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Avaliação e gestão democrática na regulação da educação básica brasileira: uma relação a avaliar

Evaluation and democratic management in the regulation of the Brazilian basic education: a relationship to be evaluated

Resumos

Embora sobejamente tratado na literatura educacional recente, volta-se ao tema gestão democrática da educação básica para analisar a sua relação/inter-relação com a avaliação educacional na regulação jurídico-legal brasileira vigente. O objetivo é derivar questões de interesse para a avaliação dessas práticas, destacar o lugar/não-lugar da avaliação na gestão democrática delineada nessa regulação e ressaltar a importância da concepção de democracia na configuração de ambas as práticas.

Política educacional; Gestão democrática; Avaliação educacional


Although largely treated in the recent educational literature, one goes back to the theme democratic management of the basic education to analyze its relation/inter-relationship with the educational evaluation in the effective Brazilian juridical-legal regulation. The objective is to derive subjects of interest for the evaluation of those practices, to detach the place/no-place of the evaluation in the democratic management delineated in that regulation and to emphasize the importance of the democracy conception in the configuration of both practices.

Educational policies; Democratic management; Educational evaluation


ARTIGOS

Avaliação e gestão democrática na regulação da educação básica brasileira: uma relação a avaliar

Evaluation and democratic management in the regulation of the Brazilian basic education: a relationship to be evaluated

Dirce Nei Teixeira de Freitas

Doutora em Educação e professora da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). E-mail: dircenei@terra.com.br

RESUMO

Embora sobejamente tratado na literatura educacional recente, volta-se ao tema gestão democrática da educação básica para analisar a sua relação/inter-relação com a avaliação educacional na regulação jurídico-legal brasileira vigente. O objetivo é derivar questões de interesse para a avaliação dessas práticas, destacar o lugar/não-lugar da avaliação na gestão democrática delineada nessa regulação e ressaltar a importância da concepção de democracia na configuração de ambas as práticas.

Palavras-chave: Política educacional. Gestão democrática. Avaliação educacional.

ABSTRACT

Although largely treated in the recent educational literature, one goes back to the theme democratic management of the basic education to analyze its relation/inter-relationship with the educational evaluation in the effective Brazilian juridical-legal regulation. The objective is to derive subjects of interest for the evaluation of those practices, to detach the place/no-place of the evaluation in the democratic management delineated in that regulation and to emphasize the importance of the democracy conception in the configuration of both practices.

Key words: Educational policies. Democratic management. Educational evaluation.

A democratização da gestão educacional no Brasil não se constitui hoje opção de governantes e administradores, porque é, antes, compromisso constitucionalmente estabelecido do Estado e da sociedade. Todavia, o entendimento e a materialização desse compromisso dependem de múltiplos e inter-relacionados fatores. Este trabalho trata da relação entre gestão democrática e avaliação educacional presente/ausente nas disposições normativas fixadas para a educação básica desde 1988, enfatizando a importância da inter-relação dessas práticas.

A análise põe em questão a noção genérica e abstrata de gestão democrática no discurso oficial, deriva indagações de interesse para as práticas gestora e avaliativa e para a necessária avaliação de ambas. O pressuposto é o de que, em "tempos de avaliação educacional", tais práticas devem ser submetidas ao exame social.

Considerações preliminares

O uso corriqueiro do termo gestão e da expressão gestão democrática está impregnado de imprecisões e obscuridade, a ponto de servirem para designar realidades diversas. Silva Júnior (2002) constatou que, no debate educacional da última década, a "hegemonia semântica e discursiva" desse conceito acabou favorecendo a intensificação da privatização por dentro dos sistemas de ensino, de tal modo que,

No imaginário coletivo e em consideráveis segmentos do discurso educacional brasileiro, gestão significa gestão empresarial, o que leva ao embotamento da produção do significado de gestão educacional e à mercadorização de seus critérios de ação. (p. 203)

No entanto, a introdução desse conceito no debate educacional se deu justamente quando a crítica ao caráter conservador e autoritário da administração na área da educação enfatizou, no contexto socioeconômico-político dos anos de 1970-80, o seu compromisso com a transformação social e com a democratização do ensino e da escola (Paro, 1996). Nesse momento, ganhou relevo o caráter político e pedagógico da administração educacional, ao qual deveria se sujeitar a sua dimensão técnica. Gestão aparecia aí com um significado distinto de gerenciamento (comando e controle tecnocrático-autoritário do trabalho de pessoas).

Considerando a origem etimológica do termo, Cury (2002, p. 165) afirmou que a gestão "(...) é a geração de um novo modo de administrar uma realidade e é, em si mesma, democrática já que se traduz pela comunicação, pelo envolvimento coletivo e pelo diálogo". A riqueza dessa noção, para ele, se faz ainda mais significativa ao se traduzir em movimento histórico a exigir novas relações de poder entre governantes e governados.

