Acessibilidade / Reportar erro

Durante qual período devemos evitar a colecistectomia em pacientes que realizaram colangiopancreatografia retrógrada endoscópica?

RESUMO

Objetivo:

Analisar o período durante o qual devemos evitar a colecistectomia após a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica.

Métodos:

Foi realizada análise retrospectiva dos prontuários eletrônicos de 532 pacientes submetidos à colangiopancreatografia retrógrada endoscópica, no período de março de 2013 a dezembro de 2017.

Resultados:

Cerca de um terço dos pacientes realizaram o procedimento entre 4 e 30 dias após a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica. A frequência de conversão do procedimento foi de 3,8%. A necessidade de dreno abdominal e o achado de lesão de via biliar após a cirurgia atingiram 15,1% e 1,9% dos pacientes, respectivamente. O tempo de internação foi significativamente menor entre os pacientes com tempo de colangiopancreatografia retrógrada endoscópica superior a 30 dias. Estes pacientes apresentaram, em mediana, um dia de internação hospitalar, enquanto o tempo mediano de internação no grupo que realizou o procedimento entre 4 e 30 dias foi de 2 dias.

Conclusão:

O período durante o qual devemos evitar realizar a colecistectomia após a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica é do 4° ao 30° dia.

Descritores:
Colecistectomia; Colelitíase; Colangiopancreatografia retrógrada endoscópica; Laparoscopia

ABSTRACT

Objective:

To determine the period during which we should avoid cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreatography.

Methods:

A retrospective analysis of electronic medical charts of 532 patients undergoing endoscopic retrograde cholangiopancreatography, between March 2013 and December 2017.

Results:

Approximately one-third of patients underwent the procedure between 4 and 30 days after endoscopic retrograde cholangiopancreatography. The conversion rate was 3.8%. The need for abdominal drainage and the finding of biliary tract injury after surgery were observed in 15.1% and 1.9% of patients, respectively. The length of stay was significantly shorter among patients undergoing surgery more than 30 days after endoscopic retrograde cholangiopancreatography. These patients had a median length of stay of one day, whereas the median length of stay in the group undergoing the procedure between 4 and 30 days after endoscopic retrograde cholangiopancreatography was 2 days.

Conclusion:

The period during which we should avoid cholecystectomy is between 4 and 30 days after endoscopic retrograde cholangiopancreatography.

Keywords:
Cholecystectomy; Cholelithiasis; Cholangiopancreatography, endoscopic retrograde; Laparoscopy

INTRODUÇÃO

A colecistectomia é o tratamento de escolha da colelitíase e da colecistite aguda, mas, quando são identificados cálculos em via biliar principal, a colecistectomia necessita de complementação, com exploração das vias biliares.(11. Gil SM, Braga JF, Centurion SA, Gil BZ. Estudo da incidência de coledocolitíase em pacientes com colecistite calculosa aguda e crônica submetidos à colecistectomia vídeolaparoscópica. Rev Col Bras Cir. 2007;34(4):1-4.

2. Melo MC. Estado atual do tratamento da coledocolitíase. Rev Bras Videocir. 2003;1(2):71-6.
-33. Manes G, Paspatis G, Aabakken L, Anderloni A, Arvanitakis M, Ah-Soune P, Barthet M, Domagk D, Dumonceau JM, Gigot JF, Hritz I, Karamanolis G, Laghi A, Mariani A, Paraskeva K, Pohl J, Ponchon T, Swahn F, Ter Steege RW, Tringali A, Vezakis A, Williams EJ, van Hooft JE. Endoscopic management of common bile duct stones: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) guideline. Endoscopy. 2019;51(5):472-91.)

O diagnóstico da coledocolitíase pode ser feito a partir de métodos de imagem, como o ultrassom abdominal, a colangiorressonância ou a colangiografia intraoperatória, a qual identifica coledocolitíase em aproximadamente 10% de pacientes assintomáticos, sendo um importante argumento para ser realizada rotineiramente.(33. Manes G, Paspatis G, Aabakken L, Anderloni A, Arvanitakis M, Ah-Soune P, Barthet M, Domagk D, Dumonceau JM, Gigot JF, Hritz I, Karamanolis G, Laghi A, Mariani A, Paraskeva K, Pohl J, Ponchon T, Swahn F, Ter Steege RW, Tringali A, Vezakis A, Williams EJ, van Hooft JE. Endoscopic management of common bile duct stones: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) guideline. Endoscopy. 2019;51(5):472-91.

