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Perfil de saúde dos idosos assistidos pelo Programa Acompanhante de Idosos na Rede de Atenção à Saúde do Município de São Paulo

RESUMO

Objetivo

Analisar o perfil de saúde de idosos residentes na comunidade, de acordo com o sexo, cadastrados no Programa Acompanhante de Idosos do Município de São Paulo.

Métodos

Os dados secundários de 535 idosos assistidos por dez equipes do Programa Acompanhante de Idosos da região sul de São Paulo foram coletados a partir da consulta em prontuários e da Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa na Atenção Primária, após verificados os critérios de inclusão e exclusão para o estudo e a autorização dos idosos selecionados.

Resultados

Os idosos assistidos por este programa eram predominantemente do sexo feminino (77,6%), apresentavam média de idade 76,2±8,0 anos, tinham autoavaliação negativa de saúde (67,8%), comprometimento das atividades instrumentais da vida diária (68,4%) e indícios de alterações de humor (60,3%). Foi observada alta prevalência de idosos com dificuldades para enxergar (58,8%), polifarmácia (58,1%), queixas de problemas de memória (55,8%) e com múltiplas morbidades (50,6%). Na comparação entre os sexos, a presença de múltiplas morbidades, polifarmácia, queixas cognitivas e sinais de alterações de humor foi maior entre as mulheres. Por outro lado, a demanda de maior prevalência entre os homens foi referente a dificuldades em ouvir.

Conclusão

As piores condições de saúde desses idosos, constatadas pela alta prevalência de autoavaliação negativa de saúde, pelo comprometimento das atividades instrumentais da vida diária, por múltiplas morbidades, pela polifarmácia e outras queixas (alterações sensoriais, sintomas depressivos e alterações cognitivas), reafirmam a importância deste programa como política de cuidados de longa duração e para a manutenção destes idosos residindo na comunidade.

Serviços de assistência domiciliar; Visitadores domiciliares; Modelos de assistência à saúde; Perfil de saúde; Serviços de saúde para idosos; Idoso

ABSTRACT

Objective

To assess the health profile of community-dwelling older adults, according to sex, assisted by the Elderly Caregiver Program of the City of São Paulo.

Methods

Secondary data of 535 older adults, assisted by ten Elderly Caregiver Program teams from the southern region of São Paulo, were collected from medical records and the Multidimensional Evaluation of Older People in Primary Care, after verifying the inclusion and exclusion criteria for the study and obtaining subjects’ consent.

Results

Older adults assisted by this program were predominantly female (77.6%), mean age of 76.2±8.0 years. They had negative self-rated health (67.8%), difficulties in instrumental activities of daily living (68.4%) and signs of mood changes (60.3%). A high prevalence of older adults with vision problems (58.8%), polypharmacy (58.1%), memory-related complaints (55.8%) and multiple morbidities (50.6%) were observed. The prevalence of multiple morbidities, polypharmacy, cognitive impairment and signs of mood changes were higher in women. On the other hand, men reported more hearing problems than women.

Conclusion

The poorer health conditions of the older adults in this study, evidenced by a high prevalence of subjects with negative self-rated health, difficulties in instrumental activities of daily living, multiple morbidities, polypharmacy and other complaints (sensorial changes, depressive and cognitive symptoms), reinforce the importance of this program as a long-term care policy and as a way to ensure these older adults can continue living in their communities.

Home care services; Home health aides; Healthcare models; Health profile; Health services for the aged; Aged

INTRODUÇÃO

A população brasileira envelhece de maneira mais rápida comparada aos países desenvolvidos e em um contexto de desigualdade socioeconômica. Em 2014, os idosos representavam 13,7% da população brasileira, enquanto projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estimam que esta proporção suba para 33,7% em 2060.(11. Tramujas Vasconcellos Neumann L, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist. 2018;58(4):611-7.) O aumento do número de idosos traz diversos desafios em termos de saúde pública, uma vez que a prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), fragilidade e incapacidades é maior nos mais longevos.(22. Nunes BP, Batista SR, Andrade FB, Souza Junior PB, Lima-Costa MF, Facchini LA. Multimorbidity: The Brazilian Longitudinal Study of Aging (ELSI-Brazil). Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):10s.

3. Andrade JM, Duarte YA, Alves LC, Andrade FC, Souza Junior PR, Lima-Costa MF, et al. Frailty profile in Brazilian older adults: ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):17s.
-44. Giacomin KC, Duarte YA, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Care and functional disabilities in daily activities – ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):9s.)