É importante relembrar que o desafio da gestão foi objeto de atenção das Conferências Brasileiras de Educação (CBEs)1 1 . As Conferências Brasileiras de Educação consistem em eventos promovidos conjuntamente pela Associação Nacional de Educação (ANDE), pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e pelo Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES). Estas organizações surgiram nos últimos anos da década de 1970, representando e possibilitando a ampliação do espaço dos debates educacionais. realizadas no período 1980-1991. Na III CBE, Silva (1986) enfatizava o imperativo de se considerar a administração educacional como uma questão de relevância para a concepção e a emergência de uma nova forma de pensar o sistema educacional e de se fazer educação no país. Essa nova forma teria compromisso com juntar/articular/fundir reflexão e ação. Assim, falar em administração ou gestão2 2 . O termo gestão, mais difundido nos trabalhos franceses e traduções portuguesas, passara a ser preferido por muitos educadores brasileiros. seria

(...) falar de políticas, de definição de estratégias, de determinação de objetivos, de alocação de recursos, e de implementação, acompanhamento, controle e avaliação do conjunto de ações que constitui o trabalho educativo, bem como de sua organização. (Silva, 1986, p. 95)

Os discursos articulados nas cbes indicam que a geração do "novo" consistiria em opor ao conservadorismo dominante um forte compromisso com a transformação social. Para isso, propugnava-se uma gestão dos negócios/serviços/coisas públicas que opusesse ao autoritarismo, ao centralismo, à concentração do poder e à heteronomia preponderantes um processo de transformação do exercício do poder. Estaria ele calcado na democratização do conhecimento, do ensino, da escola e dos sistemas, tendo como horizonte transformações substanciais nas relações sociais.

Essa "nova" forma de administrar deveria ser capaz de opor à prevalência da técnica a prevalência do político e do pedagógico; à racionalidade instrumental, uma racionalidade valorativa; ao predomínio do formalismo, das normas escritas e das estruturas hierarquizadas, a construção cooperativa de alternativas e as formas participativas de decisão-ação-regulação; à separação entre concepção e execução, a unidade do pensar-fazer, da teoria-prática; ao aprofundamento da divisão técnica do trabalho, mediações para a democratização de conhecimentos e saberes do trabalho; à seletividade do processo de escolarização, a garantia e a efetivação da educação escolar como direito público subjetivo.

Na literatura educacional recente, o termo gestão aparece com um significado restrito, geralmente empregado para designar o processo pelo qual se viabiliza determinada política educacional. Mas, também, tem sido usado para designar um processo mais amplo, que abrange a própria política educacional em suas diversas fases constitutivas (formação de agenda, formulação, implementação, implantação, monitoramento, avaliação).

Um exemplo de emprego restrito pode ser encontrado em publicação da Associação Nacional de Política e Administração Educacional (anpae), na qual gestão educacional é definida como

(...) conjunto de instrumentos para a direção, o gerenciamento e a coordenação das ações concretas previstas nos planos, programas e projetos, para garantir a obtenção dos resultados programados e o atingimento dos objetivos e orientações gerais presentes na política estabelecida. (Algarte, 1998, p. 16-17)

A gestão aparece como intervenção posterior e dependente da política,3 3 . Entende-se política, com base em Palumbo (1994, p. 35), como "(...) um processo, ou uma série histórica de intenções, ações e comportamentos de muitos participantes", cuja natureza é complexa, invisível e elusiva. Processo cujo princípio orientador é manifesto pelos objetivos, estratégias e instrumentos preferidos no equacionamento e busca de solução para os problemas públicos, condensando tanto orientações manifestas como latentes e denotando intenções das forças políticas. não resguardando a abrangência semântica atribuída ao termo no momento em que ele se propagou no discurso educacional brasileiro.

O emprego do termo com significado amplo pode ser visto em Bordignon e Gracindo (2000, p. 147; grifo nosso), que o utilizam para designar o "(...) processo político-administrativo contextualizado, através do qual a prática social da educação é organizada, orientada e viabilizada".

Além do emprego restrito e amplo, o termo gestão sofreu um processo de adjetivação que, concordando-se com Silva Júnior (2002), mais concorreu para obscurecer do que para elucidar o seu entendimento. A proliferação da adjetivação se deu desde os anos de 1980, de modo que hoje é preciso um esforço teórico para que se possa apreender não só o emprego desse termo, mas, principalmente, a lógica e os fundamentos de sua qualificação. Esse esforço é indispensável para o correto discernimento dos qualificativos da gestão educacional, encontrando-se, entre os mais usuais, estes: gestão democrática, gestão participativa, gestão dialógica, gestão compartilhada, gestão gerencial, gestão estratégica, gestão da qualidade total.

Nesse emaranhado de qualificações, proliferam na literatura educacional recente abordagens que, reportando-se à gestão democrática, se limitam a tratar da participação comunitária (necessidade, vantagens, possibilidades, empecilhos, mecanismos, instrumentos desta). Encontra-se até abordagem que apresenta a "gestão compartilhada" como se fosse o mesmo que "gestão democrática", ou a manifestação maior desta.

Para Silva Júnior (op. cit.), a qualificação da gestão como "democrática" e "participativa" tem se revelado um jogo conceitual intencional, cujo desdobramento sobrepõe esses adjetivos ao qualificativo "pública". Isso favorece a crescente prevalência da lógica do mercado educacional sobre a do direito à educação. Não se trata, portanto, de uma questão de somenos importância. Para o autor, a expressão "gestão pública" seria a mais apropriada para denominar o sentido de uma gestão que rejeita a imposição de práticas de administração privada na administração pública.

