Tradução da ferramenta Involvement Matrix para o português brasileiro

Resumo

Introdução

O envolvimento do paciente e do público traz diversos benefícios para a pesquisa, no entanto, existem desafios para sua implementação, como a falta de ferramentas que orientem o engajamento dos participantes em pesquisas que os envolvem. A Involvement Matrix (IM) é uma ferramenta que facilita o diálogo sobre o papel que o participante da pesquisa deseja desempenhar em projetos de pesquisas pro-movendo um envolvimento mais ativo desse público.

Objetivo

Traduzir os materiais da IM para o português brasileiro, a fim de disponibilizar seu uso no Brasil e ori-entar pesquisadores.

Métodos

Solicitou-se autorização aos autores do instrumento original para traduzi-lo para o português brasileiro. Em seguida, o material traduzido passou por um processo de retrotradução. O resultado foi verificado pelos autores da IM, garantindo a precisão semântica e de conteúdo.

Resultados

A Matriz de Envolvimento (ME) foi traduzida para o português e retrotraduzida ao inglês. Posteriormente, os pesquisadores da versão brasileira realizaram uma reunião com os autores da ME para esclarecer dúvi-das, havendo a necessidade de mínimos ajustes na retrotradução, sem mudanças da versão em português. Após a aprovação da versão final em português brasi-leiro, foram disponibilizadas as ferramentas traduzidas: um Guia Prático, uma Versão em Word, uma Lista de Verificação, uma Ficha Técnica, uma Visão Geral com Exemplos e um Vídeo Animado legendado em português brasileiro.

Conclusão

Os diversos materiais da ME estão adequadamente traduzidos e disponíveis gratuitamente para uso no Brasil. Trata-se de uma ferramenta valiosa para guiar o envolvimento do público e do paciente em pesquisas.

Participação do público; Tradução; Jovem

Abstract

Introduction

Patient and public involvement has numerous benefits for research; however, there are challenges to its implementation, such as the lack of tools to guide participant engagement in research. The Involvement Matrix (IM) is a tool that facilitates discussion about the role that participants play in research projects, promoting more active public involvement.

Objective

To translate IM materials into Brazilian Portuguese in order to facilitate their use and guide researchers.

Methods

Authorization to translate the original material into Brazilian Portuguese was obtained from the authors. Next, the translated material underwent backtranslation. The resulting version was verified by the original IM authors, ensuring semantic and content accuracy.

Results

The Involvement Matrix (IM) was translated into Portuguese and then backtranslated into English. The researchers discussed the translated version with the IM authors, with minimal adjustments needed in the backtranslation, and no changes made to the Portuguese version. After the approval of the final Brazilian Portuguese version, the translated tools were made available, including a Practical Guide, a Word Version, a Checklist, a Fact Sheet, an Overview with Examples, and an Animated Video with Brazilian Portuguese subtitles.

Conclusion

The various IM materials are adequately translated and freely available for use in Brazil. It is a valuable tool to guide public and patient involvement in research.

Public Involvement; Translation; Youth

Introdução

O envolvimento do paciente e do público (EPP) é definido como pesquisa sendo realizada "com" ou "por" membros do público em vez de "para" ou "sobre” eles.¹ O EPP favorece o empoderamento dos participantes, especialmente daqueles que comumente não têm voz, e vem sendo cada vez mais utilizado em países de alta renda.² Seu uso deve ser incentivado no Brasil, visando modificar uma realidade comum em que crianças e adolescentes com deficiências muitas vezes não são ouvidos quanto às suas necessidades sociais e podem ser pouco assistidos em suas necessidades terapêuticas.³

Além disso, o EPP está associado à ratificação da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança,⁴ que afirma que todos os jovens têm direito à voz nos assuntos que os afetam, sem discriminação e independentemente de suas deficiências. Os benefícios do EPP incluem priorização de questões de pesquisa com relevância e importância para os pacientes e pú-blico; identificação de problemas e detalhes que os pesquisadores podem não ter tido conhecimento inicial (por exemplo, foco em resultados que são importantes para os indivíduos participantes da pesquisa); protoco-los de estudo e intervenções sendo mais aceitáveis e sustentáveis; materiais de recrutamento e publicidade sendo mais adequados à idade e acessíveis; e a disseminação dos resultados da pesquisa com alcance estendido.⁵,⁶

Van Scheven et al.⁷ afirmam que jovens com condi-ções de saúde crônicas sempre tiveram um papel pas-sivo em projetos de saúde e assistência social, como sujeitos de pesquisa, receptores de uma intervenção e usuários de um instrumento, e que atualmente existe um consenso crescente de que eles devem estar ativamente envolvidos nos assuntos que lhes dizem respeito.

