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AFETIVIDADE E METACOGNIÇÃO EM PERCEPÇÕES DE ESTUDANTES SOBRE SUA APRENDIZAGEM EM FÍSICA

AFECTIVIDAD Y METACOGNICIÓN EN PERCEPCIONES DE ESTUDIANTES SOBRE SU PROPIO APRENDIZAJE DE FÍSICA

AFFECTION AND METACOGNITION IN STUDENTS' PERCEPTIONS ABOUT THEIR OWN PHYSICS LEARNING

RESUMO:

A complexidade dos processos de ensino e aprendizagem em Física é um desafio tanto para professores como para pesquisadores em educação em ciências. Neste trabalho, investigou-se como as percepções dos estudantes sobre sua aprendizagem em Física se relacionam a aspectos cognitivos, afetivos e metacognitivos que permeiam tais processos. Foram analisadas as respostas de alunos de Ensino Médio a um questionário com perguntas abertas. Utilizaram-se como fundamentação teórica a perspectiva vigotskiana da relação entre a cognição e a afetividade e os conhecimentos metacognitivos. Concluiu-se que as percepções dos estudantes sobre suas aprendizagens, expressas em conhecimentos metacognitivos, colocam, por um lado, o professor e sua perspectiva de ensino em posição central nas explicações sobre os êxitos e, por outro, apontam características pessoais como as principais responsáveis pelos fracassos.

Palavras-chave:
Aprendizagem; Afetividade; Metacognição.

RESUMEN:

La complejidad de los procesos de enseñanza y aprendizaje de Física es un reto para profesores e investigadores en educación en ciencias. En este trabajo, se investigó cómo las percepciones de los estudiantes sobre su aprendizaje de Física se relacionan con aspectos cognitivos, afectivos y metacognitivos que permean tales procesos. Se anlizaron las respuestas de alumnos de bachillerato a un cuestionario con preguntas abiertas. La perspectiva vygotskyana de la relación entre cognición y afectividad y los conocimientos metacognitivos constituyeron el marco teórico del estudio. Se concluyó que las percepciones de los estudiantes sobre su propio aprendizaje, en términos de conocimientos metacognitivos, ponen de manifiesto, por un lado, la posición central del docente y de su perspectiva de enseñanza en las explicaciones de los éxitos y, por otro, las características personales como las principales responsables por los fracasos.

Palabras clave:
Aprendizaje; Afectividad; Metacognición.

ABSTRACT:

Physics teaching and learning processes' complexity is a challenge for both teachers and researchers in science education. In this study, we investigated how students' perceptions of their own physics learning are related to cognitive, affective and metacognitive aspects involved in such processes. Answers given by high school students to a questionnaire with open questions were analyzed. The Vygotskian perspective of relationship between cognition and affectivity and metacognitive knowledge were used as theoretical framework. It was possible to conclude that the students' perceptions about their learning, expressed in metacognitive knowledge, put the teacher and his teaching's perspective in a central position in the explanations of success. On the other hand, the questionnaire's answers indicated personal characteristics as the main responsible for failure.

Keywords:
Learning; Affectivity; Metacognition.

Introdução

De nosso convívio em sociedade, percebemos que a Física é frequentemente apontada, tanto por pessoas que já completaram a escolarização como por alunos de Ensino Médio, como uma disciplina difícil de ser aprendida. Consideramos que tão complexo como aprender Física é ensiná-la na escola, considerando-se os conhecimentos e os interesses dos estudantes, os distintos contextos e os objetivos do ensino de ciências para a formação do cidadão. No entanto, iniciativas e propostas para a melhoria do ensino de Física, com implicações para aprendizagem dos alunos, têm estado cada vez mais presentes em relatos de experiências didáticas inovadoras e em pesquisas acadêmicas.

A complexidade e as problemáticas que permeiam os processos de ensino e aprendizagem em Física constituem-se, portanto, em desafios permanentes para os professores e, ao mesmo tempo, alimentam as investigações que visam aprofundar a compreensão sobre o fenômeno educativo. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é investigar como as percepções dos estudantes sobre sua aprendizagem em Física se relacionam a aspectos cognitivos, afetivos e metacognitivos, que permeiam tais processos.

Para tanto, analisamos as respostas escritas dos estudantes a um questionário de perguntas abertas. Esse questionário foi aplicado no contexto de uma pesquisa de doutorado em Ensino de Ciências, cujo objetivo geral era investigar a aprendizagem de Física dos alunos ao longo do tempo. As coletas de registros foram realizadas em 2013, com uma turma de 20 alunos de 2º ano do Ensino Médio de uma instituição federal de ensino, no Brasil.

É importante destacar que este estudo não se restringe ao levantamento das percepções dos estudantes, mas busca compreendê-las em sua relação com aspectos cognitivos, afetivos e metacognitivos. Também as considera como um elemento que permite mais aproximação com relação aos processos de ensino e aprendizagem em Física, pois tais percepções nos fornecem a possibilidade de considerar a perspectiva dos próprios alunos para tentar compreender o fenômeno educativo de forma mais global e profunda.

