Open-access Efeitos do treinamento muscular do assoalho pélvico Incontinência urinária e qualidade de vida em mulheres com obesidade mórbida: um estudo observacional

RESUMO

O principal objetivo deste estudo foi determinar a prevalência de incontinência urinária (IU) em mulheres com obesidade mórbida. Os objetivos secundários incluíram a avaliação da qualidade de vida das mulheres obesas com IU, bem como a comparação dos níveis de força muscular do assoalho pélvico e a incapacidade lombar entre mulheres com e sem IU. Foi conduzido um estudo observacional transversal no qual 56 mulheres com obesidade grau 3 foram avaliadas. O International Consultation of Incontinence Questionnaire-Short Form foi utilizado para detectar a presença de IU, e o King’s Health Questionnaire para avaliar a qualidade de vida daquelas que foram consideradas incontinentes. Para a avaliação da força muscular do assoalho pélvico, foi utilizada a escala PERFECT e a incapacidade lombar foi verificada por meio do Oswestry Disability Index. A IU foi prevalente na população estudada em 57,1% (n=32), e a amostra revelou baixos níveis de qualidade de vida nos domínios de “percepção geral de saúde” 51,5 (±22,8) e “impacto da incontinência” 51 (±36,8). Não houve diferença estatisticamente significativa nos desfechos de níveis de força muscular do assoalho pélvico e incapacidade lombar entre os grupos com ou sem incontinência. Todavia, houve diferença estatisticamente significativa entre a incidência de partos vaginais no subgrupo com incontinência (62,5%) quando comparado ao subgrupo sem incontinência urinária (25%) (p=0,005). A IU foi prevalente na maioria da população estudada e a amostra revelou baixos níveis de qualidade de vida. Neste estudo, o parto vaginal influenciou a ocorrência de IU.

Descritores
Saúde da Mulher; Incontinência Urinária; Obesidade Mórbida; Qualidade de vida

ABSTRACT

The primary objective of this study was to determine the prevalence of urinary incontinence (UI) in women with severe obesity. Other objectives included assessing the quality of life among women with obesity with UI and comparing levels of pelvic floor muscle strength and lumbar disability between women with and without UI. A cross-sectional observational study was conducted involving 56 women with class III obesity. The International Consultation of Incontinence Questionnaire-Short Form was used to detect the presence of UI, and the King’s Health Questionnaire was used to assess the quality of life of those considered incontinent. Pelvic floor muscle strength was evaluated using the PERFECT scale, while lumbar disability was verified using the Oswestry Disability Index. The results indicated that UI was prevalent in the studied population, with a rate of 57.1% (n=32). The sample showed low quality of life scores in the domains of “General Health Perception” (51.5 ± 22.8) and “Impact of Incontinence” (51.0 ± 36.8). There were no statistically significant differences in pelvic floor muscle strength levels and lumbar disability between the groups with or without UI. However, there was a statistically significant difference in the incidence of vaginal childbirth in the subgroup with UI (62.5%) compared to the subgroup without UI (25%) (p=0.005). Overall, UI was prevalent in most of the studied population, and the sample showed poor quality of life. Furthermore, vaginal childbirth was found to influence the occurrence of UI.

Keywords
Women’s Health; Urinary Incontinence; Obesity, Morbid; Quality of Life

RESUMEN

Este estudio tuvo el objetivo principal de determinar la prevalencia de incontinencia urinaria (IU) en mujeres con obesidad mórbida. Los objetivos secundarios incluyeron evaluar la calidad de vida de mujeres obesas con IU, así como comparar los niveles de fuerza muscular del suelo pélvico y la discapacidad lumbar entre mujeres con y sin IU. Se realizó un estudio observacional transversal en el que se evaluaron 56 mujeres con obesidad de grado 3. Se utilizó el International Consultation of Incontinence Questionnaire-Short Form para detectar la presencia de IU, y el King’s Health Questionnaire para evaluar la calidad de vida de las mujeres que se consideraron incontinentes. Para evaluar la fuerza muscular del suelo pélvico, se utilizó la escala PERFECT y se verificó la discapacidad lumbar mediante el Oswestry Disability Index. La IU fue prevalente en la población estudiada en el 57,1% (n=32), y la muestra reveló bajos niveles de calidad de vida en los dominios de “percepción general de salud” 51,5 (±22,8) e “impacto de la incontinencia” 51 (±36,8). No hubo diferencia estadísticamente significativa en los resultados de niveles de fuerza muscular del suelo pélvico y discapacidad lumbar entre los grupos con o sin incontinencia. Sin embargo, hubo diferencia estadísticamente significativa entre la incidencia de partos vaginales en el subgrupo con incontinencia (el 62,5%) en comparación con el subgrupo sin incontinencia urinaria (el 25%) (p=0,005). La IU fue prevalente en la mayoría de la población estudiada y la muestra reveló bajos niveles de calidad de vida. En este estudio, el parto vaginal influyó la incidencia de IU.

