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Saúde do trabalhador docente e pesquisa: sujeito ou objeto, raramente afeto1 1 - A pesquisa que serviu de base ao artigo conta com apoio do Programa de Excelência Acadêmica (Proex), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), aos projetos educacionais e de pesquisa coletiva dos programas de pós-graduação avaliados como 6 ou 7.

Resumo

O artigo apresenta a construção de uma estratégia de investigação em saúde do trabalhador, segundo o desejo de dizer, profundamente, respeito aos trabalhadores, enfocando o docente da educação básica. Discute aspectos da pesquisa que apontam o sujeito ou objeto da investigação, sugerindo o poder de afetar e ser afetado como oportunidade relevante da pesquisa qualitativa. Um plano das afecções constitui-se mais como uma diferença entre o vivido em comum e as representações identitárias do que propriamente um vivido ou uma representação. Reporta parte de uma tese de doutorado em educação, em andamento, que se utiliza de narrativas da docência, apoiadas em escritas de si, bem como de histórias de vida, ao modo das “escrevivências” e que, de maneira original, apareceram como “escreversões”. O referencial para encontrar o fazer ativo docente provém da Clínica da Atividade. A proposta foi designada por “co(m)textos do trabalho docente: sofrimento e alegria na docência escolar” e encontra-se em experimentação desde o ano de 2019. As situações de engajamento afetivo são fator necessário para perseverar na docência, especialmente aí residem a resistência e a criação, mas sobretudo a capacidade de lutar por melhor e mais saúde na escola, na docência e na construção política da educação escolar.

Docentes; Saúde do trabalhador; Educação; Condições de trabalho; Pesquisa qualitativa

Abstract

The article presents the construction of a strategy for research in worker’s health, according to the profound desire to say, about the workers, focusing on the basic education teacher. It discusses aspects of the research that point to the subject or object of investigation, suggesting the power of affecting and being affected as a relevant opportunity of qualitative research. A level of affections is constituted more as a difference between what is lived in common and identity representations than a lived experience or a representation. The article reports part of an ongoing doctoral thesis in education, which uses narratives of teaching, supported by writing of the self, as well as life stories, in the manner of “escrevivências” (“writtenlived”) and that, in an original way, appeared as “escreversões” (“writtenversions”). The referential to find the active doing of teaching comes from the activity clinic. The proposal was named as “co(m)texts of the teaching work: suffering and joy in school teaching” and has been under experimentation since 2019. The situations of affective engagement are a necessary factor to persevere in teaching; it is at this point where lies resistance and creation, but above all the ability to fight for a better and healthier school, teaching and the political construction of school education.

Teachers; Workers’ health; Education; Working conditions; Qualitative research

Introdução

A ofensiva neoliberal em esfera global tem repercutido em condições precárias e degradantes do trabalho em todos os países do mundo, sustentando-se, precipuamente, nas perspectivas de um Estado mínimo e um Mercado máximo, o que deixa o trabalhador constantemente ameaçado em seus direitos trabalhistas e vulnerável em relação aos mecanismos de proteção contra riscos à saúde (ANTUNES, 2018ANTUNES, Ricardo. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo, 2018.). O campo de atuação do setor sanitário não se esgota em ações assistenciais, de interface com o setor previdenciário e de tratamento ou reabilitação, sendo muito relevantes as ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária orientadas à promoção e proteção da saúde. Essas ações deveriam dizer respeito à experiência viva (intensa) das relações de trabalho, na qual estão a relação do trabalhador com seu trabalho, as relações engendradas entre os atores envolvidos, o papel desenvolvido pelo trabalho na vida dos trabalhadores e as aspirações relacionadas com vocações, talentos e satisfação pessoal, entre tantos fatores implicados com a subjetividade e as emoções.

Uma racionalidade científica conservadora roga pela neutralidade do pesquisador, mantendo-o na condição de sujeito (formula a pergunta de pesquisa, elege a metodologia, controla os procedimentos, interpreta os dados e relata os resultados), e os pesquisados na condição de objeto (alvo, território do estudo, cenário da realidade ou fonte de informação). No desvio dessa posição, estão as perspectivas críticas, colocando, de modo articulado, pesquisador e campo, a pesquisa com compromisso para com os pesquisados, ditos os reais sujeitos da pesquisa. Sobretudo as questões que envolvem a ética na pesquisa com seres humanos são desafiadoras dos modos de pensar a investigação sem preservar a dicotomia sujeitos da investigação e objetos a serem investigados. Contudo, superar a dicotomia não implica superar o par dialético sujeito e objeto (pesquisador e informantes, pesquisador e sujeitos da pesquisa). Ao operar, no interior da pesquisa, um plano de abertura aos afetos, o pesquisador perde o controle do processo e a investigação se desenha segundo a experiência do “pesquisar-com” (FORTUNA; GATTO JÚNIOR; SILVA, 2018). O pesquisador mantém a disposição de acompanhar, mas disposto a ser afetado e a estranhar seus saberes. Pesquisador e pesquisados são multiplicidade de forças, não representações identitárias e a pesquisa ainda pode convocar novos afetos. Dessa forma, a produção do conhecimento migra da explicação da realidade para a construção e apreensão de uma genealogia do sensível, que leva a marca do pesquisador, mas não na função de anunciar verdades, e sim enunciar potências vigentes, insurgentes, desassossegadoras.

