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CÍRCULOS DE CULTURA E EJA: PRESENÇA DE PAULO FREIRE NA EDUCAÇÃO DE TRABALHADORAS

CULTURE CIRCLES AND EJA: PAULO FREIRE’S PRESENCE IN FEMALE WORKERS’ EDUCATION

CÍRCULOS DE CULTURA Y EJA: LA PRESENCIA DE PAULO FREIRE EN LA EDUCACIÓN DE LAS TRABAJADORAS

RESUMO

O artigo busca reconstituir encontros e reencontros com referenciais de Paulo Freire para apreender suas influências nas práticas educativas em Círculos de Cultura, mobilizando reflexões acerca da educação de pessoas trabalhadoras. Tem como suporte teórico e metodológico os referenciais da observação participante e da reconstituição de experiências por depoimentos, fontes documentais e bibliográficas. Os conceitos de memória individual e coletiva, história, lembranças e suas relações com a vida em sociedade auxiliaram na compreensão dos sentidos produzidos pelas experiências analisadas. Entre esses sentidos, foi possível perceber o caminho de ressignificação da luta pela alfabetização de adultos na defesa da escola pública para trabalhadores com Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Palavras-chave
Paulo Freire; Círculos de Cultura; Educação de Jovens e Adultos; Escola Pública; Memória e História

ABSTRACT

The article seeks to reconstruct encounters and re-encounters with Paulo Freire’s references in order to understand his influences on educational practices in Culture Circles, mobilizing reflections on the education of working people. As theoretical and methodological support it brings the references of participant observation and the reconstitution of experiences through testimonies, as well as documentary and bibliographic sources. The concepts of individual and collective memory, history, memories, and their relationship with life in society helped to understand the meanings produced by the analyzed experiences. Among these meanings, it was possible to perceive the path of resignification of the struggle for adult literacy in the defense of public schools for workers with Youth and Adult Education (EJA, from the Portuguese, educação de jovens e adultos).

Keywords
Paulo Freire; Culture Circles; Youth and Adult Education; Public School; Memory and History

RESUMEN

Este artículo reconstruye los encuentros y reencuentros con las referencias de Paulo Freire para aprehender sus influencias en las prácticas educativas en los Círculos de Cultura, movilizando reflexiones sobre la educación de los trabajadores. Tiene como soporte teórico y metodológico los referentes de la observación participante y la reconstitución de experiencias a través de testimonios, fuentes documentales y bibliográficas. Los conceptos de memoria individual y colectiva, historia, recuerdos y sus relaciones con la vida en sociedad ayudaron a la comprensión de los significados producidos por las experiencias analizadas. Entre estos significados, fue posible percibir el camino de resignificación de la lucha por la alfabetización de adultos en la defensa de la escolarización pública de los trabajadores a través de la educación de jóvenes y adultos (EJA; del portugués, educação de jovens e adultos).

Palabras-clave
Paulo Freire; Círculos de Cultura; Educación de Jóvenes y Adultos; Escuela pública; Memoria e Historia

Introdução

De muitas formas, é possível apanhar a presença de um intelectual e político como Paulo Freire e de suas ideias na história da educação brasileira. Escolhemos fazê-lo, neste artigo, seguindo os passos das memórias individual e coletiva reconstituídas, com uma lente específica na educação voltada para pessoas trabalhadoras. Esta é, portanto, uma produção que tem como suporte teórico e metodológico os referenciais de “observações participantes” (BRANDÃO, 1981BRANDÃO, C. R. (org.). Pesquisa participante. São Paulo: Brasiliense, 1981.). Focamos, sobretudo, no que podemos depreender e sobre que podemos refletir por meio da reconstituição histórica de experiências de práticas educativas (MACHADO, 2020MACHADO, M. M. O que dizer do dito: potência e ocultamento nas narrativas. In: ALVES, W. F. (org.). Os desafios da formação: olhares cruzados sobre o trabalho e a formação humana. Goiânia: Editora Imprensa Universitária, 2020. p. 15-36.; BOLIVAR, 2002BOLÍVAR, A. “>De nobis ipsis silemus?”: epistemología de la investigación biográfico-narrativa en educación. Revista Electrónica de Investigación Educativa, Mexicali, v. 4, n. 1, 2002. Disponível em: http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1607-40412002000100003. Acesso em: 30 jul. 2021.
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; GONZÁLEZ MONTEAGUDO, 1996GONZÁLEZ MONTEAGUDO, J. Vida cotidiana y profesión docente: teoría y práctica educativas centradas em historias de vida. Un enfoque etnográfico. 1996. 736 f. Tesis (Doctorado en Teoría e Historia de la Educación y Pedagogía Social) - Facultad de Ciencias de la Educación, Universidad de Sevilla, Sevilla, 1996., 2011GONZÁLEZ MONTEAGUDO, J. As histórias de vida em educação: entre formação, pesquisa e testemunho. In: SOUZA, E. C. (orgs.). Memória, (auto)biografia e diversidade: questões de método e trabalho docente. Salvador: Editora da Universidade Federal da Bahia, 2011. p. 59-96.) registradas em depoimentos e em fontes documentais e bibliográficas. Tais reconstituições foram colhidas e acessadas no contexto do projeto de pesquisa “Educação no Distrito Federal: História e Memória”, vinculado ao Grupo de Pesquisa “História, Sociedade e Educação no Brasil” (HISTEDBR-DF), além de meu acervo pessoal de estudos e pesquisas.

Compartilho da percepção de Minayo e Minayo-Gómez quando afirmam que “não há nenhum método melhor do que o outro, o método, ‘caminho do pensamento’, ou seja, o bom método será sempre aquele capaz de conduzir o investigador a alcançar as respostas para suas perguntas [...]” (2003MINAYO, M. C. S.; MINAYO-GÓMEZ, C. Difíceis e possíveis relações entre métodos quantitativos e qualitativos nos estudos de problemas de saúde. In: GOLDENBERG, P.; MARSIGLIA, R. M. G.; GOMES, M. H. A. (orgs.). O clássico e o novo: tendências, objetos e abordagens em ciências sociais e saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2003. p. 117-142., p. 118). Nesse sentido, esta pesquisa buscou reconstituir encontros e reencontros com a pedagogia freireana para apreender suas influências na trajetória da minha prática educativa, mobilizando reflexões acerca do campo da educação de pessoas trabalhadoras como política pública.

É do lugar de historiadora que narro e analiso experiências em educação popular e educação de adultos, as quais partem do meu encontro com os referenciais freireanos nos Círculos de Cultura e chegam à retomada e à ressignificação desses referenciais na luta em defesa do direito à educação para todas as pessoas, indistintamente. Trata-se de uma produção com características autobiográficas, mas impossível de ser compreendida sem a dimensão coletiva da qual foi resultante. Conceitos como memória individual e coletiva (HALBWACHS, 2006); memória e história (RICŒUR, 2007RICŒUR, P. A memória, a história, o esquecimento. Tradução Alain François et al. Campinas: Unicamp, 2007.); lembranças e suas relações com a memória e a vida em sociedade (BOSI, 2010BOSI, E. Memória e sociedade: lembranças dos velhos. 16. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.), resguardando suas nuances, são acionados ao longo do artigo para auxiliar a compreensão dos sentidos produzidos pelas experiências refletidas. Entre essas contribuições, cabe especial destaque aos desafios de fazer a releitura de tais experiências.

A experiência da releitura é apenas um exemplo, entre muitos, da dificuldade, senão da impossibilidade, de reviver o passado tal e qual; impossibilidade que todo sujeito que lembra tem em comum com o historiador. Para este também se coloca a meta ideal de refazer, no discurso presente, acontecimentos pretéritos, o que a rigor, exigiria se tirassem dos túmulos todos os que agiram ou testemunharam os fatos a serem evocados. Posto o limite fatal que o tempo impõe ao historiador, não lhe resta senão reconstruir, no que lhe for possível, a fisionomia dos acontecimentos. Nesse esforço exerce um papel condicionante todo o conjunto de noções presentes que, involuntariamente, nos obriga a avaliar (logo, a alterar) o conteúdo das memórias

(BOSI, 2010BOSI, E. Memória e sociedade: lembranças dos velhos. 16. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2010., p. 59).

