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Implementação e otimização de projeto para certificação do MDL em estação de tratamento de águas residuárias

Implementation and optimization project for CDM certification in wastewater treatment plant

Resumos

O tratamento de águas residuárias pode ser um importante contribuinte para o acúmulo de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera. Com o objetivo de minimizar esse problema, estudou-se a implementação de um projeto de mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL) em uma estação de tratamento de esgoto (ETE), mais especificamente a ETE Brasília Norte, por meio de mínimas modificações e otimização de parâmetros operacionais. A metodologia utilizada incluiu a investigação de alternativas para implantação de projetos de MDL em ETE, a análise do fluxograma da ETE, a modelagem matemática e a otimização do processo. Foram concebidos cenários operacionais da ETE, variando a eficiência de tratamento de DBO. Os resultados indicaram uma contradição entre o incentivo à sustentabilidade pelos projetos MDL e a qualidade do efluente tratado.

projeto MDL; otimização; créditos de carbono; águas residuárias


Wastewater treatment can produce an important contribution to greenhouse effect gases accumulation in the atmosphere. With the objective of minimizing this problem, this work studied the implementation and operational optimization of clear development mechanisms (CDM) in a wastewater treatment plant (WWTP), more precisely at the sewage treatment plant of North Brasilia, by applying minimal modifications and optimizing its operation parameters. The work methodology included review of CDM projects implantation alternatives, analysis of the flow diagram of the WWTP, mathematic modeling and process optimization. Some operation scenarios for the WWTP were constructed, with different BOD treatment efficiencies. The results indicate a contradiction between sustainability encouragement by CDM projects and quality of the WWTP treated effluent.

CDM project; optimization; carbon credit; sewage


ARTIGO TÉCNICO

Implementação e otimização de projeto para certificação do MDL em estação de tratamento de águas residuárias

Implementation and optimization project for CDM certification in wastewater treatment plant

Welitom Ttatom Pereira da SilvaI; Anaxsandra da Costa Lima DuarteII; Marco Antonio Almeida de SouzaIII

IDoutorando em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos pelo Programa de Pós-graduação em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos da Universidade de Brasília (PTARH/UnB) - Brasília (DF), Brasil. Professor Assistente do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Mato Grosso - Cuiabá (MT), Brasil

IIDoutoranda em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos pelo PTARH/UnB - Brasília (DF), Brasil. Professora Assistente do Centro de Ciências Agrárias, Ambientais e Biológicas da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - Cruz das Almas (BA), Brasil

IIIPhD em Engenharia Ambiental pela Universidade de Birmingham - Birmingham, Inglaterra. Professor e Pesquisador Colaborador do PTARH/UnB - Brasília (DF), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Welitom Ttatom Pereira da Silva Universidade de Brasília/UnB - Departamento de Engenharia Civil e Ambiental - Secretaria da Pós-Graduação em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos Prédio SG-12, Térreo - Campus Universitário, Asa Norte 70910-900 - Brasília (DF), Brasil E-mail: wttatom@terra.com.br

RESUMO

O tratamento de águas residuárias pode ser um importante contribuinte para o acúmulo de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera. Com o objetivo de minimizar esse problema, estudou-se a implementação de um projeto de mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL) em uma estação de tratamento de esgoto (ETE), mais especificamente a ETE Brasília Norte, por meio de mínimas modificações e otimização de parâmetros operacionais. A metodologia utilizada incluiu a investigação de alternativas para implantação de projetos de MDL em ETE, a análise do fluxograma da ETE, a modelagem matemática e a otimização do processo. Foram concebidos cenários operacionais da ETE, variando a eficiência de tratamento de DBO. Os resultados indicaram uma contradição entre o incentivo à sustentabilidade pelos projetos MDL e a qualidade do efluente tratado.

Palavras-chave: projeto MDL; otimização; créditos de carbono; águas residuárias.

