Resumo:
Os arquivos pessoais, enquanto conjunto de documentos acumulados por pessoas no decorrer de suas atividades rotineiras e preservados consoante a manifestação do desejo e da necessidade de seus acumuladores (bem como de seus herdeiros), constituem parte do patrimônio documental produzido pela humanidade, mesmo que, em um primeiro momento, restrinjam-se às limitações dos espaços e usos privados que lhes são inerentes. Para além da oficialidade dos arquivos públicos, fundamentais para a eficiência administrativa e para a história social, entende-se que os conjuntos documentais acumulados por pessoas são imprescindíveis para a construção da história e de memórias individuais e coletivas, o que justifica os processos de institucionalização de arquivos pessoais. De caráter exploratório e baseado em revisão de literatura, o artigo discute as dinâmicas de utilidade social dos arquivos pessoais a partir de duas categorias conceituais: (1) o arquivo como prova e (2) o arquivo como informação ou testemunho. Com isso, a discussão ressalta a importância dos arquivos pessoais para além das razões que lhes deram origem e justificaram sua acumulação (vinculadas ao seu valor probatório), e sublinha a relevância social destes conjuntos, pautadas nos valores secundários (enquanto fonte de informação sobre/para a sociedade).
Palavras-chave:
arquivos pessoais; patrimônio documental; memória coletiva; identidade
Abstract:
Personal archives, as assemblages of documents accrued by individuals over the course of their routine activities - whether personal, familial, or professional - and preserved according to the wishes and needs of their creators or their heirs, form part of the documentary heritage produced by humanity. Although initially constrained by the limitations of private spaces and uses, these archives transcend their origins to hold broader significance. In contrast to the official nature of public archives, which serve as pivotal tools for administrative efficiency and social history, personal archives are indispensable for constructing individual and collective histories and memories. This recognition underpins efforts to institutionalize personal archives. This exploratory study, grounded in a literature review, examines the social utility of personal archives through two conceptual categories: (1) archives as evidence and (2) archives as information or testimony. The discussion highlights the importance of personal archives beyond the reasons for their creation and accumulation, typically tied to their evidential value, and underscores their social relevance, emphasizing their secondary value as sources of information about and for society.
Keywords:
personal archives; documentary heritage; collective memory; identity
1 Introdução
Arquivos pessoais são arquivos, como bem nos lembra Ana Maria de Almeida Camargo (2009a) e, como tal, ostentam uma dupla qualidade: são tanto prova quanto informação, já que, conforme afirma Heloísa Bellotto (2014), todo documento de arquivo nasce como prova das atividades de seu produtor e permanece como seu testemunho. Para Schellenberg (2006), desta razão incorre o entendimento de que os documentos de arquivo possuem valor primário (essencialmente probatório, de importância para a entidade que lhe deu origem) e secundário (essencialmente informativo, de importância para outros utilizadores). No primeiro caso, o valor do documento é determinado por sua utilidade prática, alinhada ao exercício das atividades de seu produtor/acumulador; no segundo, atrela-se à utilidade e à pertinência de seu conteúdo para fins culturais, históricos ou de pesquisa científica.
Os documentos que compõem os arquivos pessoais têm sua existência justificada, em um primeiro momento, pela importância que lhes é conferida pelo produtor/acumulador. Contudo, apesar de serem acumulados na esfera privada, eles podem ser preservados para além de seu uso imediato, por meio do reconhecimento de seu valor informativo. Deste modo, os conjuntos documentais acumulados por indivíduos conservam, ao longo de todo o seu ciclo vital, sua função utilitária, servindo tanto às finalidades que lhes são inerentes no contexto de sua produção/acumulação, quanto àquelas que lhes garantem a preservação e o uso secundário (seja por parte de seu acumulador ou de outros usuários aos quais se viabilize acesso). Como bem pontuou Heloísa Bellotto:
Na fase do uso primário, como acumulação e utilização em vida, o arquivo pessoal serve eminentemente ao próprio titular, em suas atividades de trabalho e para comprovação de sua existência civil, deveres cívicos, relacionamentos com pessoas e com instituições dentro e fora da vida intelectual. Passando à fase da preservação, estabelece-se o uso secundário cujo objetivo não é mais o jurídico ou profissional do próprio titular do arquivo e, sim, o da pesquisa científica, feita por terceiros. Aí a potencialidade informacional dos documentos transfigura-se e multiplica-se (Bellotto, 2006, p. 267).