Essa reconstrução da fisionomia de acontecimentos de práticas educativas, entre os grupos populares de alfabetização de adultos e a chegada à defesa de uma escola pública de qualidade social para os trabalhadores, pode ser tomada freireanamente como “um saber de experiência feito”, a princípio, para chagar a problematizar a experiência como lócus do saber (ANGELIM; REIS; BRUZZI, 2012ANGELIM, M. L. P.; REIS, R. H.; BRUZZI, R. C. Implicações da pesquisa-ação existencial no PROEJA-Transiarte. In: HILÁRIO, R.; CASTIONI, R.; TELES, L. (orgs.). Proeja-transiarte: construindo novos sentidos para a educação de jovens e adultos trabalhadores. Brasília: Verbena, 2012.). Vale a pena compreender o sentido atribuído a essa expressão ao longo de toda a obra de Freire, mas, para esta reflexão, interessa-nos o que Freire pensa sobre tomar o conhecimento imediato como ponto de partida para a mediação de novos conhecimentos.

Nossa mente, neste caso, na orientação espontânea que fazemos no mundo não opera epistemologicamente. Não se direciona criticamente, indagadoramente, metodicamente, rigorosamente ao mundo ou aos objetos a que se inclina. Este é o “saber de experiência feito” (Camões), a que falta, porém, o crivo da criticidade. É a sabedoria ingênua, do senso comum, desarmada de métodos rigorosos de aproximação ao objeto, mas que, nem por isso, pode ou deve ser por nós desconsiderada. Sua necessária superação passa pelo respeito a ela e tem nela o seu ponto de partida

(1997FREIRE, P. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho dÁgua, 1997., p. 82).

O desafio que percorremos ao longo do artigo é operar epistemologicamente na análise dessas práticas educativas para com elas pensar os desafios que as pessoas jovens e adultas viveram e vivem na realidade brasileira a fim de ter seu direito à educação garantido. As circunstâncias das histórias aqui refletidas situam-se, no contexto temporal, entre os anos finais da ditadura militar, marcados pelo retorno de Paulo Freire ao Brasil depois de quinze anos de exílio, e os anos iniciais do século XXI. No contexto geográfico, as experiências “relidas” nascem na periferia da Capital Federal, nas chamadas inicialmente de cidades-satélites,1 1 O Decreto n. 19.040, de 18 de fevereiro de 1998, do governo do Distrito Federal, proíbe a utilização da expressão “satélite” para designar as cidades situadas no território do DF, nos documentos oficiais e outros públicos, justificando para isso o fato de essas aglomerações urbanas já terem características de cidades cada vez mais independentes do Plano Piloto. Para fins deste artigo, manteremos a denominação cidade-satélite, pois o contexto aqui referido é anterior à publicação do decreto e, na experiência vivida pelos depoentes e pela autora, tal independência não se confirmava ainda. e se fixam em Goiânia. Na exposição das reflexões, optamos por subdividir o artigo em dois subitens, sendo o primeiro com foco nas experiências em Círculos de Cultura e o segundo nos desdobramentos dessas experiências: a discussão da alfabetização de adultos no sistema educacional e sua vinculação à defesa da escola pública.

Das Reproduções das Pinturas de Brennand ao Aprendizado como Alfabetizadora

Não parece ser necessário explicitar o óbvio, mas, em tempos tão difíceis como os que vivemos no país, quando paira sobre nós uma onda negacionista, é preciso começar discorrendo sobre o que pensava Paulo Freire (1967, 1987) acerca da educação. Sua perspectiva, nos contextos dos países chamados subdesenvolvidos, do Terceiro Mundo, está expressa desde as notas iniciais de esclarecimentos do seu primeiro livro publicado no exílio - no Chile, em 1965, e no Brasil, em 1967:

A educação das massas se faz, assim, algo de absolutamente fundamental entre nós. Educação que, desvestida da roupagem alienada e alienante, seja uma força de mudança e de libertação. A opção, por isso, teria de ser também, entre uma “educação” para a “domesticação”, para a alienação, e uma educação para a liberdade. “Educação” para o homem-objeto ou educação para o homem-sujeito

(FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967., p. 36).

É nesse ensaio - como o próprio Freire o denomina -, sob o título Educação como Prática da Liberdade, que localizamos a apresentação dos Círculos de Cultura, especificamente na parte 4, que trata de reflexões sobre educação e conscientização. Ao rememorar sua atuação no Movimento de Cultura Popular (MCP) do Recife, ele afirma: “Coordenávamos, naquele Movimento, o ‘Projeto de Educação de Adultos’, através do qual lançáramos duas instituições básicas de educação e de cultura popular: o ‘Círculo de Cultura’ e o ‘Centro de Cultura’” (FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967., p. 102). Na nota de rodapé que se segue a essa afirmação, podemos encontrar, de forma mais detalhada, a perspectiva dada à experiência dos círculos e sua relação com o aprender e o ensinar:

De acordo com as teses centrais que vimos [sic] desenvolvendo, pareceu-nos fundamental fazermos algumas superações, na experiência que iniciávamos. Assim, em lugar de escola, que nos parece um conceito, entre nós, demasiado carregado de passividade, em face de nossa própria formação (mesmo quando se lhe dá o atributo de ativa), contradizendo a dinâmica fase de transição, lançamos o Círculo de Cultura. Em lugar de professor, com tradições fortemente “doadoras”, o Coordenador de Debates. Em lugar de aula discursiva, o diálogo. Em lugar de aluno, com tradições passivas, o participante de grupo. Em lugar dos “pontos” e de programas alienados, programação compacta, “reduzida” e “codificada” em unidades de aprendizado

(FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967., p. 102-103).

Na experiência dos Círculos de Cultura, vai se constituindo o que se convencionou chamar método de alfabetização de adultos, baseado na observação inicial dos debates sobre homem e cultura mobilizados pelos coordenadores dos círculos, nos quais a pessoa não alfabetizada “descobrir-se-ia, criticamente, como fazedor desse mundo da cultura. Descobriria que tanto ele, como o letrado, tem um ímpeto de criação e recriação” (FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967., p. 108). A perspectiva de diálogo sobre o homem e a cultura era o primeiro passo na direção de contribuir para que as pessoas se percebessem construtoras de sua história.

Para a introdução do conceito de cultura, ao mesmo tempo gnosiológica e antropológica, elaboramos, após a “redução” deste conceito a traços fundamentais, dez situações existenciais “codificadas”, capazes de desafiar os grupos e levá-los pela sua “descodificação” a estas compreensões. Francisco Brennand, uma das maiores expressões da pintura atual brasileira, pintou estas situações, proporcionando assim uma perfeita integração entre educação e arte

(FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967., p. 109).

As “fichas de cultura” pintadas por Brennand podem ser conhecidas em sites que reúnem a história do que foi denominado Sistema Paulo Freire,2 2 No Portal dos Fóruns de EJA, no menu que trata da Memória e História (disponível em: http://forumeja.org.br/node/2976), podem ser acessados os registros de diferentes iniciativas de educação popular e EJA. Em especial, as fichas de cultura encontram-se no link http://forumeja.org.br/node/2499. bem como em publicações que revelam a importância dos fundamentos expressos naquelas imagens (FÁVERO, 2012FÁVERO, O. As fichas de cultura do Sistema Paulo Freire: um “Ovo de Colombo”. Linhas Críticas, Brasília, v. 18, n. 37, p. 465-483, set./dez. 2012. https://doi.org/10.26512/lc.v18i37.3988
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) para a assimilação dos conceitos de cultura e cultura popular. Um detalhamento sobre as aprendizagens de Paulo Freire, principalmente em sua experiência no MCP, a fim de chegar aos processos de alfabetização nos Círculos de Cultura, pode ser acessado na obra de Beisiegel, Política e Educação Popular: a Teoria e a Prática de Paulo Freire no Brasil (2008BEISIEGEL, C. R. Política e educação popular: a teoria e a prática de Paulo Freire no Brasil. Brasília, DF: Líber Livro, 2008.). Para os fins deste artigo, interessa ressaltar a importância das fichas de cultura, pois foi por elas que iniciei meu contato com a perspectiva de educação de Paulo Freire.