Fundamentação teórica

Temos como pressuposto, segundo a perspectiva vigotskiana, que os aspectos afetivo e cognitivo constituem os sujeitos e, portanto, não podem ser considerados de forma isolada um do outro, pois se influenciam mutuamente. Por isso, concordamos com Vigotski (2009VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009. 494 p.) quando critica a separação entre as dimensões cognitiva e afetiva do funcionamento psicológico, adotando uma abordagem unificadora entre elas.

Quem separou desde o início o pensamento do afeto fechou definitivamente para si mesmo o caminho para a explicação das causas do próprio pensamento, porque a análise determinista do pensamento pressupõe necessariamente a revelação dos motivos, necessidades, interesses, motivações e tendências motrizes do pensamento, que lhe orientam o movimento nesse ou naquele aspecto. (VIGOTSKI, 2009VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009. 494 p., p. 16, grifo nosso)

De acordo com a teoria sócio-histórica-cultural vigotskiana, o conhecer humano envolve não uma relação direta entre o sujeito que conhece e o objeto a ser conhecido, mas sim uma relação mediada. Concordamos com Pino (1997PINO, A. O biológico e o cultural nos processos cognitivos, em linguagem, cultura e cognição: reflexão para o ensino de ciências. In: ENCONTRO SOBRE TEORIA E PESQUISA EM ENSINO DE CIÊNCIAS, 1997, Belo Horizonte. Anais... Campinas: UNICAMP, 1997, p. 5-24.) quando afirma que

Embora a atividade de conhecer pressuponha a existência no sujeito de determinadas propriedades que o habilitam a captar as características dos objetos, há fortes razões para pensar que o ato de conhecer não é obra exclusiva nem do sujeito, nem do objeto, nem mesmo da sua interação {direta}, mas da ação do elemento mediador, sem o qual não existe nem sujeito nem objeto de conhecimento. (PINO, 1997PINO, A. O biológico e o cultural nos processos cognitivos, em linguagem, cultura e cognição: reflexão para o ensino de ciências. In: ENCONTRO SOBRE TEORIA E PESQUISA EM ENSINO DE CIÊNCIAS, 1997, Belo Horizonte. Anais... Campinas: UNICAMP, 1997, p. 5-24., p. 6)

Já os fenômenos afetivos referem-se a experiências subjetivas, que revelam a forma como cada sujeito "é afetado pelos acontecimentos da vida ou, melhor, pelo sentido que tais acontecimentos têm para ele" (PINO, 2000PINO, A. A Afetividade e vida de relação. Campinas, UNICAMP, Faculdade de Educação, 2000. (mimeo)., p. 128). Em outras palavras, consideramos que a afetividade é a capacidade que os indivíduos têm de serem positiva ou negativamente afetados, com mais ou menos intensidade, por uma dada situação, de forma que cada um deles estabelece um tipo de relação afetiva com essa situação e lhe atribui um sentido particular. De acordo com Efklides (2006EFKLIDES, A. Metacognition and affect: what can metacognitive experiences tell us about the learning process?. Educational Research Review, Nova Iorque, v. 1, n. 1, p. 3-14, jan./jun. 2006.), "{...} o afeto positivo, por um lado, alivia o esforço realizado pela pessoa e, por outro, aumenta o interesse e a sensação de gostar, apoiando, assim, o engajamento futuro em tarefas iguais ou semelhantes" (EFKLIDES, 2006EFKLIDES, A. Metacognition and affect: what can metacognitive experiences tell us about the learning process?. Educational Research Review, Nova Iorque, v. 1, n. 1, p. 3-14, jan./jun. 2006., p. 8).

Para Arantes (2003ARANTES, V. A. A afetividade na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus Editorial: 2003, p. 7-12., p. 7), o tema da afetividade é "raramente abordado e frequentemente ocultado nas encruzilhadas do cotidiano escolar". Em especial, entendemos que aspectos afetivos e cognitivos permeiam os processos de ensino e aprendizagem e também a reflexão dos estudantes acerca do que facilita ou dificulta suas aprendizagens. Fazemos tal consideração porque o conceito de afetividade se refere às influências das relações interpessoais nas singularidades de cada sujeito.

Os estudantes são afetados de diferentes modos por suas relações com os outros colegas, com o professor, com as atividades propostas e com o conhecimento científico escolar. Ademais, não podemos ignorar o fato de que cada indivíduo traz consigo um conjunto de experiências prévias, construídas anteriormente na escola e em outros espaços, as quais podem igualmente afetar positiva ou negativamente o seu aprendizado, pois "{...} cada sujeito elabora, reage e lida de modo singular com as mesmas determinações e influências sociais" (OLIVEIRA; REGO, 2003OLIVEIRA, M. K.; REGO, T. C. Vygotsky e as complexas relações entre cognição e afeto. In: ARANTES, V. A. (Org.). A afetividade na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus Editorial , 2003, p. 13-34., p. 23).

