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Uso de gemtuzumabe ozogamicina combinado com quimioterapia convencional em pacientes com leucemia mieloide aguda

Resumos

Objetivo:

Analisar a evolução de pacientes tratados com gemtuzumabe ozogamicina combinado à terapêutica convencional no Hospital Israelita Albert Einstein.

Métodos:

14 pacientes que tinham alto risco (leucemia secundária, citogenética desfavorável e doença refratária) foram tratados com gentuzumabe ozogamicina associado à terapêutica convencional, e sua evolução foi analisada por meio de seus prontuários médicos.

Resultados:

A taxa total de resposta foi de 58%, com 43% chegando a resposta completa, em acompanhamento médio de 11 meses, e três meses com intervalo de sobrevivência livre. Foram a óbito 11 pacientes, 6 deles por leucemia mieloide aguda. Somente quatro pacientes apresentaram graus 3 a 4 de toxicidade e apenas um paciente teve síndrome de obstrução sinusoidal após transplante de medula.

Conclusão:

Gemtuzumabe ozogamicina associado à terapêutica quimioterápica convencional é um tratamento factível em pacientes com leucemia mieloide aguda. Contudo, novos estudos são necessários para esclarecer qual o subgrupo de pacientes que pode se beneficiar desse tratamento.

Leucemia mieloide aguda/quimioterapia; Radioterapia; Antineoplásicos/uso terapêutico; Protocolos de quimioterapia combinada antineoplásica/uso terapêutico; Idoso


Objective:

To analyze the outcome of patients treated with gemtuzumab ozogamycin combined with conventional therapy treated at Hospital Israelita Albert Einstein.

Methods:

14 patients who had high risk features (secondary leukemia, unfavorable cytogenetics, and refractory disease) were treated with gemtuzumab ozogamycin combined with conventional therapy and their outcome was analysed by reviewing their medical records.

Results:

Overall response rate was 58%, with 43% achieving complete response, with a median follow-up of 11 months, event-free survival was 3 months. Eleven patients died, 6 of them due to refractory acute myeloid leukemia. Only four patients presented with grade 3 to 4 toxicities and only one patient had sinusoidal obstruction syndrome after bone marrow transplant.

Conclusion:

gemtuzumab ozogamycin combined with chemotherapy is a feasible treatment regimen in acute myeloid leukemia patients. However, further studies are necessary to clarify which subgroup of patients may beneft from this treatment.

Leukemia, myeloid, acute/drug therapy; Radiotherapy; Antineoplastic agents/therapeutic use; Antineoplastic combined chemotherapy protocols/therapeutic use; Aged


INTRODUÇÃO

O tratamento atual de pacientes com leucemia mieloide aguda (LMA) consiste de administração de uma fase de quimioterapia intensiva (quimioterapia de indução) com o objetivo de alcançar o estado de remissão completa (RC), que é um pré-requisito para a cura(11. Walter RB, Kantarjian HM, Huang X, Pierce SA, Sun Z, Gundacker HM, et al. Effect of complete remission and responses less than complete remission on survival in acute myeloid leukemia: a combined Eastern Cooperative Oncology Group, Southwest Oncology Group, and M. D. Anderson Cancer Center Study. J Clin Oncol. 2010;28(10):1766-71.,22. Döhner H, Estey EH, Amadori S, Appelbaum FR, Büchner T, Burnett AK, Dombret H, Fenaux P, Grimwade D, Larson RA, Lo-Coco F, Naoe T, Niederwieser D, Ossenkoppele GJ, Sanz MA, Sierra J, Tallman MS, Löwenberg B, Bloomfield CD; European LeukemiaNet. Diagnosis and management of acute myeloid leukemia in adults: recommendations from an international expert panel, on behalf of the European LeukemiaNet. Blood. 2010;115(3):453-74.). O esquema terapêutico de indução mais tradicional compreende a combinação da citarabina (ara-C) com antraciclinas, como a daunorrubicina ou idarrubicina (esquema 7+3)(22. Döhner H, Estey EH, Amadori S, Appelbaum FR, Büchner T, Burnett AK, Dombret H, Fenaux P, Grimwade D, Larson RA, Lo-Coco F, Naoe T, Niederwieser D, Ossenkoppele GJ, Sanz MA, Sierra J, Tallman MS, Löwenberg B, Bloomfield CD; European LeukemiaNet. Diagnosis and management of acute myeloid leukemia in adults: recommendations from an international expert panel, on behalf of the European LeukemiaNet. Blood. 2010;115(3):453-74.). Entretanto, em pacientes idosos com LMA (em geral definidos como > 55-60 anos de idade), a administração de um ciclo agressivo de quimioterapia de indução pode ser limitada pela presença de comorbidades e baixa tolerância(33. Kantarjian H, Ravandi F, OBrien S, Cortes J, Faderl S, Garcia-Manero G, et al. Intensive chemotherapy does not benefit most older patients (age 70 years or older) with acute myeloid leukemia. Blood. 2010;116(22):4422-9.). Além disso, os pacientes idosos com LMA mais comumente apresentam características de risco mais grave e alta taxa de doença resistente(33. Kantarjian H, Ravandi F, OBrien S, Cortes J, Faderl S, Garcia-Manero G, et al. Intensive chemotherapy does not benefit most older patients (age 70 years or older) with acute myeloid leukemia. Blood. 2010;116(22):4422-9.). Como resultado, as taxas de RC com a quimioterapia de indução em pacientes idosos com LMA estão na faixa de apenas 40 a 50%, e as taxas de sobrevida a longo prazo são inferiores a 10%(33. Kantarjian H, Ravandi F, OBrien S, Cortes J, Faderl S, Garcia-Manero G, et al. Intensive chemotherapy does not benefit most older patients (age 70 years or older) with acute myeloid leukemia. Blood. 2010;116(22):4422-9.). Assim, há uma grande necessidade de melhorar o tratamento em pacientes idosos com LMA.