4. Favaro ML, Gabor S, Pedroso RF, Ribeiro L, Rosa OM, Ribeiro-Junior MA. Single port laparoscopic cholecystectomy: technical aspects and results. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2018;31(3):e1388.
-55. Pisani JC, Bacelar A, Malafaia O, Ribas-Filho JM, Czezcko NG, Nassif PA. Estudo comparativo entre a colangiopancreatografia por ressonância magnética e a colangiopancreatografia endoscópica no diagnóstico das obstruções biliopancreáticas. Arq Gastroenterol. 2001;38(3):149-57.)

A colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) é altamente sensível e específica para coledocolitíase, mas sua maior utilização se dá após diagnóstico confirmado de coledocolitíase, tendo função terapêutica.(33. Manes G, Paspatis G, Aabakken L, Anderloni A, Arvanitakis M, Ah-Soune P, Barthet M, Domagk D, Dumonceau JM, Gigot JF, Hritz I, Karamanolis G, Laghi A, Mariani A, Paraskeva K, Pohl J, Ponchon T, Swahn F, Ter Steege RW, Tringali A, Vezakis A, Williams EJ, van Hooft JE. Endoscopic management of common bile duct stones: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) guideline. Endoscopy. 2019;51(5):472-91.,55. Pisani JC, Bacelar A, Malafaia O, Ribas-Filho JM, Czezcko NG, Nassif PA. Estudo comparativo entre a colangiopancreatografia por ressonância magnética e a colangiopancreatografia endoscópica no diagnóstico das obstruções biliopancreáticas. Arq Gastroenterol. 2001;38(3):149-57.

6. Bencini L, Tommasi C, Manetti R, Farsi M. Modern approach to cholecysto-choledocholithiasis. World J Gastrointest Endosc. 2014;6(2):32-40.
-77. Machado MA, Rocha JR, Herman P, Montagnini AL, Machado MC. Tratamento laparoscópico de coledocolitíase. Arq Gastroenterol. 2000;37(3):183-6.)

A CPRE pode ser realizada antes, durante ou após a colecistectomia, sendo que, os pacientes em que a coledocolitíase é diagnosticada antes do tratamento cirúrgico ou com risco elevado de complicação, como aqueles com colangite ou árvore biliar dilatada, devem ser submetidos à CPRE pré-operatória. Aqueles que têm risco mais baixo podem ser submetidos à colecistectomia laparoscópica com colangiografia e exploração laparoscópica do colédoco, dependendo da habilidade do cirurgião e do material disponível em seu hospital.(77. Machado MA, Rocha JR, Herman P, Montagnini AL, Machado MC. Tratamento laparoscópico de coledocolitíase. Arq Gastroenterol. 2000;37(3):183-6.

8. Bingener J, Skaran P, McConico A, Novotny P, Wettstein P, Sletten DM, et al. A double-blinded randomized trial to compare the effectiveness of minimally invasive procedures using patient-reported outcomes. J Am Coll Surg. 2015;221(1):111-21.

9. Trejo-Ávila M, Solórzano-Vicuña D, García-Corral R, Bada-Yllán O, Cuendis-Velázquez A, Delano-Alonso R, et al. Laparoscopic cholecystectomy after endoscopic treatment of choledocholithiasis: a retrospective comparative study. Updates Surg. 2019;71(4):669-75.

10. Wang CC, Tsai MC, Wang YT, Yang TW, Chen HY, Sung WW, et al. Role of cholecystectomy in choledocholithiasis patients underwent endoscopic retrograde cholangiopancreatography. Sci Rep. 2019;9(1):2168.

11. Vakayil V, Klinker ST, Sulciner ML, Mallick R, Trikudanathan G, Amateau SK, et al. Single-stage management of choledocholithiasis: intraoperative ERCP versus laparoscopic common bile duct exploration. Surg Endosc. 2019 Oct 15. doi: 10.1007/s00464-019-07215-w.
https://doi.org/10.1007/s00464-019-07215...
-1212. Qian Y, Xie J, Jiang P, Yin Y, Sun Q. Laparoendoscopic rendezvous versus ERCP followed by laparoscopic cholecystectomy for the management of cholecysto-choledocholithiasis: a retrospectively cohort study. Surg Endosc. 2020;34(6):2483-9.)

