagem de cada classe em relação ao corpus aproveitado, os nomes atribuídos e as dez palavras mais representativas, com a frequência e o valor do qui-quadrado (X²) (que mostra a força da ligação da palavra com a classe). Na divisão, houve quatro ramificações: a primeira deu origem à Classe 5 e subdividiu as Classes 1, 2, 3 e 4; a segunda subdividiu a classe 4 e as classes 1-2-3; e a quarta subdividiu a classe 1 e as classes 2-3. Nota-se a classe 1 (vermelha - Contexto familiar, recursos e dificuldades dos pais) com 102 STs de 577 STs, o que representa 17,68% do corpus aproveitado; a Classe 2 (cinza - Relações com a escola) com 112/577 (19,41%); a Classe 3 (verde - Participação na escola) com 73/577 (12,65%); a Classe 4 (azul - Dificuldades dos filhos) com 150/577 (26%); e a Classe 5 (roxa - Percurso do diagnóstico e acompanhamentos) com 140/577 (24,26%). A Figura 2, a seguir, apresenta a análise fatorial de correspondência (AFC):

Figura 2
Análise fatorial de correspondência (AFC) das classes obtidas na classificação hierárquica descendente do corpus dos responsáveis.

Através da Figura 2, podem-se observar as classes representadas em plano fatorial, as quais estão em um segmento centralizado expandido para pontos mais distantes. Assim, a Classe 5 (roxa - Percurso do diagnóstico e acompanhamento) ocupa um quadrante diferente das outras classes, das quais a classe 4 (azul - Dificuldades do filho) está mais distante, enquanto a Classe 1 (vermelha - Contexto Familiar, Recursos e Dificuldades dos Pais), a Classe 2 (cinza - Relações com a escola) e a Classe 3 (verde - Participação na escola) estão mais próximas. A seguir, será feita uma descrição detalhada de cada uma das classes apresentadas.

Classe 1: Contexto familiar, recursos e dificuldades dos pais

Nesta classe, os responsáveis falaram sobre o contexto e as relações familiares, no cotidiano de casa e em situações que envolviam o aspecto escolar e educacional. Eles falaram sobre como organizam o ambiente familiar, no sentindo de impor regras e limites. Dissertaram também sobre a questão de prestar apoio aos filhos; nesse sentido, relataram encontrar dificuldades em ajudar nas tarefas escolares e a falta de tempo disponível frente à jornada de trabalho. Manifestaram como se sentem diante das adversidades e vivências de sobrecarga; entretanto, observa-se, de um lado, pais que encontram recursos, e, de outro, os que têm mais dificuldades. Destacam-se na sequência exemplos de algumas falas (segmentos de textos da classe) que ilustram o conteúdo geral da classe:

Eu deixo ele assistir um pouco de televisão, na hora do banho ele vai tomar banho. Em casa tudo tem o horário (Resp. 30).

Ai quando eu não sei, eu peço para a menina da minha vizinha ajudar a fazer, porque eu estudei só até a quinta-série, aí ela ajuda muito a c. 39. Eu falo vai na vizinha pede para ela te ajudar. Quando não tem ela, eu mando ela ir para casa da minha cunhada (Resp. 39).

Quando eu estou trabalhando na lavoura o tempo é pouco, é corrido, sai de noite chega tarde, sempre meu esposo ajuda o c. 42. Ele que entende mais um pouquinho, ele ajuda (Resp. 41).

Eu acho que eu poderia organizar mais e tirar um tempo para estudar junto com eles, acho que está passando da hora de eu fazer isso, porque sempre falo que vou fazer e não faço (Resp. 20).

Assim não tem um descanso, já fiquei muito sobrecarregada e acaba deixando a gente um pouco sem chão para gente agir com a vida da gente. Eu coloco muito Deus na frente de tudo, eu peço a Deus para me ajudar (Resp. 9).

Classe 2: Relações com a escola

Nesta classe, a relação com a escola foi o tema principal, em que os pais disseram ter uma relação satisfatória, principalmente com o corpo docente. Quase em unanimidade no corpus, essa relação foi positiva, muitas vezes, avaliada pela presença deles na escola e pelo fato de comparecerem às reuniões ou sempre que são chamados. Os pais falaram, ainda, da relação aluno-escola, em que avaliaram, de forma geral, que os filhos se sentem bem e incluídos. Entretanto, quando questionados, não sabem dizer o que é inclusão educacional.

Boa, também, graças a Deus, boa relação com a escola, todas as professoras dela são boazinhas. Ela se sente bem, ela não reclama. Não sei o que inclusão (Resp. 3).

Eu sempre busco e levo, sempre que me chama eu vou, estou aqui sempre, então, é fácil. A relação com as professoras é boa. Ele se sente bem na escola, sente incluído (Resp. 31).

Quando tem reunião, assim, eu venho né, sempre estou aqui, tenho boa relação com professores. Ela se sente bem, está incluída (Resp. 8).

Nunca tive problema na escola não. Ele se sente bem na escola, parece se sentir bem à vontade com os coleguinhas, com a professora, inclusive gosta de mais (sic) dela (Resp. 32).

Classe 3: Participação na escola

Os pais falaram mais especificamente das situações que envolvem a família e a escola. Assim, eles se colocaram como participativos e presentes, destacando uma boa comunicação. Ainda, disseram que conversam com os filhos diante de situações conflitantes que ocorrem no cotidiano escolar, buscando auxiliá-los e remediar esses conflitos. Pôde-se observar, através dos relatos, que os pais veem a escola como importante e como um recurso no desenvolvimento dos filhos.

Sempre a escola me chama eu atendo. Muitas vezes a diretora me liga e fala que precisa conversar comigo, que o c. 44 está aprontando, aí eu venho ver o que está acontecendo (Resp. 42)

À escola eu venho diariamente, sempre que precisa eu venho, porque o c. 30 precisa muito... que nem a gente que é mãe, que é “especial”, a gente tem que correr atrás para poder estar ajudando ele (Resp. 30).

Acontece alguma coisa eu converso com ele, porque a escola é a segunda casa do menino. Toda vez eu venho, tento resolver, conversar. Só essa última professora eu não tive muita relação com ela (Resp. 37).

Falo para ele que a escola não é chata. Às vezes, tadinho, acontece de ele ficar revoltado falar que vai soltar uma bomba na escola, porque ele ouve isso, eu até conversei na escola, mas eu falo que ele não pode falar isso (Resp. 26).

Aí eu trago ela, quando eu estou em casa eu trago. Eu pergunto para professora como ela está na escola como estão as atividades. A professora dela me explica diz que trabalha diferente com ela dos outros alunos (Resp. 1).

Essa escola é a melhor para o caso dele, se ele tivesse em outra escola não ia ser tão bom. A escola atendeu rápido quando precisou da professora de apoio foi bom para ele (Resp. 31).

Classe 4: Dificuldades dos filhos

Na classe 4, foram relatadas as dificuldades dos filhos, no que se refere ao desenvolvimento da aprendizagem, além daquilo que os responsáveis fazem para conseguir auxiliar, mostrando recursos pessoais.

Muito difícil ele lê palavras simples, só palavras de duas sílabas só, se tiver um “r” ou “m” no meio ele já não dá conta mais. Escrever, ele escreve bem, tem dificuldade, mas escreve o que a professora passa (Rep. 22).

Ela não tem facilidade, tem mais dificuldade ela não sabe ler, para escrever ela escreve muito errado, o nome dela ué... o nome dela ela não sabe escrever direito. Na matemática é muito ruim também (Resp. 19).

