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Avaliação da função manual e da força de preensão palmar máxima em indivíduos com diabetes mellitus

Hand function and power grip strength assessment in individuals with diabetes mellitus

Resumos

O sucesso na realização de atividades manipulativas é crucial para um estilo independente. Como os diabéticos podem apresentar alterações sensoriais nas mãos, podem demonstrar alterações funcionais em tarefas manipulativas. Assim, o objetivo deste estudo foi comparar o desempenho de indivíduos diabéticos não neuropatas com o de não diabéticos em tarefas manipulativas e na capacidade de geração de força de preensão palmar máxima. Treze diabéticos sem diagnóstico de neuropatia (48,6±11,51 anos; 79,9±10,88 kg; 1,68 ±0,09 m) e 13 controles pareados por sexo e idade (48,5±10,09 anos; 76,44±11,79 kg; 1,69±0,1 m) participaram do estudo. A sensibilidade das mãos foi avaliada por meio do kit de monofilamentos Semmes-Weinstein e, em seguida, foram aplicados três testes comumente utilizados para avaliação da função manual na seguinte ordem: teste de função manual Jebsen Taylor (TFMJT), teste dos nove pinos nos buracos (9-PnB) e teste de força de preensão palmar máxima (FPmax). Os resultados do teste de sensibilidade cutânea indicaram que oito diabéticos apresentaram sensibilidade cutânea normal e cinco, alguma alteração sensorial detectável pelo monofilamento, a qual, no entanto, não os caracterizavam como neuropatas. Com relação aos testes funcionais, os resultados não indicaram qualquer diferença entre os grupos para os desempenhos nos três testes realizados (diabéticos e controles - TFMJT: 26,15±3,06 e 25,78±1,29 s; 9-PnB: 15,33±1,35 e 15,48±2,39 s; FPmax: 41,15±10,59 e 43,69±12,59 kgf). Assim, podemos concluir que indivíduos diabéticos sem neuropatia diabética periférica não apresentam qualquer alteração funcional nos membros superiores e na capacidade de gerar força de preensão palmar máxima.

mão; avaliação; destreza motora; diabetes mellitus


A successful object manipulation is crucial for living an independent life. As diabetic individuals could present sensory deficits in their hands, they could decrease functional performance in tasks involving object manipulation. The aim of the study was to compare the performance of diabetic individual without diagnosis of neuropathy with non-diabetic healthy individuals in manipulation task and their maximum power grip strength. Thirteen diabetic individuals without peripheral neuropathy diagnosis (48.6±11.51 years-old; 79.9±10.88 kg; 1.68±0.09 m) and 13 healthy age- and gender-matched controls (48.5±10.09 years-old; 76.44±11.79 kg; 1.69±0.1 m) participated in the study. Hand cutaneous sensitivity was assessed by the Semmes-Weinstein monofilaments examination (SWME) followed by the application of three tests commonly used to assess hand function: Jebsen-Taylor hand function test (JTHFT), nine hole peg test (9HPT) and maximum power grip strength test (GSmax). The results of SWME revealed that eight diabetic individuals presented normal cutaneous sensitivity and five showed mild sensory losses, but that was not enough to characterize them as neuropathic diabetics. Regarding the hand function tests, the results revealed no difference between diabetic individuals and healthy controls in any of the tests performed (diabetic individuals and controls - JHHFT: 26.15±3.06 and 25.78±1.29 s; 9HPT: 15.33±1.35 and 15.48±2.39 s; GSmax: 41.15±10.59 and 43.69±12.59 kgf). Therefore, we conclude that diabetic individuals without neuropathy show no hand function impairment, as well as no reduction in the maximum power grip strength.

hand; evaluation; motor skills; diabetes mellitus


PESQUISA ORIGINAL

Avaliação da função manual e da força de preensão palmar máxima em indivíduos com diabetes mellitus

Hand function and power grip strength assessment in individuals with diabetes mellitus

Kauê Carvalho de Almeida LimaI; Paulo Barbosa de FreitasII

IMestre em Ciências do Movimento Humano, Instituto de Ciências da Atividade Física e Esporte, Universidade Cruzeiro do Sul – São Paulo (SP), Brasil

