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Impactos da Desoneração da folha de pagamentos sobre o emprego formal e a competitividade industrial: Uma aproximação pelo método de Difference in Differences com Propensity Score Matching O presente trabalho foi realizado com o apoio da Escola Nacional de Administração Pública - Enap. Ele é resultado da pesquisa de avaliação de Subsídios da União do Programa Cátedras 2019, edital nº 50 de 11 junho de 2019.

Resumo

O presente estudo tem como objetivo mensurar os efeitos da política de desoneração da folha de salários sobre o emprego formal e a competitividade industrial. Para isso, uma ampla revisão de literatura foi inserida no trabalho, principalmente o enfoque nos métodos de mensuração e na base de dados. Os dados do emprego foram coletados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS, 2020) e para os indicadores industriais os dados disponíveis na Confederação Nacional da Indústria (CNI, 2020). Para a estratégia empírica de avaliação de impacto da política foi utilizado o modelo de diferenças em diferenças (DID) com Propensity Score Matching (PSM) e o modelo de triplas diferenças. Testes de robustez e sensibilidade também foram utilizados. Por fim, os resultados apontaram para um efeito médio de 2,44 p. p. e 1,12 p. p. da política de desoneração da folha sobre o emprego: quantidade de horas trabalhadas e quantidade de vínculos, respectivamente. Esse resultado retrata a comparação entre o grupo de setores desonerados em relação ao grupo não desonerado. Outro resultado importante levou em consideração a tendência temporal. Os efeitos da política de desoneração da folha de salários logo no início da implantação da lei (2012) sobre o emprego foi, em média, 1,8 p. p. (horas trabalhadas) e 1,5 p. p. (vínculos), e como passar dos anos esse efeito caiu, atingindo 0,6 p. p. em 2018. Apenas na janela de 2015 e 2016, o estimador mostrou-se significativo e o efeito da política de desoneração da folha de salários aumentou a competitividade da indústria brasileira: -36,7 p. p. (2015) e -45,2 p. p. (2016).

Palavras-chaves:
Desoneração da folha de salários; Emprego; Competitividade industrial; Escore de propensão por correspondência (PSM); Diferenças em diferenças (DID); Triplas diferenças (DDD)

Abstract

This study aims to measure the effects of the payroll tax exemption policy on formal employment and industrial competitiveness. For this, a wide literature review was inserted in the work, mainly the focus on measurement methods and database. Employment data were collected from the Annual List of Social Information (RAIS, 2020) and for industrial indicators, the data available at the National Confederation of Industry (CNI, 2020). For the empirical strategy for assessing the impact of the policy, the model of differences in differences (DID) with Propensity Score Matching (PSM) and the model of triple differences were used. Robustness and sensitivity tests will also be used. Finally, the results pointed to an average effect of 2.44 p. for. and 1.12 p. for the payroll exemption policy on employment: number of hours worked and number of employment contracts, respectively. This result portrays the comparison between the group of exempted sectors in relation to the non-exempted group. Another important result considered the temporal trend. The effects of the payroll tax exemption policy right at the beginning of the implementation of the law (2012) on employment was, on average, 1.8 p. for. (hours worked) and 1.5 p. for. (bonds), and as the years went by, this effect fell, reaching 0.6 p. for. in 2018. The results on industrial competitiveness, considering that negative values ​​mean that the industry gained competitiveness, only in the window of 2015 and 2016, the estimator proved to be significant and the effect of the payroll tax exemption policy had effects to increase the competitiveness of Brazilian industry: -36.7 p. for. (2015) and -45.2 p. for. (2016).

Keywords:
Payroll tax relief; Labor; Industrial competitiveness; Propensity score matching (PSM); Differences in differences (DID); Triple differences (DDD)

1. Introdução

No cenário nacional, principalmente no ambiente de crise fiscal que o país vem enfrentando (2015/2016 - crise fiscal e 2020/2021 - pandemia do Covid-19), a sociedade e a academia cada vez mais buscam conhecer os resultados obtidos das políticas públicas executadas pelo Governo Federal, principalmente aqueles relacionados aos subsídios da união e seus impactos fiscais, econômicos e sociais.

Os impactos econômicos de políticas públicas no formato de desoneração do fator trabalho vem sendo discutidos e estudados no meio acadêmico há longa data, tanto na literatura nacional quanto internacional. Porém são poucos os estudos, com profundidade empírica, que buscaram avaliar retrospectivamente a desoneração da folha. Nos trabalhos para o Brasil que estão disponíveis, os resultados são inconclusivos ou com quase nenhum efeito dessa política tributária sobre o emprego, salários e competitividade.

Este artigo apresenta uma análise teórica, abordando trabalhos com grande relevância, com diferentes métodos empíricos e que tiveram como escopo avaliar reformas tributárias que desoneram o fator trabalho, com ou sem compensação tributária. Em seguida, o programa de desoneração da folha de salários será exposto. Essa parte tem um aspecto crucial para o entendimento da teoria econômica acerca do tema, enfatizando a evolução das leis e normas que regem essa política tributária no país, além de descrever seus objetivos, metas e escopo de atuação.

A estratégia empírica de pesquisa (seção 4), aspecto crucial para a avaliação dos efeitos da desoneração da folha de salários sobre emprego e competitividade, será composta por duas partes. Na primeira, será apresentada a base de dados. Basicamente, os dados têm como fonte a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) disponibilizados no sitio do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) com a periodicidade de 2009 até 2018. Os dados referentes a competitividade-custo industrial são disponibilizados no sítio da Confederação Nacional da Indústria - Estatística, esses dados também serão de 2009 a 2018.

A segunda parte da estratégia empírica é o desenho do modelo econométrico, com a construção do modelo para avaliar os efeitos da política fiscal. Nesta seção, é apresentado o método Propensity Score Matching (PSM) para a construção dos setores contrafactuais (Rosenbaum e Rubin 1983Rosenbaum, P. e D. Rubin. 1983. “The central role of the propensity score in observational Studies for Causal Effects”. Biometrika, Oxford 70 (1):41-55. http://dx.doi.org/10.1093/biomet/70.1.41.
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; Cameron e Trivedi 2005Cameron, A., e P. Trivedi. 2005. Microeconometrics: Methods and Applications. Cambridge, UK: Cambridge University Press. http://dx.doi. org/10.1017/CBO9780511811241
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). Em seguida, detalha-se a união do Modelo de Diferenças em Diferenças (DID) com Propensity Score Matching (PSM), proposto inicialmente por Heckman e Smith (1995Heckman, James J.; Smith, Jeffrey A. 1995 “Assessing the case for social experiments”. Journal of Economic Perspectives 9 (2): 85-110.), de modo que este método procura reduzir o viés das não observáveis e aumenta a robustez dos estimadores. Para uma construção sólida da pesquisa, o Modelo de Triplas Diferenças será apresentado como complemento na análise empírica da avaliação. Esse método é usado em momentos onde os controles podem ser frágeis, melhorando a técnica de duplas diferenças (DID). Testes de robustez e sensibilidade dos estimadores como de Ichino, Mealli e Nannicini (2008) e Oster (2015Oster, E. 2015. “Unobservable Selection and Coefficient Stability: Theory and Evidence”. Working Paper, Brown University, Providence.) será apresentado após os resultados.

Os resultados apontam que a desoneração da folha teve impacto sobre o emprego, mas que este efeito foi se dissipando no tempo. Já em relação à competitividade, a desoneração da folha teve impactos mais restritos e limitados apenas ao período 2015 e 2016, quando se constatou um efeito positivo sobre a competitividade.