Quando eu vejo que ele está com dificuldade de algo ali dentro da sala, eu tenho o caderninho em casa, né, aí eu copio no caderno de pontinho para ele passar por cima e treinar (Resp. 42).

Eu leio com ele, ajudo fazer o dever, ele faz direitinho... quando não vai dever, a gente faz alguma coisa para ele escrever (Resp. 29).

Na mesma classe, os pais, além de apontarem as dificuldades dos filhos, também sinalizaram as dificuldades próprias e os desafios que encontram ao tentar prestar auxílio. Esses desafios referem-se principalmente ao ensinar, pois eles relataram que não têm formação suficiente para tal, ressaltando os sentimentos associados. Outro desafio apontado foi a falta de tempo e o não saber lidar com o comportamento dos filhos diante das situações em que precisam ajudá-los.

Não, eu acho que não ajudo ela a se desenvolver, porque eu tenho pouca leitura, né. E eu não aprendi ler e a escrever direito, só sei o básico mesmo, eu parei de estudar (Resp. 1).

Não, em casa eu não faço nada para ajudar, porque eu também sou analfabeta, então eu não tenho nem muito o que ensinar, porque eu sei bem pouco (Resp. 41).

O problema é que eu falo para eles irem tentando por conta própria, porque dói meu coração de eu não ter leitura, dói meu coração quando eles pedem para eu ajudar eles, mas eu não tenho leitura, não tem como (Resp. 40).

Eu ajudo no que eu posso, mas todo final de semana que eu estou em casa ela vai para escola, então desencontra. Acho que a falta de paciência, ela não tem paciência, aí fica muito crítica e nervosa, daí atrapalha a gente ajudar ela (Resp. 21).

Classe 5: Percurso do diagnóstico e acompanhamentos

Os responsáveis falaram especificamente sobre o percurso do diagnóstico e como descobriram a deficiência do filho. Os acompanhamentos realizados no momento também foram apresentados; a Associação de Pais e Alunos Excepcionais (APAE) é bastante citada no discurso, como sendo um local para identificação do diagnóstico e acompanhamento.

Aí no final do ano eu levei ela na APAE, aí passou na psicóloga, fonoaudióloga, tudo lá. Aí falou que ela tem deficiência intelectual mesmo. Aí esse ano não está tendo vaga (Resp. 19).

Eu levei ele na APAE e falaram que era deficiência intelectual. Ele é uma criança quieta não gosta de brincar com outras crianças, não fala muito. Hoje ele faz acompanhamento na APAE, vai toda sexta e não toma medicamento (Resp. 25).

Levei ele no neuropediatra, aí ele já passou remédio para TDAH, aí depois ele fez um teste cognitivo e comprovou que tem um déficit cognitivo, com deficiência intelectual. Hoje ele faz acompanhamento, eu levo de seis em seis meses na Universidade Federal de Uberlândia (UFU) (Resp. 26).

Com três anos o c. 27 estudava na creche, aí a APAE foi lá e pediram para levar ele lá. Aí eu levei, aí eles falaram que ele precisava fazer o acompanhamento lá para ver o que ele tinha, porque ele estava com o comportamento diferente (Resp. 27).

CID 70.8, é problema mental leve, eu descobri tem pouco na APAE. Ela foi para creche, aí viram que ela tinha dificuldade e mandaram para a APAE (Resp. 11)

O processo de inclusão para professoras

O corpus geral, constituído pelas entrevistas das professoras, foi formado por 34 textos, separados em 1.056 STs, com aproveitamento de 835 desses segmentos, uma porcentagem de 78,93%, considerada satisfatória. Emergiram 37.048 ocorrências (palavras, formas ou vocábulos). Na Classificação Hierárquica Descendente (CHD), obtiveram-se cinco classes, conforme apresentado na Figura 3:

Figura 3
Dendograma da Classificação Hierárquica Descendente (CHD) do corpus textual da entrevista das professoras

A Figura 3 apresenta a divisão nas cinco classes, a porcentagem de cada classe em relação ao corpus, os nomes atribuídos, as dez palavras mais representativas, com a frequência na classe e o valor do qui-quadrado (X²). Assim como o corpus dos responsáveis, houve quatro ramificações: a primeira deu origem à Classe 5 e subdividiu as Classes 1, 2, 3 e 4; na segunda, de um lado ficou a classe 2 e, do outro, as classes 1-3-4, em que houve a terceira subdivisão em classe 1 e quarta em classe 3-4. Observa-se a Classe 1(vermelha - Entendimento do processo de Inclusão) com 147 STs de 835 STs, o que representa 17,68% do corpus aproveitado; a Classe 2 (cinza - Relação escola-família), com 207/835 (24,79%); a Classe 3 (verde - Dificuldades no Processo de Inclusão), com 193/835 (23,11%); a Classe 4 (azul - Práticas das professoras dentro da sala de aula), com 139/835 (16,65%); e a Classe 5 (roxa - Desenvolvimento do aluno), com 148/835 (17,84%). A figura 4 apresenta a análise fatorial de correspondência (AFC):

Figura 4
Análise fatorial de correspondência (AFC) das classes lexicais obtidas na classificação hierárquica descendente do corpus dos responsáveis.

Na figura 4, observam-se essas classes representadas em plano fatorial; as palavras de todas as classes se apresentam num segmento centralizado que se expande para pontos mais distantes; a classe 5 (roxa - Desenvolvimento do aluno) ocupa um quadrante diferente das outras classes, assim como a classe 2 (cinza - Relação escola-família). As outras classes estão mais próximas, enquanto a classe 1 (vermelha - Entendimento do processo de Inclusão) se distancia mais das classes 3 (verde - Dificuldades no Processo de Inclusão) e 4 (azul - Práticas das professoras dentro da sala de aula). A seguir, será apresentada a descrição detalha de cada classe.

Classe 1: Entendimento do processo de Inclusão

Nesta primeira classe, as professoras falaram sobre o entendimento que elas têm sobre o processo de inclusão. Esse entendimento perpassa a ideia de que incluir está além de apenas inserir o aluno com deficiência em sala regular, sendo necessário que seja feito algo a mais para que ele possa se desenvolver e realmente ser incluído. As professoras mostraram entendimento teórico do que é a inclusão educacional e reconheceram a discrepância com a realidade prática.

Pelo que eu entendo de inclusão escolar, a gente tem que tentar colocar no convívio nosso do dia a dia aquele aluno que tem alguma dificuldade, alguma deficiência, mas incluir de verdade e não colocar lá só para fazer número, sem fazer nada por esse aluno (Prof. 8).

A inclusão é você não apenas inserir o aluno na escola, mas também criar possibilidade para o desenvolvimento dentro do que ele pode (Prof. 27).

Toda criança que tem uma certa deficiência de aprendizado ela tem direito a frequentar a escola normalmente, né. E a gente, nós professores, a gente tem um trabalho dobrado, porque a gente trabalha com eles diferenciado (Prof. 1)

Então é nessa parte aí que eu acho que não está acontecendo a inclusão né, porque só jogar o aluno dentro da sala de aula não é suficiente. Para a gente realmente trabalhar a inclusão teria que ter esse atendimento com o aluno, para ele estar desenvolvendo as habilidades dele (Prof. 2).