Geralmente, uma coledocolitíase identificada, mas não removida, durante a colecistectomia, exige CPRE posterior para a retirada do cálculo.(1313. Salman B, Yilmaz U, Kerem M, Bedirli A, Sare M, Sakrak O, et al. The timing of laparoscopic cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreaticography in cholelithiasis coexisting with choledocholithiasis. J Hepatobiliary Pancreat Surg. 2009;16(6):832-6.,1414. Ballou J, Wang Y, Schreiber M, Kiraly L. 10 years of laparoscopic common bile duct exploration: a single tertiary institution experience. Am J Surg. 2019;217(5):970-3.)

A colecistectomia deve ser executada de forma segura, mas um quadro de inflamação decorrente da própria doença e da manipulação pela CPRE pode dificultar o ato cirúrgico, com aumento do tempo operatório, maior risco de sangramento e taxas de conversão maiores do que quando a colecistectomia é realizada de forma eletiva sem CPRE prévia.(1313. Salman B, Yilmaz U, Kerem M, Bedirli A, Sare M, Sakrak O, et al. The timing of laparoscopic cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreaticography in cholelithiasis coexisting with choledocholithiasis. J Hepatobiliary Pancreat Surg. 2009;16(6):832-6.,1515. Lee R, Ha H, Han YS, Jung MK, Chun JM. Predictive factors for long operative duration in patients undergoing laparoscopic cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiography for combined choledochocystolithiasis. Surg Laparosc Endosc Percutaneous Tech. 2017;27(6):491-6.

16. Minossi JG, Picanço HC, Carvalho MA, Paulucci PR, Vendites S. Morbimortality of elderly patients submitted to cholecystectomy by laparotomy, minilaparotomy or videolaparoscopy. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2007;20(2):93-6.

17. Aziret M, Karaman K, Ercan M, Vargöl E, Toka B, Arslan Y, et al. Early laparoscopic cholecystectomy is associated with less risk of complications after the removal of common bile duct stones by endoscopic retrograde cholangiopancreatography. Turk J Gastroenterol. 2019;30(4):336-44.

18. Huang RJ, Barakat MT, Girotra M, Banerjee S. practice patterns for cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreatography for patients with choledocholithiasis. Gastroenterology. 2017;153(3):762-771.e2.
-1919. Mador BD, Nathens AB, Xiong W, Panton ON, Hameed SM. Timing of cholecystectomy following endoscopic sphincterotomy: a population-based study. Surg Endosc. 2017;31(7):2977-85.)

Estudos mostram que a colecistectomia videolaparoscópica (CCC VLP) e a CPRE, realizadas com um intervalo maior que 72 horas, apresentam alterações inflamatórias nas vias biliares, que podem dificultar a abordagem da vesícula e vias biliares por videolaparoscopia.(2020. Arezzo A, Scozzari G, Famiglietti F, Passera R, Morino M. Is single-incision laparoscopic cholecystectomy safe? Results of a systematic review and meta-analysis. Surg Endosc. 2013;27(7):2293-304. Review.

21. Salim MT, Cutait R. Complicações da cirurgia videolaparoscópica no tratamento de doenças da vesícula e vias biliares. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2008;21(4):153-7.

22. Amaral PC, Ázaro Filho EM, Fortes MF, Ettinger Jr E, Cangussu HC, Fahel E. Taxas de complicações e tempo de permanência hospitalar foram maiores em pacientes idosos submetidos a videolaparocolecistectomia. Resultados após colecistectomia videolaparoscópica em pacientes idosos. Rev Bras Videoci. 2006;4(2):48-53.

23. Silva RA, Ueda RY, Rêgo RE, Pacheco Junior AM, Fava J, Rasslan S. Tratamento cirúrgico postergado da pancreatite aguda biliar. Rev Col Bras. 2000;27(3):167-72.

24. Lima EC, Queiroz FL, Ladeira FN, Ferreira BM, Bueno JG, Magalhães EA. Análise dos fatores implicados na conversão da colecistectomia laparoscópica. Rev Col Bras Cir. 2007;34(5):321-5.

25. Araújo Neto NP, Gonçalves JE, Bromberg SH, Guz B, Zanoto A. Predição da coledocolitíase pela associação de indicadores clínicos e laboratoriais em dois momentos do pré-operatório da colecistectomia. Rev Col Bras Cir. 2005;32(1):41-6.
-2626. Peponis T, Panda N, Eskesen TG, Forcione DG, Yeh DD, Saillant N, et al. Preoperative endoscopic retrograde cholangio-pancreatography (ERCP) is a risk factor for surgical site infections after laparoscopic cholecystectomy. Am J Surg. 2019;218(1):140-4.)