De acordo o estudo “Estudo Longitudinal de Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI-Brasil)”, o qual avaliou 9.412 indivíduos com idade acima de 49 anos, e residentes em 70 cidades do Brasil, a prevalência de multimorbidades (três ou mais doenças crônicas) nas faixas etárias de 60 a 69, 70 a 79 e ≥80 anos foi de, respectivamente, 52%, 61% e 67%.(22. Nunes BP, Batista SR, Andrade FB, Souza Junior PB, Lima-Costa MF, Facchini LA. Multimorbidity: The Brazilian Longitudinal Study of Aging (ELSI-Brazil). Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):10s.)Da mesma forma, a presença de dificuldades em pelo menos uma atividades básicas da vida diária (ABVD) foi maior nos mais velhos (≥80 anos registraram 42,7%), comparativamente com as faixas etárias mais jovens (60 a 69 anos registraram 21,8% e 70 a 79 anos registraram 26,7%), sendo a demanda por cuidados maior nos indivíduos mais velhos, do sexo feminino e com menor escolaridade.(44. Giacomin KC, Duarte YA, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Care and functional disabilities in daily activities – ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):9s.)

O cuidado de uma população cada vez mais velha é um desafio para os países em desenvolvimento, como o Brasil, que precisam lidar com o rápido envelhecimento populacional em conjunto com grandes desigualdades econômicas e sociais.(11. Tramujas Vasconcellos Neumann L, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist. 2018;58(4):611-7.) Dentro das políticas públicas de saúde,(44. Giacomin KC, Duarte YA, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Care and functional disabilities in daily activities – ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):9s.) a abordagem da família com pessoas idosas ainda não está implementada em todo o território nacional, sendo escassas as políticas destinadas aos cuidados de longa duração. Atualmente, há alguns programas de assistência ao idoso voltados à garantia de permanência na própria residência como, por exemplo, o Programa Maior Cuidado, do munícipio de Belo Horizonte,(55. Alcântara AD, Camarano AA, Giacomin KC. Política Nacional do Idoso: velhas e novas questões. Rio de Janeiro: IPEA; 2016.) e o Programa Acompanhante de Idosos (PAI), do município de São Paulo.(66. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação da Atenção Básica. Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa. Programa Acompanhante de Idosos. Documento Norteador Programa Acompanhante de Idosos [Internet]. São Paulo: SMS; 2016 [citado 2019 Jul 16]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/DOCUMENTONORTEADORPAIFINAL02012017.pdf
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
)

O PAI é uma modalidade de cuidado domiciliar biopsicossocial à pessoa idosa em situação de fragilidade clínica e vulnerabilidade social, que disponibiliza a prestação dos serviços de profissionais da saúde e acompanhantes de idosos, visando à reabilitação, à manutenção/desenvolvimento do autocuidado e à socialização. Foi criado com o objetivo de prover assistência integral à saúde de idosos dependentes e socialmente vulneráveis, com dificuldades de acesso ao sistema de saúde e isolamento ou exclusão social, principalmente devido à insuficiência do suporte familiar ou social.(66. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação da Atenção Básica. Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa. Programa Acompanhante de Idosos. Documento Norteador Programa Acompanhante de Idosos [Internet]. São Paulo: SMS; 2016 [citado 2019 Jul 16]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/DOCUMENTONORTEADORPAIFINAL02012017.pdf
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
) Os idosos assistidos pelo PAI são acompanhados por uma equipe multidisciplinar, alocada em uma Unidade Básica de Saúde (UBS), composta por um coordenador, um médico, um enfermeiro, dois auxiliares/técnicos de enfermagem, um auxiliar administrativo e dez acompanhantes de idosos. Dentre as competências comuns aos profissionais do PAI, destacam-se ações de prevenção de agravos e promoção à saúde; a realização de avaliações, planos de cuidados e visitas domiciliares; e as ações de matriciamento, gestão compartilhada e educação permanente.(66. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação da Atenção Básica. Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa. Programa Acompanhante de Idosos. Documento Norteador Programa Acompanhante de Idosos [Internet]. São Paulo: SMS; 2016 [citado 2019 Jul 16]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/DOCUMENTONORTEADORPAIFINAL02012017.pdf
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)

Considerando a importância do PAI para a manutenção dos idosos frágeis e vulneráveis vivendo por mais tempo na comunidade, faz-se necessário conhecer o perfil daqueles atualmente assistidos, com o intuito de fornecer dados para a melhoria contínua deste programa.

OBJETIVO

Analisar o perfil de saúde de idosos residentes na comunidade, de acordo com o sexo, cadastrados no Programa Acompanhante de Idosos do Município de São Paulo.

