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Programa de Qualidade: o que influencia na opinião da equipe de enfermagem

RESUMO

Objetivo

Analisar as variáveis de maior impacto na opinião dos trabalhadores de enfermagem sobre um Programa de Qualidade de um hospital de ensino.

Métodos

Estudo exploratório-descritivo, desenvolvido com 72 trabalhadores de enfermagem, com dados coletados por meio de questionário autoaplicável, contendo 24 afirmações com escala Likert sobre o Programa de Qualidade. Para análise dos dados, foram utilizados análise fatorial e coeficiente de correlação de Pearson.

Resultados

A análise agrupou as afirmações em seis fatores. O coeficiente de correlação de Pearson definiu uma escala de influência das variáveis dentro de cada fator, cuja variável de maior impacto em cada fator representa a questão prioritária para a melhoria da opinião do trabalhador sobre o Programa de Qualidade. As variáveis prioritárias foram: acreditar que o Programa de Qualidade contribui para o hospital; compreender as orientações do programa; interessar-se pelos rumos de qualidade do hospital; e não se sentir desgastado em função do programa.

Conclusão

Estas variáveis devem ser focadas durante a implantação e a execução de um Programa de Qualidade, pois possuem maior impacto na melhoria da opinião em relação a ele, contribuindo para aumentar a adesão dos trabalhadores de enfermagem.

Gestão em Saúde; Gestão de Qualidade; Condições de trabalho; Recursos humanos de enfermagem no hospital; Qualidade da assistência à saúde; Equipe de enfermagem

ABSTRACT

Objective

To analyze the major impact variables in the opinion of nursing staff about the Quality Program of a teaching hospital.

Methods

An exploratory-descriptive study was performed with 72 nursing staff. Data were collected through self-administered questionnaire containing 24 statements about the Quality Program; and the degree of agreement of the participants was expressed in a Likert scale. The collected data were analyzed by factor analysis and Pearson’s correlation coefficient.

Results

The analysis grouped the statements in six factors. The Pearson’s correlation coefficient defined a scale of influence of the variables within each factor, whose variable with the greatest impact in each factor is the priority issue for improving worker opinion about the Quality Program. The priority variables were to believe the Quality Program contributes to the hospital; to understand the program orientations; interest in hospital quality direction; and do not feel exhausted due to the program.

Conclusion

These variables must be focused during the implementation and execution of Quality Program, as they have greater impact on improving opinion regarding the Quality Program and thus helping to increase compliance of the nursing staff to the program.

Health Management; Quality Management; Working conditions; Nursing staff, hospital; Quality of health care; Nursing, team

INTRODUÇÃO

As organizações de saúde têm passado por rápidas e profundas transformações, com vistas ao atendimento das demandas de uma clientela cada vez mais exigente.(11. Manzo BF, Brito MJ, Corrêa Ados R. [Implications of hospital accreditation on the everyday lives of healthcare professionals]. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(2):388-94. Portuguese.) Nesta perspectiva, alguns gestores têm empregado, nos serviços de saúde, práticas com elevado padrão de qualidade e segurança para alcançarem reconhecimento social.(22. Manzo BF, Ribeiro HC, Brito MJ, Alves M. Nursing in the hospital accreditation process: practice and implications in the work quotidian. Rev Lat Am Enfermagem. 2012;20(1):151-8.) A gestão da qualidade na saúde opõe-se aos cuidados de saúde inseguros, que resultam em morbidade e mortalidade evitáveis, e gastos adicionais com a manutenção dos pacientes nos sistemas de saúde.(33. Silva LD. Segurança e qualidade nos hospitais brasileiros. Rev Enferm UERJ. 2013;21(4):425-6.) O alcance de padrões, entendido como base para elevar a qualidade, é o principal condutor dos esforços de segurança. Internacionalmente, a qualidade é uma preocupação, especialmente no que se refere à segurança do paciente.(44. Warburton RN. Accreditation and regulation: can they help improve patient safety? [Internet]. Perspective on Safety; 2009 [cited 2013 Nov 13]. Available from: https://psnet.ahrq.gov/perspectives/perspective/74
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)