Experiência 1 - Pela Cópia dos Desenhos de Brennand, o Primeiro Contato com Freire

O cenário é a cidade-satélite do Gama, atualmente denominada região administrativa do Distrito Federal (DF), situada a 30 km de Brasília. O contexto é o início dos anos 1980, quando a Capital Federal, ainda construindo sua autonomia político-administrativa, retomava as iniciativas anteriores de organizações sindicais e populares, reivindicando moradia, direito ao voto e mais acesso à saúde, à educação e ao transporte coletivo. As conjunturas nacional e internacional desfavoráveis à continuidade da ditadura militar (GASPARI, 2002GASPARI, E. A ditadura envergonhada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. (As ilusões armadas, 1.)) impulsionaram tais mobilizações em Brasília.

Os sujeitos envolvidos nessa primeira experiência de Círculos de Cultura foram as funcionárias públicas ligadas à assistência social do governo do DF, pelo órgão conhecido como Centro de Desenvolvimento Social (CDS), bem como jovens que militavam pela mobilização para constituir a Associação de Moradores do Setor Leste do Gama. Quem narra essa história é a própria alfabetizadora.3 3 Os depoimentos utilizados no artigo foram autorizados pelos entrevistados, tanto em seu conteúdo quanto para a identificação dos depoentes. Optamos por omitir alguns trechos que identificavam pessoas citadas por esses.

Em 1982, Leador me pediu para assumir uma turma de alfabetização de adultos no Setor Sul do Gama. A atividade era coordenada pelo CDS [...]. Leador mexia com associação de moradores e foi lá que conheceu essas moças que apoiavam um trabalho de cooperativa de mulheres. Essa cooperativa tinha muitas atividades, uma delas era organizar as mulheres para fazerem compras coletivas e nesse trabalho elas identificaram que muitas mulheres não sabiam ler e por isso era preciso ter aulas de alfabetização.

Eu não achei que conseguiria, mas elas me ajudaram e ensinaram como eu deveria fazer. A primeira palavra que trabalhamos com elas foi tijolo. Minha filha fazia os cartazes com os desenhos, a palavra e as sílabas.

Elas [as assistentes sociais] fizeram primeiro a reunião com as mulheres, “pescavam” as palavras mais importantes, lembro que tinha “tijolo”, “ônibus”, elas “pescaram” dessa reunião com as mulheres.

A primeira aula foi junto com elas, elas fizeram a discussão de tijolo e discutiam as questões de moradia, de como construir a casa. Depois de discutir, a gente trabalhava com formar as sílabas e em seguida as palavras.

Elas compravam tudo e trouxeram: as cartolinas, os pincéis, tudo elas é que traziam. Era um trabalho voluntário.

As aulas começaram a funcionar numa escola no Setor Sul. O Leador ia comigo, ficava lá e voltava comigo para fazer companhia. A aula era gravada e durante o dia as meninas vinham em casa com gravador para ouvir a discussão da aula e já preparavam as discussões seguintes.

Nós trabalhávamos segunda, quarta e sexta, mas um dia fomos assaltados e aí eu não pude mais ir à noite. As meninas do CDS tentaram mudar as aulas para o sábado na sede do CDS que ficava no Setor Central, perto da 14a Delegacia de Polícia do Gama. Mas, não deu certo, porque o próprio CDS cancelou o trabalho

(Gasparina Maria Antunes, 79 anos, 2020).

Minha participação, reproduzindo as fichas de cultura e os demais cartazes com a ilustração e as palavras geradoras, ainda não configurava compreensão do que mais tarde eu viria a conhecer como o “Método Paulo Freire”. Cursando o segundo ano de uma habilitação profissional no 2° grau, Habilitação Específica para o Magistério (HEM), que, pela Lei n. 5.692/71, substituíra o antigo Curso Normal (TANURI, 2000TANURI, L. M. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n 14, p. 61-88, maio/ago. 2000. https://doi.org/10.1590/S1413-24782000000200005
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), eu nunca tinha ouvido falar no educador, mas o depoimento de meu irmão sobre essa experiência não só inclui o acesso às obras de Freire, como também esclarece o sentido daquela prática educativa e o motivo por que ela foi interrompida.

De forma descontinuada, ainda porque é coisa que está distante, lembro que o primeiro contato que tivemos com Paulo Freire, ou sobre o trabalho dele, foi com o Pe. João Castanha. Isso foi entre 1978 e 1979, quando eu ainda estava no quartel e fazíamos as reuniões no porão da igreja, por causa das proibições que ainda existiam do regime militar. Eu, Tuninho e o Ditinho nos reuníamos no porão da igreja para organizarmos as atividades de pichação contra a ditadura e ele [o Pe. João Castanha] é que nos falava do Paulo Freire e admirava que muitos no Brasil não conheciam e ele, da Itália, já tinha ouvido falar muito nele. Aí começou meu contato com o trabalho e os escritos do Paulo Freire.

No final dos anos 1979 e 1980, eu estava trabalhando na radiologia do Hospital do Gama e foi nos intervalos deste trabalho que eu li as obras do Paulo Freire. As assistentes sociais entram nesta história por causa da associação de moradores, quando estávamos naquele momento de criar a associação de moradores. Elas estavam muito motivadas a criar o Círculo de Cultura, nós chegamos a criar um no Setor Sul, mas depois elas tiveram uma pressão muito grande, dentro do CDS, por causa deste trabalho. Foram perseguidas e retiradas do trabalho no Gama.

Foi um momento complicado, nós perdemos as eleições na associação de moradores para um tal [...] e grupo muito estranho. Inclusive teve uma história de aproximação de um tal [...], chegou a participar do PT [Partido dos Trabalhadores], um negro alto, que muita gente falava que era informante do SNI [Serviço Nacional de Informação]. Aliás, isso era dito tanto do [...], quanto [...]. Esse [...] participou conosco do PT no início, mas sempre com atitudes muito estranhas. Ele parece ter se envolvido com esta perseguição às meninas no CDS, que resultou no afastamento delas do Gama

(Leador Machado, 60 anos, 2021).

As lembranças evocadas das memórias dos sujeitos envolvidos ajudam a compreender o conjunto de mediações presentes na estratégia dessa prática educativa. A necessidade de ler e escrever daquelas mulheres foi mobilizada em função da organização de seu trabalho em uma cooperativa. A resposta encontrada pelas assistentes sociais a essa demanda também se vincula às suas práticas profissionais, pelo fato de o Serviço Social ser um campo de atuação que sofreu influências do referencial freireano (BARBOSA, 1997BARBOSA, M. M. Serviço social utopia e realidade: uma visão da história. Caderno de Serviço Social, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 25-71, out. 1997.), tanto no debate acerca da formação do profissional da área quanto na metodologia de abordagem à população mais vulnerável. Como podemos constatar, no depoimento anterior, as consequências da opção feita pelas assistentes sociais, por uma abordagem de cunho emancipatório na prática educativa daquelas trabalhadoras, foram a interrupção da experiência do Círculo de Cultura e a transferência de ambas para outras unidades do CDS.

No caso dos jovens envolvidos e da alfabetizadora, a influência para atuar na associação de moradores e no Círculo de Cultura veio da participação em movimentos da Igreja Católica, em especial a Pastoral da Juventude (PJ), que, na década de 1980, assim como a Pastoral Operária, era um segmento religioso orientado, no DF, pelos referenciais da Teologia da Libertação (TdL). Autores como Boff (1986BOFF, L. Jesus Libertador. Petrópolis: Vozes, 1986,, 1988)BOFF, L. O caminhar da Igreja com os oprimidos. Petrópolis: Vozes, 1988,, Gutiérrez (1985)GUTIÉRREZ, G. Teologia da Libertação: perspectivas. Petrópolis: Vozes, 1985. e Libanio (1987)LIBANIO, J. B. Teologia da Libertação - roteiro didático para um estudo. São Paulo: Edições Loyola. 1987., entre outros, eram leituras obrigatórias, seguidas de longos debates, muitas vezes ocorridos às escondidas, como afirma o depoente, porque Brasília vivia em permanente estado de sítio.