Algumas pesquisas internacionais em Psicologia já apontam para relações entre metacognição e afetividade (EFKLIDES, 2006EFKLIDES, A. Metacognition and affect: what can metacognitive experiences tell us about the learning process?. Educational Research Review, Nova Iorque, v. 1, n. 1, p. 3-14, jan./jun. 2006.; EFKLIDES, 2011EFKLIDES, A. Interactions of metacognition with motivation and affect in self-regulated learning: the MASRL Model. Educational Psychologist, Nova Iorque, v. 46, n. 1, p. 6-25, jan./mar. 2011.). Zohar e Barzilai (2013ZOHAR, A.; BARSILAI, S. A review of research on metacognition in science education: current and future directions. Studies in Science Education, Nova Iorque, v. 49, n. 2, p. 121-169, out. 2013., p. 121), em um artigo de revisão de literatura sobre pesquisas em metacognição no ensino de ciências, no contexto internacional, afirmam que

{...} o campo da metacognição na educação em ciências está em fase de crescimento e expansão, e a metacognição está cada vez mais integrada na investigação sobre os objetivos fundamentais da educação científica. (ZOHAR; BARZILAI, 2013ZOHAR, A.; BARSILAI, S. A review of research on metacognition in science education: current and future directions. Studies in Science Education, Nova Iorque, v. 49, n. 2, p. 121-169, out. 2013., p. 121)

No Brasil, Rosa e Pinho Alves (2008, p. 1117) apontam para

{...} a necessidade de que a temática metacognição e ensino de física seja aprofundada tanta em termos de uma maior discussão no campo teórico, fornecendo subsídios para pesquisadores, como em termos de sua aplicação no contexto da sala de aula. (ROSA; PINHO ALVES, 2009ROSA, C. W.; PINHO ALVES, J. A dimensão metacognitiva na aprendizagem em física: relato das pesquisas brasileiras. Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, Vigo, v. 8, n. 3, p. 1117-1139, jul./set. 2009., p. 1117)

Assim, consideramos também que o conceito de metacognição e, em especial, os conhecimentos metacognitivos podem nos auxiliar a interpretar as reflexões dos estudantes sobre o que consideram que auxilia ou prejudica os processos de ensino e aprendizagem.

Para Flavell, Miller e Miller (1999FLAVELL, J. H.; MILLER, H. P.; MILLER, S. A. Desenvolvimento cognitivo. Tradução de Claudia Dornelles. Porto Alegre: Artmed, 1999. 341p.), a metacognição é definida de forma ampla como sendo o conhecimento ou atividade cognitiva que toma como seu objeto a cognição ou que regula qualquer aspecto da iniciativa cognitiva. Para esses autores, a metacognição se refere tanto ao conhecimento metacognitivo como à autorregulação e ao monitoramento cognitivos.

O conhecimento metacognitivo se refere ao conhecimento dos próprios recursos cognitivos. Ele pode ser subdividido em três dimensões: conhecimento metacognitivo sobre pessoas, sobre tarefas e sobre estratégias.

O conhecimento metacognitivo sobre pessoas, de acordo com Figueira (2003FIGUEIRA, A. P. C. Metacognição e seus contornos. Revista Iberoamericana de Educación, Madri, v. 1, n. 32, p. 1-20, maio/ago. 2003. Disponível em: Disponível em: <http://www.rieoei.org/deloslectores/446Couceiro.pdf> . Acesso em: 10 mar. 2015.
<http://www.rieoei.org/deloslectores/446...
, p. 3), refere-se ao "conhecimento ou crença que a pessoa tem de si enquanto ser cognitivo, em tarefas cognitivas diversas, sobre os fatores ou variáveis que atuam ou interagem e de que maneiras afetam os resultados dos procedimentos cognitivos". A dimensão das tarefas diz respeito ao conhecimento que o sujeito tem sobre a natureza, as exigências e os critérios da atividade que irá realizar. Já o conhecimento metacognitivo sobre estratégias se relaciona com o conhecimento sobre os meios mais prováveis para se alcançar os objetivos cognitivos (FLAVELL; MILLER; MILLER, 1999FLAVELL, J. H.; MILLER, H. P.; MILLER, S. A. Desenvolvimento cognitivo. Tradução de Claudia Dornelles. Porto Alegre: Artmed, 1999. 341p.). Para os autores, o conhecimento metacognitivo caracteriza-se por combinações ou interações de duas ou três dessas dimensões.

Metodologia

Realizamos uma investigação de caráter qualitativo (MOREIRA; CALEFFE, 2008MOREIRA, H.; CALEFFE, L. G. Metodologia da pesquisa para o professor pesquisador. 2. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2008. 245 p.). As coletas de registros foram realizadas em 2013, quando 20 alunos de 2º ano do Ensino Médio de uma instituição federal de ensino no Brasil responderam a um questionário sobre a disciplina Física II3 3 Na instituição locus da investigação, o ano letivo é dividido em dois semestres, de modo que os alunos cursam as disciplinas de Física I, II, III e IV nos quatro primeiros semestres do Ensino Técnico Integrado ao Ensino Médio, respectivamente. Quando responderam ao questionário sobre a disciplina do segundo semestre, os alunos estavam no quarto semestre. , cursada no ano letivo anterior. As perguntas do questionário foram as seguintes: 1 - O que você considera que aprendeu nas aulas de Física II? 2 - O que você acha que influenciou para você aprender o que mencionou acima? 3 - O que você considera que não aprendeu nas aulas de Física II? 4 - O que você acha que influenciou para você não aprender o que mencionou acima?