MÉTODOS

Amostra

A divisão administrativa da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo está distribuída em seis Coordenadorias Regionais de Saúde (CRS) que, por sua vez, se dividem em 27 Supervisões Técnicas de Saúde, as quais dão cobertura às 32 Prefeituras Regionais que compõem o território da cidade. O presente estudo foi realizado junto a dez equipes do PAI (Parelheiros, Grajaú, Cidade Dutra, Campo Grande, Cidade Ademar, Parque Doroteia, Jardim Miriam II, Jardim Souza, Maracá e Vera Cruz), todas pertencentes ao território da CRS-Sul, após o mesmo ter sido autorizado localmente e aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (parecer número: 2.917.083, CAAE: 92460318.4.0000.5390) e da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo (parecer número: 2.960.325, CAAE: 92460318.4.3001.0086).

Os idosos acompanhados pelas unidades do PAI citadas anteriormente foram convidados a participar da pesquisa, autorizando o acesso ao prontuário e às informações contidas na Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa na Atenção Básica (AMPI/AB), mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para ser acompanhado pelo PAI, o usuário deve ter idade ≥60 anos, residir na área de abrangência da UBS e apresentar pelo menos um dos seguintes critérios, detectados a partir da AMPI/AB realizada pela UBS: dependência nas atividades da vida diária (AVD); mobilidade reduzida; dificuldade de acesso aos serviços de saúde; insuficiência no suporte familiar e social; isolamento ou exclusão social; e risco de institucionalização.(66. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação da Atenção Básica. Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa. Programa Acompanhante de Idosos. Documento Norteador Programa Acompanhante de Idosos [Internet]. São Paulo: SMS; 2016 [citado 2019 Jul 16]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/DOCUMENTONORTEADORPAIFINAL02012017.pdf
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)

A coleta de dados ocorreu em novembro de 2018, quando havia 1.297 idosos em acompanhamento. Esse número foi utilizado para o cálculo amostral, que indicou a necessidade de se alcançar um tamanho de amostra mínimo da ordem de 297 idosos, considerando intervalo de confiança de 95%, margem de erro de 5% e frequência estimada de condições crônicas e/ou problemas de saúde de 50% (ou seja, frequência mais conservadora possível e, portanto, que garante maior amostra).

Além dos critérios de inclusão do próprio PAI descritos acima, foram incluídos no estudo apenas os idosos que possuíam AMPI/AB completa. Adicionalmente, era necessário que as AMPI/AB tivessem sido aplicadas por profissionais capacitados há pelo menos 1 ano e respondidas pelos próprios idosos sem interferências ou respostas de terceiros. Foram excluídos do estudo os idosos que não permitiram a consulta dos prontuários e não conseguiram assinar o TCLE devido a baixa escolaridade (analfabetos), alterações cognitivas e/ou alterações sensoriais. Após a aplicação dos critérios de inclusão e de exclusão, os dados de 535 idosos foram coletados.

Instrumento

A AMPI/AB é um instrumento de avaliação multidimensional utilizado na Atenção Primária de Saúde do Município de São Paulo para classificar o risco funcional das pessoas idosas. Além de auxiliar na construção do cadastro dos usuários idosos, a AMPI/AB favorece a organização do atendimento na rede e a elaboração de planos de cuidados; qualifica a demanda de idosos na rede pública e visa ao planejamento e à gestão do cuidado da pessoa idosa.(77. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação da Atenção Básica. Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa. Documento Norteador Unidade de Referência à Saúde do Idoso URSI [Internet]. São Paulo: SMS; 2016 [citado em em 2019 Set 7]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/arquivos/ANEXOSDOCNORTURSI21122016.pdf
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
) Esse instrumento avalia 17 parâmetros (idade, autoavaliação de saúde, arranjo familiar, doenças crônicas, medicamentos, internações, quedas, visão, audição, limitação física, cognição, humor, ABVD, atividades instrumentais de vida diária − (AIVD), incontinência, perda de peso não intencional e condições bucais) determinados a partir de 31 questões autorreferidas. Além de oferecer informações sobre as demandas dos idosos, a AMPI/AB tem sido utilizada para classificar o grau de fragilidade e encaminhar os idosos para serviços de atenção especializada, caso seja detectada necessidade de tratamentos e/ou acompanhamentos específicos.(66. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação da Atenção Básica. Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa. Programa Acompanhante de Idosos. Documento Norteador Programa Acompanhante de Idosos [Internet]. São Paulo: SMS; 2016 [citado 2019 Jul 16]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/DOCUMENTONORTEADORPAIFINAL02012017.pdf
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
,77. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação da Atenção Básica. Área Técnica de Saúde da Pessoa Idosa. Documento Norteador Unidade de Referência à Saúde do Idoso URSI [Internet]. São Paulo: SMS; 2016 [citado em em 2019 Set 7]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/arquivos/ANEXOSDOCNORTURSI21122016.pdf
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
)

