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UMA VIDA DEDICADA A EDUCAÇÃO EMANCIPATÓRIA DE BASES DEMOCRÁTICAS

A LIFE DEDICATED TO EMANCIPATORY EDUCATION FROM DEMOCRATIC BASES

UMA VIDA DEDICADA A LA EDUCACIÓN EMANCIPATORIA DESDE BASES DEMOCRÁTICAS

O livro A educação no Brasil e no mundo: prioridades e desafios, organizado por Marcelo Ivan Melek e Sarita Aparecida de Oliveira Fortunato, foi lançado recentemente pela editora CRV (Melek e Fortunato, 2022MELEK, M. I.; FORTUNATO, S. A. de O. (org). A educação no Brasil e no mundo: prioridades e desafios. Estudos em homenagem à profa. Dra. Naura Syria Carapeto Ferreira. Curitiba: CRV, 2022.).

A obra tem como propósito homenagear a professora Naura Syria Carapeto Ferreira; tendo sido organizada por dois de seus orientandos de pós-graduação stricto sensu. Marcelo é doutor em direito e mestre em educação, advogado militante e professor em diversos cursos de pós-graduação, tanto lato quanto stricto sensu, no Brasil e no exterior. Sarita é mestre e doutora em educação na linha de políticas públicas e gestão em educação, docente em cursos de graduação e pós-graduação, é pedagoga aposentada da Rede Municipal de Ensino de Curitiba.

Trata-se de Festschrift coletivo, cujos autores dos artigos são profissionais que atuam na área da educação e que, em algum momento de suas vidas, tiveram contato com a homenageada; são, portanto, amigos, colegas e ex-orientandos.

A homenageada tem sua trajetória profissional de mais de seis décadas marcada pelo compromisso ético com uma educação emancipadora e de qualidade. Profícua pesquisadora se debruçou, sobretudo, para compreender e desenvolver questões afetas às políticas públicas e à gestão democrática da educação. Reconhecida pela profunda erudição, é autora e organizadora de diversas obras, merecendo destaque também sua zelosa atuação para a criação do Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade Tuiuti do Paraná, do qual foi a primeira coordenadora.

Considerando a heterogeneidade dos autores, em que pesem suas ligações com o campo da educação, a fim de organizar a obra, os dezesseis capítulos do livro, que apresentam conteúdos específicos, foram divididos em três eixos estruturantes, quais sejam: Políticas Públicas e Gestão da Educação; Formação de Professores; e Educação, Trabalho e Direitos Humanos.

O livro tem início com o eixo que trata das políticas públicas e gestão da educação. No primeiro texto, Carlos Roberto Jamil Cury delineia um painel abrangente sobre os desafios da educação hoje. Apresenta um quadro complexo da educação nacional, no qual conquistas são suspensas e os direitos relacionados à educação são revogados. Essa situação se reflete claramente no abandono do Plano Nacional de Educação, cada vez mais inviabilizado por supostas reformas regulatórias.

Luiz Fernandes Dourado demonstra as disputas nas políticas e diretrizes da preparação dos profissionais do magistério para a Educação Básica, discutindo sobre o grande enfrentamento que envolve o sistema oficial, instituições e agentes do campo educacional que buscam garantir uma adequada formação inicial e continuada de seus profissionais, mas cuja realidade é caracterizada por retrocessos de políticas e marcos regulatórios. Reivindicando a continuidade da luta por uma concepção sócio-histórica, pautada na perspectiva da gestão democrática e da formação integral, exigindo o rompimento com a visão tecnocrática que fundamenta a Base Nacional Comum Curricular.

Yvelise Freitas de Souza Arco-Verde lida com as limitações e os desafios que o tempo impõe a escola. Ela aborda a necessidade de uma transformação fundamental do tempo vivido na escola. Tomando emprestadas ricas inspirações da mitologia, busca refletir sobre a necessidade de rever a própria concepção de tempo em momentos que exigem tomadas de decisões educacionais profundas. Discorre sobre o tempo escolar legalizado e como cultura escolar. Chama a atenção para a mediação do tempo em um período pandêmico, caracterizado pela utilização de tecnologias substitutas do ensino presencial. Tais aspectos, imbricados aos tempos sociais, demandam grande sensibilidade dos gestores em relação às políticas educacionais.

Comemorando os 30 anos da criação dos primeiros grupos de pesquisa de política educacional no Brasil, Jefferson Mainardes se debruça sobre a evolução histórica dos grupos de pesquisa de polícia educacional e o papel e importância destes, inclusive sob os aspectos sociais e culturais.

Encerrando esse primeiro eixo, José Augusto Pacheco e Helena Natália Pereira Inês nos apresentam uma proposta curricular inclusiva. Os autores discutem a possibilidade de humanizar a educação em um mundo globalizado, repensando a gestão curricular nas escolas por meio de práticas educacionais comprometidas com a inclusão, a diversidade e a equidade. Salientam que o currículo foi uma ferramenta eficaz na criação de exclusão e desigualdade, fato que foi agravado pela imposição de tecnologias digitais nas atividades pedagógicas.