ABSTRACT

Wastewater treatment can produce an important contribution to greenhouse effect gases accumulation in the atmosphere. With the objective of minimizing this problem, this work studied the implementation and operational optimization of clear development mechanisms (CDM) in a wastewater treatment plant (WWTP), more precisely at the sewage treatment plant of North Brasilia, by applying minimal modifications and optimizing its operation parameters. The work methodology included review of CDM projects implantation alternatives, analysis of the flow diagram of the WWTP, mathematic modeling and process optimization. Some operation scenarios for the WWTP were constructed, with different BOD treatment efficiencies. The results indicate a contradiction between sustainability encouragement by CDM projects and quality of the WWTP treated effluent.

Keywords: CDM project; optimization; carbon credit; sewage.

Introdução

O crescimento populacional ocasionou maior consumo de energia, sobretudo da proveniente da queima de combustíveis fósseis. Em consequência, foi observada a duplicação da concentração de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera durante o período de 1750 a 1998 (ROCHA, 2003). Atualmente, a comunidade científica vem alertando para a contribuição dos GEE sobre o aumento da temperatura média mundial, levando a um risco a todo o equilíbrio ecológico e à existência do ser humano. Cabe mencionar que há estudos contrários à contribuição dos GEE para o aumento da temperatura média mundial. Um exemplo é o desenvolvido por Koutsoyiannis et al. (2008), em que os autores questionam a validade dos modelos climáticos utilizados para realização de previsões. Segundo os autores, os grandes erros dos modelos climáticos mostram que a eficiência para previsão é muito pobre, o que leva a previsões e possíveis relações entre as variáveis não credíveis (KOUTSOYIANNIS et al., 2008).

O Protocolo de Quioto menciona o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) como dispositivo de flexibilidade concebido para a participação de países emergentes, prometendo incentivar o desenvolvimento sustentável e, ao mesmo tempo, auxiliar esses países a cumprirem parte de suas metas de redução de emissões de GEE (LIBORIO, 2005). O MDL oferece aos países emergentes a possibilidade de se beneficiarem economicamente dos projetos de redução de emissões, os quais darão origem aos chamados "créditos de carbono", que são basicamente toneladas de CO2 que deixam de ser emitidas ou são retiradas da atmosfera, e que podem ser negociados no mercado mundial. Para que um projeto seja elegível dentro das regras do MDL, há necessidade de atendimento a aspectos que, segundo Carbono Brasil (2006), incluem:

1. Adicionalidade - um projeto é adicional quando realmente contribui para a redução das emissões de gases do efeito estufa. Para isso é traçada uma linha de base (baseline) na qual é determinado um cenário demonstrando o que aconteceria se a atividade do projeto não acontecesse. A partir da linha de base, pode-se determinar a adicionalidade;

2. Validação - a contribuição para o desenvolvimento sustentável de cada projeto deve ser avaliada pela Autoridade Nacional Designada (no caso do Brasil, é a Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, presidida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia). Desta avaliação obtém-se um projeto validado;

3. Registro do documento de concepção do projeto na ONU - documentos de auxílio para a apresentação de todas as informações que devem estar contidas neste projeto;

4. Implantação do projeto - é basicamente a execução do projeto;

5. Verificação - revisão periódica das reduções monitoradas das emissões de gases do efeito estufa;

6. Certificação do desempenho - garantia escrita de que a atividade atingiu as reduções de emissões propostas, num determinado período de tempo. No Brasil, um dos maiores projetos de MDL refere-se à captura de CH4 em aterro sanitário, implementado no aterro sanitário Bandeirantes, entre os maiores do país. Com o objetivo de explorar o gás produzido para gerar eletricidade, foram realizadas adequações no sistema de captura dos gases e a instalação de geradores (UNFCCC, 2010). Informações complementares acerca de projetos MDL podem ser encontradas nos sites do United Nations Framework Convention on Climate Change (http://unfccc.int/2860.php) e no site do Ministério da Ciência e Tecnologia (http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/4007.html).