Perante a necessidade de se evitarem complicações intra e pós-operatórias e suas implicações, para que um número maior de pacientes que tenham indicação para CCC VLP, após serem submetidos à CPRE pré-operatória, possam ser agendados e tratados da melhor forma possível em um hospital com alta demanda de leitos e recursos financeiros limitados, como o Hospital Geral do Grajaú (HGG), um hospital secundário de São Paulo, fez-se necessário analisar qual o melhor período para realizar a CCC VLP nesses pacientes.

OBJETIVO

Identificar o período durante o qual deve-se evitar a realização da colecistectomia em pacientes submetidos previamente à colangiopancreatografia retrógrada endoscópica.

MÉTODOS

Foi realizada uma análise retrospectiva dos prontuários eletrônicos de 532 pacientes submetidos à CPRE, no período de março de 2013 a dezembro de 2017 no HGG.

Os Termos de Consentimento foram assinados por todos pacientes submetidos à CPRE, e o trabalho foi submetido ao Comitê de Ética da Universidade de Santo Amaro (UNISA), CAAE: 01867418.0.0000.0081, obtendo aprovação, conforme número do parecer 3.018562.

Os pacientes que aguardaram em casa pela realização da colecistectomia foram questionados em relação a complicações ou reinternações por meio de contato telefônico.

A definição da amostra se deu pelo critério de conveniência, que incluiu, consecutivamente, todos os pacientes com diagnóstico prévio de coledocolitíase elegíveis durante o período de estudo. Foram analisados os dados (sexo; idade; tempo entre a CPRE e a cirurgia; tempo cirúrgico; introdução de dreno cirúrgico; conversão para cirurgia aberta; ocorrência de lesão de via biliar; e tempo de permanência hospitalar) de 53 pacientes. Foram excluídos 341 casos em que não foi realizada colecistectomia após a CPRE; foi realizada a técnica aberta; ou os que tiveram como diagnóstico ou complicação colangite, colecistite, perfuração duodenal, neoplasia de pâncreas ou de vias biliares, e também os que realizaram derivação de vias biliares associada à colecistectomia. Foram também excluídos os que realizaram a CCC VLP antes da CPRE (Figura 1).

Figura 1
Seleção dos casos a serem estudados

Os pacientes incluídos no estudo foram divididos em dois grupos baseados no período que a cirurgia foi realizada após a CPRE, a saber: 4 a 30 dias e mais de 30 dias.

As variáveis categóricas foram apresentadas em valores absolutos e frequências relativas, enquanto as contínuas foram descritas em medidas de tendência central e dispersão.

O teste de Shapiro-Wilk foi utilizado para verificação da natureza paramétrica das variáveis numéricas contínuas. O teste de Mann-Whitney foi aplicado para a avaliação da idade e dos tempos de procedimento cirúrgico e internação hospitalar entre as categorias de tempo CPRE-cirurgia. A associação entre características demográficas e clínicas e outros desfechos categóricos, segundo os grupos de tempo CPRE-cirurgia, foi avaliada por meio do teste do χ2 de Pearson ou do teste exato de Fischer, quando indicado. Foram considerados achados estatisticamente significativos aqueles com valor de p ou probabilidade de erro tipo I <5%. As análises foram realizadas com auxílio dos programas Microsoft Excel 2010 e IBM (SPSS), versão 21.0.

RESULTADOS

A amostra estudada foi predominantemente feminina (83,0%) com idade mediana de 47 anos, variando entre 17 e 81 anos completos. O tempo mediano entre a realização da CPRE e o procedimento cirúrgico foi de 40 dias. Pouco mais de um terço dos pacientes (41,5%) realizou o procedimento entre 4 e 30 dias após a CPRE. O tempo de internação hospitalar para a realização do procedimento foi, em mediana, um dia, e o tempo mediano de procedimento foi 150 minutos (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização da amostra estudada

A frequência de conversão do procedimento foi de 3,8%. A necessidade de dreno abdominal e o achado de lesão de via biliar após a cirurgia foram observados em 15,1% e 1,9% dos pacientes, respectivamente.

A tabela 2 apresenta as características da amostra, segundo períodos de tempo, entre a realização da CPRE e o procedimento cirúrgico. Não foi possível observar diferenças nas características gerais entre os grupos. A frequência de mulheres foi maior em ambos os grupos de tempo, e a idade mediana dos pacientes do grupo que realizou o procedimento entre 4 e 30 dias foi ligeiramente superior à observada no grupo que o fez com mais de 30 dias.