O segundo eixo aborda os desafios pertinentes à formação de professores e tem início com texto de Dermeval Saviani, que apresenta os contratempos da formação docente no Brasil e sua relação com o trabalho do professor. O autor descreve a trajetória histórica da formação e do exercício docente no Brasil colocando desafios que precisam ser enfrentados e superados. Enfatiza a relação existente entre formação e trabalho docentes e o necessário ajuste de políticas públicas que não tratem os temas de forma dissociada.

Juan Salomé aborda a formação docente na Espanha por meio do que chama de uma viagem ao passado até o futuro. Com rica abordagem histórica do tema, sua socialização, pode ser de grande utilidade para a realidade das políticas educacionais brasileiras.

Leda Scheibe faz uma crítica aberta à atual política da reforma no campo da formação de professores. Destaca a emancipação humana como meta a ser priorizada; asseverando que a agenda neoliberal, imposta após o golpe de 2016, dá um caráter técnico instrumental as atuais reformas legislativas, que embasam a formação dos professores em competências e habilidades socioemocionais em detrimento de sua competência profissional intelectual. A fim de mudar essa realidade, fazem-se necessários o debate coletivo e a resistência.

A precarização do trabalho docente é o tema abordado por Acácia Zeneida Kuenzer. A autora evidencia que o capitalismo, pelo processo de exploração e regime de acumulação, tem como consequência a flexibilização das relações e do processo de trabalho. A precarização do trabalho está institucionalizada, sobretudo após o advento da reforma trabalhista. É preciso que os profissionais do magistério mantenham o enfrentamento contra a flexibilização das relações de trabalho e contra o aprendizado raso e flexível.

Luiz Carlos Eckstein trata dos desafios da formação politécnica para os profissionais da educação tecnológica. A partir de uma investigação empírica em uma instituição de ensino pública federal o autor ressalta a importância da formação continuada dos professores da educação profissional. Observa que a educação pautada na politecnia pode ser o caminho para romper com a dualidade existente na educação, superando os limites da formação dos que planejam da dos que executam, concebendo o trabalho humano como atividade que unifica a prática à teoria.

O terceiro e último eixo trata das relações entre educação, trabalho e direitos humanos. Nele, Miguel González Arroyo discute os percursos de humanização e a construção de uma identidade humana. Destaca a relevância da docência neste processo de constituição da identidade dos educandos e o saber de si como direito primeiro do conhecimento.

Antônio Joaquim Severino, que também prefacia a obra, ressalta as relações entre trabalho e educação e a luta emancipatória no contexto atual. Defende a centralidade do trabalho na existência humana e busca explicar o papel da educação como mediadora do trabalho com as outras dimensões da vida. Reconhece a realidade degradante do trabalho e busca explicar as relações entre a prática educacional e essa realidade perversa apresentada.

Os organizadores da obra, Marcelo Ivan Melek e Sarita Aparecida de Oliveira Fortunato, também contribuem com texto no qual enfrentam os desafios da relação entre educação e trabalho infantil. Analisam a educação como direito subjetivo, advogando a presença da criança na escola e expondo as violações de direito em decorrência do trabalho infantil.

Marcia Regina Mocelin e Dinamara Pereira Machado discutem, a partir de um apurado levantamento bibliográfico, os 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e os direitos interrompidos dos bebês encarcerados. Asseveram as dificuldades encontradas pelo ECA para que seus direitos sejam cumpridos na íntegra, bem como a não receptividade pelas políticas públicas nacionais das regras de Bangkok, o que acaba implicando na violação de direitos.

Fausto dos Santos Amaral Filho, do ponto de vista filosófico, busca refletir sobre as imbricações entre tecnologia, educação e inovação. Afirma que, se por um lado a tecnologia está cada vez mais presente nas relações sociais e, portanto, na educação, por outro, não se trata de novidade. Necessária então a reflexão a respeito do discurso sobre inovação e inserção de tecnologias na educação a fim de não ficarmos desorientados entre o novo e o mais do mesmo.

No último capítulo, Daniel Markowicz e Roberta Ravaglio Gagno, orientandos da Professora Naura, de forma minuciosa destacam a trajetória de vida da homenageada. Apresentam elementos de sua formação pessoal e profissional que foram os alicerces para suas reflexões e produções teóricas, assim como para sua incansável atuação prática na busca de melhorias para a educação brasileira.

Os textos, em que pese a heterogeneidade entre os autores, acabam sempre por dialogar com a homenageada, não somente pelas referências textuais, mas, principalmente por terem como base princípios e pensamentos semelhantes na construção de um mundo melhor, edificado por uma educação emancipatória e de bases democráticas.

Referência

  • MELEK, M. I.; FORTUNATO, S. A. de O. (org). A educação no Brasil e no mundo: prioridades e desafios. Estudos em homenagem à profa. Dra. Naura Syria Carapeto Ferreira. Curitiba: CRV, 2022.
Editor de seção: Antônio Alvaro Soares Zuin. https://orcid.org/0000-0002-6850-2897

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Jan 2023
  • Aceito
    01 Fev 2023
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