Regulação jurídico-legal: a gestão democrática e o lugar da avaliação

Parece importante relembrar aqui como se deu a inscrição da expressão gestão democrática da educação na regulação jurídico-legal vigente e, ao mesmo tempo, ressaltar o lugar da avaliação nessa concepção de gestão, bem como a relação entre elas. Para tanto, a análise parte de uma perspectiva histórica. Considera, de um lado, as propostas formuladas nos anos de 1980-1990 por entidades da área educacional nas Conferências Brasileiras de Educação (CBEs), no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FNDEP)4 4 . Apenas para lembrar, registra-se que o Fórum da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e Gratuito foi lançado em Brasília, em 9 de abril de 1987, tendo por proposta reivindicar um projeto para a educação. Aglutinando coletivos socialmente organizados, ele congregou inicialmente 15 entidades nacionais, sendo 12 delas da área da educação, a maioria criada ao final dos anos de 1970. No processo de elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, esse Fórum ampliou-se, passando a denominar-se Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FNDEP). Manteve-se, segundo Gohn (1992, p. 215), "(...) impulsionado apenas pelas entidades orgânicas; a pressão popular organizada não ocorreu". Não logrou construir uma identidade junto à sociedade, especialmente por meio da comunicação de massa. e em Congressos Nacionais de Educação (CONEDs). De outro lado, foca projetos de leis de autoria e defendidos pelo Ministério da Educação (MEC) e o ordenamento jurídico-legal construído no período de 1988-2001.

Lembra-se que o debate nas cbes do período de 1980-1986 enfatizou a gestão pública, acentuou a democratização da educação, a descentralização e discutiu a municipalização. Especialmente importante foi o consenso expresso na Carta de Goiânia, de 5 de setembro de 1986, uma vez que indicou para o texto constitucional a inscrição de princípios relativos à gestão democrática, destacadamente estes dois:

19. O Estado deverá garantir à sociedade civil o controle da execução da política educacional em todos os níveis (federal, estadual e municipal), através de organismos colegiados, democraticamente constituídos.

20. O Estado assegurará formas democráticas de participação e mecanismos que garantam o cumprimento e controle social efetivo das suas obrigações referentes à educação pública, gratuita e de boa qualidade em todos os níveis de ensino. (Carta..., 1988, p. 1.243; grifos nossos)

Esses princípios expressam uma concepção de gestão democrática que, centrada na execução, deixou de propugnar a atuação da sociedade civil na formação da agenda pública e na formulação de políticas educacionais, prevalecendo aí um significado restrito do termo gestão. À sociedade civil caberia a função de controle da ação executora estatal no cumprimento de suas obrigações para com a educação pública, por meio de organismos de representação constituídos democraticamente, cuja natureza/poder não se define senão por inferências baseadas na função reivindicada, qual seja, a de controle. Basicamente, a democratização da gestão propunha-se a enfrentar na esfera da execução o exercício autocrático do poder, a hierarquização e centralização administrativa e, ainda, submeter ao exame social (vigilância, fiscalização) a ação executora estatal na educação. Preso ao recente passado autoritário, o então propugnado não chega a vislumbrar o futuro da gestão educacional para além de avanços compatíveis com uma concepção liberal de democracia.

No contexto de elaboração da Carta Constitucional de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, o tema gestão democrática tornou-se eixo importante das ações políticas das entidades que constituíram o fndep. Este buscou preservar o Estado do desvirtuamento gerado por interesses privados, defendeu a escola pública, a exclusividade das verbas públicas para essa escola e a organização de um sistema educacional que contasse com a institucionalização da participação da sociedade civil na esfera do Executivo e do Legislativo (Gohn, 1992). Defendeu uma concepção ampla de gestão democrática que, nas palavras de Rosar (1999, p. 12), implicaria

(...) a redefinição da estrutura de poder, desde o nível macro do Ministério da Educação na sua forma de organização e funcionamento, até o nível micro de cada escola. As ações do MEC deveriam estar adequadas às deliberações de um Fórum Nacional de Educação que pudesse definir, a partir de amplo debate nacional, as diretrizes político-pedagógicas, as prioridades educacionais, a garantia de recursos para todos os níveis de ensino considerados como um todo, e as formas de avaliação dos mesmos, com a participação de diversos setores sociais.

A concepção restrita de gestão parecia então superada e a construção da gestão democrática não estaria focada apenas na unidade escolar.

Quanto à avaliação, constatou-se que ela não apareceu no debate educacional dos anos de 1980 como mediação necessária à forma democrática de gestão da educação. Examinando-se o conteúdo das CBEs (Conferência..., 1980; 1982; 1986; 1988), pode-se verificar que a avaliação, como estratégia ou ferramenta da gestão educacional, não figurou como tema da agenda de debates dos educadores, de modo que essas Conferências não refletiram o crescente destaque dado a essa prática, tanto no planejamento educacional, como nos estudos avaliativos e nos programas e projetos governamentais (Freitas, 2005a).