Este texto está estruturado com o seguinte formato: após a introdução, a seção 2 apresenta o referencial teórico, seguido da seção 3 com a descrição da política de desoneração da folha de salários. Na seção 4 a estratégia empírica é detalhada, com os resultados sendo discutidos na seção seguinte, bem como com a apresentação dos testes de robustez e sensibilidade na seção 6. A seção 7 apresenta as considerações finais.

2. Referencial teórico

A literatura internacional tem como referência o trabalho pioneiro de Gelles (1945Gelles, Manuel. 1945. “Financing Social Security”. Political Science Quarterly, v. 60, n. 2, p. 222-240.) que sistematizou a forma de financiamento da seguridade social. O autor ressalta que o contrato de segurança social deve ser definido de forma a garantir a todos os indivíduos um nível mínimo de existência econômica, e que a relação dos custos (receitas) e benefícios (despesas) deve ser tal que equalize a aplicação deste contrato. Após esse marco histórico, a literatura avançou com as pesquisas de Swan (1947Swan, Eliot J. 1947. “Financing Social Security”. The American Economic Review 37(2): 345-350.), Craig (1959Craig, Paul G. 1959. “The Payroll Taxes and Social Security”. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science326(1): 85-92.), Diamond e Mirrlees(1971aDiamond, Peter A. James A. Mirrlees. 1971a. “Optimal Taxation and Public Production I: Production Efficiency.” American Economic Review. e 1971b)1 1 Arrow, Kenneth J. Bernheim, B. Douglas. Feldstei, Martin S. McFadden, Daniel L. Poterba, James, M. Solow, Robert M; 100 years of the American Economic Review: The top 20 articles. The American Economic Review, v. 101, n. 1, p. 1-8, 2011. , Feldstein (1974Feldstein, Martin. 1974. “Social security, induced retirement, and aggregate capital accumulation”. Journal of Political Economy82 (5): 905-926.), Okner (1975Okner, Benjamin A. 1975. “The social security payroll tax: some alternatives for reform”. The Journal of Finance 30 (2): 567-578.), Auerbach e Kotlikoff (1983Auerbach, Alan J., e Laurence J. Kotlikoff. 1983. “National savings, economic welfare, and the structure of taxation.” In: Behavioral simulation methods in tax policy analysis, editado por Martin Feldstein. Chicago: University of Chicago Press.), Kotlikoff (1984), Hubbard e Judd (1987), Auerbach et al. (1989), Kesselman (1996Kesselman, Jonathan R. 1996. “Payroll Taxes in the Finance of Social Security”. Canadian Public Policy - Analyse de Politiques, Vol. 22, No. 2: 162-179.) e Rasmussen e Rutherford (2001Rasmussen, Tobias N., e Thomas F. Rutherford. 2001. “Modeling overlapping generations in a complementarity format”. Journal of Economic Dynamics and Control 28,(7): 1383-1409.).1

Kunze e Schuppert (2010Kunze, Lars, Christiane Schuppert. 2010. “Financing social security by taxing capital income: A bad idea?” FinanzArchiv: Public Finance Analysis 66(3): 243-262.) analisaram os efeitos do aumento de impostos sobre o rendimento de capitais como contrapartida da redução das contribuições sobre a folha de salários. Essa medida de compensação fiscal seria uma maneira de aumentar a oferta de trabalho e, assim, reduzir o desemprego. A principal conclusão dos autores foi que a reforma tributária não só promoveu o aumento dos níveis de emprego como também estimulou o crescimento econômico.

Ivens (2018Ivens, Annika. 2018. “Fiscal devaluation in the Euro area: The role of rigidities, non-tradables, and social security contributions”. Journal of International Money and Finance 87: 62-81.) explora os efeitos sobre a balança comercial de uma desvalorização fiscal unilateral, em um modelo de união monetária com dois países simétricos. O artigo diferencia-se dos estudos existentes, nos seguintes pontos: 1) ao explorar a redução da participação dos empregados nas contribuições para a seguridade social (CSC) - espécie de desoneração da folha de salários; ii) o papel da rigidez nominal, como demonstração de que os preços e salários flexíveis tem efeitos reais superiores e iii) uso de dois bens, comercializáveis ​​e não comercializáveis, no modelo macroeconômico. Essa base de pressupostos foi utilizada para simular a possibilidade da desvalorização fiscal ser implementada em países da área do Euro com déficits na balança comercial em 2015, usando um modelo com dois países, em uma estrutura teórica Nova Keynesiana. Foi constatado que a eficácia de uma desvalorização fiscal depende crucialmente dos instrumentos fiscais utilizados.

Ciżkowicz et al. (2019Ciżkowicz, Piotr B. Radzikowski, A. Rzońca, e W. Wojciechowski 2019. “Fiscal devaluation and economic activity in the EU”. Economic Modelling 88:59-81.), enfatiza que após a crise financeira global, a desvalorização fiscal, conhecida como uma mudança na tributação da mão de obra para o consumo, foi debatida como uma ferramenta possível para restaurar a competitividade. Utilizando a modelagem econométrica com dados de painéis e painéis espaciais para 27 países da União Europeia, no período 1995-2014, obtiveram como resultados que a desvalorização fiscal aumenta o valor agregado das exportações, melhora as exportações líquidas, acelera o crescimento do PIB, aumenta o emprego e desacelera o crescimento dos custos do trabalho. Esses efeitos não são lineares, são mais intensos nos membros da zona do euro e mais fracos em países com processos de negociação salarial mais coordenados ou com benefícios sobre o desemprego mais generosos. A magnitude desses efeitos é atenuada por estritas barreiras regulatórias. Outra questão é que a desvalorização fiscal implementada em um país pode beneficiar outros, desde que estejam fortemente integrados nas cadeias de valor globais.

Do Carmo (2012) em sua pesquisa, estimou o impacto da desoneração da folha salarial sobre a formalização do mercado de trabalho, bem como sobre a nível de realocação entre setores de atividade econômica. Com dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) utilizou o método econométrico de diferença em diferenças (DD) antes e depois da lei. Os resultados apontaram que não houve impactos nas variáveis analisadas.

Dallava (2014Dallava, Caroline Caparroz. 2014. “Impactos da desoneração da folha de pagamentos sobre o nível de emprego no mercado de trabalho brasileiro: um estudo a partir dos dados da RAIS”, Dissertação de Mestrado, Fundação Getúlio Vargas.), testou os efeitos da desoneração da folha de salários sobre o emprego. A técnica utilizada foi difference-in-differences sobre os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) entre 2011-2012. A inovação da pesquisa foi a utilização de clusters de subclasses da CNAE para investigar os efeitos heterogêneos da lei, em função da natureza da atividade das empresas. Os resultados sugerem que a desoneração da folha de pagamentos gerou empregos apenas para o setor Tecnologia da Informação (e Comunicação), assim como aumento do salário médio dos empregados deste setor.

Silva et al. (2015Silva, Wilton Bernardino, Nelson Leitão Paes, e Raydonal Ospina. 2015. “The replacement of payroll tax by a tax on revenues: A study of sectorial impacts on the Brazilian economy”. Economia 16(1): 46-59.), avaliaram o modelo empregado pela política pública de desoneração da folha de pagamentos com o intuito de identificar os custos sobre a arrecadação e os impactos na equidade, eficiência e simplicidade do sistema tributário. Foram feitas 2 simulações de reforma: Reforma 1 - substituição da alíquota patronal por uma alíquota de 1% sobre a receita e; Reforma 2 - substituição da alíquota patronal por uma alíquota de 2% sobre a receita. Nas duas reformas, houve aumento no produto, emprego e consumo. As firmas não intensivas em trabalho reduzem levemente o estoque de capital e forte retração no emprego, já as firmas intensivas em trabalho apresentam um comportamento crescente no trabalho, porém desaceleram a medida que a alíquota sobre o faturamento aumenta.

