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"ATRÁS DA CONSCIÊNCIA, ESTÁ A VIDA": O AFASTAMENTO TEÓRICO LEONTIEV-VIGOTSKI NA DINÂMICA DOS CÍRCULOS VIGOTSKIANOS* * *Artigo resultado do projeto de pesquisa "O campo conceitual da síntese psíquica: análise teórica e gênese histórica na psicologia histórico-cultural" financiado pelo CAPES.

"Behind consciousness, there is life": the Leontiev-Vygotsky theoretical departure in the network of vygotskian scholars

"À l'arrière de la conscience il y a la vie": l'éloignement theorique de Leontiev et Vygotski dans la dynamique des cercles vigotskienS

RESUMO:

Este artigo propõe-se a realizar análise crítica de alguns aspectos da história da troika Vigotski-Luria-Leontiev a partir da discussão de Yasnitsky das diversas fases do Círculo de Vigotski. Caracteriza-se como estudo histórico e teórico de A.N. Leontiev no contexto da década de 1930, em que se estabeleceu um novo sistema de produção científica no bojo do regime stalinista. Nesse cenário, debate-se o afastamento entre Vigotski e Leontiev problematizando a relação entre consciência e vida como foco importante das diferenças teóricas entre os autores. Finaliza-se o artigo apontando o marxismo carente de mediações para o qual Leontiev se desloca ao criticar Vigotski, de modo a se contribuir para a crítica da tese de que o afastamento Vigotski-Leontiev constitui-se em tentativa de neutralizar o marxismo de Vigotski.

Palavras-chave:
Teoria da atividade; Leontiev; Críticas a Vigotski; Materialismo; Psicologia histórico-cultural

ABSTRACT:

This article proposes to review some aspects of hagiographic history of the troika Vygotsky-Luria-Leontiev departing from Yasnitsky's definition of stages in Vygotsky's Circle. It features a historical and theoretical study of AN Leontiev in the 1930s, the decade in which a new scientific production system was established in the midst of the Stalinist regime. In this background, the author discusses the departure between Vygotsky and Leontiev presenting theoretical differences concerning the relationship between consciousness and life for both authors. The author concludes the article pointing out the deficit of mediations in Leontiev's Marxism, which is in tune with the official Marxism of the 1930s. My purpose is to criticize the thesis which assess the departure Leontiev-Vigotski as nothing else than an attempt to neutralize the Marxism of Vygotsky.

Keywords:
Activity theory; Leontiev; Criticism of Vygotsky; Materialism; Historical-Cultural psychology

RÉSUMÉ:

Cet article décrit certains aspects de l'histoire de la troïka Vygotsky-Luria-Leontiev à partir de la discussion sur les différentes étapes du Cercle de Vygotsky. Il s'agit d'une étude historique et théorique sur Leontiev dans le contexte des années 1930, où un nouveau système de production scientifique a été établi au cours du régime Stalinien. Dans ce scénario, on débat la distance entre Vygotski et Leontiev, en questionnant le rapport entre la conscience et la vie comme un axe important des différences théoriques entre Vygotsky vs. Leontiev dans la dynamique des cercles vigotskiens. L'article se conclut en soulignant le Marxisme déficitaire des médiations que Leontiev s'utilise quand il critique Vygotski. On souhaite contribuer à la critique de la thèse selon laquelle la défense de l'éloignement entre Vygotsky et Leontiev constitue une tentative de neutraliser le marxisme de Vygotsky.

Mots-clés:
Théorie de l'activité; Leontiev; La critique a Vygotski; Matérialisme; Psychologie historique et culturel

A teoria da atividade de Aleksei Nikolaievitch Leontiev (1903-1979) vem crescendo no Brasil desde que começou a ser difundida - logo após Vigotski, junto de S.L. Rubinstein e A.R. Luria - entre os anos de 1975-1980 (FREITAS, 1994FREITAS, M. T. A. O pensamento de Vygotsky e Bakthin no Brasil Campinas: Papirus, 1994.). Nessa época, a narrativa histórica "hagiográfica", na qual se desenvolveu a noção de que a psicologia histórico-cultural foi elaborada pela troika Vigotski-Luria-Leontiev, já se articulava na União Soviética (URSS), tendo como fonte especialmente relatos testemunhais colhidos na década da morte de Luria e Leontiev (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).).

Produções do pedagogo Newton Duarte (1996DUARTE, N. A escola de Vigotski e a educação escolar: algumas hipóteses para uma leitura pedagógica da psicologia histórico-cultural. Psicologia USP , v. 7, n. 1-2. p. 17- 50, 1996.; 2001DUARTE, N. Vigotski e o "aprender a aprender": crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. Campinas: Autores Associados, 2001.) causaram comoção entre os vigotskianos brasileiros. Refutando as interpretações construtivistas da obra de Vigotski, o autor vem defendendo perspectiva marxista para as leituras deste, bem como o continuísmo entre Vigotski e outros autores soviéticos, com destaque para a unidade da troika Vigotski-Luria-Leontiev e a teoria da atividade desse último. Embora reconheça o valor da preocupação de Duarte de resgatar Vigotski para o marxismo (compartilhada com diversos autores não alinhados às suas posições), considero que Duarte (2001DUARTE, N. Vigotski e o "aprender a aprender": crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. Campinas: Autores Associados, 2001., p. 161) equivoca-se ao associar, no nível teórico, a defesa do distanciamento entre Vigotski e Leontiev como tentativa de uma neutralização do caráter marxista da teoria vigotskiana, em busca da assimilação dela ao universo ideológico do capitalismo contemporâneo.

Foge ao escopo deste artigo analisar as origens e os destinos dessa tese, cuja análise parece-me essencial para o futuro de uma teoria vigotskiana de base marxista. Apesar de não concordar inteiramente com a interpretação de alguns críticos da aproximação Vigotski-Leontiev, como van der Veer, Kozulin e González-Rey (bastante diferentes entre si) - os quais não defendem a construção de uma psicologia/educação marxista stricto sensu -, parece-nos equivocado promovê-los a adversários desejosos de colar em Luria e Leontiev a pecha de stalinistas (como defende SILVA, 2013SILVA, R. L. Leontiev e natureza social do psiquismo: das lacunas no texto à totalidade na história. 2013. 206 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Estadual de Maringá, maringá, 2013.), ou mesmo relacionar a defesa de um afastamento teórico Vigotski-Leontiev empreendida por eles à "ênfase numa leitura semiótica da obra de Vigotski" (DUARTE, 1996DUARTE, N. A escola de Vigotski e a educação escolar: algumas hipóteses para uma leitura pedagógica da psicologia histórico-cultural. Psicologia USP , v. 7, n. 1-2. p. 17- 50, 1996., p. 24). Incluir nesse grupo o brilhante David Joravsky (tal como faz Elhammoumi, mencionado por DUARTE, 2001DUARTE, N. Vigotski e o "aprender a aprender": crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. Campinas: Autores Associados, 2001.), um incontornável historiador da ciência soviética (e de modo algum figura hostil ao marxismo), também me parece ideia a ser revista.

Essas noções sobre a relação Vigotski-Leontiev já se converteram em trivialidade identitária que demarca o espaço social e cognitivo dos leitores "marxistas" e "não marxistas" de Vigotski e Leontiev em nosso país, ignorando as complexas dinâmicas de poder em que se constituiu o sistema stalinista de ciência nos anos 1930, sem que sua estrutura tivesse sido desmontada mesmo após a morte de Stálin, em 1953 (conforme elucidam os trabalhos de Nikolai Krementsov, ver TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).).

Hoje, a versão "hagiográfica" é criticada em benefício de uma análise mais abrangente da obra de Vigotski e dos seus círculos de pesquisa por vários autores, com destaque para A. Yasnitsky e E. Zavershneva. Defende-se mesmo que uma "Revolução Revisionista" sobre essas relações está em curso. Seu cerne é a pesquisa arquivística nas instituições em que os autores trabalharam, como também a abertura dos arquivos do Partido Comunista da União Soviética, desvelando de modo inédito a dinâmica de produção científica soviética.