Neste sentido, a justificativa para a manutenção de arquivos pessoais enquanto patrimônio documental a ser desfrutado socialmente reside na necessidade de garantia da preservação e comunicação destes conjuntos documentais, a partir do reconhecimento de sua relevância social, fundamentada nas necessidades de desenvolvimento científico e cultural, nas dinâmicas de construção da história e da memória, justificada pela garantia de acesso público aos documentos. O que está em causa, portanto, é o reconhecimento da utilidade social dos arquivos pessoais, fundamento basilar para o incentivo à sua preservação e usufruto.
Ao refletir sobre a importância social dos arquivos, Bruno Delmas (2010) rememora um episódio particularmente sugestivo: logo após ser empossada como secretária de estado da cultura, a jornalista Françoise Giroud teria perguntado ao então diretor geral do Arquivo Nacional da França para que serviam os arquivos, revelando, com isso, a ignorância geral a respeito de sua função e relevância para a sociedade. A propósito deste episódio, Delmas questiona:
Como dizer para que “servem os arquivos” para motivar eficientemente os responsáveis pelo Estado a definir uma política, a justificar o gasto público na medida certa, a fazer com que o conjunto da sociedade seja beneficiado, deixando patente o interesse público geral? Serão os arquivos realmente úteis? Não serão justas e fundamentadas as críticas- ou até mesmo o desprezo e o descrédito- dos homens que se acham dinâmicos e cheios de energia, que só pensam em se ver livres deles e deixá-los aos historiadores? (Delmas, 2010, p. 18).
Tais questionamentos se estendem para o contexto dos arquivos pessoais, na medida em que é preciso, a todo momento, reafirmar sua importância social e seu caráter necessário, na tentativa de romper com a noção limitada de que os documentos acumulados por pessoas são importantes apenas para elas próprias, mesmo quando estes sujeitos integram importantes dinâmicas sociais, e que a sociedade pouco (ou nada) se beneficiaria pela preservação destes conjuntos documentais, o que tem constituído um desafio importante para sua preservação. Em contrapartida, o entendimento dos arquivos pessoais enquanto integrantes do patrimônio documental a ser preservado e desfrutado pela sociedade gera tanto a necessidade de reconhecimento de sua utilidade social (que justifique sua transposição do contexto privado de acumulação para a abertura ao acesso público), quanto a responsabilização para sua preservação e garantia de acesso, geradora de obrigações e investimentos. Neste sentido, Bruno Delmas (2010) afirma que o papel desempenhado pelos arquivos sempre acompanhou o desenvolvimento das práticas sociais e, por isso, suas utilidades foram se multiplicando. Apesar de considerar uma pluralidade de propósitos para os arquivos, o autor os agrupa em quatro funções1 primordiais: provar (utilidade jurídica); lembrar-se (utilidade de gestão); compreender (utilidade de conhecimento); identificar-se (utilidade social).
De caráter qualitativo e exploratório, este artigo fundamenta-se em uma revisão de literatura2, com o objetivo de explorar as dinâmicas sociais que compreendem a função dos arquivos acumulados por pessoas, em relação ao seu caráter comprobatório (dinâmicas de evidenciação) e informativo (dinâmicas de lembranças e esquecimentos). A seleção das fontes foi realizada com base na relevância e pertinência ao tema, priorizando obras de referência na área de arquivologia, memória social e estudos documentais. A análise do material selecionado foi conduzida por meio de leitura reflexiva, permitindo a construção de uma síntese interpretativa sobre a utilidade dos arquivos pessoais, destacando suas funções sociais e implicações para a memória individual e coletiva. Com isso, a discussão ressalta a importância dos arquivos pessoais para além das razões que lhes deram origem e justificaram sua acumulação (vinculadas ao seu valor probatório), e sublinha a relevância social destes conjuntos, pautadas nos valores secundários (enquanto fonte de informação sobre/para a sociedade). Ao final, espera-se destacar que as dinâmicas de utilidade dos arquivos acumulados por pessoas são reforçadas pelos processos de institucionalização, reconhecendo estes arquivos enquanto imprescindíveis para a construção da memória coletiva3 e fundamentais para a reconstituição histórica.