Também com dados da RAIS e mesmo período, Scherer (2015Scherer, Clóvis. 2015. “Payroll tax reduction in Brazil: Effects on employment and wages”. ISS Working Paper Series/General Series602:1-64.), investiga os efeitos da desoneração da folha sobre o emprego e salários em quatro setores de manufatura e serviços. As estimativas sugerem que, em média, a política levou a um aumento de 15% no emprego e os salários aumentaram 2%. Esses resultados indicam que, em seu primeiro ano de implementação, a política teve efeitos positivos no emprego, porém há uma ressalva na pesquisa, pois ao inserir um teste de robustez, houve uma existência de tendência prévia, indicando um viés na estimação, subestimando os resultados.

Baumgartner (2017Baumgartner, Erick. 2017. “A Desoneração da Folha Salarial e seu Efeito sobre o Mercado de Trabalho no Brasil”, PhD Thesis, Universidade de São Paulo.), também pesquisou o assunto, ao considerar um painel de setores econômicos com dados da RAIS, entre 2009 e 2014, com o método de diferenças em diferenças, constatou que não houve efeito da política de subsídio para os salários e para o nível de emprego dos setores desonerados em função dos produtos (NCM). Já para os desonerados por atividade (CNAE), houve um efeito positivo de 7,5% sobre o nível de emprego das empresas (não optantes pelos Simples Nacional), parcialmente compensado pela redução do emprego nas optantes pelo Simples.

Garcia, Sachsida e Carvalho (2018Garcia, Felipe; Adolfo Sachsida, Alexandre Ywata de Carvalho. 2018. “Impacto da Desoneração da Folha de Pagamento sobre o emprego: Novas evidências”. Texto para Discussão.) avaliaram de forma quantitativa o impacto da política de desoneração da folha de pagamentos sobre o volume de emprego. Com os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) entre 2009-2015 e utilizando o método de triplas diferenças, apontaram para resultados da ausência de efeitos dessa política pública sobre o emprego formal.

Porsse e Carvalho (2019Porsse, Alexandre Alves, e Terciane Sabadini Carvalho. 2019. “Análise do impacto das políticas de (Des) oneração da folha de pagamento na economia brasileira”. Revista Brasileira de Economia 73(1): 77-95.) analisou os efeitos da desoneração da folha sobre as variáveis econômicas. Porém, os autores estudaram os efeitos da reoneração da folha (Lei 13.161/2015) com um modelo de equilíbrio geral. Os resultados apontaram para o aumento do custo de produção na maioria dos setores da economia, além disso, a política de desoneração se revelou neutra em termos de impacto sobre o emprego no longo prazo, enquanto a política de reoneração produz uma redução do emprego.

De certa maneira, as pesquisas nacionais encontram diversas limitações. Por exemplo, limitações relacionadas ao método, pois em alguns casos não houve cuidado sobre a endogeneidade e viés de seleção (Ulyssea e Reis 2006Ulyssea, G, e Reis M. C. 2006. “Imposto sobre trabalho e seu impacto nos setores formal e informal”. Textos para Discussão 1218, Ipea, Brasília.; Ansiliero et al. 2008Ansiliero, Graziela et al. 2008. “A desoneração da folha de pagamentos e sua relação com a formalidade no mercado de trabalho”. Texto para Discussão, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Brasília.; Júnior 2011). Outra restrição é a questão de temporalidade, pois alguns textos não conseguiram capturar as mudanças na lei e o efeito tendência do mercado de trabalho (Dallava2014Dallava, Caroline Caparroz. 2014. “Impactos da desoneração da folha de pagamentos sobre o nível de emprego no mercado de trabalho brasileiro: um estudo a partir dos dados da RAIS”, Dissertação de Mestrado, Fundação Getúlio Vargas.; Silva et al. 2015Silva, Wilton Bernardino, Nelson Leitão Paes, e Raydonal Ospina. 2015. “The replacement of payroll tax by a tax on revenues: A study of sectorial impacts on the Brazilian economy”. Economia 16(1): 46-59.; Scherer 2015Scherer, Clóvis. 2015. “Payroll tax reduction in Brazil: Effects on employment and wages”. ISS Working Paper Series/General Series602:1-64.). As pesquisas mais recentes (Baumgartner 2017Baumgartner, Erick. 2017. “A Desoneração da Folha Salarial e seu Efeito sobre o Mercado de Trabalho no Brasil”, PhD Thesis, Universidade de São Paulo.; Garcia, Sachsida e Carvalho 2018Garcia, Felipe; Adolfo Sachsida, Alexandre Ywata de Carvalho. 2018. “Impacto da Desoneração da Folha de Pagamento sobre o emprego: Novas evidências”. Texto para Discussão.; Porsse e Carvalho 2019Porsse, Alexandre Alves, e Terciane Sabadini Carvalho. 2019. “Análise do impacto das políticas de (Des) oneração da folha de pagamento na economia brasileira”. Revista Brasileira de Economia 73(1): 77-95.) avançam na metodologia, incorporando a questão de efeito tendência e preocupações de robustez, porém, limita-se a análise apenas em um modelo de estimação (Diferenças em Diferenças - DID), com baixo critério de seleção do grupo de controle (contrafacutal) e tendo como escopo apenas o volume de emprego.

Assim, este artigo contribui com literatura, propiciando um avanço no método, incluindo testes de sensibilidade e robustez, além do rigor analítico sobre a seleção dos contrafactuais com o método Propensity Score Matching (PSM). Outro avanço foi a comparação entre os modelos PSM-DID e o Triplas Diferenças, além de inserir na análise a questão da competitividade, vetor crucial na política de desoneração da folha de salários.

3. Descrição do modelo de Desoneração da Folha adotado no Brasil

Segundo o Ministério da Fazenda (Receita Federal 2014), os principais objetivos que o Governo Federal buscou ao introduzir a Desoneração da Folha de Salários são2 2 A medida tem caráter obrigatório e abrangem os seguintes contribuintes: (i) que auferiram receita bruta decorrente do exercício de determinadas atividades elencadas na Lei nº 12.546/2011; (ii) que auferiram receita bruta decorrente da fabricação de determinados produtos listados por NCM na Lei nº 12.546/2011 e (iii) que estão enquadrados em determinados códigos CNAE previstos na Lei nº 12.546/2011 (Receita Federal 2014) : i) ampliar a competitividade da indústria nacional, por meio da redução dos custos do trabalho, estimulando as exportações com a isenção da contribuição previdenciária patronal; ii) estimular a formalização do mercado de trabalho e iii) reduzir assimetrias na tributação entre o produto nacional e o importado, impondo sobre esse último um adicional sobre a alíquota de Cofins-importação igual à alíquota sobre a receita bruta que a produção nacional pagará para a Previdência Social.

A Desoneração da Folha de Salários é um instrumento tributário comumente utilizado para proporcionar equilíbrios fiscais, impulsionar o crescimento econômico e muitas vezes aumentar a competitividade da indústria nacional. Porém, para o Brasil, a folha de pagamentos é uma das principais bases de financiamento da previdência social. Sendo assim, é um mecanismo minucioso de se alterar, uma vez que poderá causar grandes prejuízos para as gerações futuras (Freitas e Paes 2017Freitas, Carlos Eduardo, e Nelson Leitão Paes. 2017. “Macroeconomic and generational impacts of fiscal devaluation: an application for the brazilian case”. Economia Aplicada 21 (3): 417-435.; Ribeiro 2011Ribeiro, José Aparecido Carlos, A. Luchiezi Jr., e Sérgio Eduardo Arbulu Mendonça. 2011. Progressividade da tributação e desoneração da folha de pagamentos: elementos para reflexão. Brasília: Ipea.).