A TdL se pautava pelo chamado método Ver-Julgar-Agir (LIBANIO, 1987LIBANIO, J. B. Teologia da Libertação - roteiro didático para um estudo. São Paulo: Edições Loyola. 1987., p. 200), que convocava os cristãos a um compromisso com os oprimidos: a chamada opção preferencial pelos pobres. Esse método e essa opção orientavam a ação militante dos jovens leigos, que percebiam nela uma relação direta com os preceitos da teoria freireana, relação essa que se explicitava nas práticas formativas dos leigos, como se pode observar, em vários momentos, na publicação que se pretendia roteiro didático para os estudos da TdL (LIBANIO, 1987LIBANIO, J. B. Teologia da Libertação - roteiro didático para um estudo. São Paulo: Edições Loyola. 1987.). Ao tratar, na parte cinco do décimo capítulo, do tema “A Teologia da Libertação e a Teoria da Dependência”, Libanio afirma:

Merece breve alusão no final desta reflexão a teoria pedagógica da libertação de Paulo Freire, que, de certo modo, se situa dentro desse mesmo clima em que se elaborou a teoria da dependência. No caso, Paulo Freire trabalhou principalmente no campo da Pedagogia e ofereceu elementos teóricos que a TdL e, de modo especial, a pastoral assimilam e eles tornam-se então patrimônio comum da Igreja do Brasil e também de diversos outros países do continente (1987, p. 204).

Essa mesma publicação também se refere a Freire no terceiro capítulo, quando trata da emergência da consciência libertadora, destacando os aspectos sociais, políticos e econômicos do contexto do nascimento da TdL. Ao tratar do movimento cultural da década de 1960, o autor afirma que “multiplicaram-se os núcleos de alfabetização conscientizadora segundo o método do pedagogo-filósofo Paulo Freire, que desenvolvia precisamente nesse momento sua filosofia e metodologia pedagógica libertadora” (LIBANIO, 1987LIBANIO, J. B. Teologia da Libertação - roteiro didático para um estudo. São Paulo: Edições Loyola. 1987., p. 59).

É nesse sentido que o encontro entre a TdL e a pedagogia freireana parecia algo esperado. Daí a admiração do Pe. João Castanha, italiano, ao saber que aqueles jovens não conheciam o educador Paulo Freire nem suas obras. Todavia, o que aquele sacerdote também não compreendia era o fato de que mesmo os professores em formação, como era o meu caso, encaminhando-me para o último ano do Curso de Magistério, nunca haviam lido e estudado os princípios pedagógicos e filosóficos freireanos, já então conhecidos em diversos países das Américas, da Europa e da África.

Essas reflexões me colocam diante da indagação sobre os limites e as possibilidades da memória coletiva. Recorrendo a Halbwachs:

Uma cena de nosso passado pode nos parecer tal que jamais teremos nada a tirar nem a acrescentar, e nela jamais haverá nada de mais ou menos a compreender. No entanto, se encontrarmos alguém que nela estivesse envolvido ou a ela tenha assistido, que a evoca e conta - depois de escutar a sua história já não estaremos tão certos quanto antes estivemos de não podermos nos enganar sobre a ordem dos detalhes, a importância relativa das partes e o sentido geral do acontecimento: é impossível que duas pessoas que presenciaram um mesmo fato o reproduzam com traços idênticos quando o descreveram algum tempo depois (2006, p. 95-96).

Essa experiência inicial marcou a todos nós de diferentes maneiras e os detalhes apresentados nos depoimentos revelam isso, porque evocam lembranças diversas, que podem contribuir para compreensão ou indagação sobre o que ocorreu naquele contexto, com aquelas pessoas. Também podem ajudar a compreender ou indagar sobre como isso se relaciona a nosso primeiro contato com o que propunha Paulo Freire pela alfabetização de adultos. O reencontro com essas lembranças me fez repensar sobre “a importância relativa das partes”, mas sobretudo sobre o “sentido geral do acontecimento”.

Gasparina, que se achava incapaz de alfabetizar alguém, pois só tinha três anos de estudos concluídos numa escola rural multisseriada durante sua infância no interior de Minas Gerais, teve a oportunidade de dialogar com aquelas mulheres não alfabetizadas como se fosse uma delas. Quando ouvia, no dia seguinte, as aulas gravadas, ao lado das assistentes sociais que traduziam para ela o sentido daquelas práticas educativas, percebia que algo daquilo que ela sabia tinha ficado com aquelas mulheres - algo a que Freire (1967)FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967. chamava encontro de saberes. Daquela experiência dialógica, não temos como saber o desdobramento na vida das alfabetizandas, mas, na vida da alfabetizadora, ressurgiu um sonho de menina: voltar a estudar e, quem sabe um dia, tornar-se professora. Uma parte dele se realizou quando, em 2003, aos 62 anos de idade, ela concluiu o Ensino Médio.

Quanto a mim, quase me esqueço desse meu primeiro encontro com Paulo Freire. O Círculo de Cultura fora encerrado e aquelas cartolinas ficaram guardadas por muito tempo na minha casa: as cópias das pinturas de Brennand, os desenhos dos temas que levavam às palavras “pescadas” - “tijolo”, “ônibus” -, as famílias silábicas que mobilizavam a formação de outras palavras. Meu reencontro com os depoimentos sobre essa experiência e com a recordação da atividade quase mecânica de reprodutora dos cartazes do Círculo de Cultura foi mobilizador para a compreensão de que, mesmo antes de ela haver lido uma só linha dos referenciais freireanos, eles já se faziam presentes na dinâmica de atuação dialógica entre a alfabetizadora e as assistentes sociais. Estavam presentes na problematização, pelo padre supracitado, do contexto de silenciamento, no Brasil, do papel de Freire na educação e também na identificação desses referenciais com a formação por nós recebida naquele segmento da Igreja Católica, influenciado pela TdL. O ano seguinte, 1983, foi dedicado a concluir a Habilitação em Magistério, estudar para o concurso público e me tornar professora do governo do Distrito Federal (GDF) ainda aos 17 anos. A alfabetização de crianças passou a ser minha tarefa a partir de 1984, num contexto em que a palavra de ordem era o construtivismo. Meu reencontro com Freire e com os referenciais pedagógicos e filosóficos da educação emancipatória só voltaria a ocorrer dois anos depois.

Experiência 2 - “Educar é Descobrir”: os Círculos de Cultura para Além da Alfabetização

O cenário desta segunda lembrança é a cidade-satélite de Ceilândia, distante cerca de 22 km de Brasília e 23 km do Gama. O ano é 1985, quando, numa escola pública (Escola Normal de Ceilândia), onde se constituíra um Núcleo Paulo Freire, ocorria um estudo exploratório de desenvolvimento de uma metodologia de pesquisa da prática educativa, numa perspectiva de “recriação do ‘método’ de alfabetização de adultos, baseado na pedagogia de Paulo Freire” (ANGELIM, 1988ANGELIM, M. L. P. Educar é descobrir: um estudo observacional exploratório. 1988. 225 f. (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade de Brasília, Brasília, 1988.). Os sujeitos dessa experiência eram, inicialmente, alunos do Mestrado em Educação da Universidade de Brasília e jovens normalistas. Quando conheci os Círculos de Cultura na Ceilândia, em 1986, por intermédio de jovens da PJ, a experiência já sofria impactos das disputas políticas no interior da Fundação Educacional do DF, como relatado por Angelim em sua dissertação:

Com a demissão do diretor eleito do Complexo “A” da Ceilândia, em julho de 1986, por conflito político-administrativo com a direção da Fundação Educacional do Distrito federal, o Núcleo Paulo Freire foi progressivamente perdendo o apoio institucional, inclusive da Escola Normal de Ceilândia, em novembro de 1986. Esta prática educativa, tendo sido assimilada por jovens normalistas de Ceilândia, continuou na adesão de um grupo de jovens católicos da Igreja Nossa Senhora da Glória, localizada próxima à Escola Normal de Ceilândia, ao qual mantivemos nosso apoio, orientando e supervisionando (1988, p. 207).

Essa experiência da Ceilândia foi responsável pelo meu reencontro com os referenciais freireanos, agora de maneira mais sistemática, por meio de seus escritos. Educação como Prática da Liberdade (FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.) foi a leitura pela qual tive o primeiro contato com os passos pensados para a preparação inicial a fim de se chegar ao “método” de alfabetização: levantamento do universo vocabular; escolha das palavras geradoras a partir do universo levantado; “criação de situações existenciais típicas do grupo com quem se vai trabalhar” (FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967., p. 113); elaboração das fichas-roteiro para auxiliar o coordenador do círculo; e, por fim, feitura das fichas com as famílias silábicas correspondentes às palavras geradoras.