Classe 2: Relação escola-família

Esta classe é formada por relatos das professoras sobre a relação que elas e a escola, como um todo, têm com as famílias e como isso impacta no desenvolvimento, na aprendizagem e na inclusão dos alunos. Esses relatos dividem-se em famílias que não são presentes e não ajudam os filhos, e em famílias que são presentes e conseguem prestar o apoio necessário. As professoras, em grande parte, entretanto, falaram sobre famílias que são ausentes e que têm problemas familiares internos, os quais impactam no desenvolvimento dos filhos.

Eu tenho outra que tem um pouco de dificuldade, mas a mãe já apoia em tudo, então ela vem no reforço e ela melhorou muito (Prof. 3).

Eles participam junto, aceita né, a mãe que está sempre mais perto da gente, porque é ela que busca, colabora com a gente (Prof. 5).

Essa dificuldade também pode estar relacionada, muito, à estrutura familiar, porque a gente percebe o meio que convive, então, acho que isso pode interferir muito. A gente percebe que a mãe, às vezes, não tem pulso firme para ele fazer o dever (Prof. 32).

Ela mesma tem que cuidar das coisas dela... parece que até o lar dela é uma bagunça. O problema dela que eu acho é a família, a mãe dela não resolve não, o pai já tenta um pouco resolver. O problema intelectual dela para mim é mais fácil, está na psicóloga e psiquiatra (Prof. 7).

A outra na minha opinião se ela tivesse um apoio, se alguém sentasse com ela, ela iria alfabetizar sim. A c. 7, inclusive, eu conversei como a mãe. Ela não dá esse apoio de ela vir no reforço de manhã (Prof. 3).

Classe 3: Dificuldades no Processo de Inclusão

Nesta classe, as professoras trouxeram relatos sobre as maiores dificuldades vivenciadas no processo de inclusão dos seus alunos, as quais envolvem problemas do dia a dia, como dar atenção igualmente para o aluno com deficiência e para o restante da turma, conciliar atividades mais individualizadas e a falta de um professor de apoio. Outro ponto é a falta de apoio estrutural por parte da escola ou da implementação de políticas públicas que garantissem um profissional de apoio nas salas comuns.

Acho que o que mais dificulta é a falta de apoio e estrutura, porque acaba que a gente não tem tempo. A atenção que ele precisa total, eu não consigo dar, tenho 26 crianças (Prof. 25).

Tem sala que tem dois três alunos com essa dificuldade, então, assim para o professor estar trabalhando sem apoio fica meio complicado, porque muitas vezes exige um plano à parte. Pôr no papel é fácil, o difícil é você pôr na prática (Prof. 2).

Me incomoda e incomoda a sala toda. E eu acabo ficando brava com ele por isso, porque eu não consigo dar atenção necessária para ele, porque eu preciso que o resto da turma aprenda (Prof. 1).

O aprendizado dele fica prejudicado pela falta do professor de apoio, pois tenho que dar conta da turma toda e ele precisa de uma atenção especial (Prof. 11).

Classe 4: Práticas das professoras dentro da sala de aula

Na classe 4, foram abordadas as práticas que as professoras utilizam em sua vivência cotidiana dentro de sala de aula, o que contempla os recursos utilizados, como as atividades específicas, individualizadas e adaptadas às necessidades dos alunos com deficiência intelectual. Outro recurso é o trabalho em duplas ou grupo, para que os alunos com deficiência possam ser auxiliados pelos colegas de classe.

Um trabalho voltado para as necessidades dele, para as habilidades que ele já domina e precisa aprimorar. Então eu trabalho específico, atividades específicas para ele, mas

também atividades integradas com a turma para ele, também, sentir estar interagindo com todos os colegas (Prof. 9).

É um desafio a gente tem que estar buscando sempre aprender um pouco mais, procurar atividades diferenciadas (Prof. 8).

Procurar trabalhar atividades para que ele possa envolver e desenvolver de acordo com a etapa em que ele se encontra... tem que adaptar, tem que mudar, tem que trabalhar de acordo com o nível da criança e buscar material que atenda ao que ele necessita (Prof. 9).

Aí sempre tem aqueles alunos que eles têm afinidade e que se senta junto, eles fazem tudo, vai depender com quem você colocar (Prof. 6).

Classe 5: Desenvolvimento do Aluno

Por fim, nessa última classe, as professoras relataram as dificuldades e o desenvolvimento dos alunos. As dificuldades referem-se às questões de aprendizado com escrita, leitura e matemática, em que também é citado o que é feito diante dessas dificuldades (assemelhando-se à classe 4). As participantes também abordaram as evoluções que os alunos tiveram ao longo do trabalho conjunto professor-aluno.

Ela não lê não identifica o alfabeto, só algumas letras. Parece que tem dia que ela conhece mais, outros dias menos, tipo um esquecimento. Não consegue juntar sílabas, consegue falar se eu ajudar e pronunciar (Prof. 29).

Eu dou atividade para ela mais trabalhando o alfabeto, mas tudo de letra de imprensa, ela não consegue fazer nada cursivo, nem o nome dela completo sem a ficha ela consegue (Prof. 1).

Mas na matemática, agora que a gente está conhecendo os números, depois do trinta ela conta até quase cem, mas ela não conhece os números ainda todos. Então, o plano de aula dela é totalmente separado (Prof. 6).

Não se expressava muito bem, hoje já está mais expressiva. No início do ano estava lendo sílabas simples, hoje já começou a ler frases simples acho que teve uma evolução significativa (Prof. 30).

Sempre falava para ele pensar do jeito que conseguia. Foi um trabalho de formiga, aos poucos. Agora já consegue escrever palavras simples, formar frases, consegue escrever o nome inteiro (Prof. 32).

DISCUSSÃO

O presente estudo teve como objetivo verificar como está ocorrendo o processo de inclusão de alunos com deficiência intelectual, identificando recursos e dificuldades, de acordo com responsáveis e professores. A seguir, primeiramente, será feita a discussão do processo de inclusão para responsáveis, posteriormente se discutirá o processo de inclusão para professoras; por fim, serão feitas discussões sobre a relação família-escola.

O processo de inclusão para os responsáveis

A análise das entrevistas com os responsáveis originou cinco classes: Contexto familiar, recursos e dificuldades dos pais; Relações com a escola; Participação na escola; Dificuldades dos filhos; Percurso do diagnóstico e acompanhamentos. Essas classes expressam vivências e compreensões dos pais no que tange a recursos e dificuldades do processo de inclusão escolar.