O tratamento das águas residuárias pode contribuir para o acúmulo dos GEE por meio da produção de CH4 e CO2, provenientes dos processos de tratamento ou da produção de energia elétrica necessária para a efetivação do processo de tratamento. O CH4 gerado a partir de tratamento das águas residuárias constituiu cerca de 5% das fontes globais de metano (EL-FADEL; MASSOUD, 2001). Segundo Thorneloe et al. (2002), o aproveitamento desses gases representa uma opção potencial para redução das emissões de GEE, além de ter ligações com outros setores que somam oportunidades de redução na emissão de GEE. Com o intuito de contribuir para a solução da problemática apresentada, propôs-se estudar a implementação de um projeto MDL numa estação de tratamento de esgoto (ETE), mais especificamente o estudo de caso da ETE Brasília Norte, por meio de mínimas modificações e da otimização de parâmetros operacionais. Especificamente, objetiva-se propor uma alternativa de implantação de projeto MDL com mínimas modificações na ETE Brasília Norte; modelar matematicamente o sistema; e determinar os valores ótimos dos parâmetros operacionais relacionados, para obtenção do máximo de reduções das emissões dos GEE.

Metodologia

Para a realização deste trabalho, propôs-se o desenvolvimento das seguintes etapas: (1) investigação das alternativas para implantação de projeto MDL; (2) descrição e análise do fluxograma da ETE; (3) modelagem matemática do sistema; e (4) otimização do processo e extração de parâmetros ótimos operacionais. Partindo do princípio de que cada ETE é única e, como tal, representante de um sistema único (processos de tratamento; limitações físicas, químicas e biológicas; etc.) e que cada sistema requer uma modelagem matemática específica, faz-se necessário selecionar um estudo de caso para desenvolvimento da metodologia proposta. Neste estudo, adotou-se o caso da ETE Brasília Norte (ETEB-Norte), localizada na cidade de Brasília (DF) e que atende as seguintes localidades: Asa Norte, Vila Planalto, parte da área central de Brasília, Lago Norte e Vila Varjão.

Etapa 1: Investigação de alternativas para implantação de projetos MDL

O objetivo desta etapa foi buscar informações sobre projetos de MDL e opções que atendem os aspectos para a certificação dos créditos de carbono, apresentados na introdução. Esta etapa consistiu a realização de consulta às informações disponibilizadas pelo United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC, 2008) e pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT-PNMC-MDL, 2009). Foram pesquisados trabalhos correlatos ao tema de implantação e otimização de projetos MDL em resíduos de saneamento.

Etapa 2: Análise do fluxograma da estação de tratamento de efluentes (ETEB-Norte)

Nesta fase, buscaram-se oportunidades de reduzir emissões de carbono via comparação das condições físicas e operacionais da ETEB-Norte com alternativas já estabelecidas para implantação de projeto MDL. Assim, adotou-se como processo de análise do fluxograma a busca por essas oportunidades de redução de emissões em cada uma das unidades de tratamento, tendo as etapas de tratamento como regra de sistematização.

Etapa 3: Modelagem matemática

A Figura 1 ilustra o modelo adotado para o cálculo da redução de emissões de carbono, seguindo o sugerido pela UNFCCC (2009c). As etapas a serem consideradas para a avaliação das emissões de CO2 e as relações existentes entre essas emissões, os processos, as rotinas operacionais e a variação das características dos efluentes pressupõem o conhecimento dos processos físicos, químicos e biológicos envolvidos na ETEB-Norte. Para o caso, foram utilizados modelos já reconhecidos para a representação dos processos e fenômenos envolvidos (Tabela 1) bem como experiências anteriores e trabalhos correlatos ao tema MDL.