Lendo as detalhadas explicações na parte 4 do livro em questão (FREIRE, 1967FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967., p. 101-121), relembro as muitas perguntas que ficaram na minha cabeça enquanto copiava os desenhos de Brennand e elaborava os cartazes das famílias silábicas: por que aquelas imagens? Por que aquelas palavras e não outras? Por que alfabetizar a partir de imagens, palavras e sílabas, quando o curso de magistério nos indicava o construtivismo como a saída para isso? Algumas respostas ficaram mais evidentes quando fomos colocando em prática a orientação teorizada naquelas páginas. Passamos a atuar em vários Círculos de Cultura, naquilo que chamamos experiência de alfanumerização,

Como desdobramento da experiência da Alfanumerização, em Ceilândia, surgem outras experiências inspiradas em Paulo Freire, em cidades tanto do Distrito Federal (Paranoá, Gama, Sobradinho) quanto de Goiás (Luziânia, Novo Gama, Pedregal). Assim, acontece a organização do Centro de Cultura e Desenvolvimento do Paranoá - Cedep, em 1987; do Centro de Educação, Pesquisa, Alfabetização e Cultura de Sobradinho - Cepacs, em 1988; do Centro de Educação Paulo Freire - Cepafre, em 1989, sendo este centro um desdobramento do Núcleo Paulo Freire de Alfabetização de Adultos, criado em 1985; do Centro Popular de Educação de Cultura do Gama - CPEC, em 1990

(RÊSES; VIEIRA; REIS, 2012RÊSES, E.; VIEIRA, M. C.; REIS, R. H. Presença e pegadas de Paulo Freire no Distrito Federal: uma primeira aproximação. Linhas críticas, Brasília, v. 18, n. 37, p. 529-550, set./dez. 2012. https://doi.org/10.26512/lc.v18i37.4002
https://doi.org/10.26512/lc.v18i37.4002...
, p. 540).

O CPEC foi um espaço de vivência de alfabetização de adultos que resultou da mobilização de jovens ligados à PJ no Gama, mas também de militantes do movimento estudantil e de filiados ao Partido dos Tralhadores (PT) que encontraram na pauta do movimento de educação popular, entre 1987 e 1990, uma concretude para os ideais que se apresentavam tão determinados e defendidos, teoricamente, nos referenciais marxistas e humanistas de nossa formação. Inicialmente, reuníamo-nos, como Núcleo de Alfabetização Paulo Freire do Gama (MACHADO, 1995MACHADO, M. M. Educação de Jovens e Adultos e as políticas públicas. 1995. Monografia (Conclusão de Curso em Especialização em Políticas Públicas) - Instituto de Ciências Humanas e Letras. Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 1995.), com militantes de uma organização não governamental (ONG) denominada Serviço Paz e Justiça (Serpaj), tendo os Círculos de Cultura como foco de atuação.

Diferentemente de Cepafre e Cedep - organizações constituídas nesse contexto do final dos anos 1980 e do início dos 1990 e que existem até hoje -, o CPEC não teve vida longa. Seus membros acabaram se dispersando em outras ações de militância estudantil secundarista e partidária, embora os registros oficiais de sua atuação, entre 1990 e 1992, possam ser identificados em fôlderes, em relatórios e no Plano de Ação (MACHADO, 1995MACHADO, M. M. Educação de Jovens e Adultos e as políticas públicas. 1995. Monografia (Conclusão de Curso em Especialização em Políticas Públicas) - Instituto de Ciências Humanas e Letras. Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 1995.), os quais remontam às estratégias propostas no contexto do Ano Internacional da Alfabetização (AIA) e do Plano Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), do governo Collor. Trago esses registros como evidências do primeiro movimento feito, de minha parte, na direção de compreender que a ação alfabetizadora por nós desenvolvida nos Círculos de Cultura desdobrara-se em um movimento político na defesa da educação de jovens e adultos (EJA).

A releitura de todas essas experiências me remete às reflexões de Ferrarotti, quando enfatiza a contribuição do trabalho com histórias de vida para a própria história.

La historia de vida puede ser vista, desde esta perspectiva, como una contribución esencial a la memoria histórica, a la inteligencia del contexto. Sin embargo, ligar texto con contexto no es tarea sencilla como parece a primera vista. No se trata solo de un asunto de aproximación de datos, más o menos pertinentes.

[...] En efecto, la memoria es una realidad plural, dinámica, proteiforme. Más que una realidad dada, fijada, se trata de un magma, de un proceso. Es cierto que no se le puede considerar como una placa pasiva que registra -de forma neutra, notarial, desde lo externo- nuestras experiencias. Es reactiva, huye al control puramente lógico (2011FERRAROTTI, F. Las histórias de vida como método. Acta Sociologica, Coyoacán, n. 56, p. 95-119, set./ dez. 2011. https://doi.org/10.22201/fcpys.24484938e.2011.56.29459
https://doi.org/10.22201/fcpys.24484938e...
, p. 108, 109).

Esse ligar o texto ao contexto, analisando as experiências dos Círculos de Cultura no DF e seus desdobramentos, permite-nos afirmar que as práticas educativas ali desenvolvidas ultrapassaram o fazer pedagógico da alfabetização de adultos, inserindo jovens e adultos alfabetizadores num fazer político em defesa do direito à educação. Retomando Bosi, é necessário reconhecer que “o limite fatal que o tempo impõe ao historiador, não lhe resta senão reconstruir, no que lhe for possível, a fisionomia dos acontecimentos” (2010, p. 59). Elejo nesta “reconstrução”, então, não os aspectos propriamente vinculados à teoria pedagógica freireana - ou seja, não me debruço sobre as discussões calorosas acerca do “método” de alfabetização, mesmo tendo consciência da existência delas. Contudo, como não há pensamento pedagógico descolado do fazer político, considero relevante destacar como os Círculos de Cultura me fizeram questionar o lugar da alfabetização e da educação de adultos na política educacional brasileira. Isso ainda hoje me remete a pensar, a partir de Gramsci (2007)GRAMSCI, A. Cadernos do cárcere. Edição e tradução Carlos Nelson Coutinho; coedição Luiz Sérgio Henriques e Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. v. 3., na relação entre sociedade civil e sociedade política no campo da EJA.

Uma primeira evidência disso relaciona-se à constituição do Grupo de Trabalho Pró-Alfabetização do DF (GTPA/DF) e à programação dos encontros por ele realizados, como informa o fôlder do I Encontro Pró-Alfabetização no DF:

O Grupo de Trabalho Pró-Alfabetização do Distrito Federal - GTPA/DF - surgiu da iniciativa de representantes da Fundação Educar, Universidade de Brasília e Secretaria de Educação com o objetivo de, à luz dos dispositivos constitucionais e das experiências existentes, discutir e formular um Programa de Ação, no âmbito do Distrito Federal, com vistas ao Ano Internacional de Alfabetização, 1990.

Por entender que o programa do analfabetismo deve ser objeto de ação conjunta Governo/ Sociedade Civil, integram o Grupo pessoas ligadas a diferentes entidades, também comprometidas na prática com alfabetização de crianças, jovens e adultos no DF

(GRUPO DE TRABALHO PRÓ-ALFABETIZAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL, 1990GRUPO DE TRABALHO PRÓ-ALFABETIZAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL. Fôlder do I Encontro Pró-alfabetização do Distrito Federal, Distrito Federal, 1990.).

Para os núcleos Paulo Freire no DF, que compunham o GTPA/DF, o ano de 1990 foi um marco nas mobilizações em torno das questões da alfabetização de jovens e adultos, por representar o primeiro momento de conexão entre as pautas locais de alfabetização e uma agenda nacional e internacional da educação de adultos. Com a institucionalização, pela Unesco, do Ano Internacional da Alfabetização (AIA), ainda em 1989, o Governo Federal havia constituído a Comissão Nacional do Ano Internacional da Alfabetização (CNAIA), inicialmente presidida por Paulo Freire, que se afastou do cargo quando Fernando Collor assumiu a Presidência da República.

A despeito de todas as divergências ideológicas presentes nessa comissão, pelo próprio caráter impresso à pauta da educação no governo Collor (MACHADO, 1997MACHADO, M. M. Política Educacional para Jovens e Adultos: a experiência do Projeto AJA (93/96) na secretaria Municipal de Educação de Goiânia. 1997. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 1997.), o GTPA/DF consegue lugar como convidado permanente (BRASIL, 1989BRASIL. Fundação Educar. Secretaria Executiva da Comissão Nacional do Ano Internacional da Alfabetização. Of. n. 08, de 10 de novembro de 1989. Brasília, DF: Fundação Educar, 1989.). Uma análise crítica das atividades da CNAIA não pode considerar que sua atuação, de fato, tenha impactado o enfrentamento da realidade nacional do analfabetismo ou o cumprimento do que estava proposto pelo PNAC. As propostas de solicitação de verbas eram recebidas e enviadas, pelas comissões estaduais e por empresas, para a execução de programas de alfabetização de adultos. Todavia, não houve transparência no registro dos repasses dos recursos e na avaliação dos resultados das propostas.