A Classe 1 (Contexto familiar, recursos e dificuldade dos pais) aponta que a questão da deficiência perpassa o cotidiano, as relações familiares e como as famílias se organizam. Há famílias que conseguem estabelecer uma rotina, impor limites e buscar meios de auxiliar os filhos (Resp. 30, Resp. 39, Resp. 41). Tal fato sinaliza que essas famílias estão encontrando recursos e cumprindo sua função no apoio ao processo educacional e desenvolvimento dos filhos (Dessen & Polonia, 2007Dessen, M. A., & Polonia, A. C. (2007). A família e a escola como contextos de desenvolvimento humano. Paidéia, 17(36), 21-32.; Marturano & Elias, 2016Marturano, E. M., & Elias, L. C. S. (2016). Família, dificuldades no aprendizado e problemas de comportamento em escolares. Educar em Revista, 59, 123-139.). Entretanto, foram muitas as dificuldades relatadas, como a falta de tempo, devido a uma rotina de trabalho, o que traz sentimentos de sobrecarga (Resp. 20, Resp. 41, Resp. 9). Observou-se que 42,2% dos responsáveis trabalhavam fora, o que parece impactar na organização familiar. Essa necessidade de organização, de manejar a rotina e o tempo é uma questão inerente da vida dos pais de filhos com deficiência, já que precisam alinhar as demandas do trabalho com as necessidades e a atenção que os filhos exigem, além de dispor de tempo para acompanhar as consultas médicas e outros atendimentos (Cerqueira et al., 2016Cerqueira, M. M. F., Alves, R. O., & Aguiar, M. G. G. (2016). Experiências vividas por mães de crianças com deficiência intelectual nos itinerários terapêuticos. Ciência & Saúde Coletiva, 21(10), 3223-3232.; Rosário & Silva, 2016Rosário, H. R. M. F., & Silva, S. S. C. (2016). Estratégias adotadas pelos pais na vivência da escolarização de filhos adultos e crianças com deficiência. Revista de Enfermagem Referência, ser IV(11), 51-59.). Outra dificuldade relatada consiste em ajudar os filhos nas tarefas escolares, o que esbarra no nível de escolarização desses responsáveis, como menciona a responsável 39; essa questão também aparece na Classe 4 (Dificuldade dos filhos), na qual os responsáveis 1, 40 e 41 relatam incapacidade em assistir os filhos e o quanto isso se torna difícil para eles; observou-se que 42,8% dos participantes declararam Ensino Fundamental incompleto, evidenciado que grande parcela desses pais não teve uma formação completa, o que dificulta auxiliar os filhos frente ao desenvolvimento das tarefas escolares, mesmo que eles sintam essa necessidade e tenham interesse em fazê-lo.

Essas dificuldades em conciliar o trabalho e o apoio aos filhos, os desconhecimentos e as incapacidades para auxiliar no desenvolvimento escolar necessitam de um olhar cauteloso de não culpabilização dessas famílias, pois envolvem questões sociais e econômicas que não estão no controle dos pais (maior parte das famílias na classe D-E de classificação econômica). Despertam, também, para a urgência de uma aproximação com a equipe escolar, objetivando entender como essas famílias podem ser auxiliadas, já que os pais são peças-chave para o desenvolvimento, o envolvimento e a percepção dos filhos com deficiência intelectual em relação à escola (Coelho, Campos & Benitez, 2017Coelho, G., Campos, J. A. P. P., & Benitez, P. (2017). Relatos de pais sobre a inclusão e a trajetória escolar de filhos com deficiência intelectual. Psicologia em Revista, (23)1, 22-41.). Portanto, fica evidente a necessidade de as famílias terem apoio, inclusive, no sentido de emponderá-las para reconhecerem a importância das suas ações. Tal apoio pode vir tanto da escola quanto de profissionais de saúde (Rosário & Silva, 2016Rosário, H. R. M. F., & Silva, S. S. C. (2016). Estratégias adotadas pelos pais na vivência da escolarização de filhos adultos e crianças com deficiência. Revista de Enfermagem Referência, ser IV(11), 51-59.).

As classes 2 (Relações com a escola) e 3 (Participação na escola) mostram a importância da relação com o meio escolar e como os filhos se sentem nesse meio. Na Classe 2, os responsáveis relatam que os filhos se sentem bem no ambiente educacional e incluídos (Resp. 3, Resp. 8, Resp. 31, Resp. 32), mesmo sem saber conceituar a inclusão (Resp. 3), o que mostra, mais uma vez, uma falta de conhecimento relevante, que vai impactar diretamente no processo de inclusão e que precisa ser trabalhado (Rosário & Silva, 2016Rosário, H. R. M. F., & Silva, S. S. C. (2016). Estratégias adotadas pelos pais na vivência da escolarização de filhos adultos e crianças com deficiência. Revista de Enfermagem Referência, ser IV(11), 51-59.). Na Classe 3 (Participação na escola), eles disseram que conseguem conversar com os filhos diante de situações-problemas (Resp. 1 e Resp. 26), o que é importante, pois evidencia que esses responsáveis se preocupam e acompanham as situações que ocorrem no cotidiano escolar.

Nessas classes 2 e 3, a relação família-escola também é abordada. Os pais relataram ter uma boa relação com a escola e professoras, com comunicação constante, proximidade (Resp. 3, Resp. 8, Resp. 30 e Resp. 31) e com interesse em saber como os filhos estão se desenvolvendo (Resp. 1 e Resp. 30). Para alguns, essa relação é avaliada pelo comparecimento na escola, quando há uma solicitação ou em reuniões (Resp. 8 e Resp. 42). Segundo o estudo de Christovam e Cia (2016Christovam, A. C. C., & Cia, F. (2016). Comportamentos de pais e professores para promoção da relação família e escola de pré-escolares incluídos. Revista Educação Especial, 1 (1), 133-146. https:⁄⁄doi.org⁄10.5902⁄1984686X13441.
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), a maior parte dos pais de alunos com deficiências comparecem à escola quando convocados e usam as reuniões para contato. Entretanto, faz-se importante que a comunicação ocorra para além desses momentos, em um processo contínuo; destaca-se, portanto, a importância de intervenções sistemáticas e focadas para melhorar essa comunicação.

Em geral, a escola foi vista de forma positiva e como um importante recurso protetivo para os pais e alunos, conforme relatou a responsável 31, segundo a qual a escola em questão foi a melhor para o caso do filho, mostrando, assim, a importância da inclusão educacional e da necessidade de os alunos com deficiência intelectual serem recebidos com carinho e dedicação pela equipe (Coelho et al., 2017Coelho, G., Campos, J. A. P. P., & Benitez, P. (2017). Relatos de pais sobre a inclusão e a trajetória escolar de filhos com deficiência intelectual. Psicologia em Revista, (23)1, 22-41.; Luiz & Nascimento, 2012Luiz, F. M. R, & Nascimento, L. C. (2012). Inclusão escolar de crianças com síndrome de down: experiências contadas pelas famílias. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(1), 127-140.). Em contrapartida, a literatura mostra que o processo de inclusão nem sempre é visto de forma positiva pelos pais. Maturana & Cia (2015Maturana, A. P. P. M., & Cia, F. (2015). Educação Especial e a Relação Família - Escola: Análise da produção científica de teses e dissertações. Psicologia Escolar e Educacional, 19(2), 349-358.) avaliaram 20 estudos sobre a parceria família-escola, em que a maioria das famílias estudadas tinha uma compreensão negativa do processo de inclusão, indicando como problemáticos a falta de investimentos, o descrédito dado aos alunos e a não aquisição de conhecimento escolar.