Destacam-se, no histórico recente internacional, as metas para a segurança do paciente, definidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 2004.(55. World Health Organization (WHO). Conceptual framework for the international classification for patient safety. Version 1.1. Tecnical Report. Geneva: WHO; 2009.) Nacionalmente, a temática ganha destaque a partir de 2012, com a criação da Câmara Técnica de Qualidade e Segurança do Paciente, obrigatória em todos os hospitais federais, pelo Ministério da Saúde.(66. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Gerenciamento de riscos. Brasília (DF): Anvisa; 2011.) Em Minas Gerais (MG), por exemplo, destaca-se o Programa de Fortalecimento e Melhoria da Qualidade dos Hospitais do Sistema Único de Saúde.(77. Noronha KV, Fortes FB, Camargos MC, Pereira DR. Avaliação de impacto do Programa de Fortalecimento e Melhoria da Qualidade dos Hospitais do SUS/Minas Gerais (PRO-HOSP). Rev Serv Público. 2014;65(1):65-85.)

Diante deste contexto, o presente estudo teve a seguinte questão norteadora: quais as variáveis significativas que mais influenciam na opinião dos trabalhadores de enfermagem sobre o Programa de Qualidade favorecendo sua adesão?

OBJETIVO

Analisar as variáveis de maior impacto na opinião dos trabalhadores de enfermagem sobre um Programa de Qualidade de um hospital de ensino.

MÉTODOS

Estudo exploratório-descritivo desenvolvido por meio do levantamento da opinião dos trabalhadores de enfermagem sobre o Programa de Qualidade de um hospital de Ensino de Médio porte, credenciado para atendimento de média e alta complexidades, em um município de grande porte, no interior de Minas Gerais (MG).

O hospital em que este estudo foi realizado contava com um Núcleo de Gestão da Qualidade, desde 2009, e o Programa de Qualidade Total estava em desenvolvimento.(88. Lima NG, Dutra HS. Percepção do enfermeiro sobre o programa de qualidade de um Hospital Universitário de Minas Gerais. HU Rev. 2011;37(4):471-7.) Após 3 anos do programa, constatou-se baixa adesão dos trabalhadores. Embora a maioria dos trabalhadores acreditasse que o programa influenciava positivamente em suas condições e relações interpessoais no trabalho, e tivesse dado anuência a ele, expressivo percentual desconhecia as implicações de um Programa de Qualidade e não se sentia parte do que foi desenvolvido na instituição.(99. Costa FM, Greco RM, Bohomol E, Arreguy-Sena C, Andrade VL. The nursing staff opinion about the continuous quality improvement program of a university hospital. einstein (São Paulo). 2014;12(2):211-6.)

Dos 278 trabalhadores de enfermagem da instituição, 82 foram selecionados por amostragem aleatória, com base na variância das respostas da amostra-piloto de 12 indivíduos, considerando-se erro máximo admissível de 5%, intervalo de confiança de 95% e acréscimo mínimo de 15% como margem de segurança para reposição das perdas amostrais. Foram incluídos os trabalhadores que atuavam na assistência direta ou em serviços administrativos ligados à enfermagem, e excluídos os que não desejavam participar e/ou não assinaram o Termo de Consentimento.

Foram coletados dados entre maio e julho de 2012, com questionário autoaplicável desenvolvido para o estudo baseado na literatura e na experiência dos pesquisadores, e pré-testado em dez sujeitos da população-alvo, que o avaliaram quanto a conteúdo, formato e estrutura. As adequações resultaram em instrumento composto por 11 questões para caracterização sociodemográfica dos participantes e 24 afirmações sobre o Programa de Qualidade da instituição. Neste, o grau de concordância do participante deveria ser expresso em escala com amplitude da resposta, contemplando cinco níveis, que variam entre “concordo totalmente”, “concordo parcialmente”, “não tenho opinião a respeito”, “discordo parcialmente” e “discordo totalmente”. O coeficiente α de Cronbach (0,878) demonstrou adequada consistência interna do instrumento.