2 Dinâmicas de evidenciação: documentos pessoais como prova
A finalidade primeira dos arquivos é servir como prova, o que justifica sua preservação ao longo do tempo. Como ressalta Delmas (2010), a necessidade da prova perante a justiça foi o que motivou a sociedade ocidental a conservar documentos - preservando-os por seu valor probatório, e não por serem considerados, aprioristicamente, como “arquivísticos”. O documento de arquivo faz prova das ações de seu produtor e, por isso, resguarda um caráter testemunhal que se manifesta por meio do vínculo originário que mantém com seu produtor e com os demais documentos por ele acumulados. Sobre isso, Ana Maria de Almeida Camargo (2009a) comenta que o que caracteriza os documentos de arquivo:
[...] é a função que desempenham no processo de desenvolvimento das atividades de uma pessoa ou um organismo (público ou privado), servindo-lhes também de prova. Instrumentos e produtos das ações de indivíduos e instituições, tais documentos continuam a representá-las mesmo quando as razões e os agentes responsáveis por sua criação se transformam ou deixam de existir. Daí a importância de que se revestem e a série de procedimentos a que estão sujeitos para que sua principal qualidade - o efeito probatório - não se perca (Camargo, 2009a, p. 28).
A função de provar está inevitavelmente atrelada à gênese do documento, isto é, ao contexto de nascimento dos arquivos, uma vez que “[...] não ocorre nascimento de documento algum senão dentro do seu lugar de proveniência e organicidade” (Bellotto, 2014, p. 336). Isso significa dizer que todo documento é produzido/acumulado por uma entidade, seja ela física ou jurídica, em circunstâncias e segundo procedimentos específicos, com finalidades definidas, que o transfigura na prova material da ação que justificou sua feitura e/ou acumulação. Nos arquivos pessoais, esta capacidade de prova costuma ser mais evidente (no sentido jurídico) para documentos oficiais (como passaportes e contratos de compra e venda), e menos evidente no caso daqueles cuja estrutura não preenche formalidades protocolares (como os bilhetes e os diários íntimos)4.
Richard Cox (2008), em provocativa reflexão sobre os impulsos humanos e o arquivo, questiona a razão da existência dos arquivos pessoais. O autor salienta que não são raras as vezes em que os documentos são apresentados como verdadeiros fardos para o homem contemporâneo, sem que seja levado em conta o fato de que os arquivos das pessoas não surgem por mero fruto do acaso. Neste sentido, ressalta que os arquivos pessoas são formados e mantidos mediante a manifestação das necessidades quotidianas5, à semelhança dos arquivos de corporações, grupos cívicos, igrejas, organizações culturais e outras instituições de natureza administrativa, e afirma que, apesar de não haver obrigações definidas e regras expressamente delimitadas que determinem as razões e maneiras de se produzir e manter arquivos pessoais, há um impulso que leva a maioria dos indivíduos e famílias a manterem seus documentos, de modo que elas possam se lembrar e registar seus lugares no mundo. Sobre isso, ele comenta que:
Os cheques registram as despesas diárias e essas despesas diárias sugerem a natureza de nossas vidas e das de nossos antepassados. Os recibos, como os de compras de livros e viagens de férias, refletem nosso senso e uso do tempo de lazer. As cartas pessoais documentam nossa rede de amigos e parentes e frequentemente capturam os detalhes de nossas vidas e das deles. Os documentos de impostos e propriedades mostram nosso valor financeiro e nossa posição social. Os diários são interpretações pessoais mais propositais da vida de alguém, geralmente iniciadas por um motivo específico, como doenças ou um desejo de mapear o progresso em uma área específica. Os álbuns de recortes são compilações propositais e pedaços de evidências documentais que sobreviveram, fornecendo um vislumbre de como alguém interpreta sua vida ou a história de sua família. Todos esses tipos de documentos emanam de propósitos que são importantes, em muitos casos cruciais, para como alguém compreende o significado de sua vida e sua posição no tempo, lugar e sociedade presentes (Cox, 2008, p. 140-141, tradução nossa)6.