IIPhD; Docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano, Instituto de Ciências da Atividade Física e Esporte, Universidade Cruzeiro do Sul – São Paulo (SP), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Paulo Barbosa de Freitas Rua Galvão Bueno, 868, bloco B, 13º andar, sala 1.301 CEP: 01506-000 – São Paulo (SP), Brasil E-mail: defreitaspb@gmail.com

RESUMO

O sucesso na realização de atividades manipulativas é crucial para um estilo independente. Como os diabéticos podem apresentar alterações sensoriais nas mãos, podem demonstrar alterações funcionais em tarefas manipulativas. Assim, o objetivo deste estudo foi comparar o desempenho de indivíduos diabéticos não neuropatas com o de não diabéticos em tarefas manipulativas e na capacidade de geração de força de preensão palmar máxima. Treze diabéticos sem diagnóstico de neuropatia (48,6±11,51 anos; 79,9±10,88 kg; 1,68 ±0,09 m) e 13 controles pareados por sexo e idade (48,5±10,09 anos; 76,44±11,79 kg; 1,69±0,1 m) participaram do estudo. A sensibilidade das mãos foi avaliada por meio do kit de monofilamentos Semmes-Weinstein e, em seguida, foram aplicados três testes comumente utilizados para avaliação da função manual na seguinte ordem: teste de função manual Jebsen Taylor (TFMJT), teste dos nove pinos nos buracos (9-PnB) e teste de força de preensão palmar máxima (FPmax). Os resultados do teste de sensibilidade cutânea indicaram que oito diabéticos apresentaram sensibilidade cutânea normal e cinco, alguma alteração sensorial detectável pelo monofilamento, a qual, no entanto, não os caracterizavam como neuropatas. Com relação aos testes funcionais, os resultados não indicaram qualquer diferença entre os grupos para os desempenhos nos três testes realizados (diabéticos e controles – TFMJT: 26,15±3,06 e 25,78±1,29 s; 9-PnB: 15,33±1,35 e 15,48±2,39 s; FPmax: 41,15±10,59 e 43,69±12,59 kgf). Assim, podemos concluir que indivíduos diabéticos sem neuropatia diabética periférica não apresentam qualquer alteração funcional nos membros superiores e na capacidade de gerar força de preensão palmar máxima.

Descritores: mão; avaliação; destreza motora; diabetes mellitus.

ABSTRACT

A successful object manipulation is crucial for living an independent life. As diabetic individuals could present sensory deficits in their hands, they could decrease functional performance in tasks involving object manipulation. The aim of the study was to compare the performance of diabetic individual without diagnosis of neuropathy with non-diabetic healthy individuals in manipulation task and their maximum power grip strength. Thirteen diabetic individuals without peripheral neuropathy diagnosis (48.6±11.51 years-old; 79.9±10.88 kg; 1.68±0.09 m) and 13 healthy age- and gender-matched controls (48.5±10.09 years-old; 76.44±11.79 kg; 1.69±0.1 m) participated in the study. Hand cutaneous sensitivity was assessed by the Semmes-Weinstein monofilaments examination (SWME) followed by the application of three tests commonly used to assess hand function: Jebsen-Taylor hand function test (JTHFT), nine hole peg test (9HPT) and maximum power grip strength test (GSmax). The results of SWME revealed that eight diabetic individuals presented normal cutaneous sensitivity and five showed mild sensory losses, but that was not enough to characterize them as neuropathic diabetics. Regarding the hand function tests, the results revealed no difference between diabetic individuals and healthy controls in any of the tests performed (diabetic individuals and controls – JHHFT: 26.15±3.06 and 25.78±1.29 s; 9HPT: 15.33±1.35 and 15.48±2.39 s; GSmax: 41.15±10.59 and 43.69±12.59 kgf). Therefore, we conclude that diabetic individuals without neuropathy show no hand function impairment, as well as no reduction in the maximum power grip strength.

Keywords: hand; evaluation; motor skills; diabetes mellitus.