Foram excluídos dez questionários, por estarem incompletos. Os dados dos demais 72 questionários foram processados no programa Statistical Package Social Sciences (SPSS), versão 14.0, e submetidos à análise fatorial exploratória. Para obter a posição de cada variável em cada fator, foram realizados a elaboração de uma matriz de correlação, extrações dos fatores iniciais, rotação ortogonal pelo método Varimax e o cálculo dos escores fatoriais. Os testes de esfericidade de Bartlett (1004,348) e de Kaiser-Meyer-Olkin (0,820) indicaram adequação da amostra para a análise fatorial, que agrupou as afirmações em seis fatores (condições de trabalho: avalia o quanto o trabalhador acredita que o Programa de Qualidade interfere em suas condições de trabalho; anuência: averigua concordância/aprovação do Programa de Qualidade; pertencimento: quantifica o sentimento de pertencimento do trabalhador em relação ao programa; tranquilidade: mensura quanta tranquilidade o trabalhador acredita dispor para desenvolver suas atividades; relações interpessoais: verifica a percepção do trabalhador sobre a interferência da qualidade nas relações; e vida pessoal: investiga a percepção do trabalhador sobre a interferência da qualidade em sua vida).

A força de associação entre as variáveis de cada fator foi analisada por meio do coeficiente de correlação de Pearson. Desta maneira, verificou-se a influência de cada variável na opinião do indivíduo em relação ao fator a que ela está ligada. Segundo o coeficiente, todas as variáveis estão correlacionadas na mesma direção (positiva) em função de a análise fatorial agrupar as variáveis semelhantes no mesmo fator. Assim, as variáveis com coeficiente próximo a um apresentam forte correlação com o fator e alto impacto da variável em relação ao fator, isto é, possuem maior potencial de influenciar na opinião do indivíduo, de modo que ele avalie positivamente o fator analisado. Já as variáveis com coeficiente próximo a zero demonstram fraca correlação e, consequentemente, interferem pouco na opinião do indivíduo sobre aquele fator. Com base nos achados deste teste, foi elaborada uma escala de influência das variáveis em cada fator. A variável de maior impacto no fator representa questão prioritária em ações que visem à melhoria da opinião dos trabalhadores em relação ao fator a que está relacionada e, por conseguinte, ao programa como um todo.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora (MG), Brasil, com número 262/2010, CAAE: 0171.0.180.00-10.

RESULTADOS

Dentre os participantes do estudo, 78% eram mulheres; 63% tinham entre 30 e 49 anos; 53,5% eram formadas há mais de 6 anos; 54,6% atuavam há pelo menos 6 anos na instituição; 31,7% tinham mais de um emprego; e 54,9% tinham como vínculo trabalhista o regime jurídico único.

O quadro 1 apresenta a escala de influência das variáveis em cada fator, demonstrando as questões prioritárias para a melhoria da opinião dos trabalhadores sobre os fatores analisados, desenvolvida com base nos achados do coeficiente de correlação Pearson.

Ao realizar a análise fatorial, apenas uma variável foi atribuída ao fator 5 (relações interpessoais no trabalho) e uma ao fator 6 (vida pessoal). Uma vez que a estes fatores atribuiu-se somente uma variável, não é possível construir uma escala de influência das variáveis dentro destes fatores. A correlação de uma única variável com ela mesma resultaria em uma máxima força de correlação errônea; por isto, estes dois fatores não foram submetidos ao teste de correlação de Pearson, mas foram analisados com base nas variáveis atribuídas a eles.