Gemtuzumabe ozogamicina (GO) (Mylotarg®; Pfizer, Nova York, NY) é um anticorpo monoclonal dirigido contra o antígeno CD33 e conjugado ao agente quimioterápico caliqueamicina(44. Tsimberidou AM, Giles FJ, Estey E, O'Brien S, Keating MJ, Kantarjian HM. The role of gemtuzumab ozogamicin in acute leukaemia therapy. Br J Haematol. 2006;132(4):398-409.). CD33 é uma molécula de superfície expressa na superfície das células melodies e em blastos melodies na maioria dos pacientes com LMA(44. Tsimberidou AM, Giles FJ, Estey E, O'Brien S, Keating MJ, Kantarjian HM. The role of gemtuzumab ozogamicin in acute leukaemia therapy. Br J Haematol. 2006;132(4):398-409.). O anticorpo anti-CD33 no GO está conjugado a caliqueamicina por meio de ligante ácido-sensível. A caliqueamicina é um composto da classe das enediinas e induz a clivagem dos filamentos de DNA por meio da formação de radicais livres(55. Zein N, Sinha AM, McGahren WJ, Ellestad GA. Calicheamicin gamma 1I: an antitumor antibiotic that cleaves double-stranded DNA site specifically. Science. 1988;240(4856):1198-201.). Ao se ligar a CD33, o GO é internalizado em uma vesícula lisossomal e o pH ácido cliva o ligante e libera a caliqueamicina do anticorpo monoclonal(44. Tsimberidou AM, Giles FJ, Estey E, O'Brien S, Keating MJ, Kantarjian HM. The role of gemtuzumab ozogamicin in acute leukaemia therapy. Br J Haematol. 2006;132(4):398-409.).