Tabela 2
Caracterização da amostra estudada, segundo períodos de tempo entre a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica e a cirurgia

Não foi possível observar diferenças significativas na distribuição do tempo de procedimento segundo os grupos de tempo CPRE-cirurgia (p=0,813). O tempo mediano de duração do procedimento foi de 150 (80-220) minutos no grupo que o realizou entre 4 e 30 dias e de 154,0 (92-260) minutos para o grupo com tempo superior a 30 dias (Figura 2).

Figura 2
Tempo de duração do procedimento em relação ao tempo colangiopancreatografia retrógrada endoscópica cirurgia

O tempo de internação foi significativamente menor entre os pacientes do grupo de tempo CPRE-cirurgia superior a 30 dias (p=0,011). Estes pacientes apresentaram, em mediana, 1 (1 a 10) dia de internação hospitalar. Já o tempo mediano de internação no grupo que realizou o procedimento entre 4 e 30 dias foi de 2 (1 a 9) dias, conforme ilustrado na figura 3.

Figura 3
Tempo de internação em relação ao tempo colangiopancreatografia retrógrada endoscópica cirurgia

A figura 4 apresenta a frequência dos desfechos - conversão do procedimento, lesão de via biliar e necessidade de dreno abdominal, segundo os períodos de tempo entre CPRE e cirurgia. A frequência de lesão biliar, conversão e necessidade de dreno abdominal foi maior no grupo que executou o procedimento entre 4 e 30 dias.

Figura 4
Frequência de desfechos em relação ao tempo de realização de colecistectomia após colangiopancreatografia retrógrada endoscópica cirurgia

Por meio de contato telefônico ou avaliação ambulatorial, constatamos que houve sucesso no que se referiu a não reinternação e à ausência de sintomas de dor ou recorrência do quadro durante o intervalo de espera para a realização da CCC VLP.

DISCUSSÃO

Assim como evidenciado na literatura, as diferenças demográficas (sexo ou idade) não tiveram relevância estatística no presente estudo, sendo as mulheres mais prevalentes entre todos os pacientes analisados.(2121. Salim MT, Cutait R. Complicações da cirurgia videolaparoscópica no tratamento de doenças da vesícula e vias biliares. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2008;21(4):153-7.)

O tempo médio de CCC VLP eletiva encontrado nos estudos analisados variou desde 46 até 76 minutos, a depender da experiência da equipe cirúrgica.(2727. Reinders JS, Gouma DJ, Heisterkamp J, Tromp E, van Ramshorst B, Boerma D. Laparoscopic cholecystectomy is more difficult after a previous endoscopic retrograde cholangiography. HBP (Oxford). 2013;15(3):230-4.) No HGG, as colecistectomias VLP eletivas apresentaram tempo médio de 148,7 minutos. Essa diferença pode ser explicada pela curva de aprendizado dos residentes da cirurgia geral. Não foi encontrada diferença na média dos tempos cirúrgicos entre os intervalos entre a CPRE e a cirurgia.

O tempo médio de internação pós-operatória foi maior entre os pacientes que realizaram colecistectomia VLP no intervalo entre 4 e 30 dias após a CPRE, enquanto os submetidos à CCC VLP depois do 30° dia da CPRE tiveram o menor tempo de internação pós-operatória. Pacientes que realizaram CCC VLP até 3 dias após CPRE têm tempo de internação menor do que aqueles que realizaram a cirurgia após o terceiro dia da CPRE, porém não foi analisado qual o menor tempo de internação nos intervalos tardios.(2828. Mann K, Belgaumkar AP, Singh S. Post-endoscopic retrograde cholangiography laparoscopic cholecystectomy: challenging but safe. JSLS. 2013;17(3):371-5.) No nosso estudo, evidenciamos que pacientes operados no intervalo tardio (depois do 30° dia da CPRE) têm menor hospitalização pós-operatória mediana de 1 dia contra 2 dias, apresentando significância estatística.