Apresentamos, então, uma proposta de pesquisa-intervenção segundo o desejo de convocar afetos no pesquisador e nos pesquisados, de modo a gerar debate e conhecimento. O método vem sendo construído em um programa de pós-graduação, tendo em vista o doutorado em educação relativo à saúde dos professores de educação básica. Os trabalhadores da saúde, da educação e da assistência social, por exemplo, constituem um grupo muito particular de agentes do trabalho, uma vez que atuam diretamente com o público destinatário de suas ações e cuja produção tem um forte componente imaterial. Os produtos imateriais do cuidado, do aprendizado e socioassistenciais estão presentes na forma como trabalhadores e beneficiários interagem: partilha de conhecimentos e informações, práticas de cooperação e colaboração, formação de redes e composição de coletividades socioafetivas. Atuantes em serviços estatais, devido ao trabalho de superior interesse social, esses trabalhadores vêm sofrendo com a desqualificação dos serviços públicos e o desfinanciamento das políticas sociais. As greves de professores são ameaçadas pelos governantes com o desmonte de conquistas e usadas para demonstrar a necessidade de esvaziar o Estado.

Na saúde, na educação e na assistência social, as relações e a organização do trabalho ganham particular expressão e influenciam significativamente o processo saúde-doença do trabalhador. Para investigar esses aspectos da saúde do trabalhador, inclusive seus elementos de resistência e criação, devemos aprofundar nosso acesso ao trabalho imaterial e ao quanto ele opera nas dimensões da subjetividade, imaterialidade dos produtos e engajamento afetivo. Quando nos debruçamos sobre a pesquisa em saúde do trabalhador e escolhemos um grupo muito particular, aquele dos docentes da escola básica, despontam as dimensões do trabalho imaterial, sobretudo aquelas de natureza relacional e que convocam esforços de comunicação, interação, imaginação criativa e dedicação afetiva. Entre os trabalhadores docentes em educação básica, as forças ativas da subjetivação estão implicadas, sobremaneira, na afirmação do saudável e nos processos de determinação do adoecimento. Trata-se de um grupo com intensa história de afastamento do trabalho por motivo de saúde mental. Como falar de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária na proteção à saúde do trabalhador docente sem ascender às situações de elevação ou expropriação da potência de si? A captura de nossa subjetividade tanto leva ao adoecimento como pode decorrer do adoecimento. Já as situações em que construímos ativamente nossa subjetividade ampliam nossa força de existir e, portanto, nossa relação com o saudável (a promoção da saúde). Não sendo um processo individual, essa relação está embasada na emergência de coletivos; na convergência de atos cuidadores, afetivos e de confiança; na exposição aos afetos (potência de sentir, existir e fazer redes) e nas atitudes que investem forças afirmativas (no existir de cada um, sejam os alunos, seja cada agente do trabalho na docência, seja a comunidade escolar).

Se a precarização do trabalho docente (OLIVEIRA, 2004OLIVEIRA, Dalila Andrade. A reestruturação do trabalho docente: precarização e flexibilização. Educação & Sociedade, Campinas, v. 25, n. 89, p. 1127-1144, 2004.) nos faz pensar na sobrecarga de exposições ao adoecimento e ao sofrimento psíquico, entendemos ser necessário acessar essas exposições para revelar a exploração não apenas do corpo que, então, padece, mas da subjetividade que então agoniza entre sucumbir e resistir. Os diferentes contextos vividos no âmbito escolar nos possibilitam muitas formas de abordar os aspectos relacionados à saúde docente e suas formas de expressão na atividade de trabalho. Atravessadas por essa multiplicidade de perspectivas, pesquisas sobre o intensivo (a força afetiva) na atividade de trabalho docente nos permitem uma aproximação singular, viabilizando maior entendimento sobre os aspectos que atuam na saúde dos professores. Muitos estudos aportam subsídios analíticos sobre a saúde dos professores, oferecendo informações estatísticas sobre indicadores de saúde-doença. Entretanto, explorar outras formas de problematizar as questões da saúde docente em relação às condições de trabalho e ambiente escolar, bem como as relações entre subjetividade docente e cultura escolar, pode ampliar as estratégias de investigação e de problematização.