A participação do GTPA/DF na CNAIA acabou por favorecer sua tentativa de intervenção na política de alfabetização do distrito por meio da constituição da Comissão Pró-Alfabetização do DF, composta por representantes da Fundação Educacional daquela unidade federativa, da Universidade de Brasília e do GTPA/DF. Essa comissão coordenou as atividades de mobilização da pauta do AIA no distrito, como o I Encontro Pró-Alfabetização do DF, nos dias 16, 17 e 18 de fevereiro de 1990, assim descrito por Rêses, Vieira e Reis: “evento que serviu de marco para a expansão das ações de alfabetização nas cidades do Distrito Federal e Entorno (ANGELIM; COUTINHO; MENDONÇA, 1990ANGELIM, M. L. P. Educar é descobrir: um estudo observacional exploratório. 1988. 225 f. (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade de Brasília, Brasília, 1988.), seguido de encontros em Ceilândia, em Sobradinho e no Gama” (2012, p. 542).

A segunda evidência do desdobramento das influências pedagógicas dos Círculos de Cultura em ações políticas pode ser constatada pela análise da mobilização em torno da pauta da alfabetização de adultos, que irá se desdobrar de formas diferenciadas entre os grupos populares que constituíam o GTPA/DF. No caso do Gama, o Núcleo de Alfabetização Paulo Freire e o Serpaj realizaram reuniões com os representantes da Diretoria Regional de Ensino (setor da Secretaria de Educação do DF em cada cidade-satélite). Como resultado do encontro, realizado nos dias 20 e 21 de setembro, foi constituída a Comissão Pró-Educação do Gama (GAMA, 1990aGAMA (cidade). Diretoria Regional de Ensino. Comissão Pró-Educação do Gama. Ata de Constituição. Gama: Administração Regional do Gama, 21 set. 1990a. Mimeografado.), cuja primeira tarefa foi elaborar um Plano de Ação para o enfrentamento do analfabetismo na cidade.

A comissão coordenou o grande mutirão para o levantamento das pessoas não alfabetizadas, dos recursos humanos e materiais, bem como a sua carência.

Cônscios da realidade, a comissão sob a coordenação administrativa e pedagógica da Diretoria Regional de Ensino do Gama/Núcleo de Coordenação Pedagógica, propõe a implantação do Programa de Erradicação do Analfabetismo na Região Administrativa do Gama, conforme o presente projeto. [...]

OBJETIVOS:

GERAL

  • Oferecer condições necessárias para que a criança, o jovem e o adulto tenham acesso ao Programa de Alfabetização e ao prosseguimento dos estudos, até alcançar o término da escolaridade básica.

ESPECÍFICOS:

  • Atender semestralmente em classes de alfabetização as pessoas levantadas;

  • Desenvolver o Programa de Alfabetização, através da Filosofia de Paulo Freire, visando ao desenvolvimento integral do aluno;

  • Promover e/ou encaminhar coordenadores, monitores, professores e observadores para o treinamento na metodologia adotada;

  • Garantir a continuidade do processo de alfabetização, através do treinamento de professores e da expansão da matrícula na Fase II;

  • Dar continuidade ao levantamento de não alfabetizados, através dos meios de comunicação e outros recursos da comunidade (GAMA, 1990bGAMA (cidade). Programa Nacional de Alfabetização. Diretoria Regional de Ensino. Comissão Pró-Educação do Gama. Plano de Ação 1990/1991. Gama: Administração Regional do Gama, 1990b., s. p.).

No terceiro documento elaborado pela Comissão Pró-Educação do Gama, intitulado Plano de Ação 1990/1995, aparece a indicação da meta de alfabetizar 80% da população jovem e adulta não alfabetizada da cidade. Os objetivos específicos são reiterados, mas a redação do Objetivo Geral é alterada para: “Resgatar o direito que todo brasileiro tem de alfabetizar-se e ter acesso à escolaridade básica, independente de sua idade, condição financeira ou local de moradia” (GAMA, 1990cGAMA (cidade). Programa Nacional de Alfabetização. Comissão Pró-Educação do Gama. Plano de Ação 1990/1995. Gama: Administração Regional do Gama, 1990c., s. p.). O mesmo documento apresenta de forma mais detalhada as atividades previstas no levantamento dos alfabetizandos feito pelos Presidentes de Mesa das seções eleitorais no dia 3 de outubro de 1990, em formulário específico, pela identificação dos eleitores que solicitaram o uso da digital para votar; além da pesquisa de campo a ser realizada por estudantes de sociologia do Curso de Magistério da Escola Normal do Gama, líderes religiosos e diretores e professores da DRE; e, por fim, do levantamento a ser feito pelas empresas para identificar trabalhadores a serem alfabetizados. Quanto aos recursos humanos, há ainda a indicação de contratação inicial de “20 coordenadores de Círculos de Alfabetização e 4 supervisores (1 para cada 5 Círculos), membros do Núcleo de Alfabetização Paulo Freire do Gama, coordenado pelo Serpaj/Brasil, para atuarem como monitores” (GAMA, 1990cGAMA (cidade). Programa Nacional de Alfabetização. Comissão Pró-Educação do Gama. Plano de Ação 1990/1995. Gama: Administração Regional do Gama, 1990c., s. p.).4 4 O Caderno de Anexos: Educação de Jovens e Adultos e as Políticas Públicas, elaborado por Machado (1995), reúne o conjunto documental citado neste artigo no que se refere ao PNAC, ao GTPA/DF e ao registro das atividades da Comissão Pró-Educação do Gama.

As reflexões advindas da segunda experiência nos Círculos de Cultura, especialmente da retomada dessa documentação da Comissão Pró-Educação do Gama, fazem-nos reconhecer, como Bosi, ao tratar a relação da memória entre a consciência e o estereótipo, que “a participação na cena pública eleva, sem dúvida, o nível de informação do narrador, mas não o liberta, necessariamente, da modelagem a que vão sendo submetidos homens e acontecimentos” (2010, p. 464). Como participante dos movimentos populares de alfabetização e coautora daqueles documentos, revisito com algum distanciamento histórico esses escritos e percebo o peso dessa “modelagem” naquilo que propúnhamos. Tal tomada de consciência, mais uma vez, é provocada pelo reencontro com Freire (2001)FREIRE, P. Política e educação: ensaios. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001. (Coleção Questões de Nossa Época, v. 23.), com o qual pretendo caminhar para a finalização deste esforço de memória e reconstituição histórica da presença do referencial freireano na educação de adultos em minha trajetória.

Dos Círculos de Cultura à Defesa da Escola Pública

Quando leio Política e Educação, cuja primeira edição é de 1993, percebo várias inquietações de Freire. Esses ensaios dialogam hoje com minhas questões vividas a partir dos Círculos de Cultura, que não eram tão conscientes à época. A primeira delas é: qual é de fato o papel dos movimentos populares na pauta da educação de adultos? Refletindo a respeito, Freire afirma:

Daí também, o equívoco em que tombam grupos populares, sobretudo no Terceiro Mundo, quando, no uso de seu direito mas, indo além dele, criando suas escolas, possibilitam às vezes que o Estado deixe de cumprir seu dever de oferecer educação de qualidade e em quantidade ao povo. Quer dizer, em face da omissão criminosa do Estado, as comunidades populares criam suas escolas, instalam-nas com um mínimo de material necessário, contratam suas professoras quase sempre pouco cientificamente formadas e conseguem que o Estado lhes repasse algumas verbas. A situação se torna cômoda para o Estado. Criando ou não suas escolas comunitárias, os Movimentos Populares teriam de continuar, de melhorar, de enfatizar sua luta política para pressionar o Estado no sentido de cumprir o seu dever. Jamais deixá-la em sossego, jamais eximi-lo de sua tarefa pedagógica, jamais permitir que suas classes dominantes durmam em paz. Sua bandeira de luta, a dos Movimentos Populares, deve ser alçada noite e dia, dia e noite, em favor da escola, que sendo pública, deve ser democrática, à altura da demanda social que dela se fará e em busca sempre da melhoria de sua qualidade (2001, p. 13).