Por meio desta colocação, Richard Cox demonstra que os arquivos pessoais evidenciam aspectos da existência humana e que, ao serem produzidos e acumulados, viabilizam a execução/comprovação das atividades de seus titulares (valores práticos) e, em última instância, contribuem para que os lugares ocupados pelos indivíduos (valores simbólicos) posam ser compreendidos. Deste modo, evidenciam as vivências dos seres humanos e demonstram como elas são afetadas pelas dinâmicas psicológicas (que determinam as maneiras individuais de produzir e manter registros, como o acúmulo de cartões postais e suvenires que permitam a recordação de viagens) e dinâmicas oficiais que determinam a obrigatoriedade de certos documentos de validade jurídica (como a manutenção de documentos com função credencial - como as licenças profissionais e as carteiras de motorista - para fins de validação social).7
Sue McKemmish no emblemático artigo Evidence of me..., publicado originalmente em 1996, apresentou novas chaves de leitura acerca do universo dos arquivos pessoais enquanto testemunhos da vida individual e coletiva. Segundo a autora, a capacidade de testemunho desses documentos permite que eles sejam tanto provas das ações dos sujeitos acumuladores (dimensão individual), quanto das relações que estes estabeleceram em sociedade (dimensão coletiva). Sendo assim, todo o conjunto de documentos acumulado por alguém resguarda a capacidade de provar as suas ações enquanto indivíduo (sujeito idiossincrático) e parte da coletividade (sujeito social), de modo que os documentos acumulados por pessoas contribuem para a criação de narrativas do “eu” e de “nós”. Para McKemmish, ao se reconhecer a importância destes conjuntos documentais para a sociedade, transborda-se o arquivo pessoal para além dos limites de uma vida particular, transformando “a prova de mim em prova de nós” (McKemmish, 2018, p. 253). A autora considera que a vida dos sujeitos é individual e coletivamente testemunhada por meio dos documentos, sendo que:
Os registros, sob qualquer forma, nos oferecem em primeiro lugar, testemunhos de nossas interações com os outros, no contexto de nossas próprias vidas e do lugar que ocupamos nas deles-são provas de “nossa existência, de nossas atividades e experiências”. Fabricamos e guardados os registros que compõem um arquivo pessoal para assegurarmos nosso lugar no presente e no futuro (McKemmish, 2013, p. 24).
Se, por um lado, os arquivos pessoais, ao documentarem as atividades dos sujeitos, impõem-se como provas de suas ações, por outro, também resguardam a capacidade de registrar as visões particulares de seus acumuladores. Por isso, Catherine Hobbs (2018) afirma que é necessário sempre levar em consideração o aspecto “pessoal” do arquivo pessoal, salientando que estes arquivos se afastam da formalidade própria daqueles de origem institucional, uma vez que as pessoas, nos contextos privados de suas vidas, não seguem à risca regras e práticas para a criação e manutenção de documentos. Em decorrência deste fenômeno, ela não considera que os arquivos pessoais sejam evidências diretas das atividades dos indivíduos, mas o resultado da interação de múltiplos construtos que não permitiriam “encontrar a ‘prova de mim’, e sim a prova dos objetivos mutáveis da vida humana (Hobbs, 2018, p. 268).
Enquanto Sue Mckemmish (2018) ressalta o viés probatório e interacional dos arquivos pessoais (por considerar que eles evidenciam as ações e relações humanas), Richard Cox (2008) os conceitua como prova das vivências dos indivíduos (por razões semelhantes àquelas que justificam a formação e manutenção de arquivos administrativos). Catherine Hobbs (2016), por seu turno, problematiza o estatuto probatório dos arquivos pessoais. A autora ressalta que o entendimento, em grande medida, restringe-se à fatualidade documental, desconsiderando que a criação/manutenção de arquivos pessoais ultrapassa as exigências jurídicas e se submete aos desígnios de pessoas físicas, sofrendo, portanto, os impactos das mudanças de sua vida, como alterações de ponto de vista, mudanças de utilidade e abandono de objetivos, o que compromete sua força enquanto provas factuais8. Sobre isso, a autora comenta:
O termo “prova” atua no sentido de trazer o documento pessoal para o universo do factual e do jurídico: trata-se de uma palavra que, por seu próprio sentido, lança-nos na direção da área da responsabilidade pública [...]. Eu iria além e sugeriria que não se trata apenas de quais os tipos de provas se tornam evidentes no arquivo pessoal, mas quais os tipos de ações se tornam ativas na vida individual (Hobbs, 2016, p. 315).
A autora não nega que os arquivos acumulados pelas pessoas possam fornecer evidências sobre suas vivências, mas afirma ser necessário valorizar o que há de pessoal nas decisões que levam à criação e manutenção destes arquivos, afinal o arquivo se relaciona organicamente com as funções de seu criador e está arraigado na interpretação e nas escolhas deste, que podem se alterar ao longo do tempo. Neste contexto, Catherine Hobbs (2016) considera ser imprescindível a compreensão de quatro aspectos relacionados às maneiras como os indivíduos produzem e se relacionam com os documentos: interação entre o pessoal e o profissional; Documentação a partir da experiência; relação com a documentação; organização documental fluída e pessoal.
