Resumo
O presente artigo visa construir uma história do presente que alcance abordar a luta dos povos indígenas no Brasil pela permanência nos espaços territoriais originários que possibilitam que o modo de vida desses povos possa perseverar, ou seja, que os indígenas e a sua forma de viver resistam no Brasil. A abordagem se dará a partir das ferramentas analíticas que o filósofo Michel Foucault nos proporcionou; assim, analisaremos como a luta dos povos indígenas brasileiros perpassou as relações de poder discursivas e, em especial, o discurso legal, aquele que possui a materialidade qualificada pela “força de lei” e que por meio do movimento constituinte resultou no Indigenato acolhido pela Constituição Federal de 1988. Analisamos ainda como no momento presente os discursos legislativos que afirmam a tese do Marco Temporal, em afronta à Constituição Federal, coloca em risco os direitos garantidos e a vida dos povos originários. A metodologia utilizada foi a análise histórica e do discurso com um viés pragmático, assim como também utilizamos a pesquisa documental e qualitativa de leis e projetos de lei, além de pesquisa bibliográfica e análise comparativa.
Palavras-chave:
processo legislativo; advocacy; povos originários; Indigenato; Marco Temporal
Abstract
This article aims to construct a history of the present that addresses the struggle of indigenous people in Brazil to remain in the original territorial spaces that allow the way of life of these people to persevere, that is, for the indigenous people and their way of living to resist in Brazil. The approach will be based on the analytical tools that the philosopher Michel Foucault provided us, thus, we will analyze how the struggle of Brazilian indigenous people permeated discursive power relations and, in particular, legal discourse, that which has the materiality qualified by “force-of-law”, and which through the constituent movement resulted in the Indigenato welcomed by the Federal Constitution of 1988. We also analyze how at the present moment the legislative speeches that affirm the Marco Temporal thesis, in violation of the Federal Constitution, puts the guaranteed rights and lives of original people in risk. The methodology used was historical and discourse analysis with a pragmatic bias, as well as documentary and qualitative research on laws and bills, as well as bibliographical research and comparative analysis.
Keywords:
legislative process; advocacy; indigenous people; Indigenato; Marco Temporal
Resumen
Este artículo tiene como objetivo construir una historia del presente que aborde la lucha de los pueblos indígenas en Brasil por permanecer en los espacios territoriales originales que permitan perseverar el modo de vida de estos pueblos, es decir, por los pueblos indígenas y su modo de vida resistir en Brasil. El enfoque se basará en las herramientas analíticas que nos proporcionó el filósofo Michel Foucault, así, analizaremos cómo la lucha de los pueblos indígenas brasileños permeó las relaciones de poder discursivas y, en particular, el discurso jurídico, aquel que tiene la materialidad calificada de “fuerza-de-ley”, y que a través del movimiento constituyente resultó en el Indigenato acogido por la Constitución Federal de 1988. También analizamos cómo en el momento actual los discursos legislativos que afirman las tesis de Marco Temporal, en violación de la Constitución Federal, pone en riesgo los derechos garantizados y la vida de los pueblos originarios. La metodología utilizada fue el análisis histórico y del discurso con sesgo pragmático, así como la investigación documental y cualitativa sobre leyes y proyectos de ley, así como la investigación bibliográfica y el análisis comparativo.
Palabras clave:
proceso legislativo; advocacy; pueblos originarios; Indigenato; Marco Temporal
Introdução
“Pois a chance que nos resta é um Brasil cocar” 1
As lutas sociais e históricas perpassam distintos âmbitos da existência e podemos acompanha-las de diversas maneiras, o intuito do presente artigo é traçar o rastro das disputas discursivas, em especial a legislativa, para compreender como a resistência dos povos originários no Brasil se deu também por meio da afirmação dos direitos garantidos na Constituição Federal de 1988. Compreendemos a importância dos processos discursivos, não simplesmente como um modo de transmissão de informação, mas como relações sociais inseridas em relações de força, ou, como nos diria Michel Foucault, em relações de poder (Foucault, 2005a). Escolhemos seguir o rastro das disputas discursivas concretizadas na legislação brasileira e nos debates legislativos, pois a materialidade discursiva da legislação é institucionalizada no Estado por meio do que chamamos de “força de lei”, que torna possível o uso da violência estatal para garantir os efeitos materiais desse âmbito discursivo. Apontamos assim a importância de observarmos e analisarmos o Parlamento brasileiro em seu processo legislativo, pois a ele cabe, primordialmente, a possibilidade de criar discursos com força de lei. No presente trabalho, o intuito é compreender como a questão das terras originarias brasileiras foi, e ainda é, objeto de disputa legislativa. E como, por outro lado, a incidência política dos grupos sociais menorizados pode afetar a produção de leis no Brasil e que, no caso dos povos originários, analisamos se a disputa discursiva se mostrou como uma forma de resistência no âmbito fundiário ao violento processo colonial, tornando-se um meio de luta pela manutenção de terras e do modo de vida indígena no país.