Na Classe 4 (Dificuldades dos filhos), os pais relataram as adversidades dos filhos no âmbito escolar. Eles disseram que os filhos têm muitas dificuldades cognitivas (ler e escrever) (Resp. 22 e Resp. 19), o que pode sinalizar que eles provavelmente não têm uma compreensão das questões diagnósticas, bem como limitações que os filhos venham a apresentar, já que essas dificuldades são inerentes à deficiência (Rosário & Silva, 2016Rosário, H. R. M. F., & Silva, S. S. C. (2016). Estratégias adotadas pelos pais na vivência da escolarização de filhos adultos e crianças com deficiência. Revista de Enfermagem Referência, ser IV(11), 51-59.). Entende-se que, ao prover esse conhecimento, os pais tendem a ter uma maior compreensão para com os filhos. Estudos mostram que uma das necessidades mais comuns dos pais de crianças com deficiência é a de informação; portanto, eles precisam ser apoiados quanto a esse aspecto, já que essa informação nem sempre é disponibilizada (Borges et al., 2011Borges, L., Gualda, D. S., & Cia, F. (2011). O papel do professor na relação com as famílias de crianças pré escolares incluídas. Congresso Brasileiro multidisciplinar de educação especial, 6. - encontro da Associação Brasileira de pesquisadores em educação especial, 7.; Christovam & Cia, 2013Christovam, A. C. C., & Cia, F. (2013). O Envolvimento parental na visão de pais e professores de alunos com necessidades educacionais especiais. Revista Brasileira de Educação Especial, 19(4), 563-581.; Cerqueira et al., 2016Cerqueira, M. M. F., Alves, R. O., & Aguiar, M. G. G. (2016). Experiências vividas por mães de crianças com deficiência intelectual nos itinerários terapêuticos. Ciência & Saúde Coletiva, 21(10), 3223-3232.; Pavão et al., 2016). Além disso, foi possível identificar recursos desenvolvidos pelos próprios pais (Resp. 42 e Resp. 29), o que, mais uma vez, mostra a importância de orientação para que eles consigam buscar meios de auxiliar os filhos e enfrentar as adversidades.

Outro ponto a ser salientado é que os responsáveis entendiam que os filhos não estavam conseguindo se desenvolver no meio escolar, o que mostra um ponto falho da inclusão, que necessita de intervenções para o desenvolvimento integral dos alunos (cognitivo e social) (Rahme et al., 2019Rahme, M. M. F., Ferreira, C. M. R. J, & Neves, L. R. (2019). Sobre Educação, Política e Singularidade. Educação & Realidade, 44(1), 1-13.). Nesse ponto, pode ser discutida a questão do Atendimento Educacional Especializado (AEE), pois é o serviço que tem a função de trabalhar com as dificuldades e necessidades individuais de cada aluno, buscando desenvolvimento. Apesar de ser um direito dos alunos com deficiência, nem todos os participantes frequentavam o serviço, o que explica o não aparecimento dessa informação de forma significativa na análise geral das entrevistas. Tal fato levanta a grave problemática da discrepância entre o que é estabelecido e o que ocorre na prática. Entende-se que o AEE é um importante recurso para os alunos com deficiência intelectual (Lopes & Marquezine, 2012Lopes, E., & Marquezine, M. C. (2012). Sala de recursos no processo de inclusão do aluno com deficiência intelectual na percepção dos professores. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(3), 487-506.). Pasian, Mendes e Cia (2017Pasian, M. S., Mendes, E. G., & Cia, F. (2017). Aspectos da organização e funcionamento do atendimento educacional especializado: um estudo em larga escala. Educação em Revista, 33, 1-18.) dissertam sobre a importância do AEE, mas evidenciam problemáticas, como a falta de acesso, que se dá pela impossibilidade de se deslocar para escola em contraturno, pelos números de serviços insuficientes em algumas regiões e por questões estruturais.

Na Classe 5 (Percurso do diagnóstico e acompanhamentos), foi observado que os pais enfrentaram um longo caminho até que o diagnóstico de deficiência intelectual fosse concebido e que, de forma geral, buscaram providenciar atendimentos e acompanhamentos para subsidiar a melhoria de qualidade de vida dos filhos, como acompanhamentos médicos e na Associação de Pais e Amigos Especiais (APAE). A APAE, nesse contexto, é tida como importante recurso e aparece na fala da maioria dos pais. A instituição atualmente se estabelece como centro multiprofissional que presta serviços de educação, saúde e assistência social a pessoas com deficiência. Luiz e Nascimento (2012Luiz, F. M. R, & Nascimento, L. C. (2012). Inclusão escolar de crianças com síndrome de down: experiências contadas pelas famílias. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(1), 127-140.) evidenciaram que, para os pais, a APAE constituía um local de acolhimento, inclusive, para apoiar o processo de inclusão educacional, em que havia conforto e segurança por parte dos profissionais. Vilaronga e Mendes (2014Vilaronga, C. A. R., & Mendes, E. G. (2014). Ensino colaborativo para o apoio à inclusão escolar: práticas colaborativas entre os professores. Revista Brasileira de Educação, 95(239), 139-151.) ressaltam a importância de a instituição especializada atuar de forma colaborativa com a escola regular, de modo a estabelecer estratégias para a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos.

Na Análise Fatorial por Correspondência (AFC) (plano fatorial) e nas ramificações das classes, é possível compreender a relação entre elas, de modo a confirmar os resultados acima. A Classe 4 (Dificuldades dos filhos) está ligada e próxima à Classe 1 (Contexto familiar, recursos e dificuldades dos pais), mostrando que as dificuldades dos filhos impactam no cotidiano e nas relações familiares. Ainda a Classe 1 (Contexto familiar, recursos e dificuldades dos pais) está próxima e ligada às Classes 2 (Relações com a escola) e 3 (Participação na escola), que envolvem a escola. Tal fato evidencia que o contexto familiar, como a família se organiza e como presta apoio perante as dificuldades, vai impactar diretamente nas relações com a escola. A Classe 5 (Percurso do diagnóstico e acompanhamento), apesar de se ligar a todas as outras classes, está mais distante, mostrando que não há um impacto tão direto, pois esses acompanhamentos, embora importantes para o desenvolvimento, muitas vezes não ocorrem em diálogo com a escola, devido à dificuldade de comunicação entre profissionais especialistas, família e profissionais do meio escolar.

Essas classes também podem ser analisadas de forma a entender se elas compreendem recursos ou dificuldades para os responsáveis. Pode-se dizer que a Classe 1 (Contexto familiar, recursos e dificuldades dos pais) compreende dificuldades, sendo que os itens falta de tempo e nível de escolaridade se sobressaem. Tem-se que as dificuldades podem levar ao enfrentamento e consequentemente ao desenvolvimento de alguns recursos, como relatado pela responsável 39, que mencionou suas dificuldades em ensinar, por não saber o conteúdo, pedindo auxílio à vizinha ou a outras pessoas da família (recurso encontrado). A Classe 2 (Relações com a escola) pode ser compreendida como recurso, pois evidencia pontos positivos que os responsáveis elencam, como ter uma boa relação com a escola, com professores, e o fato de os filhos se sentirem bem. A Classe 3 (Participação na escola) também mostra recursos ao evidenciar que os pais têm uma conduta positiva em relação à escola, são presentes, acompanham e apoiam os filhos em adversidades. A Classe 4 (Dificuldades dos filhos) evidencia dificuldades dos filhos no desenvolvimento escolar. Alguns recursos dos pais são destacados, como treinar a escrita e leitura; entretanto, mais uma vez também são evidenciadas dificuldades que impedem o auxílio - portanto, é uma classe de dificuldade. A Classe 5 (Percurso do Diagnóstico e Acompanhamento) mostra um importante recurso para os responsáveis de acordo com sua fala; entretanto, como pôde ser visto na AFC, não está sendo um recurso no desenvolvimento escolar.

O processo de inclusão para professoras

Na análise das entrevistas das professoras formaram-se as classes: Entendimento do processo de inclusão; Relação escola-família; Dificuldades no processo de inclusão; Práticas das professoras dentro da sala de aula; e Dificuldades dos alunos. Tais classes correspondem às vivências e percepções das professoras sobre recursos e dificuldades do processo de inclusão escolar que impactam nas metodologias utilizadas para trabalhar com a inclusão e no manejo das dificuldades dos alunos.