Conforme já mencionado, os documentos de um arquivo pessoal possuem valor de prova e informação, isto é, para além de provarem e testemunham as vivências de seus titulares, também são capazes de fornecer um testemunho sui generis sobre eles e a respeito dos tempos e das circunstâncias de sua criação. Neste sentido, os documentos acumulados por indivíduos se somam àqueles acumulados por instituições públicas e privadas na construção da memória coletiva, uma vez que indivíduo e sociedade são entidades sempre entrelaçadas. E, é a qualidade probatória dos documentos acumulados pelas pessoas que permite que eles sejam usados como provas das ações e interações dos sujeitos, contribuindo para a formação da memória individual e coletiva.
3 Dinâmicas de informação: documentos pessoais para a produção de memórias e esquecimentos
Conforme Delmas (2010), lembrar é uma necessidade prática da vida humana qu/e se manifesta como resultado da necessária continuidade da vida dos indivíduos como organismos. Segundo Margaret Hedstrom (2016), há um crescente interesse sobre a memória na literatura arquivística sem, contudo, que a terminologia e a escolha de abordagem sejam tratadas com o devido rigor. Ela afirma que os arquivos costumam ser comparados metaforicamente com a memória individual (processos de codificação, rememoração e reconstrução da memória pelo cérebro de cada indivíduo), sendo esta compreensão importante para os arquivistas que produzem e manipulam dispositivos mnemônicos e ferramentas de auxílio à pesquisa, como os guias e inventários. Em contrapartida, quando os estudos arquivísticos se aproximam da memória coletiva (abordagem sociocultural relacionada ao entrecruzamento da memória individual aos processos sociais), a ênfase recai na coletividade, em que a memória compartilhada é acessada por meio de tentativas de generalização.
Embora os seres humanos compartilhem experiências para a produção de significações, é certo que, conforme salienta o antropólogo Joël Candau (2019), as pessoas não são capazes de se recordar das mesmas coisas com a mesma intensidade ou de produzirem a mesma interpretação de um acontecimento, uma vez que os atos de memória decididos coletivamente podem delimitar uma área de circulação de lembranças, sendo que algumas destas vias receberão maior adesão do que outras. Neste caso, a lembrança se manifesta por pares de oposição: memória/esquecimento e individual/coletiva.
Os arquivos podem se apresentar como suportes de verossimilhança para as retóricas construídas em torno da memória coletiva, a partir do entendimento daquilo que Candau distinguiu como representações factuais (representações da existência de certos fatos) e representações semânticas (representações dos sentidos atribuídos a estes mesmos fatos):
A destruição deliberada desses repositórios como um meio de obliterar a herança e a memória de um povo fala especialmente sobre o motivo pelo qual os registros, mesmo aqueles papéis pessoais aparentemente muito menos importantes, podem transmitir valores tão críticos através das gerações. A perda de documentos se traduz em perda de memória e identidade, o equivalente ao ataque de um tipo de Alzheimer social. Podemos fazer a mesma afirmação com nossos registros pessoais. Cartas, cheques, recibos, escrituras, certidões de nascimento, diários, álbuns de recortes e outros documentos ajudam a garantir nosso lugar no mundo. Sem as evidências e informações encontradas nesses registros, perdemos nossas amarras, autoconfiança e conexão com a sociedade e outras pessoas (Cox, 2008, p. 167, tradução nossa)9.
Para além da função de lembrar (corroborada pelas dinâmicas de memórias e esquecimentos), os arquivos resguardam a função de compreender, pois, conforme Bruno Delmas (2010), são fonte de conhecimento e permitem o entendimento daquilo que foi feito por outros para o prosseguimento das ações humanas. Esta função está relacionada ao exercício prático da memória, isto é, o uso que cada indivíduo e sociedade é capaz de fazer a partir daquilo que lembra, segundo aquilo que Paul Ricoeur (2007) definiu como “memória exercitada”. A memória, ao ser exercitada, demanda o ato de rememorar, isto é, um nível elevado de consciência e compreensão. Neste caso, ela está inevitavelmente ligada à aprendizagem, não mais relacionada ao desenvolvimento de práticas de memorização, mas sim à aprendizagem pela memória. Isso significa a possibilidade de aquisição de novos repertórios de conhecimento intelectual ou prático de maneira cumulativa, em nível individual e coletivo. É por meio dos usos da memória que os sujeitos são capazes de compreender: tanto por meio de experiências positivas, quanto traumáticas, sendo o confrontamento e a rememoração estratégias para se evitar a construção compulsória de memórias e esquecimentos.