Quadro 1
Escala de influência das variáveis em cada fator

DISCUSSÃO

O conhecimento da ordem de influência das variáveis sobre a opinião do trabalhador fornece subsídios que orientam a atuação do gestor na tomada de decisões estratégicas e operacionais para a implementação de ações sobre a variável que representa a questão prioritária para a melhoria da opinião do trabalhador sobre cada fator e, consequentemente, sobre o Programa de Qualidade, contribuindo para aumentar sua adesão ao programa.

A questão prioritária para os trabalhadores no fator 1, condições de trabalho, é “Crença de que o Programa de Qualidade contribui para que o hospital forneça orientações e recursos necessários à execução do trabalho”.

É interessante observar que os trabalhadores consideraram que ter as orientações e os recursos necessários para o adequado desenvolvimento de seu trabalho trazia benefícios coletivos, como cooperação com a equipe multidisciplinar, promoção de uma assistência qualificada e consonância com os objetivos da organização. A prioridade para eles era avaliar bem o fator e o programa em detrimento de outras questões que trariam benefícios individuais, como às relacionadas à sua saúde, à segurança, à motivação, ao reconhecimento, à facilidade no desenvolvimento das tarefas e à qualidade de vida no trabalho.

Estudos demonstraram que, em organizações que possuem Programas de Qualidade, o trabalhador sente-se mais preparado para o desempenho de suas atividades, por dispor de rotinas padronizadas, maior organização do serviço, e recursos materiais, técnicos e humanos necessários.(22. Manzo BF, Ribeiro HC, Brito MJ, Alves M. Nursing in the hospital accreditation process: practice and implications in the work quotidian. Rev Lat Am Enfermagem. 2012;20(1):151-8.) Além disso, na opinião de enfermeiros, a implantação de Programas de Qualidade promove a organização do serviço e a otimização dos processos, favorecendo a atuação segura da equipe e proporcionando tempo para a sistematização da assistência de enfermagem,(88. Lima NG, Dutra HS. Percepção do enfermeiro sobre o programa de qualidade de um Hospital Universitário de Minas Gerais. HU Rev. 2011;37(4):471-7.) o que demonstra o reconhecimento de que os resultados da assistência estão relacionados às condições de desenvolvimento do trabalho e à preocupação em ter os recursos adequados para prestar uma assistência qualificada.

Se, por um lado, estes resultados evidenciam que os trabalhadores compreendem que as orientações e os recursos necessários à execução do trabalho são determinantes para seu desempenho, por outro, podem significar que os trabalhadores não se consideram beneficiários dos Programas de Qualidade. Estudos têm demonstrado que os profissionais percebem, mais claramente, as vantagens dos Programas de Qualidade para os pacientes do que para as demais partes interessadas, entre elas, os próprios trabalhadores.(1010. Manzo BF, Ribeiro HC, Brito MJ, Alves M. As percepções dos profissionais de saúde sobre o processo de Acreditação Hospitalar. Rev Enferm UERJ. 2011; 19(4):571-6.)

A satisfação da equipe com as condições de trabalho afeta diretamente a qualidade do atendimento prestado e a satisfação do paciente.(1111. McHugh MD, Kutney-Lee A, Cimiotti JP, Sloane DM, Aiken LH. Nurses’ widespread job dissatisfaction, burnout, and frustration with health benefits signal problems for patient care. Health Aff (Millwood). 2011;30(2):202-10.) Estudos identificaram que melhores ambientes da prática, nível de pessoal e de qualificação estavam associados com experiências de trabalho mais positivas e menor apreensão com a qualidade do cuidado pelos trabalhadores, com risco significativamente menor de morte e incapacidade dos pacientes.(1212. Aiken LH, Clarke SP, Sloane DM, Lake ET, Cheney T. Effects of hospital care environment on patient mortality and nurse outcomes. J Nurs Adm. 2008;38(5):223-9.) Os autores destacaram ainda que os efeitos positivos do aumento do percentual de enfermeiros sobre os resultados de enfermagem eram diretamente proporcionais à qualidade do ambiente da prática.(1313. Aiken LH, Cimiotti JP, Sloane DM, Smith HL, Flynn L, Neff DF. Effects of nurse staffing and nurse education on patient deaths inhospitals with different nurse work environments. Med Care. 2011;49(12):1047-53.) Assim, não obstante as qualificações do profissional, seu desempenho está circunscrito às suas condições de trabalho, o que demonstra a importância de as organizações se empenharem em fornecer os recursos necessários à adequada execução do trabalho, para que melhores resultados sejam alcançados.