INTRODUÇÃO

A diabetes mellitus (DM) é uma desordem metabólica caracterizada pela hiperglicemia crônica (isto é, concentração elevada de glicose sanguínea), causada por deficiência na produção e/ou ação da insulina1. Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, cerca de 50% dos indivíduos portadores da DM apresentam algum tipo de neuropatia, sendo a neuropatia diabética periférica (NDP) a mais comum. A NDP afeta os neurônios sensoriais e motores e pode ser causada por alterações metabólicas e vasculares que ocorrem nos neurônios e também por resposta autoimune2. É caracterizada pela diminuição da velocidade de condução nervosa, por perda sensorial nos pés e nas mãos, e por alterações motoras em fases mais avançadas3,4. Embora as consequências mais graves da NDP sejam vistas nos membros inferiores (por exemplo, amputações), as mãos também são afetadas pela perda de informação sensorial5.

Como a NDP é marcada por déficits sensoriais e, em casos mais avançados, motores, é possível que os diabéticos, mesmo os que não apresentem a NDP diagnosticada, apresentem problemas na execução de tarefas manipulativas que dependem tanto da integridade do sistema motor quanto do sistema sensorial.

A capacidade de manipular objetos (função manual) é crucial para a realização de um grande número de atividades ocupacionais e da vida diária (AVDs) e, desse modo, é fundamental para a manutenção de um estilo de vida independente6. Apesar da importância da função manual nas execuções de AVDs e mesmo sabendo que portadores de DM poderiam apresentar déficits sensoriais7, poucos foram os estudos que investigaram os efeitos da DM na função manual. Por exemplo, Cetinus et al.8 e Sayer et al.9 mostraram que os indivíduos com DM apresentam redução na força de preensão palmar máxima (FPmax) aferida por um dinamômetro hidráulico de mão (Jamar), porém esses estudos apresentam alguns problemas. No estudo de Cetinus et al.8, não houve pareamento entre os indivíduos do grupo controle e de diabéticos, e o grupo controle era formado por indivíduos um pouco mais jovens (46,93±10,2) que os diabéticos (50,11±7,6). No estudo de Sayer et al.9, os participantes eram idosos entre 60 e 70 anos, não há informação do número de diabéticos e de indivíduos do grupo controle e, aparentemente, não houve distinção entre neuropatas e não neuropatas. Assim, vemos a necessidade de um estudo mais controlado para avaliar se a perda de força de preensão palmar máxima é real nesse grupo de indivíduos.

Ainda, um estudo com indivíduos diabéticos sem NPD mostrou que eles têm pior desempenho em testes de destreza dos dedos (teste dos pinos de Perdue) e de função manual global (teste de função manual de Smith e teste de O'Connor)10. Entretanto, Ganvir11 não encontrou diferenças significativas entre a função manual de pessoas idosas com e sem a DM, utilizando o Action Research Arm Test (ARAT). Esses resultados contraditórios, mesmo com o uso de testes diferentes, apontam mais uma vez para a necessidade de novos estudos que investiguem a destreza dos dedos, a função manual global e a força de preensão palmar máxima em diabéticos, a fim de avaliar quais os efeitos da DM e da possível perda sensorial associada na função manual. Assim, o objetivo deste estudo foi comparar o desempenho de indivíduos diabéticos não neuropatas com não diabéticos em tarefas manipulativas e na capacidade de geração de força de preensão palmar máxima.

MÉTODO

Participantes

Treze diabéticos sem diagnóstico de neuropatia periférica (oito homens e cinco mulheres, sendo quatro com diabetes do tipo 1 e nove do tipo 2) e 13 indivíduos adultos sadios pareados por idade e sexo participaram do estudo. Os diabéticos tinham em média (±DP) 48,6 (±11,51) anos de idade, massa corporal de 79,9 (±10,88) kg e estatura de 1,68 (±0,09) m, enquanto os controles tinham 48,5 (±10,09) anos, 76,44 (±11,79) kg e 1,69 (±0,1) m. A participação no estudo ficou vinculada à leitura e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Cruzeiro do Sul (Protocolo nº 048/2009).