Etapa 4: Modelagem de otimização e extração de parâmetros ótimos operacionais

Apoiando-se na modelagem matemática do sistema, foi possível otimizar a redução das emissões de carbono na ETEB-Norte, que podem ser direta ou indiretamente relacionadas às variáveis apresentadas. O modelo de otimização parte da hipótese de que é possível existir uma ETE que opera em condições ótimas de redução de emissões de GEE. Dessa forma, foi proposta uma função objetivo descrevendo a maximização das reduções de emissões. A fim de alcançar os objetivos descritos, empregou-se um software para otimização, acessível e de fácil utilização, denominado Excel-Solver, desenvolvido pela Microsoft Inc. e fundamentado em técnica de otimização não linear do Gradiente Reduzido Generalizado (GRG2). Essa técnica é baseada em uma movimentação iterativa de um ponto "x" qualquer, até que seja atingido um ponto "x+Dx", que otimiza a função objetivo e satisfaz as restrições do problema (ROSAL, 2007). Mais informações sobre processos internos de resolução do software de otimização Excel-Solver podem ser obtidas no site http://www.solver.com/.

Resultados

A seguir estão apresentados os resultados obtidos das etapas propostas na metodologia (Etapas de 1 a 4). Em relação à Etapa 1, podem-se mencionar como possíveis alternativas para a captura do metano as seguintes: substituição do sistema de tratamento aeróbio de efluente ou lodo por sistema anaeróbio com captura e queima de metano; e introdução de sistema de captura e queima de metano. Têm-se, ainda, alternativas de aproveitamento do metano capturado diferentes da queima, podendo ser aplicadas como soluções a geração direta de energia elétrica, a geração de energia elétrica após tratamento e armazenamento do biogás, e a produção de hidrogênio. A proposição das alternativas seguiu o sugerido pela UNFCCC (2009c), para a implantação de projetos MDL em ETE, assim, todas as alternativas propostas são passíveis de certificação e podem atender os aspectos de elegibilidade de projetos MDL.

O conhecimento do fluxograma do sistema adotado na ETEB-Norte, como mostrado na Figura 2, aliado ao das possíveis alternativas à implantação de projetos MDL (Etapa 1), permitiu o desenvolvimento da Etapa 2. Uma série de opções e combinações puderam ser elaboradas, mas, como foi proposta no trabalho a implantação de projeto MDL com mínimas modificações na planta, adotou-se como cenário para o desenvolvimento dos estudos a alternativa de introdução de sistema composto pela captura e queima do metano produzido no digestor anaeróbio.


De posse das características da ETEB-Norte, apresentadas na Tabela 2, e da alternativa a ser proposta, iniciou-se a Etapa 3.

São apresentados na Tabela 1 os modelos matemáticos referentes às variáveis operacionais da ETEB-Norte, a descrição do cenário de linha de base (representa as emissões de GEE nas condições atuais, ou seja, na ausência do projeto MDL), as emissões das atividades do projeto MDL e as reduções de emissões do projeto MDL.

Segundo Metcalf & Eddy (2002), as principais variáveis operacionais nos sistemas de lodos ativados, caso do sistema de tratamento de efluentes estudado, são o nível de aeração, a vazão de recirculação e a vazão do lodo excedente. O nível de aeração pode ser estimado por meio do pico de demanda por oxigênio (ROd), calculado conforme a Equação 1. A vazão de recirculação (Qre) e a vazão do lodo excedente (Qex) são as variáveis de manipulação que controlam a massa total de sólidos no sistema de lodos ativados, dadas pelas Equações 2 e 3.

Os modelos matemáticos adotados para representar o cenário de linha de base (EBa), as emissões das atividades do projeto MDL (EPa) e as reduções de emissões do projeto MDL (REa) foram fundamentados na metodologia proposta pelo UNFCCC para seleção de projetos MDL em pequena escala. O EBa é dado pela Equação 4 (UNFCCC, 2009c) e os valores das variáveis operacionais envolvidas foram obtidos a partir de dados operacionais da ETEB-Norte, apresentados nas Tabelas 1 e 2. Para a realização do cálculo completo do EBa, fez-se necessária a utilização de uma série de modelos matemáticos complementares, os quais estão apresentados nas Equações 5 até 11. A Figura 3 apresenta um diagrama relacionando equações e variáveis de entrada para o modelo EBa.