Nesse contexto, penso que uma pesquisa histórica investida de rigor acadêmico e base marxista deve procurar integrar diversas fontes epistemológicas - privilegiando documentos, textos e análises que foquem a história da ciência como história social e política. Assim escreve Mironenko:

Discrepâncias teóricas entre A.N. Leontiev e L.S. Vygotsky, A.N. Leontiev e S.L. Rubinstein mal podem ser avaliadas e entendidas separadamente da história das relações pessoais deles, a última sendo fortemente impactada pelo desenvolvimento da vida política no Estado totalitário, tornando a história da psicologia soviética o que A.V. Petrovsky chamou de "uma história política da psicologia" ENT#091;...ENT#093; Na realidade, não havia discussões livres e abertas na ciência soviética. (2013MIRONENKO, I. A. Concerning interpretations of activity theory. Integrative Psychological and Behavioral Science , v. 47, n. 3, p. 376-393, 2013., p. 381, trad. nossa)

Como observa Martins (2013MARTINS, J. B. Apontamentos sobre a relação Vigotski e Leontiev: a "troika", ela existiu? Dubna Psychological Journal , v. 1, p. 71-83, 2013., p. 81), as proposições teóricas de Vigotski deixaram trilhas que não se articulam necessariamente com a teoria de atividade de Leontiev, especialmente no que diz respeito às dimensões semióticas dos fenômenos psicológicos. Entretanto, elas constituem fonte para uma psicologia enraizada nos pressupostos do materialismo histórico e do materialismo dialético. Para isso, é fundamental analisar as diferenças entre os autores, aprofundando-nos na discussão sobre o tipo de marxismo desenvolvido por cada um em relação à conjuntura na qual viveram (tal como tenho procurado fazer nesta série de trabalhos).

Este artigo compõe minha pesquisa de pós-doutorado, cujo corpus consiste, até o momento, nos dois livros mais famosos de Leontiev (1978aLEONTIEV, A. N.Actividad, consciencia y personalidadBuenos Aires: Ciencias del Hombre, 1978a.; bLEONTIEV, A. N.O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Horizonte Universitário, 1978b.), mais cerca de 22 artigos do autor, análise da bibliografia compilada por D.A. Leontiev (2004LEONTIEV, D. A. Lista de trabalhos publicados de A.N. Leontiev ENT#091;Spisok petchatnikh rabot A.N. LeontievaENT#093; (mimeo). 2004. Disponível em: <http://anleontiev.smysl.ru/sp_publ.htm>.
http://anleontiev.smysl.ru/sp_publ.htm...
), pelo menos 8 textos biográficos sobre Leontiev e Luria, além de comentadores com divergentes interpretações em história e teoria da psicologia soviética1 1 1. O foco de minha pesquisa está no campo conceitual dos estudos sobre a síntese psíquica - as noções de consciência, reflexo, personalidade, pessoa e outros termos que concorram à condição de objeto da psicologia histórico-cultural. Teve impulso com a realização de estágio pós-doutoral no Canadá, apoiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). .

Frente a esse conjunto de referências pesquisado, penso ser despropositado sustentar a existência de uma estrita continuidade Vigotski-Leontiev fundada, especialmente, nas comunalidades de seu marxismo. Ademais, como afirma Mironenko (2013MIRONENKO, I. A. Concerning interpretations of activity theory. Integrative Psychological and Behavioral Science , v. 47, n. 3, p. 376-393, 2013.), o afastamento entre os autores é reconhecido por todos os biógrafos, embora haja divergência sobre as suas exatas razões. Mesmo o filho (Aleksei Alekseievitch, principal responsável pela articulação teórica da narrativa hagiográfica em 1983), e neto (Dmitri Alekseievitch) de Leontiev admitem-no em textos publicados em russo e inglês. Entretanto, tradução recente de um trabalho deles o denega (ver LEONTIEV; LEONTIEV, 2009LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A. O mito do rompimento: A. N. Leontiev e L. S. Vigotski em 1932. In: TUNES, E; PRESTES, Z. Vigotski e Leontiev: ressonâncias de um passado. Cadernos de Pesquisa v. 39, n. 136, p. 290-299, 2009.), gerando falsas impressões no leitor de língua portuguesa sobre as posições da família Leontiev.

Em minha avaliação, as informações prestadas pela família sobre a carreira de A.N. Leontiev apresentam-se mais acuradas do que a interpretação de tais informações e, em muitos pontos, coadunam-se com outras fontes históricas. A família oscila entre apresentá-lo como vítima heroica da política stalinista ou autor cujo desenvolvimento teórico a suprir lacunas da psicologia vigotskiana.Com isso, deixa-se de lado sua posição concreta: a de importante/administrador inserido em um regime político autoritário2 2 2. Utilizado por autores não marxistas desde os anos 1920, alguns marxistas referendam a ideia de Estado totalitário (em que se enquadraria o soviético) como sinônimo da subordinação de todos os processos sociais importantes ao poder estatal. Na famosa definição de Friedrich, ele apresenta-se com "uma ideologia totalizante; um partido único compromissado com essa ideologia; uma polícia secreta totalmente desenvolvida; e três tipos de controle monopolista - das comunicações de massa, das armas operacionais, e de todas as organizações, incluindo as econômicas" (BOTTOMORE, 1983, p. 535-536, trad. nossa). Entretanto, preferi utilizar neste artigo o termo "regime autoritário" ou "stalinista" por ser o "totalitarismo soviético" uma discussão polêmica no campo da teoria política marxista. . Em linhas gerais, a biografia de Golder (2004GOLDER, M. Leontiev e a psicologia histórico-cultural: um homem em seu tempo. São Paulo: Xamã, 2004.) - influente em língua portuguesa, a despeito de apresentar graves deficiências no campo da história política e científica da União Soviética - alinha-se à versão continuísta estruturada pela família de Leontiev nos anos 1980.

* * *

O presente artigo compõe uma série de três trabalhos em português e três em inglês (já publicados ou no prelo: TOASSA, 2014TOASSA, G. Creating a materialistic psychology: sources and influence of Spinoza in Vygotsky´s works. International Journal of Liberal Arts and Social Sciences , v. 2, n. 5, p. 83-94, 2014.; 2015aTOASSA, G. Is there a Vygotskian Materialism? Ontological and epistemological concerns for a contemporary Marxist Psychology (Part II). Dubna Psychological Journal , v. 3, p. 66-80, 2015a.; 2015bTOASSA, G. Is there a Vygotskian Materialism? Ontological and epistemological concerns for a contemporary Marxist Psychology (Part I). Dubna Psychological Journal , v. 1, p. 58-68, 2015b.; no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).. O segundo e o terceiro artigos em inglês contam também com versão resumida em português. O primeiro da série em português dedica-se às críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).). O presente trabalho é o segundo da sequência em português (o quinto na ordem cronológica) propondo breve revisão do percurso de Leontiev no interior dos círculos de L.S. Vigotski (LSV) de 1924 até aproximadamente 1936, conjugada às primeiras críticas que A.N. e os kharkovitas dirigiram a LSV no contexto do regime stalinista. O sexto artigo, ainda em avaliação, explora as ideias de Leontiev sobre matéria e consciência entre 1936-1940 em relação às suas críticas a LSV. A série de trabalhos concentra-se, pois, entre 1927 e 1940.

A.N. Leontiev no interior dos círculos de Vigotski

Segundo Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.), a ideia de troika obscurece o processo histórico de formação de círculos ou grupos - ou melhor, de uma instável (e numerosa) rede de pesquisadores em torno de Vigotski - que o autor denomina como "Círculo de Vigotski". Devo utilizar também a ideia de "círculo" com referência a determinados grupos dessa rede.