Neste artigo, destacamos a investigação mediante a aproximação ao afetivo, uso dos recursos da narrativa para ascender às relações de trabalho e relações com o trabalho. Localizar em vivências afetivas a memória de afetos no trabalho, mas também sua disrupção. O trabalho como experiência vivida, mas também como experiência revisitada e margem à resistência e criação (apreender e resistir às capturas, favorecendo a construção de um coletivo em luta pela saúde de todos). Pensamos a ativação de narrativas mobilizadas por afetos vividos na experiência de afastamento do trabalho por motivo de adoecimento ou sofrimento psíquico, revisitadas por afetos insurgentes na emergência de um coletivo em interação, capaz de informar-e-aprender os processos de trabalho e seus efeitos de adoecimento e sofrimento psíquico em corpos e subjetividades. Informar-e-aprender refere-se à composição de coletivos de resistência às capturas de si mesmo e do ser docente. O recurso à escrita narrativa não reporta apenas o relembrar, tampouco reviver, mas reengendrar o vivido do adoecimento/sofrimento em potência de resistência/existência, apreendendo sentidos e sensações em aprendizagem e ação (encontrar os recursos psíquicos que fazem a produção de si e de coletivos de resistência local e política). Apresentamos, mediante o interesse com a saúde dos docentes da educação básica, a invenção de um método qualitativo disposto aos afetos.

O afastamento laboral como interface entre saúde e trabalho

Não se sabe se o afastamento médico-pericial do trabalho por motivo de adoecimento e/ou sofrimento psíquico implica ou envolve um afastamento de si, resultado de experiências como impotência, trabalho impedido, “maus encontros”, mas a experiência de afastamento do trabalho em decorrência de um adoecimento ou sofrimento na agonia entre captura e resistência tem muito a dizer sobre produção da saúde (qualidade de vida) e produção de existência (qualidade da vida), sobre a relação que cada docente estabelece com sua própria atividade de trabalho (implicada a atividade de si e de seu coletivo), bem como sobre o si docente, sobre o trabalhador em educação e sobre a docência.

Com base no entendimento de que as questões envolvendo saúde-doença compõem um tema bastante abrangente que não pode ser analisado somente sob uma ótica biomédica, pois a vida se refaz mediante a instauração de novas normas diante das adversidades do meio (CANGUILHEM, 2009CANGUILHEM, Georges. O normal e o patológico. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009.), reportamos a relevância de considerar os aspectos que envolvem a compreensão a respeito das relações e condições com que se desenvolve o trabalho. Estudos desenvolvidos sobre saúde e qualidade de vida docente corroboram o caráter de imprevisibilidade no tratar das questões de saúde e doença. Com as constantes modificações na sua atividade de trabalho – tanto no que tange às questões ligadas à precarização, desvalorização e aumento na demanda de trabalho, como questões ligadas às políticas educacionais –, os docentes acabam por construir cotidianamente diferentes estratégias para melhor desenvolver sua atividade laboral.

As condições “sob as quais os docentes mobilizam as suas capacidades físicas, cognitivas e afetivas para atingir os objetivos da produção escolar podem gerar sobre-esforço ou hipersolicitação de suas funções psicofisiológicas” (GASPARINI; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2005), assim, caso não haja tempo adequado para a recuperação, “são desencadeados ou precipitados os sintomas clínicos que explicariam os índices de afastamento do trabalho por transtornos mentais” (p. 192). Em que pese muitas vezes essa situação ser vista, preconceituosamente, como uma fuga de quem, simplesmente, não quer trabalhar, como se a sobrecarga fosse algo inexpugnável e intrínseca ao fazer docente, seu transcurso é portador de diferentes formas de enfrentamento, contemplando maneiras singulares de sentir, vivenciar e experimentar a situação de afastamento do trabalho.

O afastamento da atividade laboral docente, dentre esses modos singulares de sentir e vivenciar, pode, em algumas situações, servir como um escape momentâneo para amenizar o quadro de tensão ou estresse do docente, visto que o absenteísmo muitas vezes constitui-se numa estratégia de defesa, uma tentativa de amenizar o sofrimento no trabalho (ESTEVE ZARAGOZA, 1999ESTEVE ZARAGOZA, José Manuel. O mal-estar docente: a sala de aula e a saúde dos professores. 3. ed. Bauru: Edusc, 1999.). A experiência de afastamento do trabalho por adoecimento ou sofrimento psíquico pode ser vivenciada como ruptura ou como continuidade nos modos de viver. Para além de uma ameaça de desfiliação daquele ambiente, o estar fora possibilita ao trabalhador “mobilizar afetos silenciados pelo cotidiano normativo e estafante de trabalho e, então, […] vir a descobrir e descobrir-se em outras habilidades e sensibilidades” (RAMOS; TITTONI; NARDI, 2008, p. 212). Contudo, a ausência ao trabalho também representa afastamento da produção da interação, imaginação e criação, que caracterizam a atividade afetiva da docência.