No fator 2, anuência, a questão prioritária para os trabalhadores foi “Compreensão das orientações do Programa de Qualidade”.

O sucesso na implantação de Programas de Qualidade depende de esforços individuais e coletivos.(1414. Pertence PP, Melleiro MM. [The implementation of a quality management tool at a university hospital]. Rev Esc Enferm USP. 2010;44(4):1024-31. Portuguese.) No entanto, embora muitos profissionais os considerem como ferramenta capaz de intervir no processo de trabalho e proporcionar segurança, poucos compreendem efetivamente o processo e sua responsabilidade nele.(88. Lima NG, Dutra HS. Percepção do enfermeiro sobre o programa de qualidade de um Hospital Universitário de Minas Gerais. HU Rev. 2011;37(4):471-7.) Muitos profissionais assimilam mecanicamente as informações sobre os Programas de Qualidade, sem desenvolverem uma prática reflexiva e crítica.(1010. Manzo BF, Ribeiro HC, Brito MJ, Alves M. As percepções dos profissionais de saúde sobre o processo de Acreditação Hospitalar. Rev Enferm UERJ. 2011; 19(4):571-6.)

Compreender as orientações do programa é importante para que os trabalhadores se sintam motivados a aderirem às ações propostas, uma vez que as pessoas não se envolvem com aquilo que não compreendem.(1515. Rocha ES, Trevizan MA. Gerenciamento da qualidade em um serviço de enfermagem hospitalar. Rev Lat Am Enfermagem. 2009;17(2):240-5.) A implantação de Programas de Qualidade, sem a incorporação de conceitos fundamentais por meio de informações completas, claras, objetivas e uniformes, dificulta a compreensão do processo em sua totalidade e é um grande entrave no engajamento dos trabalhadores.(1616. Manzo BF, Brito MJ, Alves M. Influência da comunicação no processo de acreditação hospitalar. Rev Bras Enferm. 2013;66(1):46-51.)

As organizações devem se empenhar em superar esse entrave por meio de uma comunicação adequada. Considerando a importância da capacitação dos trabalhadores, estratégias participativas de aprendizagem na educação permanente em saúde têm sido desenvolvidas, as quais buscam incluir o sujeito no processo por meio da reflexão coletiva sobre a prática, valorizando o trabalhador com o reconhecimento de seus saberes e promovendo o trabalho em equipe com a tomada de decisões por consenso.(1717. Medeiros AC, Pereira QL, Siqueira HC, Cecagno D, Moraes CL. [Participative management in permanent health education: view of the nurses]. Rev Bras Enferm. 2010;63(1):38-42. Portuguese.)

Como questão prioritária no fator 3, pertencimento, os trabalhadores elegeram Interesse pelos rumos da qualidade do hospital”. Embora os trabalhadores reconheçam a importância de participarem dos Programas de Qualidade, muitos assumem que não se envolvem com a proposta.(88. Lima NG, Dutra HS. Percepção do enfermeiro sobre o programa de qualidade de um Hospital Universitário de Minas Gerais. HU Rev. 2011;37(4):471-7.)