Critérios de inclusão e exclusão

Os participantes de ambos os grupos tomaram ciência do estudo e de seus objetivos por meio de anúncios publicados em jornais de circulação regional e nacional e por meio de contato pessoal. Aqueles que se dispuseram a participar voluntariamente teriam que atender aos critérios de inclusão para fazer parte do estudo. Assim, para participar do estudo, os participantes deveriam ser capazes de realizar tarefas manipulativas simples, além de entender e seguir as instruções dos testes. Ainda, os diabéticos só puderam participar do estudo mediante diagnóstico prévio de DM do tipo 1 ou 2 e se estivessem seguindo o tratamento recomendado pelo médico. Foram excluídos do estudo indivíduos diabéticos diagnosticados com qualquer tipo de neuropatia, retinopatia e nefropatia, doenças neurológicas de origem não diabética e portadores de qualquer outra alteração musculoesquelética nas mãos (por exemplo, síndrome do túnel do carpo). Para descartar a presença de neuropatia periférica, os participantes selecionados não deveriam apresentar perda de sensibilidade cutânea protetora nos pés avaliada pelo estesiômetro (monofilamento <10 g) e deveriam ter uma pontuação igual ou menor do que 6 no questionário de neuropatia de Michigan (Michigan Neuropathy Screening Instrument)7. Além disso, foram excluídos de ambos os grupos indivíduos que apresentassem qualquer tipo de lesão ortopédica e/ou musculoesquelética nos membros superiores nos últimos 12 meses antes da coleta de dados.

Procedimentos experimentais

Antes da realização dos testes de função manual, os participantes responderam às questões do inventário de dominância lateral de Edimburgo12 para definição da preferência manual. Os resultados indicaram que todos os participantes, exceto um diabético e seu controle, eram destros. Em seguida, a sensibilidade cutânea das mãos foi avaliada por meio do kit de monofilamentos (Estesiômetro-SORRI, Bauru-SP), desenvolvidos por Semmes e Weinstein13. A sensibilidade cutânea da parte central da pele que recobre as falanges distais (i.e., pontas) dos dedos mínimo, polegar e indicador foi avaliada, e o valor em gramas-força do monofilamento sentido pelo participante foi registrado para análise posterior.

Imediatamente depois, três testes comumente utilizados para avaliação da função manual foram aplicados nessa ordem: teste de função manual Jebsen Taylor (TFMJT), teste dos nove pinos nos buracos (9-PnB) e teste de força de preensão palmar máxima (FPmax). Todos os participantes foram devidamente instruídos a sentarem confortavelmente em uma cadeira fixa que permitia o contato dos pés com o chão e realizarem os testes apenas com a mão dominante. O TFMJT (Sammons Preston Jebsen-Taylor Hand Function Test) (Figura 1A) é composto de tarefas manipulativas semelhantes àquelas realizadas cotidianamente e é dividido em sete subtestes: (1) escrita, (2) simulação de uma tarefa de virar cartas, (3) levantamento de objetos pequenos, (4) simulação do uso da colher para a alimentação, (5) empilhamento de blocos (i.e., peças de dama), (6) levantamento de objetos grandes e leves e (7) levantamento de objetos grandes e pesados. Apenas seis dos sete subtestes foram aplicados em razão de o primeiro subteste ser o da escrita e exigir conhecimento da língua inglesa14,15. O tempo de execução de cada um dos subtestes do TFMJT foi registrado por um cronômetro digital, e os participantes foram instruídos a realizarem os subtestes o mais rápido possível. A somatória dos tempos de execução de cada subteste foi utilizada como variável dependente.


Após a realização do TFMJT, os participantes realizaram o teste dos 9-PnB (RolyanTM 9-Hole Peg Test, Model A8515) (Figura 1B). Durante o teste, os participantes foram instruídos a pegarem com os dedos nove pinos de 6,4 mm de diâmetro e 32 mm de comprimento, depositados em um compartimento côncavo, um de cada vez, e encaixá-los em nove buracos (7,1 mm de diâmetro e 13 mm de profundidade) e, imediatamente após a colocação do último pino, retirá-los um a um e recolocá-los no compartimento de origem6,16-18. Os participantes foram instruídos e continuamente incentivados a realizarem o teste o mais rápido possível. Um cronômetro foi utilizado para registro do tempo gasto em cada uma das três tentativas realizadas, e o menor tempo gasto foi utilizado como variável dependente.