Apesar das complicações inflamatórias geradas pela CPRE, descritas por Daher Filho et al.,(2929. Daher Filho PF, Campos T, Kuryura L, Belotto M, Silva RA, Pacheco Júnior AM. Avaliação de complicações relacionadas à cpre em pacientes com suspeita de coledocolitíase. Rev Col Bras Cir. 2007;34(2):114-8.) o presente estudo mostrou que a maioria das CCC são finalizadas por videolaparoscopia, e apenas 4,87% destas necessitaram serem convertidas à CCC aberta. Essas CCC que necessitaram conversão para via aberta foram realizadas no intervalo do 4° ao 30° dia após a CPRE, com taxa de conversão de 9,1% das cirurgias realizadas nesse intervalo, corroborando dados evidenciados.(1818. Huang RJ, Barakat MT, Girotra M, Banerjee S. practice patterns for cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreatography for patients with choledocholithiasis. Gastroenterology. 2017;153(3):762-771.e2.,1919. Mador BD, Nathens AB, Xiong W, Panton ON, Hameed SM. Timing of cholecystectomy following endoscopic sphincterotomy: a population-based study. Surg Endosc. 2017;31(7):2977-85.,2828. Mann K, Belgaumkar AP, Singh S. Post-endoscopic retrograde cholangiography laparoscopic cholecystectomy: challenging but safe. JSLS. 2013;17(3):371-5.,3030. Fortunato AA, Gentile JK, Caetano DP, Gomes MA, Bassi MA. Comparative analysis of iatrogenic injury of biliary tract in laparotomic and laparoscopic cholecystectomy. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2014;27(4):272-4.)

Apesar de ser uma escolha muito particular de cada cirurgião, a necessidade de drenagem da cavidade abdominal nas colecistectomias, em nosso serviço, somente é utilizada nos procedimentos cirúrgicos que tenham gerado dificuldades técnicas e dúvida para equipe cirúrgica quanto a possíveis lesões iatrogênicas ou sangramento em leito hepático. Conforme Fortunato et al., a CCC VLP realizada logo após a CPRE ou em até 3 dias diminui o risco em causar lesões durante o procedimento cirúrgico e a necessidade de drenagem da cavidade abdominal.(3030. Fortunato AA, Gentile JK, Caetano DP, Gomes MA, Bassi MA. Comparative analysis of iatrogenic injury of biliary tract in laparotomic and laparoscopic cholecystectomy. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2014;27(4):272-4.) No intervalo de 4 a 30 dias após a CPRE, 22,7% dos pacientes necessitaram utilização de dreno na cavidade abdominal, e 4,5% sofreram lesão em via biliar. Porém, os pacientes submetidos à CCC VLP após o 30º dia da CPRE não sofreram lesão em via biliar, e somente 9,7% necessitaram colocação de dreno em cavidade abdominal, comprovando que o processo inflamatório iniciado 72 horas após a CPRE gera maior complexidade para realização da CCC VLP,(2727. Reinders JS, Gouma DJ, Heisterkamp J, Tromp E, van Ramshorst B, Boerma D. Laparoscopic cholecystectomy is more difficult after a previous endoscopic retrograde cholangiography. HBP (Oxford). 2013;15(3):230-4.) e, após o 30º da CPRE, há menos complicações operatórias.

A colecistectomia precoce após CPRE, dentro de 72 horas, tem melhores resultados com menos morbidades, provavelmente por ainda não ter se instalado o processo inflamatório gerado após a CPRE.(1313. Salman B, Yilmaz U, Kerem M, Bedirli A, Sare M, Sakrak O, et al. The timing of laparoscopic cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreaticography in cholelithiasis coexisting with choledocholithiasis. J Hepatobiliary Pancreat Surg. 2009;16(6):832-6.) Porém, no HGG, como em grande parte dos hospitais secundários do sistema público de saúde, a maioria das CCC VLP é realizada a partir do 3° dia após a CPRE. Logo, ao analisar os períodos tardios, o melhor momento para realizar CCC VLP nos pacientes submetidos à CPRE é preferencialmente depois do 30° dia após o procedimento, por conta de menores duração cirúrgica, taxa de lesão de vias biliares, necessidade em drenagem de cavidade abdominal, taxa de conversão da via de acesso e menor tempo de internação pós-operatório. O pior momento, quando analisadas essas mesmas variáveis, é no intervalo entre o 4° e 30° dia após a CPRE.(99. Trejo-Ávila M, Solórzano-Vicuña D, García-Corral R, Bada-Yllán O, Cuendis-Velázquez A, Delano-Alonso R, et al. Laparoscopic cholecystectomy after endoscopic treatment of choledocholithiasis: a retrospective comparative study. Updates Surg. 2019;71(4):669-75.,1010. Wang CC, Tsai MC, Wang YT, Yang TW, Chen HY, Sung WW, et al. Role of cholecystectomy in choledocholithiasis patients underwent endoscopic retrograde cholangiopancreatography. Sci Rep. 2019;9(1):2168.)