Com o adoecimento, o que era corpo potente e o que era produção e criação sucumbem à impotência e à impossibilidade. Por vezes, ignora-se a falta que faz o exercício de uma ocupação desejada, bem como se ignora a experiência afetiva de encontros, de aprendizados e de interações positivas. Se, de um lado, podemos pensar no afastamento do trabalho como uma forma de explorar novas experiências no fazer laboral, reinventando a própria atividade, descobrindo até mesmo outros modos de trabalhar, de outro, podemos considerar a frustração e a adição de sofrimento por não poder perseverar naquilo que se gosta de fazer, tendo buscado formação, adquirido projeção entre seus pares e consumado investimento de si.

Pesquisar não só as visibilidades do universo escolar sob a ótica do docente, mas ascender ao mundo sensível dos protagonistas do ensino em sua atividade de trabalho podem nos permitir o acesso às nuances, às variações, às sutilezas, às delicadezas, o que significa revelar as forças e intensidades que somente existem nos afetos com o trabalho. Propomos ascender não às doenças e aos sofrimentos que o trabalho provoca, mas à experimentação do adoecimento e do sofrimento no interior da luta do trabalhador por afirmar-se, afirmar seu trabalho, afirmar a potência de saúde do seu trabalho nas vidas de sua comunidade escolar, ou seja, localizar ou problematizar “afastamento da saúde (adoecimento) versus afastamento da produção de vida (captura do poder de renormatizar)”. A pesquisa pensada junto ao universo escolar propõe, com textos de docentes, alcançar os contextos que resultam em afastamento do trabalho, assim como a afirmação de si no ensinar e o alívio em face do sofrimento docente.

Ao buscar o contexto com textos de docentes, pensamos em uma pesquisa que lida com uma escuta sensível ao sofrimento gerado no trabalho docente, no afastamento da escola e nas condições do retorno, mas também na persistência junto ao ensinar. A proposta utiliza narrativas da docência, apoiadas em escritas de si, bem como de histórias de vida, ladroando a tática das “escrevivências” (EVARISTO, 2007EVARISTO, Conceição. Memória e escrevivência – Parte I. In: ALEXANDRE, Marcos A. (org.). Representações performáticas brasileiras: teorias, práticas e suas interfaces. Belo Horizonte: Mazza, 2007. p. 16-21.). Já o referencial para encontrar a atividade de trabalho, não apenas a prescrição, mas o fazer ativo docente, provém da Clínica da Atividade (CLOT, 2007CLOT, Yves. A função psicológica do trabalho. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.). A ideia se instaura na perspectiva de que contextos não estão dados, existe um movimento, os contextos estão sempre se dando. Com textos narrativos, emergentes da interação, essa análise deixa de ser “representativa” para ganhar a “expressão de vivências”: escritas de si, escritas com poder de afetar o sensível de quem lê ou escuta, bem como desacomodar quem se envolve ou deve envolver-se com a organização do trabalho.

O referencial da clínica da atividade

O termo “clínica”, usado nas análises em saúde do trabalhador, reporta às questões relativas à subjetividade nos contextos laborais, o “sujeito” como “objeto” da investigação. Nesse escopo, aparecem a psicodinâmica ou a psicossociologia do trabalho. Na Clínica da Atividade, o conceito de sujeito atribuído ao trabalhador não pode ser delimitado ou definido sem o confronto entre captura e singularização. O trabalhador é reconhecido justamente na sua resistência às tentativas de ser objetivado, assim, não haveria um sujeito trabalhador (uma identidade), mas um campo de alteridade, tampouco um objeto a ser descrito, mas uma atividade que sempre escapa de ser objetivada (conflitos de forças). A perspectiva da Clínica da Atividade possibilita apreender a experiência vivida pelo trabalhador como um colocar-se no devir da criação e invenção do trabalho.

Sob essa ótica, o conhecimento das configurações geradoras do sofrimento amplia a compreensão sobre as relações e condições perante as quais se desenvolve o trabalho (CLOT, 2010CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010.), assim como evidencia as questões que envolvem o processo de afastamento. A ideia é agir para conhecer, propondo ações naqueles contextos em que a atividade laboral se vê apartada de seu poder de agir, visto que o sofrimento no trabalho é ocasionado, principalmente, pela subtração do poder de ação do trabalhador, e não pela falta de capacidade deste diante das exigências organizacionais do trabalho (CLOT, 2010CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010.).