Envolver crianças e adolescentes com deficiência na pesquisa é de vital importância, já que eles estão em uma posição ideal para dizer o que funciona e como e quais ações podem ser mais efetivas para eles e suas famílias. Tratando-se de adolescentes com condições de saúde crônicas, pesquisadores argumentam que o EPP melhora a relevância e a qualidade dos projetos e contribui para o desenvolvimento pessoal desse público.⁵,⁸

No contexto atual, a maioria das pesquisas ainda não utiliza ferramentas ou recursos desenvolvidos especialmente para o envolvimento de pacientes e público-alvo, sem envolvê-los na construção das etapas da pesquisa, considerando apenas as decisões dos pró-prios pesquisadores. Outro desafio relatado é manter o entusiasmo em todas as fases de um projeto, uma vez que os níveis de engajamento podem diminuir durante o processo, principalmente devido à decepção quanto ao significado de sua participação. Para enfrentar essas barreiras, argumenta-se que deve-se buscar formas de envolvimento mais eficazes e eficientes.⁵,⁹

Nesse sentido, a Involvement Matrix (IM) é uma ferramenta que ajuda a dialogar com o paciente sobre o papel que ele deseja desempenhar em um projeto/pesquisa e foi desenvolvida para promover a colabora-ção com pacientes a partir de 12 anos de idade. A IM foi construída em conjunto por pesquisadores e pacientes, no período de janeiro de 2017 a dezembro de 2018, e conduzida na Holanda por três instituições principais: Centro de Excelência para Medicina de Reabilitação Utrecht (centro de pesquisa), BOSK (associação de pacientes) e Stichting OuderInzicht (fundação para apoiar o envolvimento dos pais na pesquisa ).¹⁰,¹¹

Dada a importância da IM dentro do EPP e sua rele-vância para pesquisas, vislumbra-se essa ferramenta como uma importante aliada da prática em pesquisa no Brasil. Até o momento, porém, estes materiais não haviam sido traduzidos para o português brasileiro, dificultando seu uso no país. Entende-se que a tradução da IM pode fomentar a adoção do EPP em pesquisas que envolvem jovens no Brasil, orientando pesquisadores e pacientes. Desta forma, o objetivo deste estudo foi traduzir os materiais de uso da IM para o português brasileiro.

Métodos

Trata-se de um estudo de caráter metodológico de tradução do inglês para o português brasileiro, parte de um projeto aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (CAEE: 51319321.1.0000.5568).

Ferramenta IM

A IM é estruturada de forma que no seu centro estão os papéis em que o paciente/público pode desempenhar e as fases de execução prática de um projeto. Os diversos papéis de envolvimento funcionam horizontalmente. As diversas fases do projeto estão dispostas verticalmente. A combinação de papéis e fases resulta em uma “matriz” com várias células. A IM¹⁰ distingue cinco papéis de envolvimento para os pacientes/público:

1. O ouvinte tem um papel menos ativo, mas certamente não é menos importante no projeto.

2. O co-pensador pode fazer perguntas e dar feedback, bem como dar uma opinião.

3. O conselheiro exige feedback dos líderes de projeto para os pacientes sobre se o conselho foi seguido ou não.

4. O parceiro é valioso não apenas no início de um projeto, mas também nas fases intermediárias.

5. O tomador de decisões exige que os líderes do projeto tenham uma atitude mais passiva (de deixar que outros tomem decisões).