De acordo com a pontuação na AMPI/AB, os idosos são classificados em saudáveis (zero a 5 pontos), pré-frágeis (6 a 10 pontos) e frágeis (superior a 10 pontos). Vale ressaltar que esse instrumento está em processo de validação, e um estudo preliminar mostrou boa acurácia (área da curva ROC − de 0,851, p<0,001) para a determinação de fragilidade,(88. American Geriatrics Society 2019 Annual Scientific Meeting. AMPI-AB accuracy: a multidimensional questionnaire for the management of the public healthcare for older people in the city of São Paulo, Brazil [Internet]. Portland, OR; May 2 – 4, 2019. p. S47 [cited 2020 Mar 5]. Available from: https://meeting.americangeriatrics.org/sites/default/files/inline-files/2019%20JAGS%20abstract%20supplement.pdf
https://meeting.americangeriatrics.org/s...
) com base no fenótipo de fragilidade proposto por Fried et al.(99. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, Seeman T, Tracy R, Kop WJ, Burke G, McBurnie MA; Cardiovascular Health Study Collaborative Research Group. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2001;56(3):M146-56.)

Análise estatística

Os dados estão apresentados em percentagem, de acordo com os parâmetros da AMPI/AB e com o sexo dos participantes. Para a comparação da distribuição das respostas em relação ao sexo, utilizou-se o teste χ2. Para todas as análises, considerou-se o alfa de 5%.

RESULTADOS

Foram analisados os dados de 535 idosos assistidos pelo PAI (média de idade de 76,2±8,0 anos). As características dos idosos estão apresentadas na tabela 1.

Tabela 1
Características dos idosos assistidos pelo Programa Acompanhante de Idosos, de acordo com o sexo

Pouco mais da metade da população atendida pelo PAI da CRS-Sul estava na faixa de 75 a 89 anos (53,6%), seguido pela faixa de 60 a 74 anos (42,5%). A proporção de idosos longevos (≥90 anos) foi de apenas 3,9%.

Em relação ao sexo, houve predomínio feminino (77,6%). Dentre as questões avaliadas pela AMPI/AB, destacaram-se: autoavaliação negativa de saúde (67,8% relataram ter saúde regular, ruim ou muito ruim), presença de múltiplas morbidades (50,6% relataram ter três ou mais doenças crônicas), polifarmácia (58,1% utilizavam cinco ou mais medicamentos), presença de problemas sensoriais (58,8% tinham problemas para enxergar e 41,1% problemas para ouvir), queixas de alterações cognitivas (55,8% tinham sinais de défice cognitivo), alterações de humor (60,3% tinham algum sintoma de depressão), dificuldade na realização de AIVD (68,4% necessitavam de ajuda em pelo menos uma atividade) e presença de incontinência urinária e/ou fecal (41,3%). As queixas de problemas bucais ou ingestão alimentar também foram percebidas pela metade dos idosos (51,3%), enquanto apenas 25,7% afirmaram ter perdido peso sem motivo aparente nos últimos 12 meses.

Quanto ao arranjo familiar, 25,8% dos idosos (amostra total) relataram morar sozinhos. A prevalência de quedas e de internações recorrentes (duas ou mais vezes no último ano) foi de 18,2 e 3,0%, respectivamente. A maioria dos idosos relatou não apresentar limitações funcionais que os impedissem de realizar o autocuidado (82,6%), embora 46,7% relataram apresentar alguma limitação física.

Em relação à comparação entre os sexos, foi possível observar que uma proporção maior das mulheres apresentava três ou mais doenças crônicas (54,1% versus 38,3%), sinais de comprometimento cognitivo (58,2% versus 47,5%), alterações de humor (64,0% versus 47,5%) e polifarmácia (62,6% versus 42,5%) comparativamente aos homens (p<0,05). Os demais parâmetros (idade, autoavaliação de saúde, arranjo familiar, internações, quedas, visão, limitação física, ABVD, AIVD, incontinência, perda de peso não intencional e condições bucais) não apresentaram diferenças entre os sexos quanto às suas ocorrências. Contudo, os homens apresentaram mais dificuldades em ouvir (54,6%) comparados às mulheres (37,2%).

Com relação à classificação final obtida pela AMPI/AB, a maior parte da população assistida pelo PAI era pré-frágil (45,1%) e frágil (36,1%), não sendo observadas diferenças estatísticas para a prevalência de fragilidade entre os sexos (Figura 1).

Figura 1
Prevalência de fragilidade em idosos assistidos pelo Programa Acompanhante de Idosos, de acordo com a classificação final da Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa na Atenção Básica

AMPI/AB: Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa na Atenção Básica.