Contudo, isso não significa que o debate (nas CBEs e no FNDEP) a respeito da nova forma de administrar a educação deixasse de abrir possibilidades para a afirmação do interesse pela avaliação de larga escala como estratégia da administração central. A crítica aos resultados do sistema educacional, juntamente com um discurso sobre uma política para educação dos pobres, ensejou a ênfase nos temas da qualidade e das oportunidades do ensino. Sob esses argumentos, os diagnósticos ganharam destaque e os agentes estatais se empenharam em ressaltar a necessidade do governo central contar com indicadores confiáveis a respeito da realidade educacional existente no país (idem, ibid.).

Nota-se que o discurso dos educadores nas CBEs e no FNDEP, mesmo sem alusão direta e explícita, não deixou de trazer latente a necessidade da avaliação educacional, quer fosse para demarcar a idéia de um padrão de qualidade nos sistemas de ensino, quer para o controle social da execução de políticas e do cumprimento das obrigações estatais na educação, quer para viabilizar formas democráticas de participação. Todavia, não parece ser pertinente inferir que estivesse aí sugerida qualquer forma de avaliação que prescindisse da lógica democratizante, ou mesmo que a afirmasse como essencial à democratização da gestão educacional.

Inscrita a gestão democrática no texto constitucional de 1988 como um dos princípios do ensino público, travou-se a luta pela sua definição no processo de elaboração da LDB. As diferentes proposições em disputa no processo legislativo (que se estendeu de 1988 a 1996) revelam distintas concepções de gestão democrática e evidenciam o lugar atribuído ou não à avaliação educacional.

Expressando o debate no âmbito do Fórum em Defesa da Escola Pública, o Projeto de LDB n. 1.258-A/88 (Texto..., 1997a) propôs a criação do Sistema Nacional de Educação (SNE) e que as linhas mestras da gestão da educação fossem definidas no Plano Nacional e Planos Estaduais da área. Nesse projeto de lei, o sne compreende o Conselho Nacional de Educação (CNE), com papel central, sendo ele instância de caráter deliberativo e com representação permanente da sociedade civil, para compartilhar com o governo a formulação, o acompanhamento e a avaliação da política educacional. Seria esse Conselho secundado pelo Fórum Nacional de Educação, que com ele dividiria a condição de instância máxima de deliberação e avaliação do sistema educacional (Saviani, 1997). Esse modelo acenava com a dilatação de mecanismos e princípios próprios à democracia liberal, favorecendo a constituição de uma arena propícia à promoção da participação direta.

A última versão desse Projeto, o substitutivo Jorge Hage (Texto..., 1997b), preceituou a avaliação institucional, a avaliação como condição de liberdade de ensino à iniciativa privada, como meio para verificar efeitos das tecnologias da comunicação e informação na aprendizagem dos alunos e como mediação no processo de progressão funcional dos profissionais da educação. Propôs a fixação de um padrão de qualidade a ser garantido pelo SNE. No entanto, fica claro que a avaliação educacional não teve lugar de destaque nessa proposta e sua relação com a gestão democrática não ficou explícita.

Diferentemente, o anteprojeto de LDB do MEC, aprovado pelo Despacho Ministerial de 31 de agosto de 1989 (Brasil, 2004), não só explicita a importância da avaliação como a relaciona com a gestão democrática. Esse anteprojeto, formulado pela burocracia do Ministério, foi apresentado como subsídio ao Grupo de Trabalho instituído na Comissão de Educação da Câmara Federal. Dois artigos desse anteprojeto são especialmente elucidativos, conforme se verá.

Art. 17 – As instituições de ensino que integram cada sistema desenvolverão suas atividades segundo o ideal democrático, incentivando a participação dos diferentes segmentos sociais na consecução dos objetivos estabelecidos para cada nível de ensino. (Brasil, 2004)

A democratização da gestão aparece, nesse dispositivo, reduzida a um ideal orientador das atividades de escolas e universidades e ao incentivo à participação de seus diferentes segmentos sociais. O artigo subseqüente esclarece melhor a concepção de gestão democrática que o MEC tinha então em vista.

Art. 18 – A gestão democrática constitui princípio fundamental da organização e da administração das instituições públicas de ensino, compreendendo:

I – a existência de mecanismos de co-participação na gestão das instituições de ensino, com representação dos segmentos que a integram, incluídos, no caso das instituições destinadas à educação e ao ensino de crianças e adolescentes, os pais ou responsáveis;

II – a obrigatoriedade de prestação pública e sistemática de contas e de divulgação de informações referentes ao seu desempenho institucional e à qualidade dos serviços educacionais oferecidos.

§ 1º – O cumprimento do disposto neste artigo dar-se-á com observância dos seguintes preceitos:

I – existência de órgãos colegiados e conselhos escolares, com competência sobre o conjunto de todas as atividades desenvolvidas pela instituição;

II – fixação de objetivos, metas e prioridades em cada instituição de ensino;

III – avaliação permanente da qualidade dos serviços prestados e dos resultados das atividades educacionais oferecidas à sociedade;

IV – composição dos órgãos colegiados e conselhos, normativos ou deliberativos, com a participação majoritária de professores e proporcional de estudantes, incluindo, também, pais ou responsáveis, quando necessário, e representantes da sociedade civil, através de critérios e normas a serem definidos em cada sistema de ensino, nos termos de lei especial, ou nos estatutos e normas internas das instituições que gozam de autonomia;

V – utilização de métodos participativos para a escolha de dirigentes, ressalvado o provimento de cargos por concurso público;

VI – incentivo para a criação de associações de profissionais do ensino, alunos, ex-alunos e pais, além, das de caráter acadêmico, assegurada sua participação nos processos decisórios internos das instituições.