O líder do projeto, que comumente é o pesquisador principal, usa a IM como guia para dialogar com os pacientes/público. Além disso, a ferramenta também pode ajudar a focar mais na colaboração, melhorar a (organização da) colaboração e relatar sobre a colaboração de forma mais sistemática.¹⁰

Com o objetivo de promover e facilitar a utilização da IM, a equipe responsável pela ferramenta elaborou diversos materiais que fornecem orientações sobre como utilizá-la:

Pratical Guide: guia de utilização da matriz contendo cinco páginas, nas quais encontram-se orientações e explicações sobre os papéis e as fases durante o projeto, como usar a matriz como uma ferramenta de diálogo, recomendações para líderes de projetos, dicas e truques para a utilizar a ferramenta e uma imagem da matriz orientando como preenchê-la.

Word-version: versão em Word da IM contendo uma página, apresentando as células vazias; dessa forma ela pode ser editada e preenchida no computador durante as fases da pesquisa.

Checklist: lista de verificação composta por duas páginas, que tem o objetivo de orientar o pesquisador quanto às etapas que devem ser seguidas e que podem ser completadas conforme o projeto vai avançando. As páginas contém espaços para marcar, dependendo da etapa atual, do que já foi realizado naquele momento no projeto.

Factsheet: ficha técnica composta de duas páginas que resumem os materiais disponíveis para a utilização da IM e os principais conceitos que regem a ferramenta.

Overview with examples: visão geral da IM contendo exemplos de como preenchê-la. O material, contendo uma página, apresenta uma imagem da IM preenchida com exemplos fictícios para que o pesquisador possa tomar como base durante o seu projeto de pesquisa.

Animated film: filme de animação de 2 minutos e 35 segundos, que apresenta conceitos fundamentais da IM.

Procedimentos

Para o processo de tradução da ferramenta parti-ciparam uma doutoranda em fisioterapia e duas profes-soras doutoras em fisioterapia, nativas do idioma des-tino da tradução e fluentes em inglês, bem como uma mestranda em ciências da reabilitação.

Inicialmente, solicitou-se a autorização dos autores da versão original da IM para sua tradução para o português brasileiro. Após a obtenção da autorização, deu-se início aos procedimentos. A tradução foi realizada por um tradutor nativo do português brasileiro e fluente em inglês. Em seguida, o material traduzido passou por um processo de retrotradução para o inglês, conduzido por um especialista que dominava ambos os idiomas e não tinha conhecimento prévio das versões originais em inglês. O resultado da retrotradução foi enviado à equipe responsável pela construção da IM para uma verificação detalhada de semântica e conteúdo pelos autores; caso houvesse necessidade, novas mudanças seriam feitas, retornando aos procedimentos de retrotradução e verificação dos autores (Figura 1).

Figura 1
Etapas da tradução da ferramenta Involvement Matrix do inglês para o português brasileiro.

Resultados

A equipe de desenvolvedores da IM solicitou uma reunião para esclarecer dúvidas sobre a retrotradução e fornecer sugestões de alterações em algumas ex-pressões. Após esse processo, a versão final em portu-guês brasileiro foi aprovada e os materiais já traduzidos posteriormente foram disponibilizados gratuitamente no site oficial. Os títulos dos materiais traduzidos são: Matriz de Envolvimento - Versão em Word (Involvement Matrix) (Figura 2), Guia Prático (Pratical Guide) (Figura 3), Lista de Verificação (Checklist) (Figura 4), Ficha técnica (Factsheet), Visão geral com exemplos (An overview with examples) (Figura 5), e um Vídeo Animado com legen-da em português brasileiro intitulado de Involvement matrix subtit português.¹² As versões traduzidas encontram-se na página web da ferramenta juntamente às versões em holandês, inglês e espanhol.¹⁰

Figura 2
Versão em Word traduzida para o português brasileiro.

Figura 3
Ilustração correspondente a uma seção do Guia Prático traduzido para o português brasileiro.

Figura 4
Ilustração correspondente a uma seção da Lista de Verificação traduzida para o português brasileiro.

Figura 5
Visão geral com exemplos traduzida para o português brasileiro.