A possibilidade de produção de conhecimento, a partir de informações que, geralmente, não são exploradas em relação ao sentido do trabalho por aquele que o realiza, torna-se um ponto importante a ser analisado, uma vez que o real da atividade compreende “o que não se faz, o que se tenta fazer sem ser bem-sucedido […], o que se desejaria ou poderia ter feito e o que se pensa capaz de fazer noutro lugar” (CLOT, 2010CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010., p. 103-104). Sob a perspectiva da Clínica da Atividade, na docência, o trabalho prescrito compreende, entre outras atividades, o que foi planejado para aulas (incluindo o que é realizado em sala de aula, as atividades extraclasse, as avaliações, as reuniões e demais atribuições designadas). A atividade real, a partir da atividade prescrita, envolve o professor num universo de contextos múltiplos, não se resumindo a ministrar aulas. A aula, não raro, ocorre de uma forma diferente do que foi planejado, por vezes, pode até nem ser concluída pelos mais diversos motivos: relacionados aos alunos, às (más) condições de trabalho, às determinações de instâncias superiores ou imprevistos de toda ordem.

O poder de agir docente, diretamente relacionado à busca de estratégias para um melhor desenvolvimento da atividade de trabalho, engendra ações que auxiliam na resolução de problemas, desde os mais recorrentes até aqueles não tão habituais. Consideram-se, portanto, as ações previstas, as pensadas ou até mesmo as inesperadas, assim como aquelas ações tomadas de súbito para sanar a multiplicidade de situações possíveis de ocorrer nos contextos singulares em cada quotidiano. A apartação do poder de agir pode ser observada quando “os objetivos da ação em vias de se fazer estão desvinculadas do que é realmente importante para [o trabalhador] e quando outros objetivos válidos, reduzidos ao silêncio, são deixados em suspenso” (CLOT, 2010CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010., p. 16). Em especial na docência da educação básica de escola pública, falar sobre os impedimentos do trabalho inclui falar sobre aquele planejamento de aulas – muitas vezes realizado fora do horário de trabalho – que não saiu do papel por inúmeros motivos, sejam estes de ordem institucional e/ou mecanismos externos, sejam decorrentes do contexto do ambiente escolar e extraescolar.

A partir disso, busca-se a descoberta de “um novo objetivo possível, até então ignorado; o reconhecimento de outra coisa que seria realizável através e para além do que acaba de se realizar; ou a identificação no real de possibilidades insuspeitas […] cuja apreensão pode ser feita pela atividade” (CLOT, 2010CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010., p. 16). Uma transformação no sentido da atividade é desejada, na medida em que os docentes, por meio de suas narrativas, contatam afetos ativos, ressignificam e reconstroem sua atividade de trabalho, estabelecendo novas ligações, realimentando ambições profissionais e experimentando novas emoções. A potência decorrente desse sentimento de força e excitação, promovida por afetos e emoções dessa ressignificação da própria atividade de trabalho, pode encontrar, na escrita, um solo fértil para o desenvolvimento de novos modos de se ver, sentir e ser trabalhador, novos modos de se ver, sentir e experimentar a docência.

As escritas de si, do trabalho e sobre si no trabalho trazem o que há de singular naquilo que é vivido e experimentado na própria atividade de trabalho, propondo um outro olhar e aproximando os docentes das suas vivências, possibilitando aos leitores desses escritos um conhecimento mais próximo da realidade daqueles que são afastados do trabalho por adoecimento emergente da própria atividade laboral. Ressaltando o vivido na experiência de trabalho de professores, realizando essa prática sensível por meio de escritas narrativas de história de vida e de trabalho, podemos operar em consonância com a abordagem da Clínica da Atividade, que considera a relação singular do trabalhador com a sua atividade laboral, pressupondo que analisar o trabalho está para além de avaliar a resposta dos trabalhadores ao que é prescrito. Sob uma perspectiva de transformar para compreender e não somente compreender para transformar, a Clínica da Atividade entende que as transformações desejadas somente são efetivas se realizadas pelos próprios trabalhadores (CLOT, 2010CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010.; CLOT; FAÏTA, 2000CLOT, Yves; FAÏTA, Daniel. Genres et styles en analyse du travail: concepts et méthodes. Travailler, Paris, n. 4, p. 7-42, 2000.).

O referencial das escrevivências como um dispositivo de pesquisa

Uma inspiração proveniente das “Escrevivências” (EVARISTO, 2007EVARISTO, Conceição. Memória e escrevivência – Parte I. In: ALEXANDRE, Marcos A. (org.). Representações performáticas brasileiras: teorias, práticas e suas interfaces. Belo Horizonte: Mazza, 2007. p. 16-21.) nos trouxe à formulação de que o desenvolvimento de escritas únicas, autênticas, marcadas por experiências de vida, pode reconstituir e recompor histórias individuais e memórias coletivas. A noção inspiradora é a forma da escrita narrativa. As escrevivências levariam à consciência de um eu coletivo que vive e luta pela vida sem servidão, a vida propulsora de vida. A apreensão do contexto escolar, distintamente da proposta original, vem sem qualquer encontro com forças ancestrais de propulsão da vida, mas forças políticas de composição de um grupo social de elevado interesse social. Por meio de experiências escrevividas, possibilita-se a ressignificação de si (da servidão à propulsão de vida) e de suas vivências, além do remetimento de si e suas vivências aos sentidos políticos que singularizam um trabalho e o engendram em uma melhor compreensão da própria atividade e das forças que capturam os devires da vida de escola.