Na Classe 1 (Entendimento do processo de Inclusão), que abrange o entendimento que as professoras têm da educação inclusiva, elas disseram que inclusão é trabalhar com os alunos de forma a olhar as necessidades individuais e buscar o desenvolvimento (Prof. 27 e Prof. 8). Esse é um conhecimento condizente com as teorias que embasam a educação especial/inclusiva e com normativas como a Política Nacional de Educação Especial (Brasil, 2008). No entanto, as professoras relataram dificuldades e problemas com a prática da inclusão (Prof. 1 e Prof. 2), principalmente quanto a atender as necessidades dos alunos. Sabe-se que a formação inicial e a capacitação são fatores importantes para efetivação da inclusão (Gomes & Souza, 2012Gomes, C., & Souza, V. L. T. (2012). Psicologia e inclusão escolar: reflexões sobre o processo de subjetivação de professores. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(3), 588-603.; Garcia, 2013Garcia, R. M. C. (2013). Política de educação especial na perspectiva inclusiva e a formação docente no Brasil. Revista Brasileira de Educação, 18(52), 101-119.; Tavares et al., 2016Tavares, L. M. F. L., Santos, L. M. M., & Freitas, M. N. C. (2016). A Educação Inclusiva: Um estudo sobre a formação docente. Revista Brasileira de Educação Especial, 22(4), 527-542.). Das professoras do estudo, 44,12% relataram ter especialização em educação inclusiva. Apesar de a questão da formação docente não ter sido um tema aparente nas entrevistas e as professoras evidenciarem conhecimentos condizentes com as diretrizes, elas ainda relataram dificuldades práticas no processo, o que mostra que o conhecimento não está sendo suficiente para subsidiar a prática docente na inclusão e que a capacitação docente e a formação continuada são importantes. Silva e Carvalho (2017Silva, N. C., & Carvalho, B. G. E. (2017). Compreendendo o Processo de Inclusão Escolar no Brasil na Perspectiva dos Professores: uma Revisão Integrativa. Revista Brasileira de Educação Especial, 23(2), 293-308.), em revisão de literatura, evidenciaram que os professores das classes comuns apresentam desconhecimentos quanto à política de inclusão, quanto às capacidades e limitações do aluno no que tange à deficiência, destacando que, para a efetivação de suas ações, são necessários recursos públicos e profissionais especializados na área de educação especial. Portanto, aqui, entende-se a importância do contato do professor da sala comum com o professor da educação especial para subsidiar a prática e atenuar as dificuldades mencionadas. Além disso, as professoras destacam, no entendimento sobre a inclusão, a discrepância entre teoria e prática (Prof. 2), entendendo-se o quanto isso traz impactos no processo de inclusão (Matos & Mendes, 2015Matos, S. N., & Mendes, E. G. (2015). Demandas de Professores Decorrentes da Inclusão Escolar. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(1), 9-22.).

Na Classe 2 (Relação escola-família), as professoras abordaram a relação com a família, compreendendo que há famílias que conseguem apoiar os filhos e que isso é importante (Prof. 3 e Prof. 5). Entretanto, em maior parte existiram relatos de famílias que não conseguem acompanhar os filhos (Prof. 32, Prof. 7 e Prof. 3), o que, de acordo com elas, é um impacto para a inclusão. A Professora 3, que tem duas crianças com deficiência intelectual em sala, percebe diferenças nas famílias e como o fato traz resultados distintos. Conclui-se que a família próxima à escola auxilia no desenvolvimento dos alunos e na efetivação da inclusão (Benitez & Domeniconi, 2012Benitez, P., & Domeniconi, C. (2012). Verbalizações de familiares durante aprendizagem de leitura e escrita por deficientes intelectuais. Estudos de Psicologia, 29(4), 553-562.; Brandão & Ferreira, 2013Brandão, M. T., & Ferreira, M. (2013). Inclusão de crianças com necessidades educativas especiais na educação infantil. Revista brasileira de educação especial, 19(4), 487-502.); no entanto, são encontradas ausências e falta de apoio por parte dos responsáveis, o que necessita de intervenções (Maturana & Cia, 2015Maturana, A. P. P. M., & Cia, F. (2015). Educação Especial e a Relação Família - Escola: Análise da produção científica de teses e dissertações. Psicologia Escolar e Educacional, 19(2), 349-358.; Santos & Martins, 2015Santos, T. C. C., & Martins, L. A. R. (2015). Práticas de Professores Frente ao Aluno com Deficiência Intelectual em Classe Regular. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(3), 395-408.).

Sobre a Classe 3 (Dificuldades no processo), a maior parte das dificuldades refere-se à falta de um apoio - estrutural e profissional - (Prof. 25, Prof. 2 e Prof. 11). Essas dificuldades são representadas em muitos estudos. Silveira et al. (2012Silveira, K. A., Enumo, S. R. F., & Rosa, E. M. (2012). Concepções de professores sobre inclusão escolar e interações em ambiente inclusivo: Uma revisão da literatura. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(4), 695-708.), por exemplo, identificaram a falta de apoio, de equipe especializada, de recursos e materiais assistivos como principais dificultadores. Ainda se relatou a presença de sentimento negativo (Prof. 21), que pode se relacionar ao despreparo do professor para realizar o trabalho sob a perspectiva inclusiva (Faria & Camargo, 2018Faria, P. M. F., & Camargo, D. (2018). As Emoções do Professor Frente ao Processo de Inclusão Escolar: uma Revisão Sistemática. Revista Brasileira de Educação Especial, 24(2), 217-228.) e a essa falta de apoio, que pode gerar sobrecarga física e mental (Melo & Ferreira, 2009Melo, F. R. L. V., & Ferreira, C. C. A. (2009). O cuidar do aluno com deficiência física na educação infantil sob a ótica das professoras. Revista Brasileira de Educação Especial, 15(1), 121-140.). Segundo Matos e Mendes (2015Matos, S. N., & Mendes, E. G. (2015). Demandas de Professores Decorrentes da Inclusão Escolar. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(1), 9-22.), as dificuldades e demandas das professoras na inclusão educacional perpassam várias nuances: a necessidade de acolhimento psicológico; a formação docente e capacitação para entendimento das necessidades dos alunos; as adequações das condições físicas, materiais e pedagógicas; a contratação de profissionais para apoiar o processo de inclusão; e as políticas para melhoria das condições de trabalho dos professores. Portanto, aqui se destaca a extrema necessidade de intervenções estruturais e no âmbito da implementação das leis e políticas públicas, a fim de subsidiar essa atuação docente e criar condições para efetivação da inclusão.

Compreende-se que as dificuldades cotidianas vão incidir sobre as metodologias de trabalho que são abordadas na Classe 4 (Práticas das professoras dentro da sala de aula). As professoras relataram que usam metodologias como atividades adaptadas e individualizadas para atender as necessidades específicas dos alunos. Os professores, em sua prática inclusiva, veem a necessidade da realização de adequações metodológicas, pedagógicas e comunicativas para o ensino (Silva & Carvalho, 2017Silva, N. C., & Carvalho, B. G. E. (2017). Compreendendo o Processo de Inclusão Escolar no Brasil na Perspectiva dos Professores: uma Revisão Integrativa. Revista Brasileira de Educação Especial, 23(2), 293-308.); muitas vezes, há a adaptação de currículos, com inclusão ou exclusão de conteúdos (Santos & Martins, 2015Santos, T. C. C., & Martins, L. A. R. (2015). Práticas de Professores Frente ao Aluno com Deficiência Intelectual em Classe Regular. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(3), 395-408.). Outro recurso utilizado é a mediação de colegas ou atividades em duplas, que proporcionam trocas de experiências e desenvolvimento de cooperação entre alunos (Costa, Moreira & Seabra Junior, 2015Costa, C. R., Moreira, J. C. C., & Seabra Júnior, M. O. (2015). Estratégias de ensino e recursos pedagógicos para o ensino de alunos com TDAH em aulas de educação física. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(1), 111-126.).