As mudanças frequentes das bases institucionais dificultavam o desenvolvimento contínuo de um programa de pesquisa. Os relatos de pesquisa e as conferências internas, geradores de textos para os quais não se buscava publicação, eram de fundamental importância intelectual. Os textos de circulação restrita eram escritos em linguagem bastante distinta dos "publicáveis" (ver Yasnitsky, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.). Infelizmente, entre os traduzidos ao português e espanhol predominam os escritos filtrados pela censura (como Leontiev, 1978aLEONTIEV, A. N.Actividad, consciencia y personalidadBuenos Aires: Ciencias del Hombre, 1978a.; bLEONTIEV, A. N.O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Horizonte Universitário, 1978b.).

Na periodização de Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.), temos as seguintes formações:

  1. Primeira Fase (1924-1927): "pré-história" do Círculo de Vigotski;

  2. Segunda Fase (1927-1931): formação do Círculo de Vigotski-Luria;

  3. Terceira Fase (1931-1934): Círculo de Vigotski-Luria e o início da especialização e separação;

  4. Quarta Fase (1934-1936): os círculos vigotskianos e a desintegração do programa de pesquisa original;

  5. Quinta Fase (1936-1941): formação de um novo centro e o início da Escola de Kharkov de psicologia, e a Escola Vigotski-Luria-Leontiev.

Em certos períodos há mesmo consistentes evidências de conflitos entre esses grupos de pesquisa (caso de Zankov versus Leontiev), mas nos faltam fontes historiográficas sobre os diversos participantes e suas perspectivas sobre os fatos. A pesquisa era relativamente autônoma, embora a Vigotski e Luria coubesse a liderança intelectual. Especialmente até 1931, o papel de Leontiev era bem mais modesto (YASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.).

Nascido em 1903, esse autor graduou-se em ciências sociais na Universidade de Moscou em 1923 (GOLDER, 2004GOLDER, M. Leontiev e a psicologia histórico-cultural: um homem em seu tempo. São Paulo: Xamã, 2004., p. 17). Chegou ao Instituto de Psicologia Experimental de Moscou antes mesmo de Vigotski. A partir de janeiro de 1924, compôs a equipe do Laboratório de Reações Afetivas, dirigido por Luria no mesmo instituto (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.).

Essa agregação realizou-se na Primeira Fase do Círculo, que Yasnitsky interpreta como sendo de "pré-história" do Círculo de Vigotski, caracterizado por múltiplas interconexões. Marcou-se pela busca de um novo programa de pesquisa e um grupo.

A Segunda Fase caracterizou-se pela formação de círculos que, em algum ponto, convergiram e se interseccionaram. O termo "psicologia histórico-cultural", por muitos autores (como Golder) identificado como produto teórico do encontro da troika a partir de 1925, não é acurado nem mesmo como o termo escolhido por Vigotski e Luria para definirem sua psicologia (ver KEILER, 2012KEILER, P. "Cultural-historical theory" and "Cultural-historical school": from myth (back) to reality. Dubna Psychological Journal , v. 5, n. 1, p. 1-33, 2012.), tendo lhes sido atribuído pelos críticos stalinistas de Vigotski e Luria.

O único texto escrito em conjunto por Vigotski e Leontiev (1931/2005VIGOTSKI, L. S.; LEONTIEV, A. N. Prefácio ao livro de A.N. Leontiev, "Desenvolvimento da memória" ENT#091;Predisloviye k knige A.N. Leont'yeva "Razvitiye pamyati" ENT#093;. In: LEONTIEV, A. N. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005, p. 199-205 (Original de 1931).) foi o segundo prefácio escrito ao livro de Leontiev, "O desenvolvimento da memória". Trata-se de uma autocrítica curta e densa, de inestimável valor histórico. Aponta que o trabalho pecou por seu conteúdo exclusivamente experimental, que acabara por nivelar diferenças de idade (sinal de diferenças biológicas) e experiências culturais (como as existentes entre adultos iletrados e crianças), sacrificando a concreticidade da memória em benefício de certo "idealismo" imerso em preocupações apenas estruturais e funcionais. Isso ocorreu em detrimento de uma valorização do desenvolvimento dos significados - do plano simbólico da comunicação (VIGOTSKI; LEONTIEV, 1931/2005VIGOTSKI, L. S.; LEONTIEV, A. N. Prefácio ao livro de A.N. Leontiev, "Desenvolvimento da memória" ENT#091;Predisloviye k knige A.N. Leont'yeva "Razvitiye pamyati" ENT#093;. In: LEONTIEV, A. N. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005, p. 199-205 (Original de 1931)., p. 204).

Para Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.), os trabalhos de juventude de Leontiev já iam além dos limites da psicologia histórico-cultural, pavimentando a noção de que o signo adquire sua importância no processo de memorização através do significado. Se os comentadores observam que "no início dos anos 1930, ambos os pesquisadores começaram a perceber que seus futuros caminhos divergiam na psicologia" (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27., p. 15), silenciam sobre o conteúdo das críticas públicas a Vigotski e Luria e a natureza das mudanças político-ideológicas desse tempo, dispondo as divergências Vigotski-Leontiev apenas no campo da história das ideias.

Ocupando-se predominantemente da troika , Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.) relatam que Leontiev, Vigotski e Luria receberam, do Comissário de Saúde da Ucrânia, S.I. Kantorovich, convite para desenvolver pesquisa psicológica na capital, Kharkov. Esse momento coincidiu com o corte de postos de trabalho em Moscou - cite-se como exemplo o caso da chamada pyaterka (Zaporozhets, Bozhovich, Levina, Morozova e Slavina), grupo lotado na Segunda Universidade de Moscou. Os pesquisadores receberam indicações compulsórias para trabalhar em outras cidades, o que dissolveu um dos círculos formados ao redor de Vigotski no centro do poder soviético (ver também YASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.).

Segundo Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.), em Kharkov, em junho de 1931, ocorreu o informe de Talankin (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).), em defesa de uma crítica marxista da psicologia histórico-cultural de Vigotski e Luria. Teria isso influenciado a ambivalente crítica dos kharkovitas a Vigotski? Sem dúvida. Anos mais tarde, Leontiev (1991LEONTIEV, A. N. Artículo de introducción sobre el labor creador de L. S. Vygotski. In: VYGOTSKI, L. S. Obras escogidas (Vol. 1). Madrid: Visor Distribuiciones, 1991, p. 419-450.) mostra ter conhecido e concordado tanto com a crítica de Talankin quanto com outra mais importante, a de Razmyslov - crítica com força de lei sobre a qual ele deve ter tido ciência ainda nos anos 1930. Na versão de Vygodskaya e Lifanova (1999VYGODSKAYA, G. L.; LIFANOVA, T. M. Through a daughter´s eyes (Cont.). Journal of Russian and East European Psychology , v. 37, n. 5, p. 3-27, 1999., p. 9) um rompimento total entre Leontiev e Vigotski teria ocorrido entre 1933 e 1934. Como já afirmei, a família de Leontiev também admite um afastamento (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.), remetendo aos conflitos entre ambos ao início dos anos 1930.

Nessa época, Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.) descrevem a formação de um novo círculo ao redor de Leontiev em Kharkov, contando com A.V. Zaporozhets, P.Ya. Galperin, P.I. Zinchenko, L.I. Bozhovich, V.I. Asnin, G.D. Bows, O.M. Kontsevaia e T.O. Ginevskii3 3 3. Diverge ligeiramente a composição do Círculo de Kharkov segundo Yasnitsky (2009), que não incluiu Bows, Kontsevaia e Ginevskii, mas sim Lukov e Zinchenko. Leontiev et al. (2005) informam que, na véspera de sua partida de Moscou para Kharkov, Leontiev escreve a Vigotski reprochando a atitude indecisa dele e de Luria. Fala sobre seu desejo de preservar os fundamentos da pesquisa deles e também as relações pessoais. Descreve ainda A. Zaporozhets, Bozhovich e Morozova como um grupo maravilhoso, devotado, que passara no exame de precisão e resistência. Enigmaticamente, ele acrescenta: "Impossível que não possamos suportar o exame!" (p. 232). .