O exercício de desenvolver escritas docentes, para além de tessituras sobre saúde, trabalho e educação, pode abarcar histórias sobre a experiência da atividade de trabalho docente e as suas marcas deixadas na experiência de vida, compreendendo a complexidade implicada nas histórias de vida de professores. Observa-se que a utilização de narrativas como metodologia de estudos sobre a docência (PASSEGGI; BARBOSA, 2008PASSEGGI, Maria C.; BARBOSA, Tatyana M. N. (org.). Narrativas de formação e saberes biográficos. Natal: UFRN, 2008.) vem sendo cada vez mais recorrente, devido a sua abrangência subjetiva, e, nesse caso, intrínseca à atividade de trabalho docente. Trata-se de acessar o mundo “afetivo” do trabalho, obter visibilidade dos contextos e seus modos de convocar a experiência docente em ato, a práxis desde a experiência vivida em meio a sua atividade de trabalho.

Toda atividade de trabalho é reprodutora de história, vive e encontra suas ferramentas num percurso histórico, portanto, no exercício do trabalho, o trabalhador se revela e se atualiza no tecido histórico da cultura humana. Portadora de uma história dos afetos, a escrevivência revela não um trabalho e um sujeito ou o trabalhador objetificado pelo trabalho, mas o real da vida no real do trabalho (mundo dos afetos). A escrevivência é dos afetos, por isso reporta o posicionamento que cada trabalhador tomou diante das normas com as quais se deparou. O trabalhador não simplesmente acolhe as normas do trabalho, antes as confronta e as altera, “fazendo escolhas, arriscando-se, fazendo uso dos seus gostos, da sua inteligência, da sua história e da sua sensibilidade, recombinando valores e critérios na busca por uma adequação à sua realidade, o que leva cada ato de trabalho a ser único de trabalhador para trabalhador” (HOLZ; BIANCO, 2014HOLZ, Edvalter Becker; BIANCO, Mônica de Fátima. Ergologia: uma abordagem possível para os estudos organizacionais sobre trabalho. Cadernos EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 12, esp. p. 494-512, 2014., p. 498). Um plano das afecções constitui mais uma diferença entre o vivido em comum e as representações identitárias do que propriamente um vivido ou uma representação (CLOT, 2010CLOT, Yves. Trabalho e poder de agir. Belo Horizonte: Fabrefactum, 2010.; LARROSA, 2008LARROSA, Jorge. Tecnologias do eu e educação. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (org.). O sujeito da educação: estudos foucaultianos. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 35-86.).

Por meio de escrevivências, as histórias de vida e de docência possibilitam ao docente contar e recontar, escrever e reescrever a sua práxis. Sob a perspectiva do próprio trabalhador, busca-se viabilizar a problematização a respeito dos desdobramentos e atravessamentos das relações de trabalho no tocante à saúde docente, promovendo, assim, uma maior visibilidade dos contextos que perpassam do contentamento ao sofrimento no trabalho. A partir das marcas sensíveis presentes em cada escrita, busca-se a atividade de trabalho e o trabalhador, observando o estigma entre aqueles que, por vezes, se afastam e são apontados como professores problemas. Busca-se ampliação da visibilidade às diferentes experiências vividas pela docência, trazendo à tona desde questões pertinentes à qualidade de vida, ao prazer e à alegria com e na profissão, até aquelas referentes às situações de afastamento do trabalho.

Trata-se de poder contar essas histórias, assim como de poder discorrer sobre as histórias contadas, construindo e reconstruindo o trabalho, o fazer docente próprio. Escritas de si, escritas docentes ou histórias de vida e profissional são portadoras de uma história individual, bem como portadoras da história de um grupo social. As narrativas congregam características expressivas, dotadas do poder de afeto sobre si, sobre aquele que lê ou escuta e, espera-se, com poder de desacomodar a formulação de políticas e práticas de gestão. Ao narrarem a si próprios, os professores transmitem não somente suas experiências vividas, mas também as experiências historicamente constituídas em suas vivências a partir do lugar que ocupam, social e culturalmente, produzindo uma imagem particular, carregada de memórias, determinações e forças de imposição da vida em trajetórias de escola. O ato de narrar-se como uma forma de ressignificar uma experiência vivida nos remete à proposição de que “ao narrar-se a pessoa diz o que conserva do que viu de si mesma” (LARROSA, 2008LARROSA, Jorge. Tecnologias do eu e educação. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (org.). O sujeito da educação: estudos foucaultianos. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 35-86., p. 69). Essa forma de escrita, sem a intenção de ser neutra, reflete quem é essa pessoa que escreve, o que pensa, o que sente, de onde vem e o que a constitui. Essa condição admite a possibilidade do trabalhador escrevivente colocar-se num espaço aberto entre a criação e os fatos, tecendo textualidades marcadas pela sua realidade.