Os arquivos, ao viabilizarem a compreensão dos fenômenos em seus contextos de efetivação, possibilitam o refinamento da experiência humana (e também da memória), pois permitem a compreensão histórica dos acontecimentos em suas dimensões espaciais e temporais e o desenvolvimento da noção de continuidade, por intermédio da acumulação documental. Conforme salienta Margaret Hedstrom (2016), ao servirem de ferramentas para esta compreensão, os arquivos auxiliam no desenvolvimento da consciência histórica, já que os documentos de arquivo influenciam indiretamente a percepção que uma comunidade ou uma nação nutre de seu passado, por intermédio das interpretações históricas, tanto para o público leigo quanto para o especializado. Nesta mesma perspectiva, Brien Brothman (2001) afirma que os arquivos assumem diferentes missões perante a memória (ao disponibilizarem os resíduos do passado para promover conhecimento integrado e identidade de grupo), e a história (ao revelarem provas para a construção de narrativas sobre o passado).
Os arquivos pessoais detêm potencial significativo para a construção e o exercício da memória e da história, na medida em que contribuem para a compreensão da sociedade, a partir do entendimento da relação que o indivíduo estabelece com o mundo ao seu redor, contexto no qual os documentos ganham destaque. Renato Crivelli Duarte destaca que, quanto maior for a relevância do sujeito na sociedade, maior será o interesse pelos seus registros pessoais, já que, “[...] de modo geral, isto acontece a partir da influência social que o sujeito detém, sua capacidade de agir na sociedade e, consequentemente, de representá-la” (Duarte, 2013, p. 22). Neste sentido, a institucionalização, para além de representar a monumentalização e a inserção dos arquivos pessoais junto ao contexto coletivo, constitui um ponto de convergência entre “[...] as memórias e identidades, a pesquisa histórica, a fonte de informação, o desejo de transmissão da imagem” (Duarte, 2013, p. 41).
Ademais de engendrarem lembranças e esquecimentos e de permitirem a compreensão de fenômenos culturais, históricos e científicos, os arquivos também permitem a identificação. Conforme Bruno Delmas (2010), a função de identificar-se é uma utilidade tanto psicológica quanto moral, pois é por meio dela que ocorrem as relações sociais, pelas quais cada indivíduo se reconhece como parte de uma história coletiva. É por meio da reivindicação de memórias que os indivíduos constroem e reconstroem suas identidades, já que a função essencial da memória é gerar o sentimento de pertencimento10. Neste sentido, a utilização de recursos de memória, como os arquivos, permite que os indivíduos construam ideias de si e de seu mundo, sintam-se pertencentes a grupos e comunidades e sejam capazes de se localizar social e historicamente.
As razões que levam à acumulação dos arquivos pessoais demonstram a dinamicidade dos processos de formação de memórias e construção de identidades. Por não estarem restritas às razões utilitárias (exigência intransponível de produzir e/ou manter documentos por questões legais), também considera as razões idiossincráticas (mediante o desejo de criar e/ou manter arquivos), subsidiando a construção das memórias e das identidades dos indivíduos. Sobre isso, Richard Cox comenta:
Alguns dos materiais que temos conosco temos para facilitar nossos hábitos de trabalho e compras. Não precisamos ter um cartão de crédito ou cartão de caixa eletrônico, a menos que esperemos precisar deles [...]. Mas esse não é o caso de outros itens que carregamos, como fotografias e recordações pessoais. Mantemos esses documentos conosco porque eles nos fornecem alguma identidade, especialmente quando nos relacionamos com os outros (Cox, 2008, p. 149, tradução nossa, grifo nosso).11
O mesmo autor pontua que arquivos pessoais são usados ativamente como um meio de auxiliar os indivíduos a se conectarem ao seu passado, possibilitando o reconhecimento de pessoas, objetos, experiências, cenários e contextos que, de alguma maneira, se ligam a sua história de vida:
Muitas vezes desejamos voltar e tocar os artefatos criados por nossos ancestrais como uma forma de nos reconectarmos ao passado e aprender sobre de onde viemos; é semelhante às mesmas motivações que nos levam a ler história, visitar museus e locais históricos e colecionar documentos e antiguidades (Cox, 2008, p. 170, tradução nossa, grifo nosso).12