Kharkov impulsionou a carreira de Aleksei Nikolaievitch: ali ele obteve seus primeiros postos administrativos de maior quilate. Até os anos 1950 (com a possível exceção do nebuloso período entre 1936-1937) ele galgou posições na psicologia soviética, o que, para imitar o vocabulário militarizado desse tempo, também representava liderança do front intelectual. Ele teria sido demitido da Academia de Educação Comunista em 1º de setembro de 1931 (LEONTIEV; LEONTIEV, 2009LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A. O mito do rompimento: A. N. Leontiev e L. S. Vigotski em 1932. In: TUNES, E; PRESTES, Z. Vigotski e Leontiev: ressonâncias de um passado. Cadernos de Pesquisa v. 39, n. 136, p. 290-299, 2009.), sendo admitido pelo Instituto de Neuropsicologia de Kharkov a 15 de outubro do mesmo ano. Mudou-se para a Ucrânia em 06 de fevereiro de 1932 (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.). Ali, tornou-se diretor da seção de Psicologia Experimental e morou até aproximadamente outubro de 1934, quando se mudou de volta para Moscou (YASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.). Em geral, o mês de trabalho tinha 20 dias, após o que os profissionais podiam retornar à capital soviética (YASNITSKY; FERRARI, 2008aYASNITSKY, A.; FERRARI, M. From Vygotsky to Vygotskian psychology: introduction to the history of the Kharkov School. Journal of the History of the Behavioral Sciences , v. 44, n. 2, p. 119-145, 2008a., p. 123). Yasnitsky e Ferrari (2008bYASNITSKY, A.; FERRARI, M. Rethinking the early history of post-Vygotskian psychology: the case of the Kharkov school. History of Psychology , v. 11, n. 2, p. 101-121, 2008b., p. 106) apontam a autorregulação e certa descentralização como características organizativas do grupo, ao invés de estrita liderança de Leontiev.

Em um período que terminou com a II Guerra Mundial, os anos 1930 foram de mudanças traumáticas na União Soviética. Mostrou-se dramática a necessidade de ruptura com quaisquer sinais de psicologia ocidental que acarretassem prontas acusações de ecletismo, contrarrevolução, fascismo e similares (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).).

Os Círculos de Vigotski atravessaram um processo de reconfiguração afinada com a estruturação da ciência soviética a partir de uma hierarquia bastante rígida nos institutos de pesquisa, o que incluía a promoção de "pesquisadores porta-vozes" (spokesmen) que falavam em nome de áreas do conhecimento inteiras (ver GILGEN; GILGEN, 1996GILGEN, A. R.; GILGEN, C. K. Historical background, analytical overview and glossary. In. KOLTSOVA, V. A.; OLEINIK, Y. N.; GILGEN, A. R.; GILGEN, C. K. Post-Soviet Perspectives on Russian Psychology . London: Greenwood Press, 1996, p. 3-59.; YASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.). Gradativamente, foi se constituindo o sistema de produção científica stalinista e os pesquisadores foram adaptando-se, aprendendo a sobreviver ( e mesmo a se promover) no seu interior (ver KREMENTSOV, 1997KREMENTSOV, N. Stalinist science Princeton: Princeton University Press, 1997.). Fez-se ainda mais comum a prática dos relatos de pesquisa não dirigidos à publicação, a maior parte dos quais se perdeu no fosso da história.

Desde Lênin, tornara-se rotineiro o apelo dos cientistas a patronos no partido: isso era um expediente dos pesquisadores para busca de recursos e promoção de seus aliados e de sua ciência, em uma lógica particularista que pouco se afinava com a construção de uma ciência fundada na liberdade, universalismo e solidariedade como valores fundamentais de um ethos socialista (baseado em KREMENTSOV, 1997KREMENTSOV, N. Stalinist science Princeton: Princeton University Press, 1997.)4 4 4. Como afirmam Yasnitsky e Ferrari (2008a; b), a natureza da pesquisa em Kharkov é um grande desafio para os historiadores da psicologia, pois foi pobremente documentada. Segundo tais comentadores, o texto "Materiais Sobre a Consciência" (1940-1941/2003) de A.N. Leontiev parece ser o único a relatar os ciclos de trabalho que ali se desenvolveram, buscando esboçar resultados de um programa de pesquisa do grupo. A projetada publicação de um volume contendo os relatos de pesquisa, desafortunadamente, nunca pode se realizar. .

Não obstante, as dificuldades também eram significativas. Depois das críticas dos stalinistas às pesquisas no Uzbequistão (brevemente analisadas em TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).), emergentes após o verão de 1932, Luria atravessou o período mais adverso de sua carreira, conforme relatou a Homskhaya, sua colaboradora e biógrafa. Nessa época, segundo Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.), os jovens pupilos de A.N. Leontiev visualizaram na orientação desse último uma alternativa com relação a Vigotski. O próprio A.N. teria afirmado, em seu "Filosofia e Psicologia", que a emergência de um novo programa científico começava com "uma análise crítica das posições teóricas de LENT#091;evENT#093; SENT#091;emenovichENT#093;" (apudLEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27., p. 17). De modo similar, o kharkovita Galperin (1984GALPERIN, P. Memories of A.N. Leontiev. Soviet Psychology , v. 23, n. 1, p. 57-72, 1984., p. 58) observa que nos anos 1930 - não sabemos exatamente quando - Leontiev teria identificado uma lacuna no sistema vigotskiano, concernente à relação entre conceitos espontâneos e científicos. Vale notar a coincidência de que esse foi também um tópico privilegiado pela áspera crítica stalinista de Rudneva (1937RUDNEVA, E. I. Vygotsky's pedological distortions. Journal of Russian and East European Psychology , v. 38, n. 6, p. 75-94, 2000. (Trabalho original publicado em 1937)) durante a campanha de desconstrução da pedologia, o decreto "Sobre as deturpações pedológicas no sistema dos Narcompros" em 4 de julho de 1936.

Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.) considera que a crítica dos kharkovitas foi suave, e a estruturação dos laboratórios mostrou influência de algumas das frentes metodológicas fundamentais da psicologia histórico-cultural. Entretanto, em minha avaliação, já expressou perdas significativas no âmbito da psicologia cultural e social (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).). O estreitamento das teorias e práticas psicológicas relacionou-se também a que, em 1931, o Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) ditou uma resolução requerendo a concentração da psicologia em problemas de educação (WORTIS, 1953WORTIS, J. La psiquiatria soviética . Buenos Aires: Ateneo, 1953.), o que limitou o ambicioso programa da psicologia vigotskiana. "Poda" semelhante foi imposta à psiquiatria, que passou a se limitar apenas ao tratamento de psicopatologias mais graves, como a esquizofrenia.

De modo contrário à noção comum de que vinha sendo impiedosamente perseguido pela burocracia stalinista (embora, de fato, já fosse criticado publicamente), Vigotski resistia às críticas publicadas entre 1931-1934 e trabalhava nos últimos meses da sua vida no prestigiado Instituto de Medicina Experimental (o popular VIEM), projetando para essa instituição uma seção de psicologia clínica, com a intenção de convidar Solov'ev, Zankov, Veresotskaya, (M. or R.) Levina, Slavina, e Shif (ver YASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.; VYGODSKAIA; LIFANOVA, 1999VYGODSKAYA, G. L.; LIFANOVA, T. M. Through a daughter´s eyes (Cont.). Journal of Russian and East European Psychology , v. 37, n. 5, p. 3-27, 1999., p. 10). Entre 1934-1936, Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.) também não identificou evidência de contato direto entre Luria e Leontiev, embora em 1934 ambos tenham se mudado de volta para Moscou: Luria em março, indo trabalhar como Chefe do Departamento de Psicologia Clínica no VIEM, onde já estava Vigotski. Nesse enorme instituto, Leontiev tornou-se Chefe do Laboratório de Psicologia Genética (i.e., Psicologia do Desenvolvimento) em outubro.

Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.) aponta que entre 1936-1941 inicia-se a Quinta Fase dos "círculos dos vigotskianos", com a formação de um novo centro e o início do "Círculo de Kharkov", bem como da Escola de Vigotski-Luria-Leontiev (portanto, a ideia de troika teria sido criação de Luria e Leontiev após a morte de Vigotski, enquadrando-se na nova configuração de poder em que se encontravam os antigos pupilos de LSV). O Decreto contra a Pedologia foi a pá de cal sobre a possibilidade de referência direta aos textos pedológicos de Vigotski, bem como à "Psicologia Pedagógica", o qual continha citações de Trótski (ver FRASER; YASNITSKY, 2015FRASER, J.; YASNITSKY, A. Deconstructing Vygotsky's victimization narrative: a re-examination of the 'Stalinist suppression' of Vygotskian theory. History of the Human Sciences , v. 28, n. 2, p. 128-153, 2015.). Entretanto, sua obra nunca foi banida por completo, como mostram as referências que lhe dedica Rubinshtein, além do verbete "Psikhologuia" escrito em 1940 pelos próprios Luria e Leontiev.

Leontiev e o "palavrocentrismo" de Vigotski

Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.) observa que, a despeito da escassez de fontes (pelo temor às represálias, era comum a prática da destruição de documentos), esse foi um momento crucial na história da psicologia soviética. Seguindo Shchedrovitskii: "Eu diria mesmo que a chave para entender o que foi realmente realizado pela Escola de Vigotski é o insight sobre o que aconteceu ENT#091;...ENT#093; em meados dos anos 1930" (apudYASNITSKY; FERRARI, 2008bYASNITSKY, A.; FERRARI, M. Rethinking the early history of post-Vygotskian psychology: the case of the Kharkov school. History of Psychology , v. 11, n. 2, p. 101-121, 2008b., p. 112, trad. nossa). Após discussões públicas do Decreto contra a Pedologia, em 1936, foi lançado o livreto de Rudneva "Distorções Pedológicas de Vigotski" (1937RUDNEVA, E. I. Vygotsky's pedological distortions. Journal of Russian and East European Psychology , v. 38, n. 6, p. 75-94, 2000. (Trabalho original publicado em 1937)), inaugurando uma campanha de difamação contra o legado de Lev Semionovich, cuja obra pedológica conquistava mais e mais popularidade. Entre os críticos de Vigotski que analisei anteriormente, ela é a única que cita Leontiev junto de outros vigotskianos (como Luria, Sakharov, Shif, Zankov) (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).).

Algumas evidências apontam que tanto Luria quanto Leontiev demitiram-se ou foram afastados de seus empregos entre 1936-1937. Entretanto, já em 1939 ambos receberam postos de chefia em instituições de pesquisa e educação de Moscou, o que mostra - a tomar pela leitura de Krementsov (1997KREMENTSOV, N. Stalinist science Princeton: Princeton University Press, 1997.) - que, como muitos outros cientistas, eles já teriam estabelecido novas conexões no interior do partido, sem as quais era impossível prosperar na ciência (ver YASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.; KREMENTSOV, 1997KREMENTSOV, N. Stalinist science Princeton: Princeton University Press, 1997.). Ambos obtiveram cargos cobiçados durante a guerra. Leontiev (como Luria, já muito mais conhecido nos anos 1930) escreveu verbetes importantes para a prestigiada Grande Enciclopédia Soviética, uma honra para quem, até então, fora estrela de segunda grandeza nos mais importantes centros da psicologia soviética: Moscou e Leningrado.

Segundo Yasnitsky, do fim de 1936 ao início de 1937 (após o decreto "Sobre as deturpações pedológicas no sistema dos Narcompros ") o Setor de Psicologia da Academia Psiconeurológica da Ucrânia sofreu um grande encolhimento. Tomando o próprio Leontiev e família como fontes, o autor reporta que A.N. teria retornado ao Instituto de Psicologia de Moscou em 1936 ou 1937, época em que teria preparado sua crítica a Vigotski, "Study of the Environment in the Pedological Works of Vygotsky" (LEONTIEV, 193?/2005aLEONTIEV, A. N. Study of the environment in the pedological works of L.S. Vygotsky: a critical study. Journal of Russian and East European Psychology , v. 43, n. 4, p. 8-28, 2005a (Original de 193?).), possivelmente, base para uma apresentação oral. Segundo Yasnitsky, esse texto foi encontrado nos arquivos do Instituto de Psicologia (de Moscou) e, por razões desconhecidas, não foi arrolado por A.N. Leontiev em sua própria bibliografia (ver LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.).

É desatualizada a informação de AA. Leontiev e D.A. Leontiev (2009LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A. O mito do rompimento: A. N. Leontiev e L. S. Vigotski em 1932. In: TUNES, E; PRESTES, Z. Vigotski e Leontiev: ressonâncias de um passado. Cadernos de Pesquisa v. 39, n. 136, p. 290-299, 2009.), de que Aleksei Nikolaievitch nunca tenha contestado Vigotski. Os próprios autores admitem a crítica em outro texto originalmente publicado em russo no mesmo ano (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.), tendo reconhecido a autenticidade do "Study of the Environment..." para publicação nos Rannie Raboti , por eles organizados5 5 5. "O mito do rompimento: A. N. Leontiev e L. S. Vigotski em 1932" ENT#091;Миф о разрыве: А.Н.Леонтьев и Л.С.Выготский в 1932 годуENT#093; por A.A. e D.A.Leontiev consta na bibliografia de D.A. Leontiev como texto publicado em 2003 no Psikhologuitcheskii Jurnal . Entretanto, em Leontiev et al. (2005 - texto também escrito em 2003), comentam que a crítica de Leontiev (193?/2005a) foi descoberta ainda em 1997. Ou seja: é fora de dúvida que A.A e D.A. LEONTIEV (2009) já conheciam tal crítica, embora a ignorem por completo nessa publicação. . Outras observações críticas de Leontiev a Vigotski dispersam-se nos anos 1930.

A extinção da pedologia, entre as diversas outras características do momento político (que analisei também em TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).), representou uma demanda objetiva por mudanças importantes da psicologia no interior do sistema científico stalinista, sendo ingênuo acreditar que seria possível aos antigos pupilos simplesmente "desenvolver" o projeto de psicologia vigotskiana nessa nova conjuntura, preenchendo suas lacunas. Leontiev assumiu ali uma posição de liderança em um momento de forte hierarquização da psicologia entre os laymen (os "peões" do jogo, os pesquisadores comuns) agrupados sob os spokesmen (representantes autorizados a falar pelo(s) grupo(s) de pesquisadores, com poder sobre os laymen ). Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.) observou essa diferença hierárquica nos arquivos de Kharkov em textos redigidos coletivamente que, não obstante, eram publicados apenas em nome de um deles - notadamente, o porta-voz, posição a que se alçou Leontiev nos anos 1930. Para isso, pode ter contribuído a observação, consensual entre os relatos biográficos, de que ele era muito comunicativo, sociável e ardoroso na defesa de suas opiniões (como exemplo, ver Bratus, 2005BRATUS, B. S. Personal sense according to A.N. Leontiev and the problem of a vertical axis of consciousness. Journal of Russian and East European Psychology , v. 43, n. 6, p. 32-44, 2005.), algo que pode ter facilitado sua interação com a censura e também os tomadores de decisão (decision-makers) do partido.