DISCUSSÃO

A prevalência de mulheres assistidas pelo PAI foi um pouco maior (77,6%) quando comparada a de outros estudos nacionais, como o da rede Fragilidade em Idosos Brasileiros (FIBRA),(1010. Silva SL, Neri AL, Ferrioli E, Lourenço RA, Dias RC. [Phenotype of frailty: the influence of each item in determining frailty in community-dwelling elderly - The Fibra Study]. Cienc Saude Coletiva. 2016;21(11):3483-92.) que entrevistou 5.532 idosos de diferentes regiões do Brasil, cuja prevalência de mulheres foi de 65,6%. Da mesma forma, em estudo com dados de idosos (60 anos e mais) participantes do ELSI-Brasil,(1111. Lima-Costa MF, de Andrade FB, de Souza PR Jr, Neri AL, Duarte YA, Castro-Costa E, et al. The Brazilian Longitudinal Study of Aging (ELSI-Brazil): Objectives and Design. Am J Epidemiol. 2018;187(7):1345–53.) a prevalência de mulheres foi de 53,6%.(33. Andrade JM, Duarte YA, Alves LC, Andrade FC, Souza Junior PR, Lima-Costa MF, et al. Frailty profile in Brazilian older adults: ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):17s.)

A feminização da velhice, ou seja, a maior proporção de mulheres do que homens na população idosa, especialmente nas idades mais avançadas, tem repercussões importantes nas demandas por políticas públicas. Comparativamente com os homens, as mulheres tendem a conviver por mais tempo com DCNT e a ter maior risco de dependência, além de comumente assumirem o papel de cuidadoras de seus parceiros e ficarem sozinhas no final da vida.(44. Giacomin KC, Duarte YA, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Care and functional disabilities in daily activities – ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):9s.,1212. Muñoz Cobos F, Espinosa Almendro JM. [Active ageing and gender inequalities]. Aten Primaria. 2008;40(6):305-9. Spanish.) Como as mulheres também apresentam menor escolaridade e remuneração quando comparadas aos homens, as mesmas são mais suscetíveis à fragilidade e à falta de recursos financeiros na velhice.(1212. Muñoz Cobos F, Espinosa Almendro JM. [Active ageing and gender inequalities]. Aten Primaria. 2008;40(6):305-9. Spanish.,1313. Alvarado BE, Zunzunegui MV, Béland F, Bamvita JM. Life course social and health conditions linked to frailty in Latin American older men and women. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2008;63(12):1399-406.) Portanto, as mulheres têm maior chance de necessitar de cuidados de longa duração, tanto pela maior incapacidade como pelo baixo suporte social, justificando a grande proporção de idosos do sexo feminino assistidos pelo PAI.

A modificação do perfil de saúde da população dos países em desenvolvimento ocorre de maneira rápida, e as DCNT passam a figurar entre as principais causas de morte e incapacidade, posições essas antigamente ocupadas pelas doenças infecto-contagiosas.(11. Tramujas Vasconcellos Neumann L, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist. 2018;58(4):611-7.) Embora o envelhecimento não seja sinônimo de doenças, evidências acumuladas na literatura suportam a maior prevalência de DCNT com o avançar da idade.(1414. Marengoni A, Angleman S, Melis R, Mangialasche F, Karp A, Garmen A, et al. Aging with multimorbidity: a systematic review of the literature. Ageing Res Rev. 2011;10(4):430-9. Review.) Esse é um fato considerável e de repercussão para as políticas públicas, uma vez que as DCNT agravam as condições de saúde, podendo resultar em declínio funcional, baixa qualidade de vida, aumento da utilização de serviços e aumento dos gastos em saúde.(1414. Marengoni A, Angleman S, Melis R, Mangialasche F, Karp A, Garmen A, et al. Aging with multimorbidity: a systematic review of the literature. Ageing Res Rev. 2011;10(4):430-9. Review.)

Em idosos brasileiros residentes na comunidade, a prevalência de múltiplas morbidades (duas ou mais doenças crônicas) varia de 36% a 42%.(22. Nunes BP, Batista SR, Andrade FB, Souza Junior PB, Lima-Costa MF, Facchini LA. Multimorbidity: The Brazilian Longitudinal Study of Aging (ELSI-Brazil). Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):10s.,1313. Alvarado BE, Zunzunegui MV, Béland F, Bamvita JM. Life course social and health conditions linked to frailty in Latin American older men and women. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2008;63(12):1399-406.) Nos idosos acompanhados pelo PAI, entretanto, a prevalência de três ou mais doenças crônicas foi de 50,6%, sendo essa maior entre as mulheres (54,1%). Dados do estudo SABE (Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento) também corroboram a maior prevalência de DCNT nas mulheres idosas. Alvarado et al.,(1313. Alvarado BE, Zunzunegui MV, Béland F, Bamvita JM. Life course social and health conditions linked to frailty in Latin American older men and women. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2008;63(12):1399-406.) mostraram que 45,4% das idosas investigadas no estudo SABE-Brasil relataram ter duas ou mais doenças crônicas, enquanto que, para os homens, a percentagem foi de 36,4%.