O último teste realizado foi o teste de FPmax (Figura 1C), utilizando o dinamômetro hidráulico de mão Jamar®(Sammons Preston Jamar Hand Dynamometer), seguindo as recomendações da Sociedade Americana de Terapeutas de Mão (American Society of Hand Therapists (ASHT)). Para realização desse teste, os participantes permaneceram sentados, mantendo o ombro aduzido e em rotação neutra, cotovelo fletido a 90º, antebraço pronado a 90º e o punho em posição neutra19-21. Eles foram instruídos a segurar o dinamômetro e realizar o máximo de força de preensão possível, apertando com a mão dominante as duas hastes da manopla durante aproximadamente quatro segundos, relaxando em seguida. Foram realizadas três tentativas com intervalo de, no mínimo, um minuto entre elas, a fim de evitar qualquer efeito da fadiga6,20,22,23. O maior valor dentre três tentativas foi utilizado como variável dependente.

Análise estatística

Após a confirmação da normalidade dos dados por meio do teste de Shapiro-Wilk, três análises de variância (ANOVAs) de fator único (grupo) e amostras independentes foram realizadas para comparação do desempenho de diabéticos e controles no TFMJT, no teste dos 9-PnB e de FPmax. O valor de alfa foi estabelecido em 0,05.

RESULTADOS

Os resultados do teste de sensibilidade cutânea revelaram que todos os indivíduos do grupo controle apresentaram sensibilidade cutânea normal na ponta dos dedos da mão, pois sentiram o toque do monofilamento de menor diâmetro (i.e., 0,05 g). Com relação aos diabéticos, oito apresentaram sensibilidade normal e cinco, alguma alteração detectável pelo monofilamento. Destes cinco, quatro apresentavam mudança sensorial leve, não conseguindo sentir o monofilamento de menor diâmetro, mas sendo capaz de sentir o monofilamento seguinte (i.e., 0,2 g), e um apresentou perda de sensibilidade protetora da mão, sendo capaz apenas de sentir o monofilamento de 2 g.

Com relação aos testes de função manual, a Tabela apresenta os valores médios e os respectivos desvios padrão das variáveis analisadas para os grupos diabéticos e controles. Os resultados das ANOVAs não indicaram qualquer diferença entre os grupos para os desempenhos nos três testes realizados [TFMJT: F(1,24)=1,161, p>0,05, η2<0,01; 9-PnB: F(1,24)=0,03, p>0,05, η2>0,01 e FPmax: F(1,24)=0,309, p>0,05, η2=0,01].

DISCUSSÃO

O objetivo desse estudo foi comparar as características gerais da função manual de indivíduos diabéticos e indivíduos sadios avaliando a destreza dos dedos, a função manual global e a força de preensão palmar máxima. Tivemos o cuidado de selecionar indivíduos diabéticos sem diagnóstico de neuropatia, com idade inferior a 60 anos, e compará-los com indivíduos pareados por idade e sexo. Ainda, avaliamos o grau de prejuízo sensorial de cada participante utilizando o estesiômetro. Com base nos resultados de sensibilidade cutânea, constatamos que nenhum indivíduo do grupo controle tinha comprometimento sensorial na ponta dos dedos e que apenas cinco dos 13 diabéticos tinham algum tipo de comprometimento sensorial. Apesar disso, os resultados dos testes de destreza dos dedos, função manual global e de força de preensão máxima não revelaram qualquer diferença entre os grupos, indicando que a diabetes por si só não afeta o desempenho em tarefas manipulativas e a força de preensão palmar.