Considerando o cálculo das emissões das atividades de projeto (EPa), dado pela Equação 12 (UNFCCC, 2009c), e a hipótese da existência de condições operacionais que maximizam as reduções de emissões de GEE, foram inseridas restrições para as variáveis operacionais envolvidas. Da mesma forma que para a realização do cálculo do EBa, no cálculo de EPa utilizou-se uma série de modelos matemáticos complementares, representados nas Equações 13 a 27. A Figura 4 apresenta um diagrama relacionando equações e variáveis de entrada para o modelo EPa. Os valores das constantes e restrições envolvidas foram obtidos a partir da pesquisa bibliográfica e dos dados cedidos pela Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (CAESB). Menciona-se, ainda, que as emissões geradas a partir do condicionamento aeróbio de lodo foram consideradas nulas, seguindo as recomendações do UNFCCC (2009c) para os casos em que o lodo é utilizado como um agente de correção de solos.


Considerando que as equações utilizadas para modelagem do problema referem-se a um conjunto de modelos já reconhecidos e tradicionalmente recomendados para o dimensionamento de ETE, e também o fato da impossibilidade de validação do modelo, do ponto de vista prático (o que exigiria a realização de uma importante quantidade de medições de emissões de carbono da ETEB-Norte, a variabilidade nos valores de entrada do modelo e a verificação de valores observados e estimados pelo modelo), assumiu-se que o modelo proposto é validado.

A etapa seguinte (Etapa 4) refere-se à formulação do modelo de otimização e extração do ponto ótimo operacional, fundamentado nos modelos matemáticos já mencionados. Foi utilizada uma função objetivo para descrever a maximização da redução de emissões de carbono (REa) para o projeto MDL proposto, que está expressa pela Equação 28 (UNFCCC, 2009c). As restrições do modelo de otimização que se referem ao atendimento à legislação e às características operacionais da ETEB-Norte são apresentadas nas Tabelas 1 e 2. Outra restrição considerada refere-se à necessidade dos valores de EPa serem menores ou iguais ao EBa, o que garante o aspecto da adicionalidade do projeto MDL. Também, com a finalidade de verificar a influência dos pontos extremos de tratamento de efluentes no REa, foram analisados quatro diferentes, considerando: (i) máximo da remoção de DBO; (ii) mínimo da remoção de DBO; (iii) máximo da quantidade de lodo encaminhado ao digestor anaeróbio; e (iv) mínimo da quantidade de lodo encaminhado ao digestor anaeróbio. Os cenários diretamente relacionados a variações nas condições de operacionais da ETEB-Norte, ou seja, alterações de eficiências e parâmetros operacionais. As Equações 29, 30, 31 e 32 representam os cenários (i), (ii), (iii) e (iv), respectivamente.

A otimização das equações 28 a 32, sujeito a todas as restrições do problema (modelagem matemática da ETEB-Norte; restrições apresentadas na Tabela 1; introdução de sistema de captura e queima do metano no digestor anaeróbio) resultou nos valores de redução de emissões de GEE e nos ótimos operacionais apresentados na Tabela 3. O cenário de linha de base (EBa) indicou um valor de 7038 tCO2e por ano (Tabela 3). Como ótimo operacional da ETEB-Norte, quando se maximiza a redução das emissões de GEE (máx REa), obtiveram-se valores de demanda requerida de oxigênio de RO=11.884 kgO2.d-1, vazão de descarte de lodo de Qex=2.311 m3.d-1 e vazão de recirculação de lodo de Qre=31.750 m3.d-1, sendo possível atingir reduções de emissões de GEE de REa=6.185 tCO2e por ano. Observaram-se, ainda, valores de idade do lodo de θc=5,7 d, relação de SSV/SST de 76%, e razão de recirculação de R=70%, o que induz à ideia de que os sistemas de lodos ativados que operam com lodo relativamente jovem e com altas concentrações no lodo de retorno tendem a apresentar maiores valores de reduções de emissões de GEE.