Percebo que o esforço histórico do GTPA/DF em particular dos grupos populares que o compunham era a defesa da educação dos trabalhadores, o que ficará evidente na mobilização desses grupos em torno da elaboração da primeira Lei Orgânica do DF (PEREIRA; TÔRRES, 2015PEREIRA, M. L. P.; TÔRRES, M. M. Relações entre a Universidade de Brasília e o Movimento Social Grupo de Trabalho Pró-Alfabetização de Jovens e Adultos do DF (GTPA)/Fórum de Educação de Jovens e Adultos (EJA) do DF - tensões e desafios de um longo e permanente caminho de lutas. In: RÊSES, E. S. (org.). Universidade e movimentos sociais. Belo Horizonte: Fino Traço, 2015. p. 65-118.). Todavia, ao mantermos, naquele contexto, os Círculos de Cultura do DF funcionando com alfabetizadores voluntários, em espaços cedidos por igrejas, associações de moradores, centros comunitários e residências, não acabávamos por reforçar a omissão do Estado no cumprimento de seu dever para com o direito à educação? Os documentos da Comissão Pró-Educação do Gama nos possibilitam inferir que há uma preocupação manifesta com o comprometimento do governo do DF para que assuma a continuidade dos estudos até a conclusão da educação básica - mas a indicação da Fase I, que corresponderia à alfabetização inicial, como feita ainda por voluntários dos grupos populares corrobora as preocupações apontadas por Freire (2001)FREIRE, P. Política e educação: ensaios. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001. (Coleção Questões de Nossa Época, v. 23.) na defesa da escola pública.

Todavia, de qual escola pública estamos falando? A escola pública democrática, defendida por Freire, “rigorosa, séria, respeitadora e estimuladora da presença popular nos destinos da escola que se vá tornando cada vez mais uma escola alegre” (2001, p. 23), não era bem a realidade das escolas do Gama, onde atuei como professora de 1984 a 1992, sobretudo se analisarmos a experiência da escola noturna nos cursos supletivos (DISTRITO FEDERAL, 1985DISTRITO FEDERAL (Unidade da Federação). Secretaria de Estado da Educação e Cultura. Conselho de Educação do Distrito Federal. CONFERÊNCIA DE EDUCADORES DO DISTRITO FEDERAL, 10, 1985, Brasília. Anais [...]. Brasília: Secretaria de Estado da Educação e Cultura, 1985.). Esse contexto da educação de adultos fora marcado pelas experiências do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) e do Ensino Supletivo, ambas políticas públicas implantadas pela ditadura militar como “parte do quadro histórico em que a reforma do ensino primário e médio vai ser definida” (GERMANO, 1993GERMANO, J. W. Estado militar e educação no Brasil (1964-1985). São Paulo: Cortez, 1993., p. 164).

A extinção do Mobral, em 1985 (PAIVA, 2003PAIVA, V. História da educação popular no Brasil: educação popular e educação de adultos. São Paulo: Loyola. 2003.), e a substituição do Ensino Supletivo pela EJA, em 1996, como modalidade da educação básica (BRASIL, 1996BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, DF: Presidência da República, 1996.), não representaram, todavia, mudanças imediatas nas práticas voltadas para os trabalhadores, tão marcadas por aquelas políticas com viés compensatório e aligeirado. Evidências dessas marcas encontram-se nos documentos oficiais que reconstituem a memória das Conferências de Educadores do DF (DISTRITO FEDERAL, 1985DISTRITO FEDERAL (Unidade da Federação). Secretaria de Estado da Educação e Cultura. Conselho de Educação do Distrito Federal. CONFERÊNCIA DE EDUCADORES DO DISTRITO FEDERAL, 10, 1985, Brasília. Anais [...]. Brasília: Secretaria de Estado da Educação e Cultura, 1985.), convocadas pelo Conselho de Educação e presididas pelo Secretário de Educação. A décima conferência, realizada em 1985, tinha como tema “O Desafio do Ensino Supletivo no Distrito Federal”. Seus anais trazem as abordagens feitas pelos quatro palestrantes convidados, bem como os relatórios dos dez grupos de trabalho, que apresentaram uma série de recomendações à política de EJA do DF. Roberto Pompeu de Sousa Brasil, então Secretário de Educação do DF, abriu a conferência afirmando que Brasília precisava de outra educação de adultos,

não um supletivo que vise apenas à transferência de informações (muitas vezes, nem isso consegue cumprir), tendo como objetivo promover tão somente uma precária ascensão econômica do aluno, através do certificado de escolarização. Essa forma de pseudoeducação só presta um desserviço à nação e, sobretudo, atrás de si esconde a ação mercantil de alguns e o “corpo mole” de outros

(BRASIL, 1985BRASIL, R. P. S. A política para o ensino supletivo no Distrito Federal. In: CONFERÊNCIA DE EDUCADORES DO DISTRITO FEDERAL, 10., 1985, Brasília. Anais [...]. Brasília: Secretaria de Estado da Educação e Cultura, 1985., p. 26-27).

As reflexões realizadas naquela conferência indicam um conjunto de ressalvas ao formato e aos resultados que vinham sendo alcançados pelo Ensino Supletivo no DF (DISTRITO FEDERAL, 1985DISTRITO FEDERAL (Unidade da Federação). Secretaria de Estado da Educação e Cultura. Conselho de Educação do Distrito Federal. CONFERÊNCIA DE EDUCADORES DO DISTRITO FEDERAL, 10, 1985, Brasília. Anais [...]. Brasília: Secretaria de Estado da Educação e Cultura, 1985.). Quanto essas reflexões e proposições contribuíram para o efetivo replanejamento e a implementação de políticas e ações que levariam à oferta e à garantia da educação de qualidade aos trabalhadores na capital federal é algo ainda a ser investigado. Todavia, depoimentos de estudantes adultos, mais de uma década após a conferência, revelam os limites dessa oferta educativa, como na fala da primeira alfabetizadora popular, com a qual iniciamos esta reflexão. A experiência da educação de adultos por ela vivida é reconhecida como positiva como lugar de encontro com os outros e busca por aprender, mas também revela problemas na escola, que a distanciam da defendida por Freire:

Voltar a estudar foi muito bom para mim. Em 1999 comecei fazendo supletivo, em 2000 conclui o 1° grau, hoje estou fazendo matérias do 1° ano do Ensino Médio. Estou com 60 anos, mas eu sinto aquela mesma vontade de estudar e aprender que tinha antes, com onze anos.

A experiência de conviver com jovens, com os professores, está sendo muito boa. Em casa tem exercícios para fazer, as apostilas para estudar, eu já não me sinto mais sozinha, os livros são uma ótima companhia. Ao conviver com os jovens na sala de aula eu percebo a falta de interesse deles em estudar e aprender. Muitos querem copiar os exercícios que o colega fez, tirar cópia dos trabalhos já prontos, não gostam de ler, estão terminando o Ensino Médio sem saber quase nada. O ensino está defasado, o tempo é pouco e diminuiu muito o conteúdo. É muito difícil para esses jovens entrar no mercado de trabalho, porque o pouco que eles aprendem não dá para concorrer com os outros que estudam de fato

(Gasparina Maria Antunes. 62 anos, 2001, grifos nossos).