Apesar de alguns marcos de iniciativa de desoneração da folha de pagamentos, como foi o caso da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 233/08, somente em 02 de agosto de 2011, por intermédio da Medida Provisória (MP) 540, convertida na Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011, teve maiores repercussões, uma vez que beneficiou diretamente alguns setores, entre eles: Tecnologia de informação e comunicação, indústrias de móveis, entre outros. Esta medida consiste na substituição da base de incidência da contribuição previdenciária patronal sobre a folha de pagamentos (alíquota de 20%), prevista nos incisos I e III do art. 22 da Lei n° 8.212/1991, por uma incidência sobre a receita bruta (Silva 2013Silva, Wilton Bernardino da. 2013. “A substituição da contribuição patronal pela contribuição previdenciária sobre o faturamento: uma análise de impactos econômicos e distributivos”, Tese de Doutorado, Universidade Federal de Pernambuco.).

No ano seguinte, a Medida Provisória 563 acrescentou um ponto percentual na alíquota COFINS-importação para os produtos desonerados na MP 540/2011, ampliando a base de financiamento da desoneração da folha. Logo depois, a MP 582 de 20/09/2012 ampliou a desoneração para os setores de transportes, serviços, alimentos, higiene pessoal, saúde, automotivo, papéis, metalurgia e eletrodomésticos. Porém, alguns setores foram vetados na conversão da MP 582 na Lei 12.794 de 02/04/2013, em razão da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Porém, a marcha para ampliação dos setores beneficiados continuou. Ainda em 2012, a MP 601 de 28/12/2012 estendeu os benefícios fiscais para 42 setores da economia. Em 2013, foi publicada a MP 612/2013 desonerando a folha de pagamentos para 56 setores da economia (Silva 2013Silva, Wilton Bernardino da. 2013. “A substituição da contribuição patronal pela contribuição previdenciária sobre o faturamento: uma análise de impactos econômicos e distributivos”, Tese de Doutorado, Universidade Federal de Pernambuco.).

A partir de 2015, inicia-se processo inverso, de retração dos benefícios da desoneração da folha. A Lei 13.161 de 31 de agosto de 2015, buscou limitar e aperfeiçoar o escopo da política de desoneração da folha e corrigir algumas distorções. Especificamente, a nova norma estabeleceu o aumento das alíquotas de 1,0% para 2,5% e de 2% para 4,5%.

A Lei 13.670 de 30 de maio de 2018 estabeleceu um prazo final da desoneração da folha de salários, que seria eliminada em 31 de dezembro de 2020. Posteriormente este prazo foi estendido até 31/12/2021 pela Lei 14.020/2020 e novamente prorrogado até 31/12/2023 pela Lei 14.288/2021.

A Tabela 1 apresenta, de forma resumida, a lista das leis e atos normativos sobre a desoneração da folha de salários. O intuito é entender a evolução dessa medida de política tributária, considerando os aspectos principais.

Em termos práticos, a implementação da desoneração da folha de pagamentos veio através da criação de um novo tributo, a Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB). Esse novo tributo consiste na aplicação de uma alíquota ad valorem de 1% ou 2% sobre a receita bruta mensal, dependendo do setor econômico classificado na CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) e do produto fabricado arrolado na nomenclatura comum do Mercosul (NCM). Estas alíquotas aumentaram para 2,5% e 4,5% com a Lei 13.161/2015.

Ao desonerar a folha de pagamentos eliminando a alíquota sobre a contribuição patronal, há uma renúncia sobre a arrecadação tributária do montante pago pelas empresas. O montante dessa renúncia fiscal em 2012, 2013 e 2014 (até o mês de maio), foram R$3.615,69, R$12.284,29 e R$7.855,57 milhões, respectivamente (Receita Federal 2014).

Essa mudança na base de incidência da folha de pagamentos para a receita bruta, é de certa forma, uma tentativa de compensação fiscal, similar à desvalorização fiscal, já discutida na revisão da literatura. Esse não é um instrumento de políticas tributárias recente: muitos países já realizaram cortes de tributos advindos da seguridade social e compensaram essa queda sobre outros impostos, sempre no intuito de não causar grandes prejuízos nas receitas do governo. A forma clássica de desvalorização fiscal combina uma redução da alíquota sobre a seguridade social com um aumento da alíquota do imposto do tipo IVA, de forma que preserve as receitas do governo (Mooij e Keen 2012).

Tabela 1
Histórico de Atos e Leis da Desoneração da Folha de Salários

4. Estratégia empírica

4.1. Base de dados

Para avaliar empiricamente o efeito da desoneração da folha de pagamentos sobre o nível de emprego e competitividade industrial dos setores beneficiados pelo programa de gastos tributários, foram utilizados dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) disponibilizados no site do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) de 2009 até 2018. Para o indicador de competitividade, a base de dados será a disponibilizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), também no mesmo recorte temporal.

A base de dados disponível pela CNI (2020) agrega os grandes setores, ao todo são 22. Desses setores, alguns são desonerados e outros não ao longo do tempo. Assim, a agregação é a nível de setor. Devido à natureza dos dados, temos uma intent-to-treat effect sobre a competitividade industrial. Essa é uma aproximação do efeito do tratamento. Assim, como trata-se do efeito médio do tratamento sobre os tratados, tanto inter quanto intratemporal, é possível garantir o efeito da desoneração da folha de salários sobre a competitividade industrial (Kothari e Warner 2007Kothari, Sagar P., e Jerold B. Warner. 2007. “Econometrics of event studies”. In: Handbook of empirical corporate finance, editado por B. Espen Eckbo, 3-36. Amsterdã: Elsevier). Já com a base de dados da RAIS (2020), foi possível coletar a subclasse CNAE 2.0 até o 7 dígito.

O Quadro 1 a seguir resume a natureza dos dados.

Quadro 1
Descrição da base de dados para o emprego

4.2. Desenho do modelo

Em primeiro lugar, o tipo da pesquisa parte da estrutura de um event-study. Normalmente esse tipo de estudo examina o comportamento, por exemplo, de uma amostra de empresas que experimentam um tipo comum de evento ou uma política de subsídios tributários. Tal evento, ocorre, geralmente em momentos diferentes no tempo ou pode ser agrupado em uma data específica. Assim, o momento zero, ou t = 0, é o momento inicial do evento. Para cada unidade amostral i, ao longo do tempo t =0,1...n (Kothari e Warner 2007Kothari, Sagar P., e Jerold B. Warner. 2007. “Econometrics of event studies”. In: Handbook of empirical corporate finance, editado por B. Espen Eckbo, 3-36. Amsterdã: Elsevier).

O método utilizado, amplamente difundido e consolidado na literatura, parte de uma análise de diferença em diferenças (difference in difference - DID). Na literatura internacional, trabalhos pioneiros usaram esse modelo para abordar questões políticas importantes, como os efeitos dos salários mínimos sobre o emprego (Card e Krueger 1994Card, David, e Alan B. Krueger. 1994. “Minimum wages and employment: A case study of the fast food industry in New Jersey and Pennsylvania”, National Bureau of Economic Research, Cambridge.) ou os efeitos de programas de treinamentos no mercado de trabalho (Ashenfelter 1978Ashenfelter, 0. 1978. “Estimating the Effect of Training Programs on Earnings” Review of Economics and Statistics, 60, 47-57; Ashenfelter e Card 1985; Heckman e Robb 1986; Heckman e Hotz 1989; Heckman et al. 1998), o efeito da imigração no mercado de trabalho local (Card 1990) e a análises da oferta de trabalho.