Foi identificado, através da aproximação das classes 4 e 3 pela AFC, que essas práticas surgem das dificuldades que elas encontram. A professora 8 acredita ser um desafio encontrar atividades diferenciadas, e esse desafio pode se dar por não haver profissionais de apoio especializados, como o professor da educação especial, para um trabalho conjunto. A escolha de recursos e estratégias a serem utilizadas em sala deve surgir de um planejamento (Vilaronga & Mendes, 2014Vilaronga, C. A. R., & Mendes, E. G. (2014). Ensino colaborativo para o apoio à inclusão escolar: práticas colaborativas entre os professores. Revista Brasileira de Educação, 95(239), 139-151.), sendo importante que esse planejamento se concentre no aluno, em suas necessidades, objetivando o seu desenvolvimento, e que não seja voltado para o que o professor consegue fazer diante de suas dificuldades, como foi verificado por este estudo. Assim, destaca-se a importância e o esforço das professoras em desenvolver atividades e recursos para incluir os alunos; porém, evidencia-se a necessidade de um trabalho colaborativo com uma equipe escolar composta por profissionais da educação especial (AEE) para subsidiar a prática pedagógica e possibilitar a orientação, a reflexão e a discussão de questões específicas (Briant & Oliver, 2012Briant, M. E. P., & Oliver, F. C. (2012). Inclusão de crianças com deficiência na escola regular numa região do município de São Paulo: conhecendo estratégias e ações. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(1), 141-154.; Matos & Mendes, 2015Matos, S. N., & Mendes, E. G. (2015). Demandas de Professores Decorrentes da Inclusão Escolar. Revista Brasileira de Educação Especial, 21(1), 9-22.; Silveira et al., 2012Silveira, K. A., Enumo, S. R. F., & Rosa, E. M. (2012). Concepções de professores sobre inclusão escolar e interações em ambiente inclusivo: Uma revisão da literatura. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(4), 695-708.; Vilaronga & Mendes, 2014).

Na Classe 5 (Desenvolvimento do aluno), as professoras destacaram bastante dificuldade no desenvolvimento dos alunos. Carvalho (2019Carvalho, R. E. (2019). Educação Inclusiva: com os pingos nos “is”. (13ª ed). Mediação.) disserta que o entendimento dessas dificuldades deve ir além do quadro clínico da deficiência, visto que muitos alunos sem deficiência também exprimem dificuldades de aprendizagem devido a vários fatores, como motivação, condição social, intrapessoal, dentre outros. Mesmo que sejam dispensados esforços para elevar a aprendizagem e que o processo ensino-aprendizagem seja o mais dinâmico possível, muitas vezes o ensino escolar não terá potencial para ensejar determinadas mudanças. Nesse caso, o trabalho deve se concentrar nas habilidades e não só nas limitações; deve prover o desenvolvimento da capacidade de apreender, e não somente a apreensão de conteúdo, através de situações contextualizadas, de um conteúdo curricular adaptado e com atuação ativa do aluno (Batista & Enumo, 2004Batista, M. W., & Enumo, S. R. F. (2004). Inclusão escolar e deficiência mental: análise da interação social entre companheiros. Estudos de Psicologia, 9(1), 101-111.; Santos, 2012Santos, D. C. O. (2012). Potenciais dificuldades e facilidades na educação de alunos com deficiência intelectual. Educação e Pesquisa, 38(4), 935-948.).

Destaca-se aqui, mais uma vez, a importância do serviço do AEE para trabalhar com as dificuldades, potencializar as habilidades e o desenvolvimento dos alunos, sendo um trabalho articulado com o currículo e em comunicação constante com as professoras da sala regular, o que consistiria em um importante recurso (Lopes & Marquezine, 2012Lopes, E., & Marquezine, M. C. (2012). Sala de recursos no processo de inclusão do aluno com deficiência intelectual na percepção dos professores. Revista Brasileira de Educação Especial, 18(3), 487-506.). Entretanto, nem todos os alunos participantes deste estudo estava frequentando o atendimento, o que evidencia que as leis e políticas do País não estão sendo efetivas, o que é uma grave problemática para a inclusão educacional (Carvalho, 2019Carvalho, R. E. (2019). Educação Inclusiva: com os pingos nos “is”. (13ª ed). Mediação.).

Na análise das ramificações e da AFC, como mencionado, pode-se evidenciar o impacto das dificuldades cotidianas na prática docente, pois há ligação e proximidade entre as classes 3 (Dificuldades do processo de inclusão) e 4 (Práticas das professoras dentro da sala de aula); ou seja, essas professoras trabalham conforme o que está disponível para elas, e o trabalho é organizado conforme as dificuldades que encontram. Ainda, observa-se que a Classe 5 (Desenvolvimento do aluno) é a mais distante, apesar de estar ligada a todas as outras, o que pode evidenciar que a metodologia de trabalho (diante das dificuldades) não está sendo suficiente para subsidiar o desenvolvimento dos alunos. Tal fato se confirma porque, apesar de algumas professoras relatarem evoluções dos alunos (Prof. 30 e Prof. 32), elas ainda mencionam bastantes dificuldades (Prof. 6, Prof. 1, Prof. 29). A Classe 2 (Relação escola-família) também é uma classe distante, o que pode ser entendido tendo-se em vista o relato das professoras quanto às dificuldades e à falta de apoio familiar. A classe 1 (Entendimento do processo de Inclusão), que fala sobre o entendimento desse processo, também está mais distante das outras, ligando-se diretamente à Classes 3 (Dificuldades no processo) e 4 (Práticas das professoras dentro da sala de aula). Isso pode evidenciar que o entendimento que elas têm do processo não condiz com a prática, ou seja, elas sabem o que é inclusão, mas esse conhecimento não inclui um conhecimento efetivo de metodologias, portanto, não está auxiliando na prática para incluir, já que está mais distante da classe 5 (Desenvolvimento dos alunos).

Ao analisar se as classes compreendem mais recursos ou mais dificuldades, podem-se fazer algumas afirmações. A Classe 1 (Entendimento do processo de Inclusão) seria um importante recurso, pois mostra o entendimento e conhecimento da teoria; entretanto, não há uma efetividade prática desse conhecimento, o que mostra uma dificuldade de articular o conhecimento teórico com a práxis. A Classe 2 (Relação escola-família compreende mais dificuldades, pois em maior número as professoras relatam a falta de apoio das famílias. A classe 3 (Dificuldades no processo) compreende as dificuldades que as professoras encontram, que guiam as metodologias utilizadas que aparecem na classe 4 (Práticas das professoras dentro da sala de aula). A Classe 4 (Práticas das professoras dentro da sala de aula), por sua vez, mostra um recurso, que surge, porém, de uma dificuldade e que não está sendo efetivo; então, pode-se dizer que compreende também dificuldades. A classe 5 (Desenvolvimento do aluno), como visto, aborda mais as dificuldades dos alunos, logo é uma classe mais de dificuldade.