Palabras clave
Salud de la Mujer; Incontinencia Urinaria; Obesidad Mórbida; Calidad de Vida

INTRODUÇÃO

A obesidade é considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma doença e, atualmente, devido ao seu relevante aumento e às graves consequências que pode acarretar, é um dos problemas de saúde pública mais prevalentes no mundo1,2. No Brasil, essa doença crônica aumentou 72% nos últimos treze anos, saindo de 11,8% da população em 2006 para 20,3% em 20193.

Entre as possíveis comorbidades associadas à obesidade, a incontinência urinária (IU) em mulheres apresenta grande prevalência, podendo atingir de 60% a 70% da população, principalmente a incontinência urinária de esforço (IUE)4-6. A literatura aponta que um acréscimo de cinco unidades no índice de massa corporal (IMC) é associado ao aumento de 20 a 70% na prevalência de IU7,8. A obesidade está associada ao aumento da pressão intra-abdominal, o que enfraquece os músculos e a inervação pélvica. O efeito prolongado sobre a musculatura pélvica, o suprimento nervoso e as estruturas de suporte devido à tensão crônica podem resultar em fraqueza muscular no assoalho pélvico, tendo um impacto negativo na função dos órgãos pélvicos, facilitando a ocorrência de incontinência urinária6-9.

Em relação ao grau de obesidade e à severidade da incontinência urinária, a literatura apresenta resultados divergentes. Em um ensaio clínico randomizado, que incluiu 650 pacientes com IU, os pesquisadores encontraram uma associação positiva entre a severidade da IU e o índice de massa corporal: quanto maior o IMC, maior a severidade da IU. Em contrapartida, outro estudo analisou 1.155 questionários respondidos por mulheres estratificadas por idade e IMC, mas não encontrou nenhuma relação entre a severidade dos sintomas urinários e o grau de obesidade. Porém, foi observado um aumento na prevalência de IUE em mulheres obesas mórbidas e obesas severas em comparação com mulheres obesas10,11.

A IU é uma situação que costuma levar ao afastamento do convívio social e a frustrações psicossociais, pois afeta a vida das mulheres envolvidas de forma individualizada e complexa12. A obesidade pode estar associada ainda à presença de incapacidade funcional, à dor lombar crônica e a baixos níveis de qualidade de vida13. Atualmente, os indivíduos obesos e sedentários constituem o grupo mais suscetível a desenvolver dor lombar14. Dor lombar e incontinência urinária estão associadas em grandes estudos epidemiológicos, e a presença de uma condição parece predispor o desenvolvimento da outra. Porém, o mecanismo para essa relação ainda não é claro15.

Portanto, o diagnóstico e o tratamento da IU têm particular importância na mulher portadora de obesidade mórbida, pois contribuem para a melhora da qualidade de vida10,16.

Embora as repercussões clínicas da obesidade estejam já bem descritas na literatura, especificamente na população de mulheres obesas mórbidas, ainda há uma lacuna quanto às evidências sobre a prevalência de IU, as principais dimensões da qualidade de vida afetadas e os principais distúrbios musculoesqueléticos nesse perfil populacional. Assim, o objetivo primário deste estudo foi identificar a prevalência de incontinência urinária em mulheres com obesidade mórbida, e os secundários foram avaliar a qualidade de vida das mulheres obesas incontinentes e comparar os níveis de força muscular do assoalho pélvico e a incapacidade lombar nas mulheres com e sem incontinência urinária.