Trata-se de momento extremamente delicado para análise dos textos soviéticos: os marxistas atuais podem até se reconhecer em eventuais argumentos, citações ou tarefas neles definidos. Entretanto, nos textos que precisavam satisfazer a censura, os autores tendiam a permanecer em um nível raso - e, não raramente, autocontraditório - de desenvolvimento argumentativo, elaborando práticas discursivas quase incompreensíveis para os leitores atuais. Dado o temor de que mudanças políticas repentinas trouxessem punições severas, os textos não primavam pela clareza. Por exemplo, vejamos esse curto diálogo entre A.N. Leontiev e o seu neto:

"Aleksei Nikolaevitch, por que você escreve de maneira tão complicada, sinuosa, usando frases tão longas que são extremamente difíceis de desembaraçar e compreender? Por que você não pode expressar-se de uma maneira mais simples, direta e clara?" Ele retorquiu: "Há muito tempo atrás a vida me ensinou a escrever de modo que ninguém pudesse deliberadamente pegar uma citação minha fora de seu contexto original e usá-la como evidência para mandar-me para a prisão." (apudYASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009., p. 104, trad. nossa)

O estilo obscuro mesmo dos textos mais maduros de Leontiev (1978aLEONTIEV, A. N.Actividad, consciencia y personalidadBuenos Aires: Ciencias del Hombre, 1978a.; b) aparece, assim, como consequência direta da situação política instável de sua época - longe de ser defeito imputado por seus detratores, é característica admitida e explicada por ele próprio no diálogo acima. Análise de Vladimir Zinchenko sobre notas pessoais de Leontiev identifica uma luta por reconciliar as prioridades científicas próprias dele com as dificuldades da política científica (ver YASNITSKY, 2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009., p. 95-96). Não devendo ser julgada em termos de ética pessoal, a resposta de Leontiev anteriormente transcrita simboliza o impacto do stalinismo e sua "pragmática colagem às tendências imediatas da realidade - o que configurará sinuosidades, recuos; a intervenção staliniana terá sempre um cariz manipulador " (Netto, 1982NETTO, J. P. Introdução. In: STÁLIN, J. V. Stálin: política. São Paulo: Ática, 1982, p. 9-36., p. 8).

Meus próprios estudos da obra de Leontiev nos anos 1930 mostram criticismo recorrente desse autor ao papel da palavra no sistema vigotskiano - o qual seria eivado de "palavrocentrismo" (slovotsentrizm, ver LEONTIEV, 1933/2005aLEONTIEV, A. N. Study of the environment in the pedological works of L.S. Vygotsky: a critical study. Journal of Russian and East European Psychology , v. 43, n. 4, p. 8-28, 2005a (Original de 193?)., p. 232). Conforme ele indicou posteriormente (LEONTIEV, 1991LEONTIEV, A. N. Artículo de introducción sobre el labor creador de L. S. Vygotski. In: VYGOTSKI, L. S. Obras escogidas (Vol. 1). Madrid: Visor Distribuiciones, 1991, p. 419-450.), a crítica de Talankin, Razmyslov e outros (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).) também apontava como falha que Vigotski situasse a consciência no mundo do signo e do significado. Essa crítica não lhe faz justiça, se considerarmos a abordagem das funções psíquicas superiores como processos caracterizados pelo domínio dos meios externos do desenvolvimento cultural e pensamento (o que contempla o uso combinado de signos e instrumentos).

O estado das "Conversas com Vigotski", datadas de 12 de outubro de 1933, embora se reduza ao de meras notas pessoais tomadas por Leontiev sobre diálogos com LSV, corrobora a informação de Vygodskaia e Lifanova (1999VYGODSKAYA, G. L.; LIFANOVA, T. M. Through a daughter´s eyes (Cont.). Journal of Russian and East European Psychology , v. 37, n. 5, p. 3-27, 1999.) sobre divergências entre os autores nessa época:

Questões: 1) Palavrocentrismo do sistema. O quê - sujeito do desenvolvimento? Onde está a pessoa, o mundo? Onde está a relação real da pessoa com o mundo? 2) Não esclarecida a relação: significado - consciência, consciência - personalidade. 3) Pensamento - palavra. Onde está o pensamento? (LEONTIEV, 1933/2005bLEONTIEV, A. N. Conversas com Vigotski ENT#091;Beceda c Vigotskim ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005b, p. 231-237 (Original de 1933)., p. 232, trad. nossa com Yulia Kodalieva)

Na tradução de parte das "Conversas com Vigotski", em Golder (2004GOLDER, M. Leontiev e a psicologia histórico-cultural: um homem em seu tempo. São Paulo: Xamã, 2004., p. 24), não há esse trecho no qual Leontiev aponta o "palavrocentrismo" vigotskiano, o que resulta, para o leitor brasileiro, apenas na reprodução de considerações de teor mais neutro. Contudo, segundo Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.), os psicólogos de Kharkov - desde o início dos anos 1930 - criticaram em Vigotski a tese de que o significado fosse o demiurgo da consciência e, por sua vez, a comunicação fosse o demiurgo do significado (ideia que se apresenta em diferentes décadas da carreira do autor, como se percebe em LEONTIEV, 1935/2005cLEONTIEV, A. N. Paper presented at the All-Union Institute of Experimental Medicine. Journal of Russian and East European Psychology , v. 43, n. 4. p. 48-57, 2005c (Original de 1935)., p. 55; 1978aLEONTIEV, A. N.Actividad, consciencia y personalidadBuenos Aires: Ciencias del Hombre, 1978a., p. 85). A esse respeito, Vigotski e os kharkhovitas estiveram em oposição teórica, conforme observam Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.). Um problema científico posto pelo grupo de Kharkov demandava a abertura das reais relações para o mundo em toda a sua concreticidade e riqueza (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27., p. 17).

Notamos recorrente preocupação na obra de Leontiev com o tema da causalidade da consciência; das relações "reais" que a explicam e desenvolvem. A resposta de Vigotski, de que "atrás da consciência está a vida", teria sido considerada muito abstrata por A.N. e os kharkovitas (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.). Mas qual seria o significado concreto dessa queixa?

Ela causa estranheza, pois, conforme explorei em artigo anterior (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).), a condenação da psicologia étnica após a Grande Quebra (período de mudança dramática do regime por Stálin, aproximadamente entre 1929 e 1932) desencorajava quaisquer iniciativas sérias para uma análise da cultura concreta dos povos soviéticos. Isso incluía sua língua e pensamento - ou mesmo diferenças etárias e de experiências de vida, como também haviam defendido VIGOTSKI e LEONTIEV (1931/2005VIGOTSKI, L. S.; LEONTIEV, A. N. Prefácio ao livro de A.N. Leontiev, "Desenvolvimento da memória" ENT#091;Predisloviye k knige A.N. Leont'yeva "Razvitiye pamyati" ENT#093;. In: LEONTIEV, A. N. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005, p. 199-205 (Original de 1931).).

Décadas depois, ao relatar esse momento, Leontiev teria declarado: "A alternativa dos anos 30-31 não era uma alternativa, mas uma linha necessária para o movimento da pesquisa psicológica" (LEONTIEV et al., 2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27., p. 18). Nessa linha de problematização, Zinchenko (2004ZINCHENKO, V. P. The Psychological Theory of Activity. Journal of Russian and East European Psychology v. 42, n. 2, p. 30-68, 2004., p. 30-31) afirma que Rubinshtein e Leontiev consideraram o conceito de atividade como meio de sobrevivência da psicologia, frente à rude normatização científica implantada no stalinismo.

No caminho dessa reflexão, percebo que, à pergunta abstrata sobre a causalidade da consciência, tal como lhe respondia Vigotski, Leontiev e os kharkovitas não deram resposta menos abstrata. É o que se observa nas notas pessoais "Materiais sobre a Consciência" (LEONTIEV, 1940-1941/2005cLEONTIEV, A. N. Paper presented at the All-Union Institute of Experimental Medicine. Journal of Russian and East European Psychology , v. 43, n. 4. p. 48-57, 2005c (Original de 1935).). O autor observa que Vigotski tentara solucionar à moda espinosana o problema sobre o que está "atrás" da consciência, valorizando a conexão entre afeto e intelecto. Essa resposta - já esboçada no "Pensamento e Linguagem" (ver VYGOTSKI, 1982VIGOTSKI, L. S. Pensamento e Linguagem ENT#091;Myshlenie i riétch ENT#093;. In: Sobranie sotchinenii . (Tomo 2) Moskva: Pedagoguika , 1982, p. 5-361. (Trabalho original de 1934)) - mostra o autor buscando uma leitura sistêmica da personalidade, um modelo psíquico que contemplasse o desenvolvimento das mais diversas motivações a partir de bases impulsivas bastante simples, que a sociedade diversifica/humaniza. Leontiev (2005dLEONTIEV, A. N. Materiais sobre a consciência ENT#091;Materiali o soznanii ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005d, p. 335-352 (Originais de 1940-1941).), embora admitindo não saber muito sobre os estudos então realizados por Vigotski, mostra-se descrente com respeito aos resultados alcançados, afirmando que o problema "não poderia ser resolvido" (LEONTIEV, 2005dLEONTIEV, A. N. Materiais sobre a consciência ENT#091;Materiali o soznanii ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005d, p. 335-352 (Originais de 1940-1941)., p. 345) por essa via. Em oposição a Vigotski, observa tanto que o afeto não é a força orientadora (dvijushaia sila ), como também que era insuficiente considerar as atividades práticas apenas como imagem externa, algo que, de fora, controla a consciência. Isso transformaria a consciência sempre numa questão psicológica, drenando sua materialidade.