No caso específico dessa pesquisa, para uma análise mais robusta do impacto da desoneração da folha de pagamentos sobre o emprego e competitividade-custo, o método de diferença em diferenças (DID) com pareamento será utilizado. Isto é, aplicamos o método DID nas sub-amostras selecionadas pelo propensity score matching (PSM). Com isso o viés advindo de: i) falta de suporte comum (pareamento); ii) proveniente dos observáveis (regressão/pareamento) e iii) de seleção (não observáveis), é reduzido, pois o PSM ajuda a minimizar o viés das observáveis e da ausência de suporte comum enquanto o DID ajuda a reduzir o viés de seleção.

Outro ponto importante é o conjunto de variáveis explicativas utilizadas para essa pesquisa. O intuito é cumprir a uniformização dos setores em termos de características observáveis e, por outro lado, compor um vetor de controles para o estimador de diferenças em diferenças (DID), refinando os coeficientes estimados. Para Heckman, Ichimura e Todd (1997Heckman, James J.; Ichimura, Hidehiko; Todd, Petra E. 1997. “Matching as an econometric evaluation estimator: Evidence from evaluating a job training programme”. The review of economic studies, v. 64, n. 4, p. 605-654.) e Abadie (2005Abadie, A. 2005. “Semiparametric difference-in-difference estimators” Review of Economic Studies 72: 1-19.), a ponderação pelo propensity score do estimador DID apresenta melhor performance, especialmente quando existem características das variáveis omitidas invariantes no tempo.

Conforme Heckman e Smith (1995Heckman, James J.; Smith, Jeffrey A. 1995 “Assessing the case for social experiments”. Journal of Economic Perspectives 9 (2): 85-110.), tal método pode ser entendido como o cálculo de subtrações: a primeira é diferença das médias da variável de resultado entre os períodos anterior e posterior ao evento entre os grupos de tratamento e controle, a segunda é a diferença entre as diferenças da primeira entre os dois grupos.

Porém ao avaliar o impacto de políticas públicas, há um esforço em estabelecer uma relação causal entre o programa e os objetivos finais dele. No caso da pesquisa, há a necessidade de ter um cuidado na análise pois, outros fatores, que não sejam diretamente relacionados à lei da desoneração da folha de salários podem influenciar na relação causal sobre o efeito no emprego e competitividade-custo industrial. Dessa forma, o objetivo do trabalho empírico é isolar apenas essa relação entre muitos outros fatores existentes.

Dessa forma, o ponto principal é construir os dois grupos estatisticamente idênticos. Rubin (1974Rubin, Donald B. 1974. “Estimating causal effects of treatments in randomized and nonrandomized studies”. Journal of Educational Psychology 66(5): 688.) construiu um método onde é feito uma randomização entre o grupo que receberá a política (grupo de tratamento) e o grupo que não a receberá (grupo de controle). Dessa forma, para a estimação do efeito causal da política pública de subsídios da União, em específico da desoneração da folha de salários, é necessário comparar as unidades do grupo de controle e do grupo de tratamento que apresentam a mesma probabilidade de recebimento do tratamento, isto é, as empresas optantes pelo SIMPLES Nacional e as não optantes.

Assim, utilizando uma técnica de pareamento Propensity Score Matching e o método de diferença em diferença para comparar os grupos antes e depois da lei, a equação abaixo apresenta o modelo a ser estimado:

Y i , t = α D S i , t + β D F i , t + γ D p o s t + δ 0 ( D S i , t D F i , t ) + δ 1 ( D S i , t D p o s t ) + δ 2 ( D F i , t . D p o s t ) + δ 3 ( D S i , t . D F i , t D p o s t ) + π t + π i + j = 1 N  controls  i , t + ε i , t (1)

Yi,t é o outcome de interesse: emprego ou competitividade-custo industrial do subsetor i e ano t. δ3 é o impacto da desoneração da folha sobre o outcome (Estimador de diferenças em diferenças - DID), DSi,t assume valor 1 se variável i no período t é não optante do Simples e zero caso contrário, DFi,t assume o valor 1 se o subsetor i pertence é contemplado pela desoneração de folha e zero caso contrário, Dpost variável dummies que indica os períodos posteriores à implementação da desoneração da folha de pagamentos (valor 1) e valor 0 para períodos antes da lei3 3 Nesse caso, como os setores foram inseridos ou retirados ao longo dos anos, essa variável binária irá controlar essas mudanças no programa. ; πt é um vetor de dummys de tempo e πi vetor de dummies para a divisão de atividade econômica (divisões da CNAE), j=1N controls i,t são os j-ésimos controles para os dois outcomes e εi,t= erro aleatório.

Outro avanço a ser testado nessa pesquisa é a estratégia de triplas diferenças. Ela é usada quando temos controles imperfeitos, melhorando a técnica de dupla diferenças para estimar o efeito médio de tratamento (Berck e Villas-Boas 2016Berck, Peter, e Sofia B. Villas-Boas. 2016. “A note on the triple difference in economic models”. Applied Economics Letters23(4):239-242.). A construção desse modelo usa como referência a mudança no resultado yit (emprego ou competitividade) devido à política pit (desoneração da folha de salários). Partimos de um modelo de referência como:

y i c t = α c + β i t + γ i ln p i c t + δ i ln x i c t (2)

Considerando i como o subsetor classificado no CNAE 2.0, t o tempo e c o momento da entrada da política, por simplificação, o modelo está escrito em logaritmo, γ denota o efeito médio da política no resultado y, a variável δ é a elasticidade dos i-ésimos controles. Tome Δ o operador diferença. No caso do tempo, a diferença é retirada do valor inicial, onde t = 0. A diferença no tempo produz:

Δ t y i c t = β i t + γ i ln ( p i c t / p i c t = 0 ) + δ i ln ( x i c t / x i c t = 0 ) (3)

Aplicando a diferença no tempo:

Δ t c y i c t = γ i ln ( p i , c = 0, t / p i , c = 1, t = 0 ) + δ i [ ln ( x i , c = 1, t / x i , c = 1, t = 0 ) ln ( x i , c = 0, t / x i , c = 0, t = 0 ) ] (4)

Podemos reescrever como:

Δ t c y i c t = γ i Δ t c ln p + δ i Δ t c ln x (5)

Conforme configurado, a diferença dupla remove o efeito fixo de tempo, com os dados exógenos, podem ser incluídos diretamente em uma regressão e facilmente controlados. No entanto, se não houver dados disponíveis em um dos períodos ou se x for uma variável endógena, seria desejável eliminar x com mais uma estratégia de diferenciação. Assim, com dados ausentes ou endogeneidade, a diferença tripla aparece como uma opção viável. Nesse caso, acontece mais uma diferenciação no subsetor i.

Δ t c i y i c t = γ i ln ( p i = 1, c = 1, t / p i = 1, c = 1, t = 0 ) + ( δ i = 1 δ i = 0 ) [ ln ( x i , c = 1, t / x i , c = 1, t = 0 ) ln ( x i , c = 0, t = 1 / x i , c = 0, t = 0 ) ] (6)

Ou

Δ t c i y i c t = γ i Δ t c ln p + ( δ 1 δ 0 ) Δ t c ln x (7)

Na prática, para entender a aplicação desse método, vamos dividir em duas partes. Na primeira parte considera-se apenas os setores desonerados. Dentro desses setores temos dois grupos, tratados e controles. Os tratados são aqueles subsetores não optantes pelo SIMPLES que estão no grupo de desonerados pela folha. Os controles são optantes pelo SIMPLES e são elegíveis para estarem no grupo de desonerados. O resultado da diferença de médias desses dois grupos antes e depois da desoneração da folha, por simplicidade, denominamos de DID*.