Estudos clínicos revelaram que o GO tem atividade nos casos de LMA recorrente/refratária e não tratada. Três estudos de fase II incluíram 142 pacientes CD33-positivos com a primeira recorrência de LMA não tratada(66. Sievers EL, Larson RA, Stadtmauer EA, Estey E, Löwenberg B, Dombret H, Karanes C, Theobald M, Bennett JM, Sherman ML, Berger MS, Eten CB, Loken MR, van Dongen JJ, Bernstein ID, Appelbaum FR; Mylotarg Study Group. Efficacy and safety of gemtuzumab ozogamicin in patients with CD33-positive acute myeloid leukemia in first relapse. J Clin Oncol. 2001;19(13):3244-54.). Os pacientes foram tratados com uma ou duas infusões de GO na dose de 9 mg/m2. A taxa de RC foi de 16%, e 13% dos pacientes alcançaram a RC sem a recuperação completa da contagem de plaquetas (CRp), com uma taxa de resposta global (ORR) de 29%. Com base nesse trabalho, o GO foi aprovado como o agente único para o tratamento de pacientes idosos (idade ≥ 60 anos) com LMA recorrente(77. Bross P F, Beitz J, Chen G, Chen XH, Duffy E, Kieffer L, et al. Approval summary: gemtuzumab ozogamicin in relapsed acute myeloid leukemia. Clin Cancer Res. 2001;7(6):1490-6.). Outros trabalhos confirmaram a atividade do GO como agente único(88. Amadori S, Suciu S, Selleslag D, Stasi R, Alimena G, Baila L, et al. Randomized trial of two schedules of low-dose gemtuzumab ozogamicin as induction monotherapy for newly diagnosed acute myeloid leukaemia in older patients not considered candidates for intensive chemotherapy. A phase II study of the EORTC and GIMEMA leukaemia groups (AML-19). Br J Haematol. 2010;149(3):376-82.1414. Schwarz J, Marková J, Peková S, Trnková Z, Sponerová D, Cetkovský P. A single administration of gemtuzumab ozogamicin for molecular relapse of acute promyelocytic leukemia. Hematol J. 2004;5(3):279-80.). Mais recentemente, estudos clínicos enfocaram a combinação do GO com outros agentes, incluindo a citarabina, as antraciclinas e os análogos de purinas(1515. Chevallier P, Delaunay J, Turlure P, Pigneux A, Hunault M, Garand R, et al. Long-term disease-free survival after gemtuzumab, intermediate-dose cytarabine, and mitoxantrone in patients with CD33(+) primary resistant or relapsed acute myeloid leukemia. J Clin Oncol. 2008;26(32):5192-7.,1616. Tsimberidou A, Estey E, Cortes J, Thomas D, Faderl S, Verstovsek S, et al. Gemtuzumab, fludarabine, cytarabine, and cyclosporine in patients with newly diagnosed acute myelogenous leukemia or high-risk myelodysplastic syndromes. Cancer. 2003;97(6):1481-7.). Relatamos a experiência de nossa instituição com um esquema terapêutico combinado contendo citarabina e GO para o tratamento de pacientes idosos com LMA.

MÉTODOS

Revisamos os resultados de 14 pacientes tratados com GO combinado a agentes quimioterápicos convencionais no Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE) entre 2007 e 2009. Os pacientes tinham o diagnóstico de LMA de acordo com a classificação de 2001 da Organização Mundial da Saúde (OMS) e tinham LMA recorrente/refratária ou não tratada, mas não eram capazes de tolerar a quimioterapia intensiva em razão da idade e/ou comorbidades. Os pacientes assinaram o consentimento informado antes de iniciarem a quimioterapia. Os laudos patológicos das biópsias de medula óssea (MO) foram revisados quanto às informações sobre displasia de células hematopoiéticas no início do estudo. O cariótipo foi classificado como prognóstico bom, intermediário e ruim, com base na mais recente classificação citogenética do Medical Research Council (MRC).

Tratamento

Quatorze pacientes foram tratados com diferentes combinações de GO e agentes quimioterápicos convencionais dependendo da idade, comorbidades e decisão clínica. GO foi administrado na dose de 3 mg/m2 IV, durante 2 horas, nos dias de tratamento 1, 4 e 7. Esse esquema fracionado foi inicialmente publicado por Taksin et al. em 2007 e difere da escala de dose inicial de GO aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos(1717. Taksin AL, Legrand O, Raffoux E, de Revel T, Thomas X, Contentin N, et al. High efficacy and safety profile of fractionated doses of Mylotarg as induction therapy in patients with relapsed acute myeloblastic leukemia: a prospective study of the alfa group. Leukemia. 2007;21(1):66-71.).