Família-escola

A relação família-escola foi bastante abordada nas entrevistas dos responsáveis e das professoras, constituindo classes nos dois corpus de análises, porém com discrepâncias consideráveis. Os responsáveis relataram, de forma geral, que são presentes no ambiente educacional e que têm um bom relacionamento com a escola como um todo; apesar das dificuldades, encontram recursos para ajudar os filhos, como auxiliar nos deveres, treinar leitura e escrita. Pela análise da AFC (corpus pais), é possível observar que as dificuldades dos filhos advindas da deficiência e os desafios dos pais impactam no contexto familiar, que também impacta nas relações com a escola.

As professoras, por sua vez, trouxeram relatos de que algumas famílias são presentes, porém outras, não. Para elas, muitas vezes, o problema maior no desenvolvimento do aluno encontra-se nas questões familiares; elas verbalizaram que, se a família conseguisse ajudar, os alunos teriam uma progressão na aprendizagem. Esses resultados são confirmados até mesmo visualmente pela análise da AFC (corpus professoras), em que a classe referente à família se encontra distante da do desenvolvimento do aluno. Portanto, este estudo evidencia diferentes percepções de escola e família: os responsáveis veem a escola como um recurso positivo, um fator de apoio e proteção para o desenvolvimento dos filhos; as professoras, por sua vez, relatam problemas na parceria com a família e dificuldades que impedem o desenvolvimento desses alunos. A comunicação e presença na escola foi tida como satisfatória pelos pais; entretanto, professoras não veem essa participação dos pais ou não a enxergam como suficiente. Pamplin (2005Pamplin, R. C. O. (2005). A interface família-escola na inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais: uma perspectiva ecológica [Dissertação de Mestrado]. Programa de Pós-Graduação em Educação Especial. Universidade Federal de São Carlos.) também evidenciou uma relação assíncrona entre escola e família, em que os pais se consideravam presentes e a escola alegava não interesse, apontando que, embora seja desejada a participação dos pais, ainda não existem mecanismos e estratégias para promover tal envolvimento.

Ressalta-se aqui a importância de se compreender essa relação e buscar subsídios no trabalho de mediação entre os atores. A família e a escola são fontes educacionais distintas; o ensino disponibilizado pela família apresenta caráter informal, enquanto o da escola tem caráter sistemático e visa a construção do conhecimento em etapas sequenciais, em que ambos são importantes, assim como a parceria é compartilhada, de forma a buscarem estratégias conjuntas de benefício do processo educativo (Dessen & Polonia, 2007Dessen, M. A., & Polonia, A. C. (2007). A família e a escola como contextos de desenvolvimento humano. Paidéia, 17(36), 21-32.). A parceria família-escola é tida, em vários estudos, como um dos fatores de maior influência no processo de inclusão, até mesmo tendo-se em vista o desenvolvimento cognitivo e social do aluno (Benitez & Domeniconi, 2012Benitez, P., & Domeniconi, C. (2012). Verbalizações de familiares durante aprendizagem de leitura e escrita por deficientes intelectuais. Estudos de Psicologia, 29(4), 553-562.; Brandão & Ferreira, 2013Brandão, M. T., & Ferreira, M. (2013). Inclusão de crianças com necessidades educativas especiais na educação infantil. Revista brasileira de educação especial, 19(4), 487-502.; Christovam & Cia, 2013Christovam, A. C. C., & Cia, F. (2013). O Envolvimento parental na visão de pais e professores de alunos com necessidades educacionais especiais. Revista Brasileira de Educação Especial, 19(4), 563-581.; Vilaronga & Mendes, 2014Vilaronga, C. A. R., & Mendes, E. G. (2014). Ensino colaborativo para o apoio à inclusão escolar: práticas colaborativas entre os professores. Revista Brasileira de Educação, 95(239), 139-151.). Maturana e Cia (2015Maturana, A. P. P. M., & Cia, F. (2015). Educação Especial e a Relação Família - Escola: Análise da produção científica de teses e dissertações. Psicologia Escolar e Educacional, 19(2), 349-358.) mostram discrepâncias nessa relação; entretanto, evidenciam que o contato semanal escola-família favorece a criação de estratégias de ambos os lados e que o relacionamento próximo é essencial. Essa parceria, entretanto, está sujeita a fatores como as concepções da escola sobre a inclusão, o suporte ofertado e as políticas educacionais municipais, estaduais e nacionais, sendo necessários, portanto, estudos para investigar essa temática.

Assim, entende-se que os participantes deste estudo precisam de estímulos e projetos voltados para fortalecer e amparar essa relação, buscando melhorias para ambas as partes, com o propósito de efetivar o processo de inclusão e favorecer o desenvolvimento integral dos alunos com deficiência intelectual. Estudar as relações entre família-escola é uma considerável fonte de informação, pois permite identificar condições e aspectos que influenciam na comunicação e padrões de colaboração e conflitos entre essas duas instituições (Dessen & Polonia, 2007Dessen, M. A., & Polonia, A. C. (2007). A família e a escola como contextos de desenvolvimento humano. Paidéia, 17(36), 21-32.). Tanto a família como a escola, apesar de essenciais ao desenvolvimento, também são contextos em que atuam mecanismos de risco e proteção (Marturano & Elias, 2016Marturano, E. M., & Elias, L. C. S. (2016). Família, dificuldades no aprendizado e problemas de comportamento em escolares. Educar em Revista, 59, 123-139.). Logo, faz-se essencial haver intervenções voltadas para esses dois microssistemas e que também sejam amparadas por questões ao nível de macrossistema, com a concretização de políticas públicas para fortalecimento da relação escola-família.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo investigar como está ocorrendo o processo de inclusão de alunos com deficiência intelectual, levantando recursos e dificuldades. Foi possível entender, segundo a ótica de responsáveis e professoras, esse processo sob diversos aspectos, envolvendo tanto as relações familiares pessoais como as relações intrínsecas ao ambiente escolar e a relação escola-família. Observou-se que os responsáveis veem, como dificuldades, prestar apoio e ajudar os filhos com as questões escolares; e, como recursos, o fato de seus filhos estarem matriculados e se sentirem bem no meio escolar, além da boa relação com a escola. As professoras, por sua vez, apontaram dificuldades cotidianas no processo de inclusão e problemáticas na parceria família-escola.

O estudo apresenta um rico material analisado com um número importante de participantes, com auxílio do software Iramuteq, que traz rigor científico, além de originalidade, contribuindo para as discussões no campo da inclusão educacional. Como limitações, destaca-se a não participação dos alunos como informantes, o que deve ser considerado em novos estudos.

Foi possível realizar contribuições importantes ao estudar a inclusão sob a perspectiva de diferentes informantes (família e professores), agentes centrais na promoção da inclusão. Entende-se que, ao levantar aspectos de recursos e dificuldades, sejam levantadas possibilidades de intervenção junto a essas famílias e esses professores, para assim estabelecer conclusões frutíferas que levem ao entendimento do que seria a inclusão de alunos com deficiência - tema amplamente estudado, mas que ainda enfrenta críticos problemas de execução prática e divergências entre o que está estabelecido nas diretrizes educacionais. Uma das conclusões importantes deste estudo é a necessidade de um trabalho integrado dentro das escolas, com os professores da sala regular, professor especializado, família e gestão. Conclui-se, assim, a importância de intervenções direcionadas e a articulação de leis e políticas públicas para amparar e subsidiar com mecanismos eficientes o processo de inclusão em sua efetividade na prática.

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FINANCIAMENTO

  • O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    10 Dez 2020
  • Aceito
    25 Mar 2022
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