Na segunda parte, considera-se o grupo de setores não desonerados pela folha. Nele temos também os tratados e controles. Nos tratados são potenciais elegíveis para a política aqueles subsetores não optantes pelo SIMPLES que poderiam desonerar, mas por algum motivo, não o fizeram. Os controles são os optantes pelo SIMPLES que não são elegíveis para entrarem na política. A diferença de médias antes e depois da Lei e suas mudanças, denominamos de DID**. O resultado da diferença entre a segunda parte (DID**) e a primeira parte (DID**) será o efeito médio da política de desoneração da folha de salários sobre os outcomes de interesse (emprego e competitividade), pelo método de Triplas Diferenças (DDD). Ou seja, ao invés de considerar apenas os subsetores que não são optantes pelo Simples, e realizar a diferença entre desonerados ou não, utilizaria esse resultado e realizaria a diferença entre os não Simples e Simples dos subsetores não contemplados pela desoneração.

Para Garcia, Sachsida e Carvalho (2018Garcia, Felipe; Adolfo Sachsida, Alexandre Ywata de Carvalho. 2018. “Impacto da Desoneração da Folha de Pagamento sobre o emprego: Novas evidências”. Texto para Discussão.) a estratégia de triplas diferenças, tendo como pressuposto inicial de que na ausência da lei as diferenças na trajetória da variável de interesse (emprego e competitividade) entre os subsetores Simples e não Simples seriam idênticas entre setores desonerados e não desonerados. Assim, caso seja válido este pressuposto, problemas relacionados à tendência prévia e divergentes seriam eliminados na terceira diferença.

Por fim, essa pesquisa contribui com a literatura nacional, ao utilizar o estimador de diferenças em diferenças com escore de propensão, ainda não testada no cenário nacional. Em resumo, as variáveis de interesse (emprego e competitividade) são observadas em dois grupos e em dois períodos distintos, esses grupos são subdivididos em mais dois: grupo de controle antes e após a lei, e grupo de tratamento antes e após a lei de desoneração dos salários.

5. Resultados

A competividade industrial foi calculada a partir de dados disponíveis no portal da indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI, 2020). Utilizou-se o custo unitário do trabalho (CUT), que mensura o grau de competitividade industrial, e tem a seguinte expressão matemática (BCB, 2007):

C U T = C / y (8)

Onde C são os custos totais nominais do trabalho e y é o produto. Esse indicador mensura quanto custa, em termos do insumo trabalho, produzir uma unidade de produto. Ao dividir tanto o numerador quanto o denominador pela quantidade de trabalho usado na produção (horas trabalhadas) temos o seguinte:

C U T = ( C / H ) ( y / H ) = h A (9)

Onde h é o custo médio do trabalho (por hora trabalhada) e A é a produtividade do trabalho. Essas duas formas de mensuração refletem que quanto maior o indicador mais caro se torna produzir considerando o insumo trabalho, o que em consequência reduz a competitividade (índices com ajuste sazonal).

As Tabelas 2 e 3 trazem informações relevantes sobre dois prismas: emprego e competitividade industrial. A Tabela 2 apresenta as estatísticas descritivas da quantidade de vínculos e das horas trabalhadas. A questão central é ter um panorama entre a relação de horas trabalhadas nos setores desonerados e não desonerados.

A evolução das médias de horas trabalhadas, a partir de 2009, dos setores não desonerados, nitidamente, são maiores do que os desonerados. Para as subclasses desoneradas entre 2009 a 2013 (pico máximo da série), houve um crescimento de 19,9%, após esse período, a média do número de horas inicia sua queda, e em 2017, praticamente volta aos patamares de 2009.

Tabela 2
Estatísticas descritivas do emprego (horas contratadas e quantidade de vínculos), dos setores desonerados e não desonerados (2009/2018)

A Tabela 3 apresenta a competitividade da indústria considerando os dois indicadores do custo unitário do trabalho: a massa salarial (COMPMS) e as horas trabalhadas (COMPHT). Para os setores desonerados, em 2015, a competitividade industrial considerando a massa salarial atingiu seu ponto máximo (2,034), apontando para um crescimento deste indicador de 75,34%, entre 2009 e 2015. Para os setores não desonerados a variação nesse mesmo intervalo foi de 56,22%. Considerando o indicador de custo do trabalho com as horas trabalhadas, é possível verificar que houve aumento na média do indicador para ambos os setores (desonerados ou não) até 2012. Porém, a partir desse ponto, ocorre um processo de redução da competitividade, incluindo uma queda abrupta entre 2014 e 2015: -11,87% (desonerados) e -9,33% (não desonerados).

Por fim, é importante constatar que a indústria brasileira perdeu competitividade, de forma geral, ao longo da série, considerando o indicador COMP massa salarial e ganhou competitividade com o indicador COMP horas trabalhadas. A média dos anos 2013/2015 para ambos os setores (desonerados ou não) foi a janela de maior perda de competitividade, considerando a COMP massa salarial.

Tabela 3
Estatísticas descritivas da competitividade, dos setores desonerados e não desonerados (2009/2018)

A comparação das subclasses CNAE considerado a relação dos setores desonerados e não desonerados e entre optantes do Simples e não optantes, é apresentado na Tabela 4. Com três recortes temporais 2009/2011; 2012/2015 e 2015/2018, a média do número tanto de horas trabalhadas quanto de vínculos são maiores nas subclasses que não são optantes do Simples ao longo dos três recortes temporais.

A Tabela 5 apresenta o teste para comparar os dois grupos, setores desonerados e não desonerados, em relação aos outcomes de interesse - emprego e competitividade industrial. Como já argumentado, optamos por duas mensurações para cada variável: i) emprego - horas trabalhadas e quantidade de vínculos empregatício e ii) competitividade industrial - custo unitário do trabalho considerando a massa salarial (COMPMS) e custo unitário do trabalho considerando as horas trabalhadas (COMPHT). O extrato crucial desses resultados são que existem, com significância estatística, dois grupos distintos (desonerados e não desonerados) que podem ser comparados entre si sem viés de inferência estatística.

Tabela 4
Comparação de subclasses Desonerados x Simples (valores médios)
Tabela 5
Teste de diferença de médias

A Tabela 6 apresenta os resultados das técnicas de pareamentos. O importante dessa tabela é que a técnica Kernel matching e Neighbors matching foram significantes para a construção do pareamento das variáveis de controle. Diante disso, no estimador de diferenças em diferenças com escore de propensão para avaliar os efeitos da desoneração sobre a competitividade será utilizado o Kernel matching (o Apêndice apresenta o teste de pareamento e o gráfico de matched x unmatched).

As Tabelas 7, 8 e 9 apresentam a análise de quatros método de estimação: métodos dos mínimos quadrados ordinários (OLS), estimador de diferenças em diferenças (DID), estimador de diferenças em diferenças com pareamento por escore de propensão (DID-PSM) e triplas diferenças (DDD). Essa comparação dos quatros modelos é útil do ponto de vista dos estimadores, uma vez que, a comparação entre eles é importante, principalmente no quesito de comparabilidade e viés do sinal do efeito da desoneração da folha de salários sobre o emprego e a competitividade.

Tabela 6
Resultados para as técnicas de pareamento (competitividade e emprego)
Tabela 7
Resultados da estimação com os modelos: OLS, DID, DID-PSM e DDD (2009/2011 com 2012)

A principal constatação é que apenas o estimador de diferenças em diferenças com o pareamento por escore de propensão foi estatisticamente significativo, deixando para trás qualquer dúvida quanto à eficiência do estimador. Muitos trabalhos utilizaram outras técnicas e encontraram resultados negativos, e alguns deles não significativos (Garcia, Sachida e Carvalho 2018Garcia, Felipe; Adolfo Sachsida, Alexandre Ywata de Carvalho. 2018. “Impacto da Desoneração da Folha de Pagamento sobre o emprego: Novas evidências”. Texto para Discussão.).