O curioso é perceber que, anos depois, ele haveria equivocadamente de atribuir sua própria ideia sobre atividade prática a Vigotski. Tratando da condição da linguagem como instrumento psicológico e seu caráter posterior à ação, ele afirma:

Liev Semionóvich expresaba aforísticamente esta idea, parafraseando la locución proverbial de "Fausto". Em lugar de la expresión bíblica "En el principio fue la palavra", Goethe escribe: "Primero fueron los actos". Para Vygotski, en el problema de lá génesis del pensamento, el centro lógico se desplaza a la palavra "primero". Por tanto, primero fueran los actos (la actividad práctica), que actuaron de forma mediada a través de la palavra. (LEONTIEV, 1991LEONTIEV, A. N. Artículo de introducción sobre el labor creador de L. S. Vygotski. In: VYGOTSKI, L. S. Obras escogidas (Vol. 1). Madrid: Visor Distribuiciones, 1991, p. 419-450., p. 439-440, grifo nosso)

Em russo, notei que Vigotski atribui anterioridade genética à ação (delo , ver VIGOTSKI, 1934/1982VIGOTSKI, L. S. Pensamento e Linguagem ENT#091;Myshlenie i riétch ENT#093;. In: Sobranie sotchinenii . (Tomo 2) Moskva: Pedagoguika , 1982, p. 5-361. (Trabalho original de 1934), p. 360) e não à atividade prática (praktitcheskaia deiatelnost , ver LEONTIEV, 1991LEONTIEV, A. N. Artículo de introducción sobre el labor creador de L. S. Vygotski. In: VYGOTSKI, L. S. Obras escogidas (Vol. 1). Madrid: Visor Distribuiciones, 1991, p. 419-450., p. 31), que Leontiev trata como sinônimos. Essa equiparação não ocorre em Leontiev (1940-1941/2005dLEONTIEV, A. N. Materiais sobre a consciência ENT#091;Materiali o soznanii ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005d, p. 335-352 (Originais de 1940-1941)., p. 321).

O significado e sua natureza mediadora na perspectiva vigotskiana parecem insatisfatórios para Leontiev (1940-1941/2005dLEONTIEV, A. N. Materiais sobre a consciência ENT#091;Materiali o soznanii ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005d, p. 335-352 (Originais de 1940-1941).), pois não seriam "contato com o mundo objetivo" (idem, p. 345). Realizando uma inflexão objetivista no pensamento de LSV, Leontiev argumenta que o significado (znatchenie ), para aquele, separa a consciência do mundo - forma um véu que envolve o mundo, externa e internamente, um prisma . Leontiev (1940-1941/2005dLEONTIEV, A. N. Materiais sobre a consciência ENT#091;Materiali o soznanii ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005d, p. 335-352 (Originais de 1940-1941)., p. 345) acreditou que seu antigo professor considerava a consciência como resultado do discurso (riétch ), da comunicação espiritual; permanecendo intelectualizada, não avançava para além da sociologia francesa. Tal aspecto também fora assinalado por Razmyslov (TOASSA, no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).).

Na página 342, também sublinha a noção vigotskiana de que o significado é generalização, reflexo generalizado da realidade, antecipando a popular definição do "Ensaio sobre o desenvolvimento do psiquismo" (publicado em 1947 como reconstrução de monografia preparada pelo autor no início dos anos 1940, ver ZAPOROZHETS, 1981ZAPOROZHETS, A. V. Notas ENT#091;PrimetchaniaENT#093;. Problemas do desenvolvimento do psiquismo ENT#091;Problemi razvitia psikhiki ENT#093;. 4ª ed. Moscou: Editora da Universidade de Moscou, 1981,p. 558-564.). Aí escreve Leontiev que "A significação (znatchenie ) é a generalização da realidade que é cristalizada e fixada num vector sensível, ordinariamente a palavra ou a locução. É a forma ideal, espiritual da cristalização da experiência e da prática sociais da humanidade" (LEONTIEV, 1947/1978cLEONTIEV, A. N. Ensaio sobre o desenvolvimento do psiquismo. In: O desenvolvimento do psiquismo . Lisboa: Horizonte Universitário , 1978c, p. 19-68 (Originalmente publicado em 1947)., p. 94).

O mesmo texto também enfatiza a significação como reflexo que se "abre" em um sistema de ligações objetivamente existente, atendendo à queixa dos críticos stalinistas sobre a falta da teoria leniniana do reflexo na psicologia de Vigotski. Impõe, assim, nova diretriz ao pensamento soviético, em detrimento da originalidade do materialismo vigotskiano (ver TOASSA, 2014TOASSA, G. Creating a materialistic psychology: sources and influence of Spinoza in Vygotsky´s works. International Journal of Liberal Arts and Social Sciences , v. 2, n. 5, p. 83-94, 2014.; 2015aTOASSA, G. Is there a Vygotskian Materialism? Ontological and epistemological concerns for a contemporary Marxist Psychology (Part II). Dubna Psychological Journal , v. 3, p. 66-80, 2015a.; no prelo, 2016TOASSA, G. Nem tudo que reluz é Marx: críticas stalinistas a Vigotski no âmbito da ciência soviética. Psicologia USP (no prelo, 2016).). Com isso, há um estreitamento da análise dialética das relações entre pensamento e linguagem. Também se configura novo tipo de marxismo, mais afinado com a pesquisa sobre generalização que evoluía em Kharkov a partir das "lacunas" detectadas em Vigotski.

Considerações Finais

Continuando texto anterior, dedicado à análise da contestação stalinista a Vigotski, este artigo começou análise das pontuações críticas de Leontiev a Vigotski contribuindo com o "revisionismo" da narrativa hagiográfica da Escola Vigotski-Leontiev-Luria. Nesse processo, certo número de equívocos teóricos e biográficos precisou ser esclarecido. Ao debatê-los por meio de análise de textos e observações do próprio Leontiev, iniciei também a exposição do "palavrocentrismo" que esse atribuiu a Vigotski desvelando parte das suas repercussões teóricas e sua relação com o contexto histórico soviético. Outrossim, espero também ter contribuído com o entendimento da gênese da produção intelectual leontieviana.

Não tendo publicado os "Materiais sobre a consciência" ou as "Conversas com Vigotski", Leontiev tampouco teve de prepará-los para atravessar os filtros da censura ou das pressões institucionais, como foi o caso do "Ensaio sobre o desenvolvimento do psiquismo" (1947/1978cLEONTIEV, A. N. Ensaio sobre o desenvolvimento do psiquismo. In: O desenvolvimento do psiquismo . Lisboa: Horizonte Universitário , 1978c, p. 19-68 (Originalmente publicado em 1947).) ou "Study of the Environment in the Pedological Works of LS Vigotski" (193?/2005aLEONTIEV, A. N. Study of the environment in the pedological works of L.S. Vygotsky: a critical study. Journal of Russian and East European Psychology , v. 43, n. 4, p. 8-28, 2005a (Original de 193?).). Esses aspectos textológicos orientam-nos a perceber as linhas gerais da crítica de Leontiev a LSV. Auxiliam, também, a deitar por terra as tentativas de desqualificação desse último texto como sendo exclusivo cumprimento de um ritual político para sobrevivência do autor em meio aos anos de Grande Terror. Retornando à minha tese inicial: a crítica de Leontiev a Vigotski foi recorrente - e as mudanças empreendidas no sistema de pensamento deste último, significativas. A presente análise continuará em textos futuros.