Definições de resposta e análise estatística

Os critérios de resposta e os resultados de sobrevida foram publicados anteriormente. Resumidamente, a RC foi definida pela presença de menos de 5% de blastos na MO com mais de 1 x 109/L neutrófilos e mais de 100.000/ mm3 plaquetas no sangue periférico (SP)(1818. Cheson BD, Cassileth PA, Head DR, Schiffer CA, Bennett JM, Bloomfield CD, et al. Report of the National Cancer Institute-sponsored workshop on definitions of diagnosis and response in acute myeloid leukemia. J Clin Oncol. 1990;8(5):813-9.,1919. Cheson BD, Bennett JM, Kopecky KJ, Büchner T, Willman CL, Estey EH, Schiffer CA, Doehner H, Tallman MS, Lister TA, Lo-Coco F, Willemze R, Biondi A, Hiddemann W, Larson RA, Löwenberg B, Sanz MA, Head DR, Ohno R, Bloomfield CD; International Working Group for Diagnosis, Standardization of Response Criteria, Treatment Outcomes, and Reporting Standards for Therapeutic Trials in Acute Myeloid Leukemia. Revised recommendations of the International Working Group for Diagnosis, Standardization of Response Criteria, Treatment Outcomes, and Reporting Standards for Therapeutic Trials in Acute Myeloid Leukemia. J Clin Oncol. 2003;21(24):4642-9. Erratum in: J Clin Oncol. 2004 Feb 1;22(3):576). Os pacientes com RC sem recuperação da contagem de plaquetas preencheram todos os critérios de RC, exceto a recuperação das contagens de plaquetas acima de 100.000/mm3. A recorrência foi definida como mais de 5% de blastos no aspirado de MO não relacionada à recuperação ou pela presença de doença extramedular. A sobrevida livre de eventos (SLE) foi calculada desde o início do tratamento até a ocorrência de um evento. Um evento foi definido como uma recorrência, doença resistente e morte. A morte na indução foi definida como a morte que ocorreu antes de se alcançar a RC ou confirmar a doença resistente. Os pacientes sem eventos foram computados no último acompanhamento. A sobrevida livre de doença (SLD) foi calculada desde o tempo da RC até a recorrência ou morte na RC. Os pacientes vivos em RC foram computados no último acompanhamento. A sobrevida global (SG) foi calculada desde o momento do diagnóstico até a morte. Foram computados todos os pacientes vivos no último acompanhamento. As incidências cumulativas de recorrência e morte na RC foram estimadas pelo método de Gray, levando em consideração os riscos competitivos(2020. Gray RJ. A class of K-sample tests for comparing the cumulative incidence of a competing risk. Ann Stat. 1988;16:1140-54.). Foram usadas estatísticas descritivas para as covariadas do início do estudo. A sobrevida foi estimada pelo método de Kaplan-Meier.

RESULTADOS

As características clínicas estão resumidas na tabela 1. A idade mediana foi de 69 anos (variação de 33 a 83 anos). Quatorze pacientes receberam tratamento com GO combinado com agentes quimioterápicos convencionais. Seis pacientes (UPI# 1,3,4,5,6,7) receberam GO combinado com a dose padrão de citarabina (100 mg/m2 I V, em infusão contínua, durante 7 dias). Um paciente (UPI#2) recebeu GO combinado com a citarabina em baixa dose (10 mg/m2 I V, por 10 dias), uma vez que o paciente estava na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) recebendo tratamento para infecção pulmonar quando o tratamento começou. A idade mediana desses pacientes foi 75 anos (variação de 64 a 83 anos) e quatro pacientes tiveram performance status (PS) de 3 a 4. Os outros sete pacientes receberam GO combinado com a quimioterapia para LMA recorrente. O número mediano de tratamentos prévios foi dois (variação de 1 a 3). Dois pacientes (UPI#8 e #9) receberam GO com a dose intermediária de citarabina (600 mg/m2 I V, por 5 dias) e UPIN#9 também recebeu mitoxantrona (10 mg/ m2 IV, por 2 dias). Um paciente (UPIN#11) recebeu GO combinado com alta dose de citarabina (3 g/m2 IV, duas vezes ao dia, por 5 dias) e mitoxantrona (10 mg/m2 IV, por 3 dias). Os outros quatro pacientes receberam GO fracionado combinado com citarabina e mitoxantrona, de acordo com o protocolo MIDAM (citarabina 1 g/m2 IV, duas vezes ao dia, por 5 dias; mitoxantrona 12 mg/m2 IV, uma vez ao dia, por 3 dias). Cinco pacientes receberam transplante alogênico de células-tronco (TCT), em média, 2 meses após a quimioterapia com GO (variação de 1 a 5 meses). As fontes de célulastronco foram sangue do cordão umbilical (SCU) em três casos e um doador não relacionado compatível, em dois casos. No momento do TCT, dois pacientes tinham doença ativa e três pacientes estavam em RC.