§ 2º – Os sistemas de ensino definirão a natureza e a extensão da autonomia pedagógica, administrativa e de gestão financeira das instituições públicas de ensino que os integram, observando-se, em relação às universidades, o disposto na Seção II, Capítulo V, do Título V. (Brasil, 2004; grifos nosso)

Como se vê, a democratização da gestão é proposta para escolas e universidades públicas e consiste em co-participação (via representação) e prestação de contas (via avaliação e divulgação de desempenho/resultados do ensino). O texto indica também meios para isso, assim como o limite da autonomia. A relação entre gestão democrática e avaliação educacional fica evidente. Fundamentalmente, esse anteprojeto de lei introduz na proposta de gestão o germe de uma concepção de avaliação centrada em desempenho/resultados, que abre caminho para avaliações externas e em larga escala. Percebem-se aí reflexos das experiências brasileiras em avaliação de rendimento escolar e de estudos em avaliação educacional realizados no decorrer dos anos de 1980, sob o comando ou em articulação com o MEC, bem como a influência do crescente interesse internacional pela avaliação educacional em larga escala (Freitas, 2005a, 2005b). Todavia, esse anteprojeto foi abandonado no confronto com interesses de "grupos privatistas" (Saviani, 1997). Ainda assim, esse texto é importante porque revela disposições e tendências verificadas ao final dos anos de 1980.

Como é de amplo conhecimento, a disputa no legislativo girou em torno do Projeto n. 1.258-A/88, ou seja, da proposta baseada no debate educacional, e do Projeto de n. 67/1992 (Texto..., 1997c), apresentado ao Senado Federal, em 20 de maio de 1992, pelo então Senador Darcy Ribeiro. Esta segunda proposta contou com a assessoria de burocratas do MEC (Saviani, 1997) e definiu para a gestão democrática os seguintes princípios: integração do sistema/escola com a família, comunidade e sociedade; descentralização; participação democrática no processo educacional; maioria absoluta dos professores em colegiados e comissões. Em título específico que trata da qualidade do ensino, esse Projeto dispôs sobre: estabelecimento de um padrão mínimo de qualidade do ensino; estabelecimento de padrão mínimo de oportunidades educacionais, sendo este orientador da política educacional, inclusive da alocação de recursos, priorizando-se o ensino obrigatório; supervisão da qualidade do ensino pelos sistemas, com a função de colaborar na melhoria das práticas docentes e práticas administrativas e de normalizar a avaliação educacional; processo nacional de avaliação do rendimento escolar pela União, com assistência financeira condicionada à colaboração "ativa" dos sistemas de ensino. Percebe-se que esse Projeto ressaltou o caráter instrumental da avaliação para o controle e a fiscalização centralizada da educação básica, dissociando-a do preceito da gestão democrática. Esta, por sua vez, não apareceu como condição necessária e possibilidade de qualificação do ensino.

A solução das disputas na elaboração normativa materializou-se em disposições legais e constitucionais. Primeiro, a Lei n. 9.131, de 24 de novembro de 1995, ignorou as propostas relativas ao SNE, estabelecendo que o MEC exercesse o poder público federal em matéria de educação e que o CNE seria fundamentalmente um órgão colaborador. Coube, assim, ao MEC a função de (art. 1º) "formular e avaliar a política nacional de educação, zelar pela qualidade do ensino e velar pelo cumprimento das leis que o regem". A seguir, a Emenda Constitucional n. 14, de 12 de setembro de 1996, estabeleceu a organização dos sistemas de ensino pelos entes federativos, explicitando a moldura do regime de colaboração recíproca, a distribuição de autoridade, a divisão de competências e a repartição de funções administrativas. Na seqüência, a Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabelecendo as diretrizes e bases da educação nacional, fixou funções da União, incumbências de cada ente federativo, dos estabelecimentos de ensino e dos docentes, mas deixou a cargo dos sistemas de ensino fixar as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, apenas determinando a participação na elaboração do projeto pedagógico da escola e em conselhos escolares. No primeiro caso, exigiu a participação dos profissionais da educação e, no segundo, das comunidades escolar e local. Também prescreveu a promoção da autonomia da unidade escolar pública pelos sistemas.

Conforme ressaltou Saviani (1997), a Lei abriu mão de instituir uma instância com representação permanente da sociedade civil, destinada a compartilhar com o governo tanto a formulação como o acompanhamento e a avaliação da política educacional. Paro (1998) chama a atenção para o fato de que a Lei também renunciou a regulamentar o princípio de gestão democrática de forma mais precisa, deixando de fazer avançar importantes aspectos da gestão escolar. Assim, atribuiu a estados e municípios a decisão sobre importantes aspectos da gestão. Nota-se, ainda, que os dispositivos sobre a matéria focaram somente o âmbito escolar. Basicamente, a gestão democrática ficava aí reduzida à participação, notadamente pela via representativa.