Comparando os anos de 2009/2011 com 2012, o efeito médio da desoneração da folha de pagamentos sobre a quantidade de horas foi de 2,44 pontos percentuais, isto é, a política tributária adotada no ano de 2012 em comparação com os anos anteriores, aumentou a quantidade de horas, assim como o número de vínculos (em média 1,12 p. p.) em relação ao grupo dos setores não desonerados

Essa tabela também apresenta os efeitos da desoneração da folha de pagamentos sobre a competitividade. Como explicado na seção anterior, temos duas formas de mensurar a competitividade industrial: COMPMS e COMPHT. Nessa comparação intertemporal (2009/2011 com 2012) apenas o estimador por mínimos quadrados (OLS) foi significativo. Assim, em média, a desoneração da folha reduz a competitividade, uma vez que, quanto maior o indicador de competividade industrial, menos competitiva tornou-se a indústria.

Os resultados dos estimadores OLS, DID, DID-PSM e DDD, do cutoff entre 2009/2011 e 2013 são apresentados na Tabela 8. Podemos observar que as horas trabalhadas considerando a estimação de mínimos quadrados ordinários (segunda coluna), apresentou um resultado negativo da influência da desoneração da folha sobre as horas trabalhadas. A magnitude foi de -0,0007, e apesar de pequeno, houve uma indicação do sinal negativo.

Tabela 8
Resultados da estimação com os modelos: OLS, DID, DID-PSM e DDD (2009/2011 com 2013)

Outro ponto, considerando o DID-PSM (quarta coluna), temos um estimador estatisticamente significativo (p-valor - 0.014), enfatizando que, considerando o recorte temporal, a desoneração da folha de salários impacta positivamente no emprego, em média de 1,2 p. p. nas horas trabalhadas e 1,4 p. p. no número de vínculos empregatícios.

Por fim, continuando nessa mesma análise, a Tabela 9 traz a comparação entre 2009/2011 com 2015. Os resultados não apresentaram significância estatística nos estimadores, apenas o método dos mínimos quadrados ordinários (OLS) para o indicador de competitividade utilizando a massa salarial (COMPMS).

Tabela 9
Resultados da estimação com os modelos: OLS, DID, DID-PSM e DDD (2009/2011 com 2015)

A Tabela 10 apresenta a comparação entre os dois estimadores propostos: diferenças em diferenças com pareamento por escore de propensão (DID-PSM) e triplas diferenças (DDD). Uma vez que, desde a entrada da lei que trata da desoneração da folha de pagamentos, alguns setores foram contemplados enquanto outros saíram, essa evolução temporal considerando essa característica foi contemplada nesses resultados. A inovação desse resultado é a análise da evolução do programa ao longo dos anos.

A primeira constatação foi que o estimador de triplas diferenças não apresentou significância estatística em toda a análise temporal. Uma das justificativas dessa não significância pode estar relacionado à questão do enquadramento da terceira diferença, ou seja, como existe a opção de enquadramento no sistema tributário Simples, isso não reflete diferenças substanciais, em termos estatísticos, como método de comparabilidade na inferência. Ou seja, o emprego (horas trabalhas e vínculos) das subclasses que se enquadram no Simples e são desoneradas, não são muito diferentes das subclasses Simples e não desoneradas. Isso reflete diretamente no estimador da terceira diferença, não apresentando significância estatística.

Por outro lado, verifica-se que o efeito médio da desoneração da folha de salários surtiu efeitos maiores no início do programa do que nos anos finais, considerando as horas trabalhadas: 1,8 p. p. (2012); 1,8 p. p. (2013); 1,6 p. p. (2014); 1,5 p. p. (2015); 0,6 p. p. (2017) e 0,6 p. p. (2018). Essa constatação também foi apresentada na quantidade de vínculos ativos. Assim, pode-se dizer que houve efeitos positivos da desoneração da folha de salários sobre a geração de novos empregos e também no aumento das horas trabalhadas. Esse efeito não é único, mas gradual ao longo dos anos.

Tabela 10
Resultados dos estimadores de diferenças em diferenças com propensity score matching x triplas diferenças (2009-2018)

Já em relação à competitividade, de acordo com o banco de dados disponibilizado no sítio da Confederação Nacional da Indústria (CNI, 2020), houve um aumento da competitividade industrial, considerando o indicador horas trabalhadas, no cutoff 2015 (-36,7 p. p.) e 2016 (-45,2 p. p.). Nota-se que nesses anos houve uma mudança substancial na lei da desoneração da folha de salários, e isso é um argumento válido para que nesses dois anos, de forma específica, o modelo proposto conseguisse capturar essa mudança e apresentar efeitos consideráveis do programa fiscal sobre a competitividade industrial.

6. Testes de Robustez e sensibilidade

Quatro testes para robustez e sensibilidade foram realizados: i) falsificação; ii) “placebo”; iii) Ichino, Mealli e Nannicini (2008) e iv) Oster (2015Oster, E. 2015. “Unobservable Selection and Coefficient Stability: Theory and Evidence”. Working Paper, Brown University, Providence.).

O teste de falsificação consiste em mudar o outcome, de modo que não tenha relação aparente com a desoneração da folha. Nesse caso, utilizamos dois outcomes para o emprego: tempo no emprego e mês de admissão. Para ambas as variáveis temos cinco categorias. A pergunta desse teste é: será que a desoneração da folha de salários tem algum efeito sobre o tempo no emprego e sobre o mês de admissão dos trabalhadores?

Os testes apontaram para ausência do efeito médio do tratamento nos tratados (ATT) para ambos os outcomes: tempo no emprego e o mês de admissão. Enfatizando que o intuito da política, entre outros, era não ser arbitrário quanto a essas questões, mas sim, com o foco nos setores chaves para a geração de emprego.

Tabela 11
Resultados do teste de falsificação - tempo no emprego, em meses (2009-2018)
Tabela 12
Resultados do teste de falsificação - mês de admissão (2009-2018)

A Tabela 13 tem como resultado o teste “placebo”. Esse teste consiste em randomizar as subclasses CNAE 2.0 que são contempladas pela desoneração da folha de salários.. O intuito é verificar, caso fosse atribuído a não arbitrariedade, se os estimadores apresentariam alguma significância estatística. Neste caso, foram aleatorizadas três variáveis denominadas placebo 1, 2 e 3, em uma distribuição uniforme, que consiste em um placebo para os setores desonerados.

Neste caso, o teste apresentou não significância estatística. Isto significa, para três amostras de randomização das subclasses desoneradas, que a política de desoneração da folha de salários foi assertiva na seletividade dos setores contemplados. Outro ponto, o teste reforça a existência dos efeitos da desoneração da folha de salários sobre o emprego, uma vez que, ao mudar as amostras, não apresenta significância estatística sobre o estimador.

Tabela 13
Resultados do teste placebo (2009-2018)

A próxima Tabela destaca a análise de sensibilidade proposta por Ichino, Mealli e Nannicini (2008), que simula a possibilidade da presença de uma variável não observada que invalide a suposição de independência condicional necessária para identificar a relação de causalidade. Duas considerações sobre a análise de sensibilidade. A primeira é a calibragem dos fatores não observáveis (U), que é realizada através de uma cópia de algumas variáveis de controle. A segunda consideração sobre a análise de sensibilidade é não considerar as variáveis contínuas no teste, enfatizando apenas as variáveis binárias. Pois, segundo Ichino, Mealli e Nannicini (2008), ao utilizar variáveis binárias não causaram a perda de generalidade. Assim, as variáveis contínuas foram transformadas em binárias, sendo que assumem valores 1 caso o valor da variável for superior à média do grupo e valor zero, caso contrário. Isso possibilita comparações robustas intra e intergrupos. Outra questão desse método foi a utilização do método vizinho mais próximo para o pareamento

Tabela 14
Análise de sensibilidade de Ichino, Mealli e Nanncini. (2008), emprego, vínculos.