De certa maneira, esta realidade relaciona-se àquilo que Paul Ricoeur (2007) chamou de nível prático ou “memória manipulada”. Trata-se da percepção dos usos e manipulações do conceito de memória individual e coletiva para fins de construções de identidades. Para o autor, a mobilização da memória a serviço de reivindicações de identidades leva tanto aos abusos da memória (mobilização de recursos para promover a lembrança) quanto aos abusos do esquecimento (mobilização ou ausência de mobilizações de recursos para promover o esquecimento), a serviço da reivindicação de identidades. Neste sentido, ao adquirirem acervos pessoais, as instituições de custódia documental conferem anuência ao processo que introduz os documentos acumulados por um indivíduo ao universo memorial da coletividade. Isto não quer dizer, no entanto, que os documentos acumulados por pessoas não integrem a complexa estrutura de formação de memórias coletivas, mas que, ao se reconhecer o interesse público destes conjuntos documentais, eles são chancelados como representativos de um contexto social que é mais amplo do que a vivência individual de seu acumulador. A tomada de consciência acerca da importância dos arquivos pessoais é, portanto, condição essencial para sua inserção nas dinâmicas de preservação patrimonial, pelas quais é possível incentivar o desenvolvimento de políticas públicas voltadas à captação, gestão e disponibilização destes arquivos em prol do cumprimento de sua função social, pautada na garantia de que eles, a despeito da passagem do tempo, preservem a capacidade de viabilizar a prova, a lembrança, o entendimento e a identificação.
Considerações finais
Os conjuntos documentais acumulados por pessoas no decorrer de suas trajetórias pessoais e profissionais constituem parte do patrimônio documental produzido pela humanidade, mesmo que, em um primeiro momento, restrinjam-se às limitações dos espaços e usos privados que lhes são inerentes. À margem da oficialidade que caracteriza os arquivos institucionais, especialmente aqueles originados por força das atividades da administração pública, estes conjuntos documentais se credenciam como elementos imprescindíveis para a construção da memória (individual e coletiva) e para a reconstituição histórica, do que decorrem os processos de institucionalização de arquivos pessoais. Ademais, o reconhecimento da conexão entre indivíduo e sociedade faz com que os arquivos pessoais sejam importantes ferramentas para a compreensão da humanidade, para a reconexão com a herança cultural e para a formulação de lembranças e esquecimentos. Daí a importância de sua inserção em um contexto ampliado de preservação e acesso, assumindo-se sua relevância enquanto fonte de informação social, não mais restrito ao sujeito que o acumulou, mas para toda a sociedade.
Quando adquiridos por instituições de custódia e disponibilizados para acesso, adquirem um potencial latente para a reivindicação de identidades, de modo que, quanto mais abrangente e representativo é o espólio documental de uma sociedade, maiores são as oportunidades de provar, lembrar, compreender e identificar-se, permitindo que memórias possam ser moldadas e remodeladas sempre que necessário. Com isso, não se pode esquecer que as instituições arquivísticas se constituem, junto à sociedade, enquanto equipamentos abalizados para a produção de narrativas, sendo que a pluralidade dos arquivos viabiliza a construção de identidades igualmente plurais e incentiva o reconhecimento público de grupos que, por longos períodos, viram-se privados de identificação e voz no discurso histórico.
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Bruno Delmas (2010) salienta que essas utilidades se desenvolvem paralelamente, com maior ou menor intensidade, mediante os contextos históricos de desenvolvimento da sociedade. Por exemplo: Se, por um lado, a função de prova foi mais evidente durante a Idade Média, por outro, a função de identificar-se ganhou maior relevância na contemporaneidade.
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As reflexões aqui apresentadas derivam do desenvolvimento de pesquisa de mestrado junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UFMG, com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
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O entendimento da memória coletiva, neste trabalho, parte da obra do sociólogo francês Maurice Halbwachs (1990), que introduziu a ideia de que, embora seja sempre os indivíduos que se lembrem dos eventos, é como membro de um grupo que eles se lembram e recriam o passado.
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Isso não significa, no entanto, que os demais documentos não constituam provas das atividades de seus acumuladores, mas que as razões de sua produção/acumulação, por serem menos evidentes, precisam ser investigadas para serem compreendidas. Por isso, após a aquisição de um arquivo pessoal por uma instituição de custódia e acesso, é necessário um minucioso trabalho arquivístico a fim de garantir que os documentos adquiridos continuem a ocupar o lugar lógico que lhe foi devido no processo de acumulação, para que este sentido seja assimilado pelos usuários.