Porém, a Lei foi bastante precisa ao estabelecer como incumbências da União, "em colaboração com os sistemas de ensino", a obtenção, a análise e a divulgação de informações sobre a educação, assim como a avaliação de rendimento escolar, em vista dos objetivos de definição de prioridades e de melhoria da qualidade do ensino. Estabeleceu também, no seu artigo 87 (§ 3º, inciso IV), como dever dos municípios – e, supletivamente, dos estados e da União – a integração de todos os estabelecimentos de ensino fundamental ao sistema nacional de avaliação do rendimento escolar, até o final da Década da Educação (1997-2007). Entretanto, nenhum dispositivo dessa Lei tratou da relação/inter-relação de avaliação e gestão democrática.

Mesmo assim, há que se concordar com Cury (2002) de que, na esfera constitucional, foram fixadas condições favoráveis à prática da gestão democrática, principalmente a opção federativa configurada por um regime político e normativo plural e descentralizado, de entendimento e colaboração entre os entes federativos e a opção pelo Estado democrático de direito, que sujeita a administração à legalidade e à existência de controles, propicia a legitimidade do sistema representativo e a força da organização e controle sociais. Nesse contexto, a regulação legal acabou criando condições para a prática da gestão democrática no país.

Importante contribuição foi propiciada pela reforma administrativa, que teve como corolário a Emenda Constitucional n. 19, de 4 de junho de 1998.5 5 . Foi essa Emenda aprovada após 34 meses de tramitação legislativa, sendo a 58ª versão do Projeto de Emenda Constitucional do Executivo n. 173 (PEC 173) enviado ao Congresso Nacional em agosto de 1995. Embora inspirada no ideário neoliberal e nos pressupostos do gerencialismo, essa Emenda, ao dispor sobre princípios e normas da administração pública, trouxe novas disposições para a gestão democrática da educação, ainda que a ela não se refira diretamente. Dando nova redação ao artigo 37 da Constituição Federal de 1988, o artigo 3º dessa Emenda fixou os princípios de "(...) legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)" da administração pública dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Para Cury (2002, p. 168), esses dispositivos, "(...) se e quando efetivados, colocam a transparência, o diálogo, a justiça e a competência como transversais à cidadania democrática e republicana."

No mesmo artigo, § 3º, inciso I, essa Emenda dispôs sobre a exigência de assegurar a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços prestados pela administração pública, enquanto dimensão das formas de participação dos usuários em tais serviços. Participação essa a ser regulada em lei.

Além de permitir uma visão ampliada da gestão democrática, os referidos princípios e normas apontam para a inclusão da avaliação na gestão pública. Isso abre a possibilidade da inter-relação entre ambas, porém sem determinar sob que ótica.

Por fim, há que se atentar para a Lei n. 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE). Essa Lei propugna o aprimoramento contínuo do regime de colaboração (com vistas à ação coordenada entre entes federativos, compartilhamento de responsabilidades e colaboração entre redes e sistemas de ensino), o fortalecimento das instâncias de controle interno e externo e órgãos de gestão nos sistemas de ensino, a implantação de sistemas de informação que favoreçam o planejamento, a consolidação de um sistema de avaliação, a desburocratização e descentralização da gestão e o exercício da autonomia dos sistemas de ensino, mediante implantação da gestão democrática. Para isso, prevê conselhos de educação nos sistemas, conselhos nas unidades escolares e formas de escolha da direção escolar, ressaltando a representatividade, a participação, a competência e a liderança dos gestores. Reafirma a definição das normas da gestão democrática como tarefa de cada sistema de ensino, com a participação da comunidade.

Essa Lei acentua a atuação da União no monitoramento, controle, avaliação do ensino e na indução de políticas subnacionais. Favorece a ampliação da regulação central instrumentada por um sistema nacional de avaliação e um sistema de informações, bem como pela absorção das funções de supervisão e inspeção nesse contexto, assim como a articulação de mecanismos de avaliação federais, estaduais e municipais.

A aprovação desse Plano se dá em prejuízo da proposta de pne apresentada por entidades organizadas no contexto do I e II CONEDs. Tal proposta retoma a defesa da instituição do sne, entendendo a gestão democrática como um processo estratégico de superação do autoritarismo, do individualismo e de desigualdades socioeconômicas e propiciador do trabalho coletivo participativo na construção de uma sociedade fundada na justiça social. Basicamente, um processo constituinte do espaço público de direitos fundamentais.

Mesmo sem contemplar a ótica democrática das proposições historicamente formuladas pelas organizações sociais referidas, a regulação jurídico-legal atualmente vigente no Brasil oferece, conforme mostrou Cury (2002), importantes bases para a efetivação da gestão democrática. Esse ordenamento não engessa ou inviabiliza práticas gestoras fundadas em distintas concepções de democracia, como a competitiva, a deliberativa, a democrático-popular (Dallmayr, 2001; Coelho & Nobre, 2004). Por isso mesmo, em tempos de políticas públicas marcadas pelo neoliberalismo, esse tema figurou de forma genérica e abstrata no discurso oficial. Também por isso, os sistemas de ensino podem optar por definir uma concepção própria de gestão e de avaliação da educação básica. Resta saber como isso tem se dado.