Tabela 1
Características de linha de base no momento do tratamento

Em geral, a taxa de RC foi de 43%; dois pacientes alcançaram CRp com ORR de 58%. A doença refratária e a morte na indução ocorreram, cada uma, em 21% dos pacientes. O tempo mediano até a RC foi de 29 dias (variação de 22 a 38 dias). Entre os sete pacientes que receberam GO combinado com ara-C na terapia de indução inicial, a taxa de ORR foi de 43% (2 CRs + 1 CRp), um paciente teve doença resistente e três pacientes (43%) morreram antes que fosse possível avaliar a resposta. A ORR para o GO combinado com a quimioterapia usada como salvação foi 71% (4 CRs + 1 CRp); dois pacientes tiveram leucemia refratária. A RC foi alcançada em dois de três pacientes que tiveram resultados citogenéticos de alto risco; entre os nove pacientes restantes com cariótipo de risco intermediário, a ORR foi de 67%.

O acompanhamento mediano dos pacientes que sobreviveram foi de 11 meses. As estimativas da sobrevida são apresentadas nas figuras 1 a 3. Onze pacientes morreram ou sofreram recorrência, com a mediana da SLE igual a 3 meses (IC95%: 0-6,6 meses). Onze pacientes (79%) morreram, seis deles (54%) em razão de LMA refratária e os outros em razão de toxicidade relacionada ao tratamento (três mortes ocorreram pelo GO e quimioterapia). A SG mediana foi 4 meses (IC95%: 0-9,5 meses). Nos oito pacientes que apresentaram resposta, a mediana da SLD foi de 10 meses (IC95%: 2,617,3 meses). Entre os três sobreviventes no momento deste trabalho, dois receberam consolidação com transplante alogênico de sangue do cordão no momento da RC. A incidência cumulativa de recorrência nos pacientes com resposta foi de 42,5% (IC95%: 6,9-75,9%) em 1 ano, e a incidência cumulativa de morte na RC em 1 ano foi de 21% (IC95%: 0,4-44,4%).

Figura 1
Sobrevida livre de eventos
Figura 2
Sobrevida geral
Figura 3
Sobrevida livre de doença

Como esperado, a toxicidade mielossupressora foi superior, com incidência universal de neutropenia graus 3 a 4 e trombocitopenia. Nos pacientes que alcançaram a RC, o tempo mediano até a recuperação da contagem absoluta de neutrófilos (CAN ≥ 1.000/mm3 em, pelo menos, 2 dias consecutivos) foi de 23 dias (variação de 18 a 29 dias) e o tempo mediano até a recuperação da contagem de plaquetas foi de 35 dias (variação de 22 a 66 dias). A toxicidade hepática graus 3 a 4 foi observada em três pacientes, sendo um deles com elevação grau 3 da bilirrubina e elevação grau 4 da gama-GT e fosfatase alcalina, e dois com elevação grau 3 da gama-GT. Nenhum paciente desenvolveu a síndrome de obstrução sinusoidal (SOS) durante o tratamento com GO, mas um paciente desenvolveu a SOS após o transplante alogênico de células-tronco de doador não relacionado compatível 2 meses após o tratamento com GO.

O quadro 1 mostra o tratamento e a evolução dos pacientes.

Quadro 1
Tratamento e resultado por paciente

DISCUSSÃO

Na nossa experiência, o GO combinado à quimioterapia mostrou ser um esquema terapêutico viável, com baixa incidência de toxicidade graus 3 a 4. Mesmo assim, os resultados a longo prazo confirmam a necessidade de aprimorar o tratamento de consolidação e a manutenção da resposta após o alcance da RC.

Ainda é controverso se o tratamento com GO tem quaisquer benefícios no tratamento de pacientes com LMA. Recentemente, a Pfizer retirou o GO do mercado em razão dos resultados decepcionantes observados em um estudo de fase III(2121. Petersdorf S, Kopecky K, Stuart RK, Larson RA, Nevill TJ, Stenke L, et al. Preliminary Results of Southwest Oncology Group Study S0106: An International Intergroup Phase 3 Randomized Trial Comparing the Addition of Gemtuzumab Ozogamicin to Standard Induction Therapy Versus Standard Induction Therapy Followed by a Second Randomization to Post-Consolidation Gemtuzumab Ozogamicin Versus No Additional Therapy for Previously Untreated Acute Myeloid Leukemia [abstract]. Blood. 2009 November 20, 2009;114(22).). Nesse estudo, a adição de GO à terapia de indução ou como terapia de pós-consolidação não melhorou a taxa de RC, sobrevida livre de recidiva (SLR), SLD pós-consolidação ou SG, mas estava associada a um risco significativamente maior de eventos adversos de indução fatal.