CONCLUSÃO

Na amostra estudada, o período durante o qual se deve evitar a realização de colecistectomia em pacientes que submetidos à colangiopancreatografia retrógrada endoscópica foi o intervalo entre o 4° o 30° dia.

REFERENCES

  • 1
    Gil SM, Braga JF, Centurion SA, Gil BZ. Estudo da incidência de coledocolitíase em pacientes com colecistite calculosa aguda e crônica submetidos à colecistectomia vídeolaparoscópica. Rev Col Bras Cir. 2007;34(4):1-4.
  • 2
    Melo MC. Estado atual do tratamento da coledocolitíase. Rev Bras Videocir. 2003;1(2):71-6.
  • 3
    Manes G, Paspatis G, Aabakken L, Anderloni A, Arvanitakis M, Ah-Soune P, Barthet M, Domagk D, Dumonceau JM, Gigot JF, Hritz I, Karamanolis G, Laghi A, Mariani A, Paraskeva K, Pohl J, Ponchon T, Swahn F, Ter Steege RW, Tringali A, Vezakis A, Williams EJ, van Hooft JE. Endoscopic management of common bile duct stones: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) guideline. Endoscopy. 2019;51(5):472-91.
  • 4
    Favaro ML, Gabor S, Pedroso RF, Ribeiro L, Rosa OM, Ribeiro-Junior MA. Single port laparoscopic cholecystectomy: technical aspects and results. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2018;31(3):e1388.
  • 5
    Pisani JC, Bacelar A, Malafaia O, Ribas-Filho JM, Czezcko NG, Nassif PA. Estudo comparativo entre a colangiopancreatografia por ressonância magnética e a colangiopancreatografia endoscópica no diagnóstico das obstruções biliopancreáticas. Arq Gastroenterol. 2001;38(3):149-57.
  • 6
    Bencini L, Tommasi C, Manetti R, Farsi M. Modern approach to cholecysto-choledocholithiasis. World J Gastrointest Endosc. 2014;6(2):32-40.
  • 7
    Machado MA, Rocha JR, Herman P, Montagnini AL, Machado MC. Tratamento laparoscópico de coledocolitíase. Arq Gastroenterol. 2000;37(3):183-6.
  • 8
    Bingener J, Skaran P, McConico A, Novotny P, Wettstein P, Sletten DM, et al. A double-blinded randomized trial to compare the effectiveness of minimally invasive procedures using patient-reported outcomes. J Am Coll Surg. 2015;221(1):111-21.
  • 9
    Trejo-Ávila M, Solórzano-Vicuña D, García-Corral R, Bada-Yllán O, Cuendis-Velázquez A, Delano-Alonso R, et al. Laparoscopic cholecystectomy after endoscopic treatment of choledocholithiasis: a retrospective comparative study. Updates Surg. 2019;71(4):669-75.
  • 10
    Wang CC, Tsai MC, Wang YT, Yang TW, Chen HY, Sung WW, et al. Role of cholecystectomy in choledocholithiasis patients underwent endoscopic retrograde cholangiopancreatography. Sci Rep. 2019;9(1):2168.
  • 11
    Vakayil V, Klinker ST, Sulciner ML, Mallick R, Trikudanathan G, Amateau SK, et al. Single-stage management of choledocholithiasis: intraoperative ERCP versus laparoscopic common bile duct exploration. Surg Endosc. 2019 Oct 15. doi: 10.1007/s00464-019-07215-w.
    » https://doi.org/10.1007/s00464-019-07215-w
  • 12
    Qian Y, Xie J, Jiang P, Yin Y, Sun Q. Laparoendoscopic rendezvous versus ERCP followed by laparoscopic cholecystectomy for the management of cholecysto-choledocholithiasis: a retrospectively cohort study. Surg Endosc. 2020;34(6):2483-9.
  • 13
    Salman B, Yilmaz U, Kerem M, Bedirli A, Sare M, Sakrak O, et al. The timing of laparoscopic cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreaticography in cholelithiasis coexisting with choledocholithiasis. J Hepatobiliary Pancreat Surg. 2009;16(6):832-6.
  • 14
    Ballou J, Wang Y, Schreiber M, Kiraly L. 10 years of laparoscopic common bile duct exploration: a single tertiary institution experience. Am J Surg. 2019;217(5):970-3.
  • 15
    Lee R, Ha H, Han YS, Jung MK, Chun JM. Predictive factors for long operative duration in patients undergoing laparoscopic cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiography for combined choledochocystolithiasis. Surg Laparosc Endosc Percutaneous Tech. 2017;27(6):491-6.