Outro ponto refere-se à observação de que os cenários de minimização da eficiência do tratamento (cenários 2 e 4) tendem a apresentar maiores valores de reduções de emissões de GEE, conforme mostram as Figuras 5a e 5b. Como justificativa para essa observação, recorreu-se à formulação matemática do problema, em que fatores como a redução da quantidade de lodo tratado pelo sistema de tratamento de lodo (relacionados às variáveis como eficiência do decantador primário, capacidade de captura do adensador por gravidade, e DBO removida) minimizam as emissões das atividades do projeto MDL e maximizam a reduções de emissões de GEE.


Assim, a redução na eficiência no tratamento implicará na também redução da emissão de CO2 apenas na ETE. Como a matéria orgânica não foi completamente exaurida na ETE, as emissões devidas à degradação da matéria orgânica remanescente poderão ocorrer no corpo receptor, caso não seja respeitado o equilíbrio natural entre os processos de respiração e fotossíntese. Este resultado levanta uma discussão: a metodologia de certificação de redução de emissões de carbono é uma ferramenta de incentivo à preservação e conservação ambiental, ou é meramente uma ferramenta empresarial de marketing? Especificamente para o estudo de caso da ETEB-Norte, nota-se que minimizar emissões de GEE significa diminuir o grau de tratamento das águas residuárias e, portanto, aumentar a quantidade de matéria orgânica não degradada na ETE, que é lançada no meio ambiente, com potencial de maiores emissões de GEE no corpo receptor, caso o gás carbônico produzido no ambiente aquático não seja totalmente utilizado pela comunidade fotossintetizante. Além disso, deve-se considerar, também, que ao se diminuir o grau de tratamento das águas residuárias há aumento na possibilidade de danos ao ecossistema aquático e aos usuários da água.

Observa-se, então, contradição entre a proposta de sustentabilidade representada pelo projeto MDL e a prática no sistema de tratamento de águas residuárias. Essa contradição sugere a necessidade de discussões para que se possa alcançar o real objetivo da sustentabilidade ambiental, que deveria ser contido na proposta dos projetos MDL.

Conclusões

As alternativas para a implementação de um projeto MDL com mínima modificação e otimização operacional de uma ETE foram determinadas e o processo de seleção dessas alternativas foi apresentado no presente trabalho. Elas referem-se à introdução de sistema de captura e queima do metano no digestor anaeróbio. Para o valor ótimo operacional, especificamente da ETE Brasília Norte, foram obtidos os valores de requisito de oxigênio de 495 kg.h-1, vazão excedente de 96,3 m3.h-1, vazão de recirculação de 1.322,9 m3.h-1, idade do lodo de 5,7 d, relação de SSV/SST de 76% e razão de recirculação de 70%. O estudo de cenários de máximo e mínimo de eficiência do tratamento de efluentes indicou contradição entre a proposta de incentivo para sustentabilidade dos projetos MDL e a qualidade do efluente tratado. Como consequência, o resultado obtido para o estudo de caso leva à conclusão de que mais pesquisas e discussões são necessárias para a adequação da metodologia de cálculo e certificação de projetos MDL em estações de tratamento de águas residuárias.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo auxílio financeiro, e à Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (CAESB), pelo fornecimento de dados para o desenvolvimento do trabalho.

Recebido: 03/05/10

Aceito: 08/03/12

Reg. ABES: 077 10

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  • Endereço para correspondência:

    Welitom Ttatom Pereira da Silva
    Universidade de Brasília/UnB - Departamento de Engenharia Civil e Ambiental - Secretaria da Pós-Graduação em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos
    Prédio SG-12, Térreo - Campus Universitário, Asa Norte
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      Mar 2012

    Histórico

    • Recebido
      03 Maio 2010
    • Aceito
      08 Mar 2012
    Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental - ABES Av. Beira Mar, 216 - 13º Andar - Castelo, 20021-060 Rio de Janeiro - RJ - Brasil - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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