Outro problema bastante comum em idosos com múltiplas morbidades diz respeito ao uso exacerbado e/ou inadequado de medicamentos. Estudos de base populacional mostram que a prevalência de polifarmácia (cinco ou mais medicamentos de uso regular) em idosos pode variar entre 10,3% e 36%,(1515. Carvalho MF, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polypharmacy among the elderly in the city of São Paulo, Brazil - SABE Study. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(4):817-27.

16. Ramos LR, Tavares NU, Bertoldi AD, Farias MR, Oliveira MA, Luiza VL, et al. Polypharmacy and Polymorbidity in Older Adults in Brazil: a public health challenge. Rev Saude Publica. 2016;50(Suppl 2):9s.

17. Nascimento RC, Álvares J, Guerra AA Junior, Gomes IC, Silveira MR, Costa EA, et al. Polypharmacy: a challenge for the primary health care of the Brazilian Unified Health System. Rev Saude Publica. 2017;51(Suppl 2):19s.
-1818. Almeida NA, Reiners AA, Azevedo RC, Silva AM, Cardoso JD, Souza LC. Prevalence of and factors associated with polypharmacy among elderly persons resident in the community. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2017;20(1):138-48.) valores esses inferiores ao observado no presente estudo (58,1%). Dentre os fatores associados à polifarmácia, destacam-se a autoavaliação negativa de saúde, a presença de DCNT (principalmente do sistema cardiovascular e metabólicas) e a utilização de serviços de saúde.(1616. Ramos LR, Tavares NU, Bertoldi AD, Farias MR, Oliveira MA, Luiza VL, et al. Polypharmacy and Polymorbidity in Older Adults in Brazil: a public health challenge. Rev Saude Publica. 2016;50(Suppl 2):9s.

17. Nascimento RC, Álvares J, Guerra AA Junior, Gomes IC, Silveira MR, Costa EA, et al. Polypharmacy: a challenge for the primary health care of the Brazilian Unified Health System. Rev Saude Publica. 2017;51(Suppl 2):19s.
-1818. Almeida NA, Reiners AA, Azevedo RC, Silva AM, Cardoso JD, Souza LC. Prevalence of and factors associated with polypharmacy among elderly persons resident in the community. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2017;20(1):138-48.) Adicionalmente, dados do estudo SABE(1515. Carvalho MF, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polypharmacy among the elderly in the city of São Paulo, Brazil - SABE Study. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(4):817-27.) mostraram maior risco de polifarmácia entre as mulheres e os mais velhos (>75 anos). Dentre os idosos avaliados no presente estudo, a maioria era mulher (77,6%) e grande parte tinha idade ≥75 anos (57,5%), o que pode ter contribuído para alta percentagem de polifarmácia. Foi possível observar também maior prevalência de polifarmácia entre as mulheres (62,6%) em comparação com os homens (42,5%). A polifarmácia aumenta o risco para desfechos negativos em idosos, como reações adversas, declínio funcional, declínio cognitivo, incontinência urinária, quedas, entre outros,(1919. Maher RL, Hanlon JT, Hajjar ER. Clinical consequences of polypharmacy in elderly. Expert Opin Drug Saf. 2014;13(1):57-65. Review.)sendo essa prática considerada um desafio para a assistência à saúde do idoso.(1616. Ramos LR, Tavares NU, Bertoldi AD, Farias MR, Oliveira MA, Luiza VL, et al. Polypharmacy and Polymorbidity in Older Adults in Brazil: a public health challenge. Rev Saude Publica. 2016;50(Suppl 2):9s.,1717. Nascimento RC, Álvares J, Guerra AA Junior, Gomes IC, Silveira MR, Costa EA, et al. Polypharmacy: a challenge for the primary health care of the Brazilian Unified Health System. Rev Saude Publica. 2017;51(Suppl 2):19s.)

A autoavaliação da saúde tem sido associada ao risco de mortalidade, principalmente em idosos.(2020. Reile R, Stickley A, Leinsalu M. Re: Letter to the Editor of Public Health in response to ‘Large variation in predictors of mortality by levels of self-rated health: results from an 18-year follow-up study’. Public Health. 2017; 147:157-8.