Neste trabalho, analisamos as respostas às perguntas 2 e 4

O questionário foi um dos instrumentos de uma coleta de registros mais ampla, para uma pesquisa de doutorado, ou seja, os alunos realizaram, antes e após responderem às perguntas, outras atividades sobre o que havia sido ensinado em Física II. Vale ressaltar que a pesquisadora atuou como observadora participante em 2012 e 2013. As aulas foram ministradas nos dois anos por outro professor e a perspectiva de ensino que norteou as aulas foi o ensino por investigação (AZEVEDO, 2004AZEVEDO, M. C. P. S. Ensino por investigação: problematizando as atividades em sala de aula. In: CARVALHO, A. M. P. (Org). Ensino de Ciências. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004, p. 19-33.).

Resultados e discussão

As respostas dos 20 alunos da turma investigada à pergunta 2 (O que você acha que influenciou para você aprender o que mencionou acima?) aparecem no Quadro 1 abaixo.

Quadro 1
Dados relativos às respostas à pergunta 2 do questionário

É interessante notar que, em algumas respostas, os estudantes parecem expressar não seus sentimentos com relação ao que, de fato, facilitou a sua aprendizagem, mas sim o que eles, de forma geral, consideram mais adequado para a sua aprendizagem. Por exemplo, quando a Aluna 12 escreveu Ter ido às aulas e ter prestado atenção, foram mencionados por ela, de forma genérica, elementos que costumam permear o imaginário dos estudantes sobre o que os ajuda a aprender, devido à própria cultura escolar e às concepções relativas à escola vigentes na sociedade. Não se pode afirmar com certeza que a aluna expressa uma percepção sobre si nem que faz uma reflexão de caráter metacognitivo. Seguem os outros exemplos de dados desse tipo: {...} meu esforço; sempre estar estudando (Aluna 2); o assunto das matérias (Aluno 5); as aulas {...} (Aluno 20); dedicação {...} (Aluno 21).

No entanto, na maioria das respostas presentes no Quadro 1, ao escreverem sobre o que entendem que facilitou suas aprendizagens, os alunos colocaram justificativas explícitas para as suas percepções e/ou mencionaram elementos do contexto vivenciado nas aulas, o que evidencia a presença do aspecto metacognitivo. A análise desses dados permitiu identificar duas dimensões que influenciaram a aprendizagem dos estudantes, de acordo com seus próprios pontos de vista: características da perspectiva de ensino do professor e características pessoais dos alunos.

A primeira dessas dimensões, mencionada por 17 alunos, diz respeito a características da perspectiva de ensino do professor (exemplos, experimentos, explicações, trabalhos práticos, entre outros) que facilitaram a aprendizagem, como, por exemplo, nos seguintes dados: Experimentos em sala e no laboratório (Aluno 4); aulas práticas (Aluna 6); aprender com exemplos do dia a dia, como da panela de pressão ou do azulejo e sua dilatação (Aluna 9); a forma que o conteúdo foi apresentado (Aluno 13); explicações com a participação dos alunos (Aluna 18).

O estabelecimento de relações entre o que era apresentado em sala de aula e o cotidiano dos alunos foi mencionado por quatro alunos como uma característica da perspectiva de ensino do professor que facilitou suas aprendizagens: as colocações com o dia a dia (Aluna 7); as associações com o cotidiano e com a parte química (Aluna 16).

Houve também sete menções à presença da experimentação como sendo um elemento que ajudou os alunos a aprender, como nos seguintes dados: exemplos práticos do laboratório (Aluna 11); experiências em sala de aula e laboratório (Aluna 7). Ainda que os estudantes não tenham mencionado como realizar um experimento contribuiu para suas aprendizagens (o que pode remeter apenas à ampliação do aspecto motivacional gerado pela atividade experimental), suas percepções sobre o papel da experimentação concordam com os resultados da pesquisa realizada por Araújo e Abib (2003ARAÚJO, M. S. T.; ABIB, M. L. V. S. Atividades experimentais no ensino de física: diferentes enfoques, diferentes finalidades. Revista Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 176-194, jun. 2003.), que afirmam que "{...} o uso de atividades experimentais como estratégia de ensino de Física tem sido apontado por professores e alunos como uma das maneiras mais frutíferas de se minimizar as dificuldades de se aprender e de se ensinar Física" (ARAÚJO; ABIB, 2003ARAÚJO, M. S. T.; ABIB, M. L. V. S. Atividades experimentais no ensino de física: diferentes enfoques, diferentes finalidades. Revista Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 176-194, jun. 2003., p. 176, grifo nosso).

Ademais, concordamos com Oliveira (2010OLIVEIRA, J. R. S. A perspectiva sócio-histórica de Vygotsky e suas relações com a prática da experimentação no ensino de Química. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Santa Catarina, v. 3, n. 3, p. 25-45, nov. 2010., p. 36-37): "{...} os fatores que fazem com que os alunos gostem e sejam atraídos pelas atividades experimentais {...} também podem despertar a dúvida, a curiosidade, o desejo de compreender o porquê dos fenômenos observados" (OLIVEIRA, 2010OLIVEIRA, J. R. S. A perspectiva sócio-histórica de Vygotsky e suas relações com a prática da experimentação no ensino de Química. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Santa Catarina, v. 3, n. 3, p. 25-45, nov. 2010., p. 36-37).

