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Considerações sobre Bioética

DOSSIÊ (A) - A BIOÉTICA / DOSSIÊ (B) - LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL

Considerações sobre Bioética

Glaci T. Zancan

Professora do Departamento de Bioquímica, Universidade Federal do Paraná

Desde que foi proposta a estrutura da dupla hélice para o DNA, em 1953, a sucessão de desencobertas científicas no campo da biologia molecular possibilitou em apenas duas décadas a manipulação do genoma bacteriano. Paralelamente, as descobertas na área de fisiologia celular tornaram possível o cultivo de células animais e vegetais em laboratório e a manipulação de embriões. Isto propiciou a manipulação gênica de organismos superiores.

A rapidez com que uma descoberta científica passa do laboratório para aplicação vem fazendo com que as descobertas na área de Biologia estejam sendo apropriadas por patenteamento na medida em que elas se sucedem (Vide Tabela).

A dimensão do mercado para os produtos obtidos a partir dos seres vivos vem se ampliando sucessivamente. Em 1984 se estimava que o mercado para o ano 2000 seria de 60 bilhões de dólares, atualmente a estimativa é de 150 bilhões.

A associação entre o potencial econômico da nova biotecnologia e rapidez dos acontecimentos na área vem fazendo com que a sociedade se aperceba da dimensão das alterações que podem ser induzidas na vida da humanidade por essas novas descobertas.

Tecnicamente, hoje é possível construir microorganismos, animais ou plantas com a habilidade genética que se desejar. Esse fato permite interferir no meio ambiente, na pecuária, na agricultura, na produção de alimentos e medicamentos. Além disso, já é possível conhecer a herança genética de um indivíduo, determinar a sanidade e o sexo de embriões, manipular o genoma de células somáticas e recolocá-las no organismo para aliviar os problemas de erros genéticos.

Todas essas possibilidades levantam problemas éticos que precisam e devem ser discutidos por toda a sociedade.

Há, evidentemente, técnicas que por serem mais fáceis já se encontram em execução entre nós. A primeira delas é uso da análise de DNA para mapeamento genético desde a fase pré-natal. Essa metodologia permite o diagnóstico de doenças genéticas, a sexagem de embriões e a identificação de paternidade. O mapeamento genético levanta a discussão sobre o controle legal da informação face ao fato de que os dados poderão servir como fonte de discriminação de indivíduos.

A manipulação de embriões, a possibilidade de se obter cópias idênticas, bem como o uso do tecido fetal coloca o problema da definição do "status" moral do embrião como da legitimidade do uso de técnicas que tornem clones humanos, produtos passíveis de apropriação comercial.

Outra discussão, que deve ser levada a efeito, é sobre a terapia genética em células somáticas, autorizada em fase experimental. É uma terapia extremamente cara e exige condições de laboratório e de infra-estrutura hospitalar que poucas instituições possuem. Como as fontes financeiras, para salvar vidas, são limitadas há um sério problema ético na definição dos beneficiários dessa terapia, especialmente em países aonde há milhões fora do sistema de saúde.

Há uma grande defasagem entre os avanços científicos e tecnológicos e as discussões filosóficas e éticas sobre as vantagens e desvantagens dessas novas técnicas. Como o interesse econômico é enorme, corre-se o risco de marginalizar a maioria da população do planeta. Por este motivo, é imperativo que toda a sociedade participe da discussão sobre as implicações dessas tecnologias nas condições de vida da humanidade no próximo século, especialmente, dada a enorme diferença cultural e ética entre indivíduos e nações.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1995
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