METODOLOGIA

Desenho e população

Trata-se de um estudo observacional transversal, no qual foram avaliadas mulheres que estavam em acompanhamento pelo serviço ambulatorial de preparo para cirurgia bariátrica de um Hospital Universitário. Todas as mulheres que estavam na fila de espera para realizar cirurgia bariátrica entre março de 2021 até dezembro de 2021 foram avaliadas. Como critérios de inclusão foram assumidos: indivíduos do sexo feminino e com idade superior a 18 anos e inferior a 60 anos. Entre essa amostra, foram excluídas mulheres com intervenção cirúrgica ginecológica; mulheres em reabilitação uroginecológica ou que fizeram fisioterapia para incontinência urinária ou menopausa.

Procedimentos e instrumentos de medida

Inicialmente, foram coletadas variáveis sociodemográficas e clínicas para a caracterização de amostra (idade, peso, altura, circunferência abdominal; número de gestações, tipos de parto, presença de aborto; relatos de tabagismo e etilismo; diagnósticos de ansiedade e depressão; e outras comorbidades associadas). Ansiedade e depressão foram definidas com base no autorrelato dos participantes e no uso de medicamentos específicos prescritos pelos respectivos médicos.

Para avaliar a presença de incontinência urinária nas participantes, foi utilizado o questionário International Consultation of Incontinence Questionnaire – Short Form (ICIQ-SF), traduzido e validado para a língua portuguesa por Tamanini et al.17. O ICIQ-SF é um questionário simples, composto por questões que avaliam a frequência, a gravidade e o impacto da incontinência urinária. O resultado do ICIQ-SF igual a zero determina ausência de incontinência urinária. Foram consideradas incontinentes as mulheres que tiveram soma igual ou maior do que três.

Para as participantes que apresentaram queixa de incontinência urinária e escores no ICIQ-SF compatíveis com esse diagnóstico, foi aplicado o King’s Health Questionnaire (KHQ). Esse questionário permite mensurar especificamente a repercussão da incontinência urinária na qualidade de vida das mulheres e foi traduzido e validado na língua portuguesa18,19. É composto por vinte questões que dizem respeito a nove domínios relacionados à incontinência urinária: saúde geral, impacto da incontinência urinária, limitações nas atividades de vida diária, limitações físicas, limitações sociais, relações pessoais, emoções, sono/disposição e medidas de gravidade. A pontuação do questionário varia de zero a 100 para cada domínio, sendo zero a ausência do sintoma e 100 o máximo impacto na qualidade de vida.

A avaliação física dos músculos do assoalho pélvico (MAP) foi realizada em todas as participantes, com ou sem incontinência. Por meio do toque digital, foi aplicado o esquema PERFECT, desenvolvido e validado por Laycock e Jerwood20. É um acrônimo no qual “P” avalia a intensidade da contração voluntária máxima (CVM) dos MAP, graduada segundo a escala de Oxford modificada. O “E” representa a resistência, medida pelo tempo em que a CVM é mantida antes de uma perda de 35% ou mais da contração; “R” representa as repetições, medindo o número de vezes que a contração sustentada pode ser realizada com duração satisfatória; e “F” representa as contrações rápidas, avaliando o número de CVM de curta duração após uma pausa para repouso. A avaliação foi realizada por um único profissional fisioterapeuta com experiência clínica de oito anos em fisioterapia pélvica. O participante foi posicionado em uma maca em decúbito dorsal, com abdução dos membros inferiores, quadris e joelhos flexionados. A primeira contração foi solicitada para orientar a forma correta de contração muscular e a familiarização do participante, evitando a manobra de Valsalva, a abdução do quadril e o uso da musculatura acessória.

Por fim, o índice Oswestry de incapacidade (Oswestry Disability Index – ODI), validado para a língua portuguesa por Vigatto et al.21, foi utilizado para quantificar a incapacidade lombar em todas as participantes. Os valores finais do ODI são apresentados em porcentagem e classificados em: incapacidade mínima (0-20%), incapacidade moderada (21-40%), incapacidade severa (41-60%), paciente que se apresenta inválido (61-80%) e indivíduo restrito ao leito (81-100%).

Análise dos dados

Para a análise estatística, os dados foram testados de acordo com o teste de normalidade de Shapiro-Wilk. Por apresentarem distribuição normal, foram apresentados em média e desvio-padrão ou frequência de ocorrência e percentual. Foi realizada análise de subgrupo do questionário ICIQ-SF, considerando a seguinte comparação: (1) subgrupo incontinência urinária (IU) – participantes com valores acima de três pontos no ICIQ-SF; (2) subgrupo sem incontinência urinária (SIU) – indivíduos com pontuação abaixo de três pontos no ICIQ-SF. Para comparação entre as médias dos grupos SIU e IU, foi realizado o teste t para amostras independentes. Para investigar associações entre as variáveis categóricas, foi empregado o teste de qui-quadrado. O software empregado foi o SPSS® versão 22.0 e o nível de significância estipulado foi de 5% (p<0,05).