A ideia por trás do teste é verificar o efeito médio do tratamento nos tratados, ou seja, o efeito da desoneração da folha sobre o emprego naqueles que estão dentro do programa de subsídios da união, caso tivesse variáveis não observadas. Utilizando as variáveis, sexo, idade, remuneração, tempo no emprego e tamanho do estabelecimento para simular o confounder, percebemos que os resultados foram estatisticamente significativos e que os efeitos da desoneração da folha caso tivesse alguma variável omitida, poderia ter influenciado o emprego em média de 0,02 p. p. (sexo), -0,01 p. p (idade) e 0,01 p. p. (tamanho do estabelecimento). Tanto a remuneração quanto o tempo no emprego, mesmo que estatisticamente significativos, apresentam quase uma ausência de efeitos de variáveis omitidas, -0,004 p. p. (remuneração) e -0,001 p. p. (tempo no emprego). Esses resultados são influenciados pelo tamanho da amostra: um número grande de observações e de variáveis melhora o pareamento e também o estimador, com isso tendem a apresentar resultados consistentes e não viesados.

Por fim, o último teste proposto nessa pesquisa é o de Oster (2015Oster, E. 2015. “Unobservable Selection and Coefficient Stability: Theory and Evidence”. Working Paper, Brown University, Providence.), conforme tabela 15.

Tabela 15
Teste de Oster (2015Oster, E. 2015. “Unobservable Selection and Coefficient Stability: Theory and Evidence”. Working Paper, Brown University, Providence.) para o Efeito da Desoneração da folha de salários

O método segue a noção de que as variáveis não observáveis não devem ser mais importantes do que as observáveis na explicação dos efeitos da política de desoneração. Os resultados do teste de Oster (2015Oster, E. 2015. “Unobservable Selection and Coefficient Stability: Theory and Evidence”. Working Paper, Brown University, Providence.) enfatiza que o R2 máximo de um modelo com todas as variáveis, observadas e não observadas, não é conhecido, então deve-se atribuir valores para o R2. A literatura usualmente expõe os valores de 0,7; 0,8; 0,9 e o caso extremo de 1,0. A tabela 15 apresenta os resultados. Observa-se que os resultados para a variável emprego são robustos ao teste (δ >1). Já para a variável competitividade (horas trabalhadas) não apresentou robustez (δ < 1). Um exemplo seria o caso do emprego (horas trabalhadas), no qual δ = 19.549. Isto significa que os fatores não observáveis teriam que ser 19.549 mais fortes do que o efeito dos fatores observáveis para explicar os efeitos da desoneração da folha de salários sobre o emprego.

7. Considerações finais

Percebe-se que não há um consenso nas pesquisas empíricas dos impactos da desoneração da folha de pagamentos sobre o emprego e a competitividade. Com isso, torna-se de extrema importância investigar com profundidade esse subsídio da União e as suas consequências sobre as variáveis macroeconômicas.

A principal constatação foi que o efeito da desoneração da folha de salários sobre o emprego, em média, foi de: 2,44 p. p. (horas trabalhadas) e 1,12 p. p. (vínculos) do grupo desonerado em relação ao grupo não desonerado, no ano de entrada da política fiscal. No ano seguinte, 2013, esse efeito atingiu, em média, 1,2 p. p. (horas trabalhadas) e 1,4 p. p. (vínculos).

No outro resultado, que leva em consideração a tendência temporal, percebe-se que os efeitos da política de desoneração da folha de salários iniciaram com efeitos médios sobre o emprego em média 1,8 p.p (horas trabalhadas) e 1,5 p. p (vínculos), e como passar da implementação da política, esse efeito foi caindo, atingindo 0,6 p. p em 2018. Isso demonstra que a política surtiu seus efeitos logo no início da implementação e que depois, pelo simples fato de acomodação da política pública, mudanças em alíquotas e setores atingidos, esse efeito foi dissipando-se no tempo. Cabe lembrar, que o país enfrentou uma severa crise econômica entre os anos 2014/2016 e isso reflete diretamente no emprego e competitividade.

Já acerca da competitividade industrial, apenas na janela de 2015 e 2016, o estimador mostrou-se significativo e o efeito da política de desoneração da folha de salários surtiu efeitos para aumentar a competitividade da indústria brasileira: -36,7 p. p. (2015) e -45,2 p. p. (2016). Essa janela temporal foi o auge da crise econômica brasileira, na qual houve queda do emprego, e como essa variável faz parte do componente da construção do indicador, os setores industriais que estão no grupo no qual existe a política de desoneração da folha em relação ao grupo não desonerado conseguiu ganhar competitividade.

Por fim, a presente pesquisa atingiu seus objetivos propostos e, principalmente, constatou resultados importantes dos impactos dessa política de subsídios da União para o emprego e a competitividade industrial. Inovando a literatura nacional e, também, encaminhando apontamentos para as possíveis aplicações para a administração pública federal.

Referências

  • Abadie, A. 2005. “Semiparametric difference-in-difference estimators” Review of Economic Studies 72: 1-19.
  • Ansiliero, Graziela et al. 2008. “A desoneração da folha de pagamentos e sua relação com a formalidade no mercado de trabalho”. Texto para Discussão, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Brasília.
  • Ashenfelter, 0. 1978. “Estimating the Effect of Training Programs on Earnings” Review of Economics and Statistics, 60, 47-57
  • Ashenfelter, 0., Card, D. 1985. „Using the Longitudinal Structure of Earnings to Estimate the Effect of Training Programs“ Review of Economics and Statistics, 67, 648-660.
  • Auerbach, Alan J., e Laurence J. Kotlikoff. 1983. “National savings, economic welfare, and the structure of taxation.” In: Behavioral simulation methods in tax policy analysis, editado por Martin Feldstein. Chicago: University of Chicago Press.
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  • JEL Classification

    H24; C23; C54
  • O presente trabalho foi realizado com o apoio da Escola Nacional de Administração Pública - Enap. Ele é resultado da pesquisa de avaliação de Subsídios da União do Programa Cátedras 2019, edital nº 50 de 11 junho de 2019.
  • 1
    Arrow, Kenneth J. Bernheim, B. Douglas. Feldstei, Martin S. McFadden, Daniel L. Poterba, James, M. Solow, Robert M; 100 years of the American Economic Review: The top 20 articles. The American Economic Review, v. 101, n. 1, p. 1-8, 2011.
  • 2
    A medida tem caráter obrigatório e abrangem os seguintes contribuintes: (i) que auferiram receita bruta decorrente do exercício de determinadas atividades elencadas na Lei nº 12.546/2011; (ii) que auferiram receita bruta decorrente da fabricação de determinados produtos listados por NCM na Lei nº 12.546/2011 e (iii) que estão enquadrados em determinados códigos CNAE previstos na Lei nº 12.546/2011 (Receita Federal 2014)
  • 3
    Nesse caso, como os setores foram inseridos ou retirados ao longo dos anos, essa variável binária irá controlar essas mudanças no programa.

Apêndice

Tabela 16
Teste de pareamento (logit)

Figura 1
Test PSM Unmatched x Matched

Editor Responsável:

Fábio Waltenberg

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    16 Mar 2021
  • Aceito
    03 Fev 2022
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