A criação de elos entre a nossa escrita com outras histórias que nos inspiram, bem como o estabelecimento de pontes e diálogos – mostrando o quanto nos instigam, como se articulam e se compõem ideias – nos permitem uma construção mais rica, permeada de significados e de vivências que, ao mesmo tempo, edificam e remodelam um contexto. Os desafios e experimentações que ocorrem no processo da escrita envolvem transgressão de regras e inversão de regularidades. Trata-se – a escrita – da abertura de um espaço no qual aquele que escreve “não para de desaparecer” (FOUCAULT, 2001FOUCAULT, Michel. O que é um autor. In: FOUCAULT, Michel. Estética: literatura e pintura, música e cinema. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 264-298. (Ditos e escritos, v. 3)., p. 269).

As narrativas, “seja na qualidade de quem as viveu, seja na qualidade de quem as relata” (BENJAMIN, 1994BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Obras escolhidas, v. 1)., p. 205), são formas artesanais de comunicação, nas quais é impressa a marca daquele que narra, deixando seus vestígios nas coisas narradas. Essa contação, que é única e singular, ao mesmo tempo dá voz para uma coletividade, um lugar de enunciação solidário e identificado com o contexto da atividade laboral docente. Procura-se, assim, trabalhar com uma narrativa que traduza a experiência de um corpo, com suas memórias vividas, suas marcas, suas sensações e emoções. Afinal, ao tratarmos de saúde, seja em pesquisa, seja na clínica, “de alguma forma, é sempre de narrativas que tratamos” (PASSOS; BARROS, 2015PASSOS, Eduardo; BARROS, Regina Benevides de. Por uma política da narratividade. In: PASSOS, Eduardo; KASTRUP, Virgínia; ESCÓSSIA, Liliana da (org.). Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina, 2015. p. 150-171., p. 150).

Essas narrativas escrevividas nos permitem uma escuta do trabalho, realizada por meio de conversas e escritas, as conversas sobre as escritas e as escritas sobre as conversas. É nessa medida que escrevivências podem apontar a captura dos devires da vida de escola: em lugar de corpos potentes, a impotência. É possível que o narrar experimente as linhas de fuga da ressingularização: “escrever é traçar linhas de fuga, que não são imaginárias, que se é forçado a seguir, porque a escritura nos engaja nelas, na realidade, nos embarca nelas. Escrever é tornar-se, mas não é de modo algum tornar-se escritor. É tornar-se outra coisa” (DELEUZE; PARNET, 2004DELEUZE, Gilles; PARNET, Claire. Diálogos. Lisboa: Relógio d’Água, 2004., p. 35). Esse tornar-se outra coisa tem muito a ver com a entrega daquele que escreve, com a sua obra, a sua escrita. Dessa forma, o docente vai tecendo sua história entrelaçada com a sua história profissional, podendo construir, num caso de afastamento, novos modos de interpretar o trabalho, bem como as questões relacionadas ao afastamento.

A escrita é como um caminho que perpassa o mundo interior, aquele do interlocutor, dos pensamentos, das ideias e do mundo exterior, com o qual irá constituir pontes, promover trocas (DELEUZE; PARNET, 2004DELEUZE, Gilles; PARNET, Claire. Diálogos. Lisboa: Relógio d’Água, 2004.). Embora cada um tenha sua própria forma distinta de vivenciar uma dor ou sofrimento, as escritas docentes visam alcançar esse sentimento, não sua categorização. É um movimento fluido que perpassa os limites de uma criação restrita a uma análise sobre o trabalho docente. Compreende uma escrita que, singular, se enriquece à medida que as ideias de quem escreve se encontram com outras histórias que as atravessam, tornando-se parte integrante daquela produção.