Em outras palavras, as influências mútuas entre as dimensões cognitiva e afetiva foram evidenciadas na presença da experimentação como uma atividade que auxilia a aprendizagem dos alunos, pois,

{...} da mesma forma que o desenvolvimento do pensamento conceitual é fortemente influenciado pelos desejos e emoções, estes também são influenciados pelos conceitos internalizados ao longo da história individual e coletiva. (OLIVEIRA, 2010OLIVEIRA, J. R. S. A perspectiva sócio-histórica de Vygotsky e suas relações com a prática da experimentação no ensino de Química. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, Santa Catarina, v. 3, n. 3, p. 25-45, nov. 2010., p. 36)

No estudo piloto de nossa tese de doutorado, também houve, dois anos após a instrução formal na escola, muitas menções dos estudantes aos experimentos realizados previamente (MAXIMO-PEREIRA, 2011MAXIMO-PEREIRA, M. Dimensões da aprendizagem de Física em médio prazo para os estudantes: um estudo preliminar. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS - ENPEC, 8., e CONGRESO IBEROAMERICANO DE INVESTIGACIÓN DE ENSEÑANZA DE LAS CIENCIAS - CIEC, 1., 2011, Campinas. Anais... Rio de Janeiro: Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, 2011. v. 1, p. 1-12.). A importância que os alunos parecem atribuir à experimentação "concorda com o que tem apontado a pesquisa em ensino de ciências sobre o papel essencial das experiências para a visualização de fenômenos científicos e como fator de motivação para os estudantes" (MAXIMO-PEREIRA, 2011, p. 8).

O aspecto dialógico mencionado pela Aluna 18 (Explicações com a participação dos alunos), tanto no que se refere às explicações do professor como à participação dos alunos em tais explicações, parece ser devido ao modo como o professor conduzia as suas aulas e também a características do ensino por investigação, perspectiva que norteava a sua prática profissional.

Por tudo isso, interpretamos que características da perspectiva de ensino do professor permeiam o conhecimento metacognitivo sobre estratégias dos estudantes investigados, pois eles apontaram como meios mais prováveis para favorecer suas aprendizagens as relações com o cotidiano - trazendo exemplos do dia-a-dia (Aluna 11) - e o uso da experimentação - as práticas feitas tanto em sala de aula como em laboratório (Aluna 18).

Apenas quatro dados relativos a características da perspectiva de ensino do professor puderam ser associados ao conhecimento metacognitivo sobre tarefas. Por exemplo, quando o Aluno 20 mencionou as aulas como sendo o que o influenciou a aprender, ele não explicitou que aspectos ou características dessas aulas contribuíram para tal. No entanto, reconheceu que, de forma geral, um dos critérios possíveis a se seguir para conseguir aprender na escola é ir às aulas. Ou seja, ele remeteu à tarefa, mas não especificou a estratégia necessária para que a tarefa contribuísse, de fato, para a sua aprendizagem.

Nove dos 20 alunos mencionaram diretamente o próprio docente como tendo contribuído para suas aprendizagens: primeiramente o professor, que soube ensinar muito a bem matéria (Aluna 2); a forma de ensinar do professor (Aluna 7); com certeza... o modo em que o professor deu a matéria (Aluna 11); as maravilhosas explicações do professor (Aluna 22). Em todos os casos, a menção ao professor apareceu acompanhada de uma justificativa. Por exemplo, a Aluna 1 citou o professor, as aulas dinâmicas e as práticas feitas em laboratório como sendo aquilo que a influenciou a aprender, ou seja, a presença do professor apareceu atrelada às características de sua perspectiva de ensino. Por esses dados, podemos inferir que as aulas dinâmicas e as atividades práticas feitas em laboratório foram características da perspectiva de ensino do professor que levaram a Aluna 1 a mencioná-lo como tendo contribuído para a sua aprendizagem. Igualmente, no caso da Aluna 11, ela também explicou qual seria o modo em que o professor deu a matéria: dando exemplos, trazendo exemplos do dia-a-dia, exemplos práticos do laboratório.

Interpretamos que esses nove alunos expressaram, de alguma forma, que estabeleceram uma relação afetiva positiva com o professor, pois tal relação contribuiu positivamente para suas aprendizagens, pelo menos, de acordo com seus próprios pontos de vista.

No que diz respeito às menções aos bons professores (Aluna 10 e Aluno 21) e à dedicação dos professores (Aluna 17), entendemos que a presença dos professores (no plural) se refere ao docente da disciplina e à pesquisadora.

Ainda que tivéssemos esclarecido, desde o início da pesquisa, o papel da pesquisadora durante as aulas, os estudantes sabiam, pela formação acadêmica dela e por sua prática profissional, que se tratava de uma professora de Física, mesmo que em outro contexto e em outra instituição de ensino. Além disso, o caráter de observação participante da investigação realizada propiciou contatos frequentes, na sala de aula e em outros espaços do ambiente escolar, entre a pesquisadora e os alunos, a fim de observar as atividades, esclarecer dúvidas quando solicitada pelos estudantes, fornecer exemplos adicionais, etc. Acreditamos que tais elementos do contexto da pesquisa podem ter influenciado os estudantes a se referirem à pesquisadora como professora.