21. Bamia C, Orfanos P, Juerges H, Schöttker B, Brenner H, Lorbeer R, et al. Self-rated health and all-cause and cause-specific mortality of older adults: Individual data meta-analysis of prospective cohort studies in the CHANCES Consortium. Maturitas. 2017;103:37-44.
-2222. Kusumastuti S, Gerds TA, Lund R, Mortensen EL, Westendorp RG. Discrimination ability of comorbidity, frailty, and subjective health to predict mortality in community-dwelling older people: Population based prospective cohort study. Eur J Intern Med. 2017;42:29-38.) De acordo com Reile et al.,(2020. Reile R, Stickley A, Leinsalu M. Re: Letter to the Editor of Public Health in response to ‘Large variation in predictors of mortality by levels of self-rated health: results from an 18-year follow-up study’. Public Health. 2017; 147:157-8.) indivíduos com autoavaliação negativa de saúde apresentam duas vezes mais risco de mortalidade em 5 anos, em comparação com aqueles que autoavaliam sua saúde como excelente, mesmo após ajustes para covariáveis importantes (comorbidades, capacidade funcional e depressão). Bamia et al.,(2121. Bamia C, Orfanos P, Juerges H, Schöttker B, Brenner H, Lorbeer R, et al. Self-rated health and all-cause and cause-specific mortality of older adults: Individual data meta-analysis of prospective cohort studies in the CHANCES Consortium. Maturitas. 2017;103:37-44.) também encontraram risco aumentado de mortalidade em idosos com autoavaliação negativa de saúde em diversas regiões da Europa e Estados Unidos e, portanto, concluíram que essa é uma ferramenta rápida e simples para a identificação de grupos de idosos com risco de mortalidade precoce.

Segundo Kusumastuti et al.,(2222. Kusumastuti S, Gerds TA, Lund R, Mortensen EL, Westendorp RG. Discrimination ability of comorbidity, frailty, and subjective health to predict mortality in community-dwelling older people: Population based prospective cohort study. Eur J Intern Med. 2017;42:29-38.)a capacidade discriminativa de risco de mortalidade da autoavaliação de saúde é similar a outros índices mais objetivos (índices de comorbidade e fragilidade), reforçando a importância de considerar a percepção dos idosos quanto à sua condição de saúde.

No presente estudo, 67,8% dos idosos do PAI relataram ter saúde regular, ruim ou muito ruim, valor esse superior aos encontrados para dados populacionais de idosos residentes na comunidade. Dados da última onda do estudo SABE, por exemplo, mostraram que 48,9% dos entrevistados autoavaliaram a saúde como regular, ruim ou muito ruim,(2323. DeSalvo KB, Bloser N, Reynolds K, He J, Muntner P. Mortality prediction with a single general self-rated health question. A meta-analysis. J Gen Intern Med. 2006;21(3):267-75.,2424. Antunes JL, Chiavegatto Filho AD, Duarte YA, Lebrão ML. Social inequalities in the self-rated health of the elderly people in the city of São Paulo, Brazil. Rev Brasil Epidemiol. 2019;21(Suppl 2):e180010.) sendo que essa apresentou associação com sexo feminino, idade ≥75 anos, baixa renda e baixa escolaridade.

De acordo com Organização Mundial da Saúde (OMS), a saúde da pessoa idosa deve ser considerada a partir da perspectiva funcional, e não baseada na ausência de doenças.(2525. World Health Organization (WHO). Ageing and life-course. World report on ageing and health 2015 [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2019 Jul 16]. Available from: https://www.who.int/ageing/events/world-report-2015-launch/en/
https://www.who.int/ageing/events/world-...
)A funcionalidade, por sua vez, é determinada pelo nível de ajuda que o indivíduo necessita para realizar as AVD, que é influenciada por fatores individuais (habilidades físicas e mentais) e ambientais, e pela interação entre eles.(2626. Cesari M, Araujo de Carvalho I, Amuthavalli Thiyagarajan J, Cooper C, Martin FC, Reginster JY, et al. Evidence for the Domains Supporting the Construct of Intrinsic Capacity. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2018;73(12):1653-60. Review.) A instalação da incapacidade segue um processo hierárquico que, tipicamente, começa com o aparecimento de uma morbidade, que leva a uma disfunção, seguida por limitações funcionais e, em última instância, por uma determinada incapacidade.(2727. Verbrugge LM, Jette AM. The disablement process. Soc Sci Med. 1994; 38(1):1-14.,2828. Gu D, Gomez-Redondo R, Dupre ME. Studying disability trends in aging populations. J Cross Cult Gerontol. 2015;30(1):21-49. Review.) De acordo com Bleijenber et al.,(2929. Bleijenberg N, Zuithoff NP, Smith AK, de Wit NJ, Schuurmans MJ. Disability in the individual ADL, IADL, and mobility among older adults: a prospective cohort study. J Nutr Health Aging. 2017;21(8):897-903.) idosos com três ou mais doenças crônicas apresentam três a cinco vezes maior risco de desenvolver incapacidade, comparativamente àqueles sem condições crônicas. Portanto, é essencial intervir precocemente no processo de incapacidade, com o intuito de preservar ao máximo a capacidade funcional de idosos em risco.