A qualidade de vida no trabalho e o padrão do trabalho desenvolvido são influenciados por questões associadas às relações familiares e sociais, e à rotina do trabalhador, perpassando pelo sentimento de pertencimento.(1818. Olivieri GM, Ribeiro HS. Organizações em mudança e o trabalhador [Internet]. In: Simpósio de jornalismo e Direito. Barra do Garças (MT). Anais eletrônicos. Universidade Federal de Mato Grosso; 2012 [citado 2016 Nov 30]. Disponível em: http://anaissimposiojd2012.blogspot.com.br
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) Sentir-se parte do processo é fundamental para que os sujeitos se engajem em movimentos em que sejam atualizados práticas e significados. Esta noção de pertencimento depende da existência de espaços de gestão compartilhada que permitam a construção coletiva de valores e sentidos para a produção de saúde.(1919. Guizardi Fl, Cavalcanti FO. [The concept of co-management of health institutions: reflections on the production of institutional democracy]. Physis Rev Saude Coletiva. 2010;20(4):1245-65.)

A equipe dos serviços de enfermagem acreditados pelo programa americano Magnet Recognition Program® refere mais oportunidade de ter sua opinião acatada nas questões referentes à organização do espaço de trabalho e participação na liderança compartilhada, bem como um ambiente com atmosfera positiva.(2020. Hess R, Desroches C, Donelan K, Norman L, Buerhaus PI. Perceptions of nurses in magnet® hospitals, non-magnet hospitals, and hospitals pursuing magnet status. J Nurs Adm. 2011;41(7-8):315-23.)

Estudos têm demonstrado que os trabalhadores sentem-se orgulhosos, satisfeitos e reconhecidos, por perceberem que foram importantes na obtenção das certificações decorrentes da implantação de Programas de Qualidade e por atuarem em serviços certificados.(11. Manzo BF, Brito MJ, Corrêa Ados R. [Implications of hospital accreditation on the everyday lives of healthcare professionals]. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(2):388-94. Portuguese.) Uma vez que o homem é um ser gregário, que se constitui ao ser reconhecido pelo outro e, ao afirmar seu pertencimento a um grupo social,(2121. Miranda L, Rivera FJ, Artmann E. Trabalho em equipe interdisciplinar de saúde como um espaço de reconhecimento: contribuições da teoria de Axel Honneth. Physis Rev Saude Coletiva. 2012;22(4):1563-83.) este sentimento de orgulho é oriundo da noção de pertencimento a uma organização pela qual se tem admiração e identificação de valores.(2222. Bonato VL. Gestão em saúde: programas de qualidade em hospitais. São Paulo: Icone; 2007. p.119.)

Como questão prioritária no fator 4, tranquilidade no trabalho, os trabalhadores apontam que não se sentem desgastados em função do Programa de Qualidade”. Consequentemente, se o trabalhador se sente desgastado em decorrência do Programa de Qualidade ou do nível de exigência institucional deste, ele tem uma opinião negativa tanto em relação à tranquilidade no trabalho quanto ao programa como um todo.

O desgaste do trabalhador é proveniente de situações estressoras no cotidiano do trabalho. Majoritariamente, as pesquisas vinculam frequentemente o estresse ao local/ambiente de trabalho e as características da atuação profissional, como: emergência, centro cirúrgico e unidade de terapia intensiva.(2323. Adriaenssens J, De Gucht V, Maes S. Determinants and prevalence of burnout in emergency nurses: a systematic review of 25 years of research. Int J Nurs Stud. 2015;52(2):649-61. Review.,2424. Ferreira Ndo N, de Lucca SR. Burnout syndrome in nursing assistants of a public hospital in the state of São Paulo. Rev Bras Epidemiol. 2015;18(1):68-79.)