No discurso oficial do período de 1988-2001, a tônica da democratização da gestão da educação básica foi a participação comunitária, por meio de conselhos constituídos e operantes nos sistemas de ensino e nas instituições escolares do país. Embora represente inegavelmente um avanço, essa tônica tem concorrido para disseminar uma concepção estreita de gestão democrática nos sistemas e instituições de ensino estaduais e municipais, na medida em que deixa de acentuar outros importantes elementos dessa prática. Por outro lado, a política educacional da última década, referida a elementos ressaltados pelo gerencialismo, pôs ênfase na prática da avaliação externa e em larga escala de resultados da educação básica, consolidando-a como importante estratégia da administração central e induzindo-a em administrações subnacionais. Assim, nas práticas reguladoras estatal e governamental, passaram a coexistir discursos e práticas relativos à gestão democrática, ao gerencialismo e à avaliação mencionada. Essa coexistência do discurso da democratização da gestão com práticas avaliativas apoiadas em supostos do gerencialismo precisa ser objeto de maiores ponderações.

Na necessária avaliação da gestão democrática, precisa-se considerar que esta última consiste num complexo processo que tem a participação como um de seus elementos principais. Porém, não qualquer participação,6 6 . Motta (1987) e Gohn (2001) oferecem importantes contribuições a respeito. mas a participação que permite aos cidadãos influenciar/tomar parte do poder, ter parte na deliberação e tomada de decisão públicas, ou seja, aquela que Motta (1987) considerou ser a "autêntica participação". No entanto, há que não se reduzir a gestão democrática à participação (representativa e direta), uma vez que são diversos os elementos que a constituem, mencionando-se estes: compromisso cotidiano e substantivo com a transformação das relações sociais e com a justiça social; compartilhamento do poder e da autoridade; práticas culturais emancipadoras, ou seja, que propiciem liberação de submissões, dominações, tutelas e explorações; práticas administrativas regidas pela legalidade, impessoalidade, transparência (publicidade), moralidade; liderança colegiada; trabalho coletivo; diálogo como princípio e método da gestão de conflitos e do trabalho; competência e eficiência como expressões da responsabilidade com o que é público.

Não há, porém, uma única concepção de gestão democrática, até porque não há uma só concepção de gestão e de democracia. Por isso mesmo, os elementos acima mencionados podem apresentar-se com distintos significados. Daí a impropriedade de se falar genérica e abstratamente em gestão democrática, como se não existissem dissensões teórico-práticas essenciais, bem como escolhas a fazer. Uma implicação disso é a necessidade de um tratamento mais consistente dos temas envolvidos nessa noção, tanto na literatura educacional como na formação inicial e continuada dos profissionais da educação.

Avaliação e gestão democrática: uma relação a ser avaliada

O que se viu até aqui mostra o lugar que foi dado ou não à avaliação educacional na construção da noção de gestão democrática na regulação jurídico-legal brasileira vigente. Essa regulação propicia e instrumenta práticas de gestão comprometidas com relações mais democráticas entre os envolvidos e, implicitamente, indica parâmetros de sua avaliação. Esta passou a ser um dos meios para a participação na administração pública pelos cidadãos, vistos como "usuários dos serviços públicos", conforme já mencionado.

Mesmo que o ordenamento constitucional não estabeleça explícita associação da avaliação com o princípio de gestão democrática e nem determine de forma direta a necessária inter-relação dessas práticas, nota-se que ele não coloca entrave para os esforços de qualificação de ambas as práticas, ainda que o financiamento educacional não a favoreça. Logo, a relação/inter-relação de gestão e avaliação na educação emerge como objeto avaliativo.

Entende-se que tal inter-relação pode ser importante condição para a difusão de valores democráticos e republicanos e, principalmente, do caráter pedagógico e educativo de ambas as práticas. A gestão não prescinde da avaliação para que possa efetivamente se materializar segundo seus pressupostos e finalidades. Por outro lado, a natureza dessa prática demarca a razão de ser da avaliação, seu conteúdo, seu formato. Por isso, não é irrelevante a concepção que se tem da gestão democrática.

Por outro lado, a prática da avaliação – sua lógica, seus propósitos, seu modelo e seus usos – concorre para a configuração de um padrão de gestão mais ou menos próximo/distante do ideal democrático propugnado por esferas públicas, pois a avaliação é um dos componentes constituintes da gestão. Assim, tanto a forma como se dá a prática da avaliação como a inexistência dela expressam os fundamentos, o caráter e o grau do compromisso de democratização de determinada gestão. A forma como se avalia pode ser bem mais reveladora da democratização ou não da gestão do que a existência de processos e mecanismos de eleição, ação colegiada, ação coletiva e participativa.

A gestão que se quer democrática requer avaliação capaz de informar, de modo fundamentado e pertinente, a democratização tanto das deliberações e tomadas de decisão como da execução, avaliação e aprimoramento de tais decisões e práticas delas decorrentes. Requer que a avaliação opere como mediação em processos/práticas de gestão colegiada e participativa em todas as instâncias educacionais.

Diante disso, destaca-se aqui a importância de avaliar para que concepção de gestão democrática tem concorrido a prática da avaliação em larga escala realizada pela União, nos últimos quinze anos. Uma vez que a avaliação é componente estratégico da gestão educacional e esta deve ser de natureza democrática, cabe avaliar se essa avaliação tem sido efetiva nessa direção. O mesmo precisa ser verificado com relação aos sistemas de ensino e escolas, como parte da consecução da regulação instituída.