Características pessoais (estudo, interesse, vontade de passar de ano, etc.), ainda que com menor frequência (dados de seis alunos), também apareceram como tendo influenciado positivamente a aprendizagem: meu esforço e estar sempre estudando (Aluna 2); ter prestado atenção (Aluna 12); a vontade de passar de período (Aluno 20). As características pessoais dos alunos podem ser relacionadas ao conhecimento metacognitivo sobre pessoas, pois eles foram capazes de identificar suas características de aprendizagem (ter prestado atenção {Aluna12}), suas potencialidades e seus interesses (interesse pelos assuntos {Aluna 16}; a vontade de aprender; gostei muito, tenho até meu caderno do 2º período {Aluna 17}).

Sobre esse último dado, o fato de a aluna ter gostado do que aprendeu é algo que ela reconheceu como sendo importante para ter aprendido. Além disso, a Aluna 17 trouxe um elemento para justificar que gostou, de fato, do que aprendeu: mencionou que guardou o caderno relativo à matéria de Física II. Ela parece ter estabelecido algum tipo de relação afetiva positiva com aquilo que aprendeu ou, ainda, algum tipo de relação afetiva positiva (gostar muito) com o que lhe foi apresentado como um fator que a influenciou a aprender. Esse é um exemplo que evidencia a inter-relação entre aspectos cognitivos e afetivos na reflexão de caráter metacognitivo feita pela aluna.

De forma geral, identificamos aspectos afetivos presentes explicitamente nos seguintes dados do Quadro 1: interesse pelos assuntos (Aluna 16); gostei muito, tenho até meu caderno do 2º período (Aluna 17); a vontade de passar de período (Aluno 20); as maravilhosas explicações do professor (Aluna 22). Como não havia uma pergunta específica sobre esses elementos no questionário, entendemos que essas foram menções espontâneas dos estudantes a relações afetivas positivas que estabeleceram com o que foi ensinado, com o contexto escolar e com o professor.

Passando à análise das respostas à pergunta 4 ( O que você acha que influenciou para você não aprender o que mencionou acima? ), elas aparecem no Quadro 2 abaixo.

Quadro 2
Dados relativos às respostas à pergunta 4 do questionário

Os dados do Quadro 2 foram construídos com base nas respostas de apenas 12 alunos. Os demais ou não responderam ou informaram que não havia nada que tivesse influenciado negativamente suas aprendizagens. Esses dados (ou a falta deles) podem indicar ser mais difícil para os alunos expressarem o que não os ajudou a aprender do que aquilo que contribuiu positivamente para a aprendizagem, visto que, sobre esse último aspecto, todos os 20 sujeitos respondentes ao questionário se manifestaram na pergunta 2.

Algumas características pessoais foram identificadas por dez alunos como não tendo contribuído para suas aprendizagens: incompetência minha; por não ter exercitado mais (Aluno 3); minha dificuldade em gravar algumas fórmulas (Aluna 18); falta de dedicação (Aluno 19); não estudei o suficiente (Aluno 21). Tais dados refletem, como identificado anteriormente, o conhecimento metacognitivo sobre pessoas dos estudantes, pois, por intermédio desse conhecimento, o aluno se reconheceu como ser cognitivo, apontando suas dificuldades (tenho um pouco de dificuldade em questões de gráfico, mas isso é um "problema" que vem do ensino fundamental {Aluna 11}) e suas próprias características que dificultaram a aprendizagem (falta de atenção, falta de dedicação, falta de interesse pelos temas {Aluno 19}).

Houve apenas quatro alunos que citaram sua própria dificuldade para aprender o que foi ensinado na disciplina Física II. Por exemplo, a Aluna 10 identificou que a dificuldade na matéria anterior foi o que prejudicou sua aprendizagem em Física II: tive bastante dificuldade com Física I. Já a Aluna 18 citou sua dificuldade em gravar algumas fórmulas. Diante dos problemas na aprendizagem de Física identificados pela literatura da área de ensino de ciências e de uma concepção (que parece ser mais ou menos consensual entre as pessoas comuns e que é bastante difundida socialmente) de que a Física é uma disciplina de difícil aprendizagem por parte dos estudantes de Ensino Médio, consideramos que, no caso dos alunos investigados, houve poucas menções a tal dificuldade.

Apenas dois alunos atribuíram suas dificuldades para aprender algum assunto de Física a características do contexto ou da perspectiva de ensino do professor. A Aluna 7 mencionou a pressão das últimas provas. Entendemos que, para essa aluna, o sentimento de pressão vivenciado à época fez com que ela estabelecesse uma relação afetiva negativa com a situação. Entretanto, para outro aluno, poderia ocorrer que a pressão das provas finais fosse um fator que o levasse a estudar e a tentar aprender, ou seja, que ele estabelecesse uma relação afetiva positiva com a situação de pressão. Vemos, assim, que um mesmo acontecimento pode desencadear relações afetivas positivas ou negativas, isto é, ajudar ou prejudicar a aprendizagem, dependendo das características pessoais do aluno considerado.