Sabe-se que a LMA é uma doença heterogênea com subtipos distintos identificados pelas anormalidades morfológicas, cromossômicas e genéticas(2222. Marcucci G, Haferlach T, Döhner H. Molecular genetics of adult acute myeloid leukemia: prognostic and therapeutic implications. J Clin Oncol. 2011;29(5):475-86.). Diferentes subtipos de LMA podem responder de maneira diferente a uma droga específica ou a um esquema quimioterápico. Sabe-se também, por exemplo, que as anormalidades do fator de ligação ao core, as mutações NPM1 (e também as possíveis mutações Ras), podem identificar subgrupos de pacientes com LMA com melhor resposta à alta dose de citarabina na consolidação, enquanto o mesmo esquema terapêutico é supostamente pouco eficaz nos pacientes com anormalidades cromossômicas de alto risco(2323. Bloomfield CD, Lawrence D, Byrd JC, Carroll A, Pettenati MJ, Tantravahi R, et al. Frequency of prolonged remission duration after high-dose cytarabine intensification in acute myeloid leukemia varies by cytogenetic subtype. Cancer Res. 1998;58(18):4173-9.2525. Schlenk R F, Döhner K, Krauter J, Fröhling S, Corbacioglu A, Bullinger L, Habdank M, Späth D, Morgan M, Benner A, Schlegelberger B, Heil G, Ganser A, Döhner H; German-Austrian Acute Myeloid Leukemia Study Group. Mutations and treatment outcome in cytogenetically normal acute myeloid leukemia. N Engl J Med. 2008;358(18):1909-18.). Assim, é importante discernir qual subgrupo de pacientes pode se beneficiar do GO. Um estudo publicado recentemente analisou os pacientes selecionados para um estudo de fase III do MRC com enfoque neste aspecto. Nesse estudo, os pacientes com LMA CBF (cariótipo de risco favorável) demonstraram resultado significativamente melhores com a associação de GO (3 mg/m2) durante a quimioterapia de indução(2626. Burnett AK, Hills RK, Milligan D, Kjeldsen L, Kell J, Russell NH, et al. Identification of patients with acute myeloblastic leukemia who benefit from the addition of gemtuzumab ozogamicin: Results of the MRC AML15 Trial. J Clin Oncol. 2011;29(4):369-77.). Os mesmos resultados foram observados em uma análise preliminar do outro estudo de fase III mencionado anteriormente(2121. Petersdorf S, Kopecky K, Stuart RK, Larson RA, Nevill TJ, Stenke L, et al. Preliminary Results of Southwest Oncology Group Study S0106: An International Intergroup Phase 3 Randomized Trial Comparing the Addition of Gemtuzumab Ozogamicin to Standard Induction Therapy Versus Standard Induction Therapy Followed by a Second Randomization to Post-Consolidation Gemtuzumab Ozogamicin Versus No Additional Therapy for Previously Untreated Acute Myeloid Leukemia [abstract]. Blood. 2009 November 20, 2009;114(22).). Postulou-se que o GO possa superar o impacto negativo das mutações KIT em pacientes com LMA CBF. No estudo clínico MRC, o GO não melhorou o resultado de pacientes com LMA com cariótipo de alto risco, sugerindo que novas opções terapêuticas são necessárias para esse subgrupo de pacientes.

CONCLUSÃO

A combinação do GO com a quimioterapia convencional teve uma eficácia modesta em nossa coorte de pacientes. Acreditamos que o GO seja um composto que possa beneficiar pacientes selecionados com LMA. São necessários novos estudos para avaliar o papel do GO em pacientes com LMA com cariótipo de risco favorável.

  • Trabalho realizado no Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE - São Paulo (SP), Brasil

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2011

Histórico

  • Recebido
    15 Jan 2011
  • Aceito
    11 Abr 2011
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