Em relação à dificuldade para realizar as AVD, foi possível observar que 17,4% dos idosos do PAI precisam de ajuda em pelo menos uma ABVD. Nesse aspecto, esse resultado corrobora o de outros estudos envolvendo idosos brasileiros, sendo que a prevalência de dificuldades em ABVD em idosos comunitários varia entre 14,8% e 25,4%.(44. Giacomin KC, Duarte YA, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Care and functional disabilities in daily activities – ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):9s.) No entanto, foi constatado que a proporção de idosos do PAI que necessitam de auxílio para as AIVD é duas vezes maior (68,4%) quando comparada ao estudo SABE (aproximadamente 30%).(44. Giacomin KC, Duarte YA, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Care and functional disabilities in daily activities – ELSI-Brazil. Rev Saude Publica. 2018;52(Suppl 2):9s.) Esses resultados sugerem maior dependência dos idosos do PAI, especialmente em tarefas mais complexas e importantes para manutenção da independência na comunidade. Este fato é preocupante, já que a capacidade de realizar atividades complexas parece declinar de maneira mais rápida em relação às atividades básicas, o que pode, a curto prazo, aumentar o grau de dependência destes idosos.(3030. Bendayan R, Cooper R, Wloch EG, Hofer SM, Piccinin AM, Muniz-Terrera G. Hierarchy and speed of loss in physical functioning: a comparison across older U.S. and english men and women. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2017;72(8):1117-22.)

Ao considerar a funcionalidade como principal determinante da saúde na velhice, é fundamental que a atenção ao idoso seja embasada no gerenciamento da capacidade funcional e não das doenças crônicas presentes.(3131. Veras RP, Caldas CP, Cordeiro HA. Modelos de atenção à saúde do idoso: repensando o sentido da prevenção. Physis Rev Saude Coletiva. 2013;23(4):1189-213.) Assim, na proposta de linha de cuidado para o idoso, o risco de fragilização deve ser monitorado a partir da capacidade funcional e, consequentemente, de acordo com sua necessidade, em diferentes níveis da atenção.(3232. Veras RP, Caldas CP, Cordeiro HA, Motta LB, Lima KC. Desenvolvimento de uma linha de cuidados para o idoso: hierarquização da atenção baseada na capacidade funcional. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2013;16(2):385-92.) Dentro da assistência domiciliar, o PAI contribui para a atenção integral à pessoa idosa em situação de fragilidade e vulnerabilidade, uma vez que fornece apoio e suporte às necessidades de saúde e sociais.(3333. Ferreira FC, Bansi LO, Paschoal SP. Serviços de atenção ao idoso e estratégias de cuidado domiciliares e institucionais. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014; 17(4):911-26.) Nesse sentido, as diversas demandas de saúde, apresentadas pelos idosos do presente estudo, reforçam a importância do PAI na manutenção da autonomia e na independência de seus usuários.

Por fim, o presente estudo possui algumas limitações, que devem ser consideradas. Ao excluir idosos não alfabetizados, com alterações cognitivas e sensoriais, por não conseguirem responder às questões da AMPI/AB e/ou assinar o TCLE, possivelmente os mais frágeis e vulneráveis tenham ficado de fora da amostra final. Além disso, como a AMPI/AB está em processo de validação, os autores optaram por não discutir os dados relativos à classificação de fragilidade, uma vez que esse construto ainda precisa ser testado e confirmado em estudos psicométricos futuros.

CONCLUSÃO

As piores condições de saúde de idosos vulneráveis assistidos pelo Programa Acompanhante de Idosos, constatadas pela alta prevalência de autoavaliação negativa de saúde, comprometimento das atividades instrumentais da vida diária, múltiplas morbidades, polifarmácia e outras queixas (alterações sensoriais, sintomas depressivos e cognitivas), reafirmam a importância deste programa como política de cuidados de longa duração e, portanto, para a manutenção destes idosos residindo o maior tempo possível na comunidade.

AGRADECIMENTOS

À Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, à Coordenadoria Regional de Saúde Sul, às Supervisões Técnicas de Saúde e às equipes Programa Acompanhante de Idosos pela participação no projeto. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    05 Jul 2019
  • Aceito
    29 Nov 2019
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