RESULTADOS

Foram avaliadas 56 mulheres com idade média de 37(±8,2) anos. O IMC médio foi de 43,9 (±7,5) kg/m², sendo todas classificadas como obesidade grau 3. Com relação à obesidade abdominal, foi constatado uma circunferência abdominal média de 123,1 (±12,1) cm.

Após a aplicação do questionário ICIQ-SF, mais da metade das pacientes (57,1%; n=32) foram classificadas como portadoras de incontinência urinária (subgrupo IU) e 42,9% (n=24) foram considerados sem incontinência urinária (subgrupo SIU).

Tabela 1.
Valores da pontuação do King’s Health Questionnaire (n=32) aplicado no subgrupo IU.

O subgrupo com IU também foi avaliado em relação à qualidade de vida, em os valores para as dimensões “percepção geral de saúde” e “impacto da incontinência” foram de 51,5 (± 22,8) e 51,0 (± 36,8), respectivamente, indicando comprometimento nessas áreas. Os valores médios referentes ao impacto na qualidade de vida das diferentes dimensões do KHQ podem ser observados na Table 1.

Posteriormente à divisão dos grupos e para efeito de comparação, os subgrupos IU e SIU foram considerados homogêneos. Não foi observada diferença estatisticamente significativa ao comparar as médias de força muscular do assoalho pélvico (escala PERFECT) e incapacidade lombar (ODI) entre os grupos (Table 2).

Tabela 2.
Comparação dos desfechos secundários entre os subgrupos IU e SIU.

Quanto à análise das variáveis clínicas, foi observada diferença estatisticamente significativa em relação à variável parto vaginal no subgrupo incontinência urinária (62,5%), quando comparado ao subgrupo SIU (25%) (p=0,005) (Table 3).

Tabela 3.
Comparação das variáveis clínicas entre os subgrupos IU e SIU.

DISCUSSÃO

Para o desfecho primário, este estudo demonstra uma prevalência de 57,1% de IU em mulheres com obesidade mórbida. Notou-se que a IU foi prevalente mesmo com a idade média das mulheres da amostra sendo inferior a 40 anos. Dados semelhantes foram observados em outros estudos. A prevalência de incontinência urinária variou de 46% a 67% nas mulheres estudadas por Gerten et al.22, enquanto Castro et al.23 observaram que a prevalência pode chegar a 70,8% em sua amostra composta por mulheres submetidas ao pré-operatório de cirurgia bariátrica.

Lamerton et al.5, em sua revisão e metanálise, encontraram resultados que mostraram como o sobrepeso e a obesidade aumentaram o risco de IU nessa fase da vida. À medida que mais mulheres desenvolvem sobrepeso ou obesidade em idades mais jovens, é provável que a incidência de incontinência urinária aumente quando estiverem na meia-idade.

Richter et al.11 compararam escores de intensidade de IUE e o seu impacto em mulheres com IMC dentro da normalidade, com sobrepeso e obesas, encontrando que mulheres obesas apresentavam mais episódios de perda urinária, mais angústia dos sintomas e pior qualidade de vida.

Chen et al.24 observaram, na população adulta dos Estado Unidos da América (EUA), que um aumento do IMC e da porcentagem de gordura do tronco estão significativamente associados à maior prevalência e gravidade da IU em mulheres. Embora existam relatos de que, em mulheres idosas e obesas, a adiposidade central aumente o risco para IU25,26, os resultados deste estudo apontam que as variáveis de composição corporal, como IMC e circunferência abdominal, não impactam significativamente nos níveis de IU. Isso pode ser observado pela ausência de diferença entre essas variáveis nas mulheres que apresentaram ou não IU. Possivelmente, o perfil da amostra incluída, com baixa média de idade, e a influência de outros fatores de confusão não controlados neste estudo, como a deficiência de estrogênio, podem explicar a divergência entre os resultados27.