Ao cobrar de Vigotski que entendesse o objeto pela indústria; como objeto das atividades humanas (LEONTIEV, 1940-1941/2005dLEONTIEV, A. N. Materiais sobre a consciência ENT#091;Materiali o soznanii ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005d, p. 335-352 (Originais de 1940-1941)., p. 346); ao considerar que a noção de significado separa a consciência do mundo, Leontiev desidrata ideias fundamentais no entendimento vigotskiano das mediações psicológicas. Isso culmina com sua afirmação da noção de significado como "reflexo generalizado da realidade", sendo esse reflexo uma aptidão em refletir atividades exteriores de acordo com suas ligações objetivas. Para ele, a consciência humana é forma de reflexo dependente do trabalho, mas a essência desse conceito - e suas implicações contemporâneas - precisa ser melhor debatida.

Sob um ponto de vista macroteórico, esse afastamento com respeito a Vigotski é um dos aspectos da crítica de Leontiev que mais me inquieta por aproximar-se teoricamente do marxismo vulgar de Stálin. Lembremo-nos da avaliação de Lukács: "A tendência staliniana é sempre a de abolir, quanto possível, todas as mediações e a de instituir uma conexão imediata entre os fatos mais crus e as posições teóricas mais gerais" (LUKÁCS, 1963/1977LUKÁCS, G. Carta Sobre o Stalinismo. In: Temas de ciências humanas (Vol. 1). São Paulo: Grijalbo, 1977, p. 1-17 (Texto original de 1963)., p.6). É assim que a atividade surge como o encontro direto, sem interpretação, do sujeito com as condições materiais de sua vida - em uma fórmula extremamente abstrata que se adequou à natureza pragmática e formulaica do marxismo staliniano. Como afirma V.P. Zinchenko:

De tempos em tempos, Leontiev habituou-se a dizer que atrás da atividade está a vida, que através de sua atividade objeto-motivada está conectado o mundo da vida, mas essas asserções não fizeram seus esquemas abstratos sobre a atividade nem um pouco mais vivos. (ZINCHENKO, 2004ZINCHENKO, V. P. The Psychological Theory of Activity. Journal of Russian and East European Psychology v. 42, n. 2, p. 30-68, 2004., p. 37, trad. nossa)

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  • ZAPOROZHETS, A. V. Notas ENT#091;PrimetchaniaENT#093;. Problemas do desenvolvimento do psiquismo ENT#091;Problemi razvitia psikhiki ENT#093;. 4ª ed. Moscou: Editora da Universidade de Moscou, 1981,p. 558-564.
  • ZINCHENKO, V. P. The Psychological Theory of Activity. Journal of Russian and East European Psychology v. 42, n. 2, p. 30-68, 2004.
  • *
    *Artigo resultado do projeto de pesquisa "O campo conceitual da síntese psíquica: análise teórica e gênese histórica na psicologia histórico-cultural" financiado pelo CAPES.
  • 1
    1. O foco de minha pesquisa está no campo conceitual dos estudos sobre a síntese psíquica - as noções de consciência, reflexo, personalidade, pessoa e outros termos que concorram à condição de objeto da psicologia histórico-cultural. Teve impulso com a realização de estágio pós-doutoral no Canadá, apoiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
  • 2
    2. Utilizado por autores não marxistas desde os anos 1920, alguns marxistas referendam a ideia de Estado totalitário (em que se enquadraria o soviético) como sinônimo da subordinação de todos os processos sociais importantes ao poder estatal. Na famosa definição de Friedrich, ele apresenta-se com "uma ideologia totalizante; um partido único compromissado com essa ideologia; uma polícia secreta totalmente desenvolvida; e três tipos de controle monopolista - das comunicações de massa, das armas operacionais, e de todas as organizações, incluindo as econômicas" (BOTTOMORE, 1983BOTTOMORE, T. B. (Ed.). A dictionary of Marxist thought . Cambridge: Harvard University Press, 1983., p. 535-536, trad. nossa). Entretanto, preferi utilizar neste artigo o termo "regime autoritário" ou "stalinista" por ser o "totalitarismo soviético" uma discussão polêmica no campo da teoria política marxista.
  • 3
    3. Diverge ligeiramente a composição do Círculo de Kharkov segundo Yasnitsky (2009YASNITSKY, A. Vygotsky Circle during the decade of 1931-1941: toward an integrative science of mind, brain, and education. 2009. PhD Thesis - Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, 2009.), que não incluiu Bows, Kontsevaia e Ginevskii, mas sim Lukov e Zinchenko. Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27.) informam que, na véspera de sua partida de Moscou para Kharkov, Leontiev escreve a Vigotski reprochando a atitude indecisa dele e de Luria. Fala sobre seu desejo de preservar os fundamentos da pesquisa deles e também as relações pessoais. Descreve ainda A. Zaporozhets, Bozhovich e Morozova como um grupo maravilhoso, devotado, que passara no exame de precisão e resistência. Enigmaticamente, ele acrescenta: "Impossível que não possamos suportar o exame!" (p. 232).
  • 4
    4. Como afirmam Yasnitsky e Ferrari (2008aYASNITSKY, A.; FERRARI, M. From Vygotsky to Vygotskian psychology: introduction to the history of the Kharkov School. Journal of the History of the Behavioral Sciences , v. 44, n. 2, p. 119-145, 2008a.; bYASNITSKY, A.; FERRARI, M. Rethinking the early history of post-Vygotskian psychology: the case of the Kharkov school. History of Psychology , v. 11, n. 2, p. 101-121, 2008b.), a natureza da pesquisa em Kharkov é um grande desafio para os historiadores da psicologia, pois foi pobremente documentada. Segundo tais comentadores, o texto "Materiais Sobre a Consciência" (1940-1941/2003LEONTIEV, A. N. Materiais sobre a consciência ENT#091;Materiali o soznanii ENT#093;. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl , 2005d, p. 335-352 (Originais de 1940-1941).) de A.N. Leontiev parece ser o único a relatar os ciclos de trabalho que ali se desenvolveram, buscando esboçar resultados de um programa de pesquisa do grupo. A projetada publicação de um volume contendo os relatos de pesquisa, desafortunadamente, nunca pode se realizar.
  • 5
    5. "O mito do rompimento: A. N. Leontiev e L. S. Vigotski em 1932" ENT#091;Миф о разрыве: А.Н.Леонтьев и Л.С.Выготский в 1932 годуENT#093; por A.A. e D.A.Leontiev consta na bibliografia de D.A. Leontiev como texto publicado em 2003 no Psikhologuitcheskii Jurnal . Entretanto, em Leontiev et al. (2005LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A.; SOKOLOVA, E. E. Primeiros trabalhos de A.N. Leontiev e o caminho à psicologia da atividade ENT#091;Rannie raboti A.N. Leontieva i evo put k psikhologii deiatelnosti ENT#093;. In: LEONTIEV, D. A. Stanovlenie psikhologuii deiatelnosti: Rannie raboti. Moscou: Smisl, 2005, p. 8-27. - texto também escrito em 2003), comentam que a crítica de Leontiev (193?/2005aLEONTIEV, A. N. Study of the environment in the pedological works of L.S. Vygotsky: a critical study. Journal of Russian and East European Psychology , v. 43, n. 4, p. 8-28, 2005a (Original de 193?).) foi descoberta ainda em 1997. Ou seja: é fora de dúvida que A.A e D.A. LEONTIEV (2009LEONTIEV, A. A.; LEONTIEV, D. A. O mito do rompimento: A. N. Leontiev e L. S. Vigotski em 1932. In: TUNES, E; PRESTES, Z. Vigotski e Leontiev: ressonâncias de um passado. Cadernos de Pesquisa v. 39, n. 136, p. 290-299, 2009.) já conheciam tal crítica, embora a ignorem por completo nessa publicação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    31 Dez 2014
  • Aceito
    06 Abr 2016
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