Estudo comparativo a partir da percepção dos membros da equipe de enfermagem de instituições hospitalares, com ou sem acreditação, analisa como a existência de um Programa de Qualidade pode desgastar ou proteger a equipe. Trabalhar no hospital acreditado foi fator de proteção contra o estresse quando se consideraram as seguintes situações: estresse frente à falta de material, falta de recursos humanos e trabalho em ambientes físicos inadequados. No entanto, trabalhar em hospital acreditado foi fator de risco para estresse decorrente do fato de ter que conciliar questões profissionais e familiares, assistir pacientes graves, atender familiares e administrar ou supervisionar o trabalho de outros. Em suma, trabalhar em hospital acreditado protege do estresse relacionado a recursos materiais, humano e físico, porém, constitui fator adverso à saúde emocional de enfermeiros quando são considerados aspectos relacionais e da complexidade do trabalho.(2525. Higashi P, Simonetti JP, Carvalhaes MA, Spiri WC, Parada CM. Situações potencialmente geradoras de estresse para enfermeiros segundo condição de acreditação do hospital. Rev Rene. 2013;14(6):1141-8.)

Para motivar a tranquilidade do trabalhador e, consequentemente, a adesão ao Programa de Qualidade, o programa em si não pode ser percebido como fator estressor que cause desgaste.

A partir da análise fatorial, o fator 5 foi constituído por uma única questão: “O Programa de Qualidade promove uma melhor interação com meus colegas de trabalho e chefia”. As relações interpessoais no trabalho podem constituir um fator estressor, mais frequente em hospitais acreditados do que nos não acreditados. Para os enfermeiros, as relações interpessoais são especialmente estressantes em situações nas quais eles têm que conciliar questões profissionais e familiares; assistir pacientes graves e, principalmente, atender a familiares.(2525. Higashi P, Simonetti JP, Carvalhaes MA, Spiri WC, Parada CM. Situações potencialmente geradoras de estresse para enfermeiros segundo condição de acreditação do hospital. Rev Rene. 2013;14(6):1141-8.) Portanto, o Programa de Qualidade deve adotar estratégias para promover a interação entre a equipe multidisciplinar, os pacientes e familiares, como minimizar estruturas hierarquizadas/verticalizadas e barreiras de comunicação.

O fator 6, vida pessoal, também foi constituído por uma única variável: “Nos momentos de lazer e descanso, sou capaz de me esquecer das demandas do Programa de Qualidade”. Frequentemente, as condições laborais geram problemas orgânicos e psíquicos decorrentes do estresse e do desgaste, com reflexos na vida pessoal.(2626. Elias MA, Navarro VL. [The relation between work, health and living conditions: Negativity and positivity in nursing work at a teaching hospital]. Rev Lat Am Enfermagem. 2006;14(4):517-25. Portuguese.) Este resultado corrobora a reflexão sobre o fator 4, cujo programa em si não pode ser percebido como fator estressor que comprometa a vida pessoal e até mesmo o lazer e o descanso dos trabalhadores de enfermagem.

CONCLUSÃO

As variáveis que mais impactaram a opinião dos trabalhadores de enfermagem sobre o Programa de Qualidade em questão foram: crença de que o Programa de Qualidade contribui para que o hospital forneça orientações e recursos necessários à execução do trabalho; compreensão das orientações do Programa de Qualidade; interesse pelos rumos da qualidade do hospital; condição de não se sentir desgastado em função do Programa de Qualidade; promoção de melhor interação com os colegas de trabalho e chefia e capacidade de se esquecer das demandas do Programa de Qualidade nos momentos de lazer e descanso.

Esta informação possibilita elaborar estratégias para melhorar o programa a partir da ótica dos trabalhadores, favorecendo sua adesão. Assim, a pesquisa fornece as variáveis prioritárias para a tomada de decisões estratégicas pelo gestor, a fim de melhorar a opinião da equipe de enfermagem em relação ao Programa de Qualidade e, consequentemente, proporcionar maior adesão ao programa, visando a uma maior qualificação no atendimento. Ademais, amplia as discussões e as reflexões sobre a participação da enfermagem no Programa de Qualidade.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    18 Jan 2016
  • Aceito
    25 Out 2016
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