Já em relação aos desfechos secundários, para a análise da qualidade de vida das mulheres com IU, notaram-se implicações, principalmente para as dimensões “percepção geral de saúde” e “impacto da incontinência”, resultado que corrobora outros dados já reportados na literatura. Nygaard et al.28 desenvolveram um estudo com o objetivo de analisar a prevalência de IU em pacientes do sexo feminino com indicação de cirurgia bariátrica e investigar possíveis fatores de risco. Concluíram que a IU impacta negativamente na qualidade de vida desse perfil de mulheres, sendo as principais dimensões de qualidade de vida afetadas medidas pelo instrumento KHQ: “impacto da incontinência urinária”, “medidas de gravidade” e “percepção geral de saúde”. Outro estudo, desenvolvido por Pazzianotto-Forti et al.29, avaliou a prevalência dos sintomas da IU em mulheres obesas mórbidas e seu impacto sobre a qualidade de vida. Apesar da baixa prevalência encontrada em seu estudo, a qualidade de vida foi prejudicada pela IU, principalmente nos domínios “impacto da IU” e “percepção geral da saúde”.

Outro dado obtido nesse estudo foi em relação à influência do parto normal na ocorrência de IU, que vai de encontro a outros dados já relatados. Em um estudo realizado por Chan et al.30, foi concluído que o parto está associado à disfunção do assoalho pélvico, incontinência e prolapso de órgãos pélvicos. Os efeitos são mais pronunciados com aumento da paridade e do parto vaginal e acredita-se que seja devido a efeitos neuromusculares anteparto e intraparto e trauma perineal no momento do parto31. Pomian et al.32 também destacaram que a prevalência de IU está associada à paridade e que essa associação é mais forte em mulheres jovens entre 20 e 34 anos, enquanto é praticamente ausente em pacientes acima de 65 anos.

A integridade anatômica e funcional dos músculos do assoalho pélvico tem um papel importante no sistema de suporte uretral e, portanto, no mecanismo de continência6. Estudos demonstraram que mulheres com IU, comparadas com indivíduos continentes, têm os músculos do assoalho pélvico menos efetivos em termos de força, resistência, espessura, coordenação, bem como apresentam atividade eletromiográfica alterada33. Neste estudo, não foi observada diferença entre os grupos IU e SIU quanto à fraqueza e à disfunção dos músculos do assoalho pélvico, o que não corrobora os dados encontrados na literatura. Esperava-se que, da amostra considerada obesa em sua totalidade, o grupo IU apresentasse maior fragilidade do assoalho pélvico. Contudo, tal diferença não foi observada.

Além disso, também não foram identificadas diferenças na presença de incapacidade lombar. Esse resultado diverge de um estudo epidemiológico realizado no Japão, no qual as variáveis idade acima de 40 anos, sobrepeso e obesidade, parto vaginal e dor lombar foram associadas à presença de IU34.

As limitações encontradas neste estudo estão relacionadas aos efeitos multifatoriais da IU, nos quais não se consegue isolar apenas o fator obesidade de outros fatores de risco. Deve-se reconhecer ainda que, embora sejam de utilização pragmática, os instrumentos de medida centrados no paciente ou com certa subjetividade podem apresentar grau de erro imbuído.

No entanto, os achados contribuem para discussões sobre o impacto da obesidade mórbida na qualidade de vida das mulheres, na função do assoalho pélvico e em outros aspectos importantes da saúde da mulher pertencentes ao perfil populacional incluído neste estudo. Pesquisas futuras com amostras mais amplas poderão apresentar resultados mais assertivos sobre o tema, uma vez que foi identificada prevalência importante de IU mesmo nessa amostra composta por mulheres com faixa etária mais baixa.

CONCLUSÃO

A incontinência urinária foi prevalente na maioria da população estudada e a amostra revelou baixos níveis de qualidade de vida nos domínios de “percepção geral de saúde” e “impacto da incontinência”. Não houve diferença estatisticamente significativa nos níveis de força muscular do assoalho pélvico e incapacidade lombar entre os grupos com IU e IUE. Neste estudo, o parto vaginal influenciou a ocorrência de incontinência urinária.

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  • Estudo realizado no Centro Universitário Augusto Motta, (UNISUAM). Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
  • Fonte de financiamento: nada a declarar
  • Trabalho como parte integrante de tese de doutoramento em Ciências da Reabilitação do Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), Rio de Janeiro, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Abr 2025
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2023
  • Aceito
    15 Abr 2024
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