No tocante à avaliação, considera-se que o desafio avaliativo não pode mais ficar restrito ao exame de aspectos técnicos, metodológicos, administrativos, operacionais da experiência brasileira dos últimos quinze anos, uma vez que uma gama variada de perguntas espera por respostas. Entre outras indagações pertinentes, encontram-se as seguintes: A experiência brasileira de avaliação em larga escala tem concorrido para qualificar a gestão da educação básica no país? Tem propiciado avanços significativos no âmbito da gestão central e na esfera das relações federativas? Quais foram os seus efeitos nos sistemas de ensino e nas escolas? O que representam e propiciam em termos de democratização das relações de poder na educação?

A avaliação da regulação jurídico-legal e da experiência brasileira em avaliação em larga escala precisa oferecer elementos que permitam responder perguntas relacionadas à democratização da gestão educacional. Devem ser respondidas questões como as que seguem:

  • Que lugar tem sido dado à

    avaliação na configuração da prática da

    gestão democrática da educação básica, considerando-se a política educacional nacional, a ação dos sistemas e dos estabelecimentos de ensino?

  • Teria a experiência brasileira de

    avaliação em larga escala do período de 1990-2006 concorrido para

    democratizar a gestão da educação básica? Em outras palavras, a

    avaliação, conforme realizada, tem concorrido para o diálogo, a autonomia, o trabalho coletivo e participativo na

    gestão educacional? Como e quanto a

    avaliação em larga escala tem concorrido para a observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência na

    gestão educacional?

  • Teria a experiência avaliativa nacional, subnacional e local propiciado a inter-relação de

    gestão democrática e

    avaliação? Em que medida e como isso tem ocorrido? Em que tem redundado?

  • Em que medida a própria prática de

    avaliação orienta-se pelo princípio de democratização?

  • Como e em que medida a

    avaliação em larga escala tem sido efetiva como dimensão da participação dos cidadãos?

  • Em que medida a

    avaliação em larga escala tem contribuído para o controle democrático do Estado pela participação da população na tomada de decisões, seja em razão dos direitos de cidadania e de usuário dos serviços públicos, seja em razão da necessidade das escolas contarem com essa participação?

  • Como e em que medida a

    avaliação em larga escala tem sido efetiva como ferramenta da geração de eficiência e competência individual, coletiva, institucional, administrativa, sistêmica? – porque também eficiência e competência devem ser marcas de uma

    gestão democrática, o que implica que sejam definidas no interesse desta.

Enfim, o valor e a utilidade da avaliação para a gestão democrática precisam ser considerados como critérios de aferição da pertinência da avaliação efetuada. E, como manifestação da própria concepção de gestão democrática prevalecente, pode essa prática, examinada em seu valor e utilidade, revelar e orientar escolhas relativas à vivência democrática na educação.

Notas

Recebido em julho de 2006 e aprovado em novembro de 2006.

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  • BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1999.
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  • CONFERÊNCIA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO, 2., 1982, Belo Horizonte. Anais.. São Paulo: Loyola, 1982.
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  • 1
    . As Conferências Brasileiras de Educação consistem em eventos promovidos conjuntamente pela Associação Nacional de Educação (ANDE), pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e pelo Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES). Estas organizações surgiram nos últimos anos da década de 1970, representando e possibilitando a ampliação do espaço dos debates educacionais.
  • 2
    . O termo gestão, mais difundido nos trabalhos franceses e traduções portuguesas, passara a ser preferido por muitos educadores brasileiros.
  • 3
    . Entende-se
    política, com base em Palumbo (1994, p. 35), como "(...) um processo, ou uma série histórica de intenções, ações e comportamentos de muitos participantes", cuja natureza é complexa, invisível e elusiva. Processo cujo princípio orientador é manifesto pelos objetivos, estratégias e instrumentos preferidos no equacionamento e busca de solução para os problemas públicos, condensando tanto orientações manifestas como latentes e denotando intenções das forças políticas.
  • 4
    . Apenas para lembrar, registra-se que o Fórum da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e Gratuito foi lançado em Brasília, em 9 de abril de 1987, tendo por proposta reivindicar um projeto para a educação. Aglutinando coletivos socialmente organizados, ele congregou inicialmente 15 entidades nacionais, sendo 12 delas da área da educação, a maioria criada ao final dos anos de 1970. No processo de elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, esse Fórum ampliou-se, passando a denominar-se Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública (FNDEP). Manteve-se, segundo Gohn (1992, p. 215), "(...) impulsionado apenas pelas entidades orgânicas; a pressão popular organizada não ocorreu". Não logrou construir uma identidade junto à sociedade, especialmente por meio da comunicação de massa.
  • 5
    . Foi essa Emenda aprovada após 34 meses de tramitação legislativa, sendo a 58ª versão do Projeto de Emenda Constitucional do Executivo n. 173 (PEC 173) enviado ao Congresso Nacional em agosto de 1995.
  • 6
    . Motta (1987) e Gohn (2001) oferecem importantes contribuições a respeito.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Set 2007
    • Data do Fascículo
      Ago 2007

    Histórico

    • Recebido
      Jul 2006
    • Aceito
      Nov 2006
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