Sobre características da perspectiva de ensino do professor que não contribuíram para a aprendizagem de um assunto de Física, a Aluna 22 escreveu que o professor não entrou muito no assunto; não houve exercícios; não foi matéria de prova. Ela identificou, em termos do conhecimento metacognitivo sobre estratégias, que fazer exercícios é algo importante para que aprenda; em termos de conhecimento metacognitivo sobre tarefas, a aluna relacionou o critério da atividade (cobrança de determinado tema na avaliação) à aprendizagem desse conteúdo, pois considera que, se o assunto fosse "cobrado" em uma prova, ela teria estudado e aprendido. Ao afirmar que o professor não entrou muito no assunto, ela expressou, em forma coloquial, que o fato de o professor não ter abordado muito o assunto a levou a não aprendê-lo.

Todavia, a mesma aluna, na questão 2, previamente analisada, forneceu a seguinte resposta sobre o que teria auxiliado sua aprendizagem: as maravilhosas explicações do professor; meu interesse pela matéria (Aluna 22). Pela relação entre as duas respostas, entendemos que a aluna estabeleceu uma relação afetiva positiva com o professor, se interessou pela disciplina e, nesse contexto, conseguiu apontar características da prática do professor que pontualmente não contribuíram para sua aprendizagem, mas tal fato não indica uma "culpabilização" do docente, visto que, para ela, houve também maravilhosas explicações do professor. Ao contrário, ela valorizou as explicações do professor, pois, como ele não entrou muito no assunto, logo, ela não aprendeu. Se ele tivesse feito suas maravilhosas explicações, ela teria aprendido.

Por tudo isso, entendemos que as pouquíssimas menções à perspectiva de ensino do professor como tendo provocado problemas na aprendizagem dos estudantes ocorreram não pela presença do professor e de sua figura de autoridade na sala de aula no momento da coleta de registros; tampouco porque os alunos se sentiram constrangidos ou não dispunham de um ambiente propício para tais considerações, mas porque, de forma geral, os alunos, de fato, não atribuíram as dificuldades de aprendizagem encontradas à perspectiva de ensino do professor, como no dado relativo à Aluna 17 (Nada vindo da sala de aula ou dos professores. Minha dificuldade mesmo).

Outro dado que fortalece tal conclusão é o relativo à Aluna 11 (Tenho um pouco de dificuldade em questões de gráfico, mas isso é um "problema" que vem do ensino fundamental). Ela promoveu o apagamento do professor como responsável pela dificuldade de aprender, mas identificou o que prejudicou a sua aprendizagem (o trabalho com gráficos e a interpretação dos mesmos) e localizou no tempo a origem de sua dificuldade (o Ensino Fundamental). Tal aluna expressou conhecimento metacognitivo sobre pessoas em forma bem elaborada e a sua não menção ao professor e à sua perspectiva de ensino ocorreram, de fato, porque ela atribuiu a outros elementos o seu problema de aprendizagem. Ademais, a dificuldade com gráficos no Ensino Fundamental parece tê-la afetado fortemente e, mesmo que não tenha sido superada, auxiliou na compreensão de seu processo de aprendizagem atual.

Em resumo, características do contexto escolar e da perspectiva de ensino do professor foram mencionadas por apenas dois alunos como sendo responsáveis por dificultar a aprendizagem sobre determinado conteúdo da disciplina. Assim, entendemos que, de forma geral, os alunos fizeram poucas associações, no âmbito do conhecimento metacognitivo sobre tarefas, entre os critérios das atividades propostas para que aprendessem e aquilo que dificultou a aprendizagem de um assunto específico de Física.

Três alunos remeteram ao conhecimento metacognitivo sobre estratégias ao identificarem que não terem feito exercícios sobre os assuntos trabalhados foi algo que influenciou negativamente suas aprendizagens − Por não ter exercitado mais (Aluno 3); não fazer exercícios (Aluno 13); não houve exercícios (Aluna 22). Ainda no âmbito das estratégias, apenas o Aluno 13 afirmou que não relacionar com coisas do cotidiano dificultou a sua aprendizagem. Sobre a importância da identificação de tais aspectos para a aprendizagem, concordamos com Andretta et al. (2010ANDRETTA, I.; SILVA, J. G.; SUSIN, N.; FREIRE, S. D. Metacognição e Aprendizagem: como se relacionam?, PSICO (PUCRS), Porto Alegre, v. 41, n. 1, p. 7-13, jan./mar. 2010., p. 7) quando afirmam que "torna-se essencial que os alunos estejam conscientes dos seus estilos e estratégias de estudo e aprendizagem, que sejam incentivados a pensar sobre o que objetivam com o seu estudo e a avaliar a qualidade das abordagens adotadas {...}."

De forma geral, identificamos aspectos afetivos presentes explicitamente nos seguintes dados do Quadro 2: a pressão das últimas provas (Aluna 7) e falta de dedicação; falta de responsabilidade; falta de interesse pelos temas (Aluno 19). Entendemos que essas foram menções espontâneas dos estudantes a relações afetivas negativas que estabeleceram com o contexto escolar e com o que foi ensinado.

Considerações finais

Neste trabalho, analisamos as respostas dos estudantes a um questionário aberto com perguntas acerca de suas percepções sobre os processos de aprendizagem relativos às suas aulas de Física, ministradas um ano antes. Consideramos aspectos cognitivos, afetivos e metacognitivos para fundamentar nossas análises.