O processo ativo de recriação e ressignificação de si, proporcionado pelas memórias nas histórias de vida e do trabalho docente, evidencia-se na medida em que “são as mediações entre a memória da trajetória passada e o desejo de projetos de futuro” e entre o eu e os muitos outros que favorecem a própria tessitura de uma imagem de si (BRAGANÇA, 2012BRAGANÇA, Inês Ferreira de Souza. Memória, narração e experiência: um “círculo virtuoso”. In: BRAGANÇA, Inês Ferreira de Souza. Histórias de vida e formação de professores: diálogos entre Brasil e Portugal. Rio de Janeiro: UERJ, 2012. p. 95-130., p. 112). As histórias biográficas, presentes nas narrativas, funcionam como “biografemas” (COSTA, 2011COSTA, Luciano Bedin. Estratégias biográficas: biografema com Barthes, Deleuze, Nietzsche e Henry Miller. Porto Alegre: Sulina, 2011.), eventos de uma vida, a ponto de nos fazer sentir uma espécie de amigo íntimo, desses que conhecem todos os pensamentos e sofrimentos do amigo. Na medida em que nos percebemos de algum modo nesses traços de sensação, vivência, afecção, nos misturamos a eles, aí podemos tomar em mãos as rédeas de um destino a construir, a principiar.

Considerações finais

A pesquisa (em fase inicial) se insere em uma tese de doutorado na área da Educação, tendo os referenciais da Clínica da Atividade como caminho do pensamento, e os da Escrevivência (modificada do original) como estratégia de intervenção, reconhecendo na docência a luta pelo direito ao bem-estar no exercício do fazer de escola. A construção de escrevivências de vida e trabalho com o propósito de dar maior visibilidade aos contextos vividos pelos protagonistas do labor docente, além de abordar a rotina da atividade de trabalho e as diferentes experiências vividas, compreende o que compete à sua saúde, buscando seja uma melhor qualidade de vida no trabalho (produção de saúde), seja a melhor qualidade da vida (produção de existência). A proposta foi designada por “co(m)textos do trabalho docente: sofrimento e alegria na docência escolar” e encontra-se em experimentação desde 2019. Da pesquisa, emergem a alegria do ensinar, do fazer docente e do poder de agir desses trabalhadores. O sofrimento no trabalho, que leva ao adoecimento, também é um sofrimento no afastamento que se ressente da ausência no trabalho. Essas escritas, na medida em que abandonam o lastro autobiográfico, o contato com os antecedentes individuais e coletivos de trajetória de vida, aproximam-se da fabulação de histórias, isto é, versões (autoafecção ou afetos resultantes da experiência de si), não mais escrevivências, mas “escreversões”, como potência de afirmação de inéditas linhas de luta.

Ao dizerem de si, os professores dizem também dos outros, dos dirigentes, dos alunos, das famílias e das políticas públicas de educação e de saúde, dizem das normas antecedentes e daquelas em processo de destituição/constituição, dos efeitos da duração do trabalho e do aqui e agora da atividade. A ideia se instaura na perspectiva de que contextos não estão dados, existe um movimento, os contextos estão sempre se dando. Busca-se uma escuta sensível em relação ao sofrimento gerado no trabalho, no afastamento da escola e nas condições do retorno, bem como nas perspectivas referentes à persistência junto ao ensinar e ao prazer do fazer do ensino. Nesse sentido, busca-se encontrar o que há no ressignificar e se reinventar a partir de si e do próprio trabalho para compreender as transferências de afetos e de signos como saúde docente, força de subjetivação e condição da promoção e convocação da saúde.

Para além disso, faz com que as escritas de si e do trabalho possibilitem uma maior visibilidade para o vivido na docência, na qual se experimentam, por um lado, as vivências de sofrimento relacionadas à precarização das condições e do processo de trabalho, e, de outro, as vivências do prazer possibilitadas pela interação e produção de conhecimento e pelo reconhecimento do espaço escolar como espaço de cooperação intelectual e trocas afetivas. A compreensão das relações e condições perante as quais se desenvolve o trabalho docente torna-se fundamental para o estudo sobre a saúde dos professores e qualidade de vida docente.

O entendimento sobre as questões implicadas no processo saúde-doença do professor não pode ser analisado desde o ponto de vista da saúde, como se estivessem presentes apenas fatores biológicos. Acredita-se na importância de compreender os sentidos da atividade de trabalho docente, por meio daqueles que protagonizam e vivenciam os contextos envolvidos nesse fazer, assim, prioriza-se a atenção para os caminhos que surgem a partir das escritas, destacando a pluralidade (e suas singularizações) que constitui as experiências humanas na atividade de trabalho. As situações de engajamento afetivo são fator necessário para perseverar na docência, especialmente aí residem resistência e criação, mas sobretudo a capacidade de lutar por melhor e mais saúde na escola, na docência e na construção política da educação escolar.

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    - A pesquisa que serviu de base ao artigo conta com apoio do Programa de Excelência Acadêmica (Proex), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), aos projetos educacionais e de pesquisa coletiva dos programas de pós-graduação avaliados como 6 ou 7.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    18 Ago 2020
  • Aceito
    21 Out 2020
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