Discussão

O objetivo deste estudo foi traduzir para o portu-guês brasileiro a Matriz de Envolvimento (ME) e suas ferramentas de apoio. Essa tradução traz diversos be-nefícios, como a possibilidade do uso desses materiais no Brasil, ampliando o acesso às ferramentas da ME. Dessa forma, promove-se a disseminação do conceito de EPP entre profissionais, familiares e pesquisadores brasileiros, facilitando sua aplicação em contextos clínicos, educacionais e de pesquisa. Além disso, a ME incentiva e apoia a participação ativa de paciente/público em pesquisas que os envolvem. Isso promove uma maior inclusão e empoderamento desses partici-pantes, contribuindo para que as pesquisas sejam mais relevantes, coerentes e alinhadas com suas necessida-des e experiências reais.

A ME já tem sido utilizada por muitos pesquisadores, tendo já uma versão traduzida para o espanhol com o nome de Matriz de participación.¹³ No estudo de van Schelven et al.,¹⁴ a ferramenta foi utilizada para investigar o envolvimento de jovens com doenças crô-nicas que participavam de projetos de pesquisas. Após a conclusão dos projetos, solicitou-se às equipes que preenchessem a ME descrevendo as atividades de en-volvimento do público e do paciente e registrando-as nas células correspondentes. Essa abordagem pro-porcionou uma fonte de dados para obter informações sobre a perspectiva desses jovens em relação ao seu envolvimento nos projetos de pesquisa, com o objetivo de promover sua inclusão na sociedade.

Em outro estudo conduzido por Pozniak et al.,¹⁵ os pais de crianças com transtorno de desenvolvimento foram convidados a participar do desenvolvimento e implementação de oficinas de orientação em saúde. Nesse contexto, a utilização da ME permitiu mapear as atividades de todos os pais envolvidos no programa de pesquisa, fornecendo informações sobre o nível de envolvimento de cada um ao longo do estudo.

No estudo de Dada et al.,¹⁶ a ME teve como propósito guiar o planejamento do envolvimento de jovens com deficiências severas de comunicação no projeto de pesquisa, além de mapear as atividades do projeto. A matriz também foi utilizada para oferecer suporte a esse envolvimento, levando em consideração o interesse dos participantes, sua disponibilidade e consentimento para se envolverem.

A ausência de ferramentas que facilitem o envolvi-mento do público em pesquisas no Brasil pode justi-ficar a escassez de pesquisas onde adolescentes com deficiências graves sejam copesquisadores e/ou parti-cipem ativamente em alguma etapa de forma mais ativa. Um protocolo recentemente publicado propõe a utilização da ME para orientar a coconstrução de uma intervenção para promover a participação em atividades de lazer de adolescentes com paralisia cerebral níveis GMFCS IV e V, no Brasil e na Espanha, em parceria com os adolescentes, suas famílias e profissionais de saúde.¹⁷

Considerando a falta de ferramentas disponíveis no cenário brasileiro para facilitar o engajamento do público-alvo em pesquisas, a disponibilização desses materiais em português brasileiro traz benefícios para os profissionais, pesquisadores, pacientes e familiares. Essa iniciativa pode promover um maior envolvimento de todas as partes envolvidas, pesquisadores e pacientes, resultando em parcerias colaborativas e fortalecendo a qualidade e o impacto de intervenções e pesquisas no campo da saúde e da reabilitação.

Conclusão

A Involvement Matrix foi traduzida para o português brasileiro com o nome de Matriz de Envolvimento. Os materiais da ME estão disponíveis para serem utilizados no Brasil e seu uso deve ser incentivado globalmente por parte dos pesquisadores. A disponibilidade gratuita da ferramenta facilita seu uso em todos os cenários do contexto brasileiro, onde os recursos para pesquisa muitas vezes são limitados. Sua natureza de fácil utilização, com ferramentas e guias práticos, também contribui para sua acessibilidade e aplicabilidade. Dessa forma, a ME se destaca como uma ferramenta acessível e prática, impulsionando a realização de pesquisas de qualidade no campo do EPP no Brasil.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Dra Marjolijn Ketelaar, uma das autoras da Matriz de Envolvimento.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  30 Out 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  22 Jun 2023
• Revisado
  28 Ago 2023
• Aceito
  28 Ago 2023