O teste do 9-PnB é um teste que avalia a destreza dos dedos. Por isso, o desempenho em testes com tarefas desta natureza (i.e., uso de pinos) tem sido frequentemente utilizado na avaliação da função manual de crianças18,24, adultos jovens16,17 e idosos25. Num estudo anterior, foi observado que indivíduos diabéticos tiveram um desempenho pior em um teste de pinos (i.e., teste dos pinos de Perdue)10. Esse resultado é diferente do resultado do presente estudo, que utilizou um teste similar (i.e., 9-PnB). Diferentemente do presente estudo, no estudo de Casanova e colaboradores10, não houve controle para a NDP e não foi feito nenhum teste de sensibilidade cutânea nas mãos. Assim, uma possível causa para o conflito entre os resultados é que os diabéticos investigados por Casanova e colaboradores poderiam ter maiores déficits sensoriais que os diabéticos do presente estudo. Adicionalmente, a NDP em estágios mais avançados poderia trazer alterações motoras, principalmente nas extremidades distais7,26-28, e isso poderia prejudicar o desempenho dos diabéticos em tarefas que envolvem destreza dos dedos.

O TFMJT é um teste que avalia a função manual global dos participantes por envolver tarefas que simulam as realizadas cotidianamente. O resultado do presente estudo mostrou que os diabéticos têm desempenho similar nessa tarefa quando comparado aos controles. Esse resultado está de acordo com o estudo de Ganvir11 que utilizou o ARAT para avaliar a função manual global. Tanto o ARAT quanto o TFMJT são testes que contêm tarefas manipulativas que utilizam desde preensão de pinça para manipulação de objetos pequenos até preensão palmar e movimentos dos membros superiores. Porém, o ARAT é baseado em escore numa escala de quatro pontos (0–3) dado por avaliadores de acordo com o desempenho na tarefa, e o TFMJT é baseado em medidas de tempo de execução de cada subteste. Assim, mesmo sendo mais sensível (i.e., ter maior resolução) que o ARAT, o TFMJT não foi sensível para detectar diferenças entre os diabéticos e controles, indicando que os diabéticos não têm a função manual global afetada.

Com relação à FPmax, os resultados também não indicaram qualquer efeito da diabetes. Mais uma vez, a falta de controle no recrutamento dos diabéticos e não inclusão de diabéticos pareados por idade e, principalmente, sexo dos estudos realizados anteriormente poderiam ter afetado os resultados e levado os pesquisadores a concluírem que diabéticos geram menos FPmax que os indivíduos sadios. Como mencionado anteriormente, os indivíduos do grupo controle do estudo de Cetinus et al.8 eram em média mais jovens (46,93±10,2) que os diabéticos (50,11±7,6). Ainda, os grupos não foram pareados já que o grupo de diabéticos era composto por 66 participantes e o controle por 47 indivíduos. Outro estudo que reportou menor FPmax em diabéticos foi o de Sayer et al.9. Nele, os participantes eram idosos (entre 60 e 70 anos), não foi fornecida qualquer informação do número de diabéticos e de controles e, aparentemente, não foi feita distinção entre neuropatas e não neuropatas. Todos os problemas mencionados poderiam ter afetado os resultados da FPmax e as conclusões dos estudos. Com base no nosso desenho experimental e no controle das possíveis variáveis intervenientes (e.g., idade, sexo e presença de neuropatia), podemos afirmar que os diabéticos sem neuropatia geram magnitudes semelhantes de FPmax quando comparados com indivíduos sadios da mesma faixa etária.

CONCLUSÃO

Com base nos resultados do presente estudo, pudemos concluir que indivíduos diabéticos sem neuropatia diabética periférica diagnosticada têm desempenho similar em tarefas que exigem destreza dos dedos e que envolvem a participação do membro superior como um todo. Ademais, concluímos que indivíduos diabéticos não neuropatas são capazes de produzir força de preensão palmar com magnitude similar aos indivíduos sem diabetes.

AGRADECIMENTOS

Os autores do estudo são gratos à FAPESP pelo suporte financeiro do projeto de pesquisa (Processo nº 2010/02939-4).

Apresentação: jun. 2012

Aceito para publicação: out. 2012

Fonte de financiamento: FAPESP (#2010/02939-4)

Conflito de interesse: nada a declarar

Parecer de aprovação no Comitê de Etica nº 048/2009.

Estudo desenvolvido no Laboratório de Análise do Movimento (LAM), Universidade Cruzeiro do Sul – São Paulo (SP), Brasil.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      Jun 2012
    • Aceito
      Out 2012
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