Essa é uma narrativa que, ao dialogar com a história de outras tantas Gasparinas que retornaram à escolarização depois de adultas, tem muito a dizer sobre o que essas mulheres viveram e o que esperavam da escola. Fala de um encontro de gerações, nessa EJA do século XXI, já anunciado nas pesquisas sobre a juvenilização da EJA no Brasil (ABRAMO; BRANCO, 2005ABRAMO, H. W.; BRANCO, P. P. M. (orgs.). Retratos da juventude brasileira. São Paulo: Instituto Cidadania/Fundação Perseu Abramo, 2005.; SPOSITO, 2005SPOSITO, M. P. Algumas reflexões e muitas indagações sobre as relações entre juventude e escola no Brasil. In: ABRAMO, H.; BRANCO, P. P. (orgs.). Retratos da juventude brasileira. Análises de uma pesquisa nacional. São Paulo: Instituto da Cidadania/Editora Fundação Perseu Abramo, 2005. p. 129-148., 2007SPOSITO, M. P. (coord.). Espaços públicos e tempos juvenis. São Paulo: Global, 2007.; CARRANO, 2007CARRANO, P C. R. Educação de Jovens e Adultos e Juventude: o desafio de compreender os sentidos da presença dos jovens na escola da “segunda chance”. Revista REVEJA, Belo Horizonte, n. 1, p. 1-11, 2007. Disponível em: http://www.emdialogo.uff.br/sites/default/files/educacao_de_jovens_e_adultos_e_ juventude_-_carrano.pdf. Acesso em: 24 jun. 2021.
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). Há um sentimento contraditório de estar bem, por estar com a juventude, mas achar que os jovens “não querem nada” com os estudos. Esse “sentimento” também é problematizado nas pesquisas já indicadas. Para esta nossa reflexão, interessa retomar a percepção de Freire (2001)FREIRE, P. Política e educação: ensaios. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001. (Coleção Questões de Nossa Época, v. 23.) sobre a escola pública. É preciso nos perguntarmos por que “o ensino está defasado, o tempo é pouco e diminuiu muito o conteúdo”.

Nos Círculos de Cultura, das experiências já relatadas às vividas em Goiás, para onde me mudei em 1992, minhas percepções sobre o ensino, o tempo e o conteúdo na educação de trabalhadores foram sendo alteradas. Também percebo, na política de EJA em Goiás, especificamente na rede estadual, mas também no município de Goiânia, os caminhos do aligeiramento dos tempos e do conhecimento a ser mediado pela escola, assim como da certificação da escolaridade, como fundantes para a manutenção da subalternidade de jovens e adultos a um sistema econômico, político e social ao qual interessa manter uma massa acrítica, formada a partir do sistema educativo. No entanto, essa não é uma percepção fatalista. É preciso reconhecer, como Freire, que

A escola burguesa teria de ter, necessariamente, como tarefa precípua dar sustentação ao poder burguês. Não há como negar que esta é a tarefa que as classes dominantes de qualquer sociedade burguesa esperam de suas escolas e de seus professores. É verdade. Não pode haver dúvida em torno disto. Mas, o outro lado da questão está em que o papel da escola não termina ou se esgota aí. Este é um pedaço apenas da verdade. Há outra tarefa a ser cumprida na escola apesar do poder dominante e por causa dele — a de desopacizar a realidade enevoada pela ideologia dominante. Obviamente, esta é a tarefa dos professores e das professoras progressistas que estão certos de que têm o dever de ensinar competentemente os conteúdos mas também estão certos de que, ao fazê-lo, se obrigam a desvelar o mundo da opressão. Nem conteúdo só, nem desvelamento só, como se fosse possível separá-los, mas o desvelamento do mundo opressor através do ensino dos conteúdos. O cumprimento dessa tarefa progressista implica ainda a luta incansável pela escola pública, de um lado, e~, de outro, o esforço para ocupar o seu espaço no sentido de fazê-la melhor. Esta é uma luta que exige claridade política e competência científica (2001, p. 28).

Os desafios, os limites e o desejo de alcançar essas claridade política e competência científica vão se tornando evidentes neste exercício de memória da prática educativa provocada pelo reencontro com os referenciais freireanos. Voltando às contribuições de Halbwachs (2006)HALBSWACHS, M. Memórias coletivas. São Paulo: Centauro, 2006., essas lembranças não representam um reviver, mas um refazer, um reconstituir, com ideias de hoje, as experiências do passado. Nesse sentido, a percepção de minha atuação como professora de jovens, adultos e idosos (na rede estadual de Goiás e na rede municipal de Goiânia), bem como em coletivos de professores e pesquisadores que se dedicavam a essa modalidade contribuindo para a criação de um movimento social em defesa da educação dos trabalhadores (como são os Fóruns de EJA do Brasil); a retomada da trajetória de formação pela especialização em políticas públicas, mestrado e doutorado em educação; o constituir-me gestora da política de EJA nos níveis municipal e federal: tudo isso é, neste texto, mobilizado por essa busca de claridade política e competência científica, na defesa da construção da escola pública popular.

Concluindo essas Memórias e Mobilizando Outras

Compartilhar memórias e histórias de encontros e reencontros com os referenciais freireanos foi a opção feita neste artigo para homenagear Paulo Freire no ano em que celebramos o centenário desse grande educador brasileiro. Revisitando suas obras, é possível afirmar que as tarefas com as quais deveriam se ocupar os educadores progressistas, de quem Freire tanto nos fala, foram assumidas por ele em suas andarilhagens.

Reitero, nestas palavras finais, a presença e a importância do referencial freireano na educação de pessoas trabalhadoras, sejam elas educandas ou educadoras, que busquei explicitar ao trazer memórias e histórias das experiências de práticas educativas individuais e coletivas nos Círculos de Cultura. Tais experiências, que, para mim, representavam certo “saber de experiência feito” provocado pelo “caminho do pensamento”, foram mobilizadas, epistemologicamente, com o auxílio de depoimentos, documentos e referenciais bibliográficos, contribuindo para a percepção delas como certo lócus de saber. Uma releitura que, restrita às décadas de 1980 e 1990, contribui ainda assim para problematizar as lutas que até hoje precisam ser travadas para a garantia do direito à educação das pessoas trabalhadoras.

Entre os sentidos produzidos por essas práticas, ou, melhor dizendo, ao retomá-las como práxis educativas, foi possível perceber o caminho de ressignificação de uma luta pela alfabetização de jovens e adultos, o qual foi se reconstituindo como defesa da escola pública para os trabalhadores. O desafio colocado por Freire (2001)FREIRE, P. Política e educação: ensaios. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001. (Coleção Questões de Nossa Época, v. 23.) de, partindo da experiência da militância progressista dos Círculos de Cultura, buscar forças para seguir formando professores e professoras progressistas, que buscam clareza política e competência científica, ainda parece ser atual e urgente para contribuir na luta em defesa da escola pública.

Uma escola pública que, configurando-se em educação popular, numa sociedade de classe como a nossa, como diria Freire, será sempre “um nadar contra a correnteza” (2001, p. 49), se tomarmos essa realidade como situação-limite, determinante histórico ao qual devemos nos adaptar. Contudo, o convite de Freire (1987)FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. é para que enxerguemos nas situações-limite os inéditos-viáveis, que se concretizarão na nossa ação coletiva de construção da escola pública popular.

Notas

  • 1
    O Decreto n. 19.040, de 18 de fevereiro de 1998, do governo do Distrito Federal, proíbe a utilização da expressão “satélite” para designar as cidades situadas no território do DF, nos documentos oficiais e outros públicos, justificando para isso o fato de essas aglomerações urbanas já terem características de cidades cada vez mais independentes do Plano Piloto. Para fins deste artigo, manteremos a denominação cidade-satélite, pois o contexto aqui referido é anterior à publicação do decreto e, na experiência vivida pelos depoentes e pela autora, tal independência não se confirmava ainda.
  • 2
    No Portal dos Fóruns de EJA, no menu que trata da Memória e História (disponível em: http://forumeja.org.br/node/2976), podem ser acessados os registros de diferentes iniciativas de educação popular e EJA. Em especial, as fichas de cultura encontram-se no link http://forumeja.org.br/node/2499.
  • 3
    Os depoimentos utilizados no artigo foram autorizados pelos entrevistados, tanto em seu conteúdo quanto para a identificação dos depoentes. Optamos por omitir alguns trechos que identificavam pessoas citadas por esses.
  • 4
    O Caderno de Anexos: Educação de Jovens e Adultos e as Políticas Públicas, elaborado por Machado (1995)MACHADO, M. M. Educação de Jovens e Adultos e as políticas públicas. 1995. Monografia (Conclusão de Curso em Especialização em Políticas Públicas) - Instituto de Ciências Humanas e Letras. Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 1995., reúne o conjunto documental citado neste artigo no que se refere ao PNAC, ao GTPA/DF e ao registro das atividades da Comissão Pró-Educação do Gama.
  • Artigo vinculado ao projeto de pesquisa “Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores em Goiás – relações entre o local e o nacional/Fase II” – Financiamento: CNPq. Processo 302799/2020-6.

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Editor de Seção: Celso João Ferretti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    03 Ago 2021
  • Aceito
    21 Set 2021
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