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Para Richard Cox (2008), as necessidades cotidianas podem se manifestar por finalidades legais (como o acúmulo de documentos financeiros que permitem a comprovação de débitos e quitações) ou emocionais (como as fotografias familiares que conectam os indivíduos aos seus antepassados).
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No original: “Even if we cannot read the language of the document, we can usually guess its purpose (if not its specifics) by the form and structure of the information. The most common forms of documents found in personal and family archives suggest reasons why care needs to be given to such documents, a topic I explored some in the first part of this book. Checks chronicle the daily expenses and these daily expenses suggest the nature of our lives and those of our forbears. Receipts, such as for book purchases and vacation travel, reflect our sense and use of leisure time. Personal letters document our network of friends and relatives and often capture the details of both our and their lives. Tax and property records show our financial worth and our social standing. Diaries are more purposeful personal interpretations of one’s life, usually started for a specific reason, such as illnesses or a desire to chart progress in a particular area. Scrapbooks are purposeful compilations of the bits and pieces of documentary evidence that has survived, providing a glimpse into how someone interprets their life or the history of their family. All of these kinds of records emanate from purposes that are important, in many cases crucial, to how someone comprehends the meaning of their life and their position in the present time, place, and Society” (Cox, 2008, p. 140-141).
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Certos autores, como a historiadora francesa Anne Zink (2001), chegam a considerar que a fatia mais importante dos arquivos pessoais se concentra nos documentos que não dispõem de equivalentes nos arquivos institucionais, isto é, aqueles caracterizados pela centralidade do “eu” como produtor e como objeto de enunciação. Trata-se daquilo que o historiador holandês Jacques Presser, na década de 1950, chamou de “ego-documentos”, categoria em que se incluem os diários, as memórias e demais relatos autobiográficos, parte da correspondência, os relatos de viagem e outros documentos que flagram a ótica subjetiva de seu produtor. Não se confundem, é bom notar, com os documentos identitários expedidos pelos órgãos oficiais, como as carteiras de identidade e passaportes. A respeito da noção de “ego-arquivo”, ver Patrice Marcilloux (2013). Sobre os documentos identitários e sua função de inscrever o indivíduo e condicionar sua existência em uma sociedade, ver Claudine Dardy (1990). A respeito da dimensão autobiográfica dos arquivos pessoais, vale sempre revisitar as reflexões de Fraiz (1998).
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Tal entendimento só faria sentido se assumíssemos a equivocada noção de que a autenticidade e a força probatória dos documentos de arquivo resultam da veracidade de seu conteúdo, como demonstrou Camargo (2009b) em rigorosa argumentação.
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No original: “The deliberate destruction of these repositories as a means of obliterating a people’s heritage and memory especially speak to why records, even those seemingly far less important personal papers, can transmit such critical values across generations. A loss of documents translates into a loss of memory and identity, the equivalent of the onslaught of a kind of societal Alzheimer’s. We can make the same assertion with our personal records. Letters, checks, receipts, deeds, birth certificates, diaries, scrapbooks, and other documents all help secure our place in the world. Without the evidence and information found in these records, we lose our moorings, self-assurance, and connection to society and other people.” (Cox, 2008, p. 167).
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As identidades, de acordo com Candau (2019), não são dadas a priori, ou seja, não são inerentes aos sujeitos, mas produtos de suas experiências e sociabilidades, sendo produzidas e modificadas no quadro das relações, reações e interações sociossituacionais, das quais emergem os sentimentos de pertencimento.
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No original: “Some of the material we have with us we have to facilitate our work and shopping habits. We don’t need to have a credit card or ATM card unless we expect to need it […]. But this is not the case with other items that we carry, such as photographs and personal memorabilia. We keep these documents with us because they provide some identity for us, especially as we relate to others” (Cox, 2008, p. 149).
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No original: “We often wish to reach back and touch the artifacts created by our ancestors as a way of reconnecting to the past and learning about where we have come from; it is similar to the same motivations driving us to read history, visit museums and historical sites, and collect documents and antiques” (Cox, 2008, p. 170).
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Declaração de disponibilidade de dados
Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
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Financiamento
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Disponibilidade de dados
Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
06 Out 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
08 Jan 2025 -
Aceito
27 Maio 2025


Fonte: Elaborado pelos autores, com base em Catherine