  • 16
    Minossi JG, Picanço HC, Carvalho MA, Paulucci PR, Vendites S. Morbimortality of elderly patients submitted to cholecystectomy by laparotomy, minilaparotomy or videolaparoscopy. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2007;20(2):93-6.
  • 17
    Aziret M, Karaman K, Ercan M, Vargöl E, Toka B, Arslan Y, et al. Early laparoscopic cholecystectomy is associated with less risk of complications after the removal of common bile duct stones by endoscopic retrograde cholangiopancreatography. Turk J Gastroenterol. 2019;30(4):336-44.
  • 18
    Huang RJ, Barakat MT, Girotra M, Banerjee S. practice patterns for cholecystectomy after endoscopic retrograde cholangiopancreatography for patients with choledocholithiasis. Gastroenterology. 2017;153(3):762-771.e2.
  • 19
    Mador BD, Nathens AB, Xiong W, Panton ON, Hameed SM. Timing of cholecystectomy following endoscopic sphincterotomy: a population-based study. Surg Endosc. 2017;31(7):2977-85.
  • 20
    Arezzo A, Scozzari G, Famiglietti F, Passera R, Morino M. Is single-incision laparoscopic cholecystectomy safe? Results of a systematic review and meta-analysis. Surg Endosc. 2013;27(7):2293-304. Review.
  • 21
    Salim MT, Cutait R. Complicações da cirurgia videolaparoscópica no tratamento de doenças da vesícula e vias biliares. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2008;21(4):153-7.
  • 22
    Amaral PC, Ázaro Filho EM, Fortes MF, Ettinger Jr E, Cangussu HC, Fahel E. Taxas de complicações e tempo de permanência hospitalar foram maiores em pacientes idosos submetidos a videolaparocolecistectomia. Resultados após colecistectomia videolaparoscópica em pacientes idosos. Rev Bras Videoci. 2006;4(2):48-53.
  • 23
    Silva RA, Ueda RY, Rêgo RE, Pacheco Junior AM, Fava J, Rasslan S. Tratamento cirúrgico postergado da pancreatite aguda biliar. Rev Col Bras. 2000;27(3):167-72.
  • 24
    Lima EC, Queiroz FL, Ladeira FN, Ferreira BM, Bueno JG, Magalhães EA. Análise dos fatores implicados na conversão da colecistectomia laparoscópica. Rev Col Bras Cir. 2007;34(5):321-5.
  • 25
    Araújo Neto NP, Gonçalves JE, Bromberg SH, Guz B, Zanoto A. Predição da coledocolitíase pela associação de indicadores clínicos e laboratoriais em dois momentos do pré-operatório da colecistectomia. Rev Col Bras Cir. 2005;32(1):41-6.
  • 26
    Peponis T, Panda N, Eskesen TG, Forcione DG, Yeh DD, Saillant N, et al. Preoperative endoscopic retrograde cholangio-pancreatography (ERCP) is a risk factor for surgical site infections after laparoscopic cholecystectomy. Am J Surg. 2019;218(1):140-4.
  • 27
    Reinders JS, Gouma DJ, Heisterkamp J, Tromp E, van Ramshorst B, Boerma D. Laparoscopic cholecystectomy is more difficult after a previous endoscopic retrograde cholangiography. HBP (Oxford). 2013;15(3):230-4.
  • 28
    Mann K, Belgaumkar AP, Singh S. Post-endoscopic retrograde cholangiography laparoscopic cholecystectomy: challenging but safe. JSLS. 2013;17(3):371-5.
  • 29
    Daher Filho PF, Campos T, Kuryura L, Belotto M, Silva RA, Pacheco Júnior AM. Avaliação de complicações relacionadas à cpre em pacientes com suspeita de coledocolitíase. Rev Col Bras Cir. 2007;34(2):114-8.
  • 30
    Fortunato AA, Gentile JK, Caetano DP, Gomes MA, Bassi MA. Comparative analysis of iatrogenic injury of biliary tract in laparotomic and laparoscopic cholecystectomy. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2014;27(4):272-4.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    30 Ago 2019
  • Aceito
    16 Fev 2020
Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein Avenida Albert Einstein, 627/701 , 05651-901 São Paulo - SP, Tel.: (55 11) 2151 0904 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@einstein.br