Ao analisar as respostas às perguntas 2 e 4 do questionário, foi possível perceber que o conhecimento metacognitivo sobre pessoas envolveu características pessoais dos estudantes investigados. Já o conhecimento metacognitivo sobre tarefas esteve relacionado a características do contexto e a características da perspectiva de ensino do professor. O conhecimento metacognitivo sobre estratégias se referiu a características pessoais e a características da perspectiva de ensino do professor.

Assim, de forma geral, as reflexões de caráter metacognitivo realizadas pelos estudantes estiveram associadas tanto a aspectos cognitivos (na medida em que a metacognição abrange também o conhecimento das formas por intermédio das quais o sujeito acredita que aprende mais facilmente) como afetivos, pois as vivências dos estudantes foram essenciais para a reflexão sobre seus processos de aprendizagem. Portanto, a afetividade, tal como a definimos, fez-se necessária para explicar dificuldades de aprendizagem de estudantes que, ao destacarem elementos explicitamente vinculados à metacognição, evidenciaram que tais dificuldades podem não somente estar relacionadas a fatores cognitivos do sujeito que aprende, mas também às formas por intermédio das quais ele é afetado pelas relações que estabelece no ambiente escolar.

É importante esclarecer que a defesa da importância dos aspectos afetivos nos processos de ensino e aprendizagem de Física, a qual fazemos ao longo deste texto, não tem como base a frequência deles nos dados da pesquisa, expressos nos Quadros 1 e Quadros 2, como se poderia supor. Pelas análises empreendidas, é possível perceber que tais aspectos (i) aparecem nos dados dos alunos, ainda que não sejam solicitados explicitamente, e (ii) são essenciais para se entender a presença de alguns dados no que os alunos escreveram. Em outras palavras, em uma atividade de forte caráter metacognitivo, como era o questionário utilizado como instrumento de coleta desta pesquisa, os aspectos afetivos se fizeram presentes nos textos de alguns alunos e nos auxiliaram a ampliar e aprofundar as análises.

Ao mencionarem o que os levou a aprender, os alunos atribuíram certo protagonismo ao professor e à sua perspectiva de ensino. Assim, consideramos que as relações que os estudantes estabeleceram no ambiente escolar mais contribuíram do que prejudicaram suas aprendizagens, pelos menos na perspectiva dos próprios alunos. Esse é mais um argumento que fortalece nosso entendimento de que uma relação afetiva positiva foi estabelecida entre alunos e professor, por intermédio de sua perspectiva de ensino, de forma que eles não reconheceram no docente ou em sua forma de ensinar as causas de sua dificuldade para aprender.

Houve também pouca frequência de menções a características pessoais que favorecessem a aprendizagem. Isso pode estar associado ao fato de que, mesmo tendo contato com uma perspectiva de ensino mais dialógica e aberta à participação dos alunos, como é o caso do ensino por investigação, eles podem não ter se reconhecido como sujeitos do processo de ensino e aprendizagem. Acreditamos que esse não reconhecimento pode estar relacionado à cultura escolar de forma mais ampla, na qual os estudantes estão imersos historicamente e a qual é fortemente influenciada pela concepção de que o professor é o centralizador do processo de ensino e aprendizagem.

Contudo, as menções ao que não auxiliou a aprendizagem de Física II revelaram o protagonismo do aluno como sujeito da aprendizagem e o apagamento do professor, de sua perspectiva de ensino e do contexto escolar, já que houve pouquíssimas menções a esses três últimos elementos nos dados. Ao mencionarem suas características pessoais como tendo dificultado suas aprendizagens, os alunos se reconheceram como seres cognitivos, o que aconteceu com mais frequência nesse caso do que quando eles se referiram àquilo que os auxiliou a aprender. Tal fato parece indicar que os alunos refletem mais sobre suas próprias características diante de situações de dificuldade de aprendizagem do que quando conseguem aprender, pelo menos de acordo com suas próprias percepções sobre esses processos.

Em síntese, este trabalho permitiu evidenciar que as percepções dos estudantes investigados sobre suas aprendizagens, expressas em conhecimentos metacognitivos, colocam, por um lado, o professor e sua perspectiva de ensino em posição central nas explicações sobre os êxitos e, por outro, apontam características pessoais como as principais responsáveis pelos fracassos. Diante desses resultados, salientamos que a relação afetiva positiva estabelecida entre professor e estudantes pode explicar as percepções aparentemente contraditórias sobre a influência desses últimos nos processos de aprendizagem. Tal fato reafirma a indissociabilidade entre cognição e afetividade no contexto educativo e aponta para a importância de que o professor desenvolva atividades e discussões de caráter metacognitivo junto aos estudantes, de modo a promover oportunidades de reflexão e de tomada de consciência sobre as influências mútuas entre os aspectos sociais e pessoais nos processos de ensino e aprendizagem.

REFERÊNCIAS

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  • 3
    Na instituição locus da investigação, o ano letivo é dividido em dois semestres, de modo que os alunos cursam as disciplinas de Física I, II, III e IV nos quatro primeiros semestres do Ensino Técnico Integrado ao Ensino Médio, respectivamente. Quando responderam ao questionário sobre a disciplina do segundo semestre, os alunos estavam no quarto semestre.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Mar 2015
  • Aceito
    05 Abr 2016
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