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Cultura material escolar: a escola e seus artefatos

RESENHAS

Castro, César Augusto (Org.). Cultura material escolar: a escola e seus artefatos (MA, SP, PR, SC e RS, 1870-1925). São Luis: EDUFMA, Café & Lápis, 2011

Fernanda Ramos Oliveira Prates

Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Centro de Ciências da Educação. Av. Madre Benventura, nº 2007, Itacorubi, Florianopólis, Santa Catarina, Brasil. CEP: 88035-001

Pesquisas contemporâneas realizadas no campo dos estudos da História da Educação têm frequentemente se preocupado em conhecer e reconhecer o cerne das instituições educativas não a partir de uma abordagem direcionada a uma visão macro e generalizante, focada nas diretrizes legalistas estatais, e como estas se corporificavam nos documentos oficiais produzidos pela escola. Pelo contrário, as investigações têm se inquietado com o interior escolar, com suas práticas e culturas e de que forma foram sendo apropriadas em face de mecanismos de controle menores, materializadas ou não dentro das próprias instituições.

Levando em consideração essa proeminente preocupação historiográfica em relação ao cotidiano escolar e o que tal cotidiano construiu em termos de subjetivação e identificação pelos sujeitos escolares de forma individual e coletiva, é que esse livro privilegia o aprofundamento de um núcleo analítico ainda reticente na historiografia da educação brasileira: a cultura material escolar da escola primária.

A obra Cultura Material Escolar: a escola e seus artefatos (MA, SP, PR, SC, e RS, 1870-1925), publicada em 2011 pela Editora da Universidade Federal do Maranhão, é parte do resultado do projeto integrado de pesquisa nacional Por uma teoria e uma história da escola primária no Brasil: investigações comparadas sobre a escola graduada (1870-1930), coordenado pela professora-doutora Rosa Fátima de Souza (Unesp/Araraquara), mas especificamente pelo trabalho designado ao grupo composto pela equipe do eixo temático número 2: "Exame da materialidade da escola primária graduada pelo estudo da cultura material".

O livro é o produto dessa cooperação coletiva de equipes dos estados do Maranhão, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, após um processo de conferência das análises e discussões das diferentes fontes, que foram confrontadas em caráter comparativo.

A estrutura da obra envolve a apresentação, na qual o organizador, professor doutor Cesar Augusto Castro, enfatiza os esforços realizados pelos pesquisadores destas regiões em localizar, coletar e analisar os mais diversificados documentos para que os leitores possam compreender a real importância do papel dos "objetos" que fizeram parte do dia a dia escolar no recorte temporal de 1870-1925, de sua importância para a história da educação brasileira e, mormente, para a história da educação de seus respectivos estados.

O prefácio, da coordenadora do projeto nacional,mostra o quanto o campo historiográfico se beneficiou com os estudos comparativos, assim como realça a fecundidade de seu teor para a gênese de novas categorias de análise no campo da cultura material escolar.

Além da apresentação e do prefácio, o livro está subdivido em três capítulos que abordam temáticas relacionadas às potencialidades dos estudos. Problematizam as relações entre os materiais escolares, a indústria escolar e a escola como mercado; as frágeis condições de guarda e preservação da cultura material; a cultura material como construtora de subjetividades; além de questões relacionadas à legitimidade dos discursos pedagógicos com vistas a uma possível aproximação com essa cultura.

Além destes tópicos, mereceram destaque as operações atinentes à prática da pesquisa educacional-histórica, protagonizadas por alunas de pós-graduação e de graduação em suas respectivas regiões, proporcionando aos leitores, mais que uma reflexão sobre o papel do historiador da educação nesse novo panorama, a possibilidade de ampliação de novos meios e métodos de investigação e, portanto, um possível aprimoramento do exercício analítico acerca da cultura material no ensino primário.

O livro ainda traz curiosidades sobre as questões em tela, com a apresentação de quadros da cultura material escolar dos estados pesquisados, evidenciando a intricada natureza das escolas primárias como instituições promotoras de educação e cultura.

A partir da definição de uma problemática de pesquisa (cultura material escolar) e da delimitação de objetivos específicos, foram criadas as seguintes categorias de classificação de materialidade escolar: indumentária; jogos e brinquedos; livros, material de higiene; material de limpeza; materiais visuais, sonoros e táteis para o ensino; mobília; organização/escrituração da escola; ornamentos; prédios escolares; e utensílios da escrita.

O livro mobiliza e coteja um número variado e significativo de documentos e uma séria preocupação com suas interpretações, a partir de pressupostos metodológicos investigativos atinentes ao campo de estudo. Privilegia, a todo o momento, a proposição de questionamentos, como também o diálogo estreito e assíduo com aportes teóricos consolidados no campo historiográfico, tudo em linguagem clara, mas sem perder o caráter de cientificidade.

É importante assinalar um aspecto significativo do trabalho, que é o rigor metodológico na construção das considerações finais de cada capítulo: hipóteses bem-formuladas e indícios evidenciados com o intento de oferecer um conhecimento histórico confiável.

Ao tratar da cultura material da escola primária brasileira de cinco estados, cada um com suas singularidades, o livro oferece aos leitores um panorama histórico geral de nosso sistema de ensino, desvelando concepções pedagógicas, políticas de expansão da educação pública e práticas e métodos de ensino de acordo com as especificidades de cada região contemplada. Fica claro que tais particularidades, que constituíram desafios metodológicos no trabalho comparativo ao longo da pesquisa, transparecem também na leitura, que faz perceber a necessidade de se criar um vocabulário comum para melhor desenvolver as reflexões e estreitar os laços, apesar das diversidades regionais, mas preservando-as.

Na intenção de recortar esse vasto debate sobre a cultura material escolar, os autores buscam instigar o leitor interessado nestas questões a adentrar no universo ainda embrionário do mundo material da educação primária e nos desafios de ampliar tais motes, estimulando as reflexões acerca da importância de preservação do patrimônio da história escolar como mais uma forma de compreender os desafios do nosso sistema educacional.

Apesar de não se tratar de um livro de resultados definitivos, tendo em vista que ainda há muito a investigar acerca da temática, as últimas impressões sinalizam que todos os capítulos deixam explícita a gama de possibilidades e limites para estudos futuros. A obra é relevante para os estudos da história da educação maranhense, paulista, paranaense, catarinense, gaúcha e brasileira, não apenas por evidenciar aspectos da cultura material escolar, que não devem ser olvidados, mas por constituir uma importante referência por seu objetivo de instigar diversificadas pesquisas na área e pela busca do olhar sobre o tempo presente.

Texto recebido em 12 de dezembro de 2012.

Texto aprovado em 05 de fevereiro de 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2013
  • Data do Fascículo
    Set 2013
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