O discurso e a lei
A importância de pensar as formações discursivas no contemporâneo está diretamente relacionada ao entendimento de que a linguagem não é uma simples comunicação de informação entre dois ou mais sujeitos, nem uma ponte entre pensar e falar, mas sim uma forma de relação de poder (Foucault, 2005a), onde se sabe, por exemplo, que nem tudo que seja dito por qualquer pessoa a qualquer tempo produzirá os mesmos efeitos sociais, comparados a atos de fala inseridos em relações específicas de poder. O discurso jurídico, por exemplo, é marcado por uma linguagem própria que se vale de categorias retóricas, que afunilam as possibilidades de ele ser dito, além de doutrinas e jurisprudências, nem sempre acessíveis, que são compartilhadas em espaços institucionalizados, como no próprio parlamento.
O que se mostra mais importante, portanto, é pensarmos a materialidade dos discursos que se concretiza no fato de as pessoas falarem, e, tais discursos, possuírem os mais diversos efeitos. Em especial, o discurso concretizado em uma lei que se diferencia por adquirir a denominada “força de lei”, categoria oriunda da dogmática jurídica que possui a intenção de inferir que algo, ao adquirir tal característica, passa a ser de cumprimento obrigatório por todos e, em caso de violação, é passível de punição, é a legitimação do uso da força e da violência institucionalizada por parte do Estado.
Traremos ao texto, brevemente, algumas questões importantes referentes ao que chamamos de discurso. Uma primeira característica importante do discurso é este ser uma relação, e como outras relações de poder, o discurso “permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz [outros] discurso” (Foucault, 2001a, p. 8). Ou seja, a prática discursiva faz agir, faz pensar, faz ver, faz sentir, faz chorar, faz rir...
A análise que aqui será empreendida tratará o discurso como relação, e, assim, citamos a proposta que Foucault (2005a) apresentou na sua aula inaugural do College de France, denominada “A Ordem do Discurso”, nos seguintes termos:
Suponho que em toda sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que têm por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade (Foucault, 2005a, p. 8-9).
Portanto, o discurso é mais que algo que acontece entre pensar e falar, o discurso possui materialidade, que modifica o estado das coisas. Por esse motivo existem procedimentos interiores e exteriores ao próprio discurso que se destinam a controlar, selecionar, organizar e redistribuir aquilo que pode ser dito. Foucault (2005a) classificou tais procedimentos em interdição, separação e vontade de verdade como procedimentos externos de exclusão do que pode ser dito. E o princípio do autor, do comentário e da disciplina, como procedimentos de limitação interna dos discursos.2
Vamos propor, seguindo a proposta delineada por Foucault (2005a), uma breve análise de como funcionam os princípios de coerção dentro dos discursos de projetos de lei específicos “como se formam através, apesar, ou com o apoio desses sistemas de coerção, séries de discursos, qual foi a norma específica de cada uma e quais foram suas condições de aparecimento, de variação” (Foucault, 2005a, p. 60).
Existem alguns tipos de regras impostas aos indivíduos que pronunciam os discursos, produzindo uma qualificação necessária e impedindo que determinadas pessoas tenham acesso3 a eles. Trata-se de uma “rarefação” dos sujeitos falantes. “Ninguém entrará na ordem do discurso se não satisfizer certas exigências e não for, de início, qualificado para fazê-lo” (Foucault, 2005a, p. 37).
Deleuze e Guattari (2002) também apresentam essa questão quando demonstram a importância do pragmatismo para o estudo da linguagem. Eles mostram que as transformações nos corpos não acontecem independente das circunstâncias e dos agenciamentos que se dão: “Alguém pode gritar ‘decreto de mobilização geral’; esta será uma ação de infantilidade ou demência, e não um ato de enunciação, se não surgir uma variável efetuada que dê o direito de enunciar”(Deleuze; Guattari, 2002, p. 21).
A junção entre mecanismos como a vontade de verdade e a rarefação do sujeito do discurso dá formas ao que chamaremos de especialismos. Esses especialismos se referem à “legitimidade para o verdadeiro” que o discurso de certos sujeitos possui frente a outros considerados menores. Os discursos autorizados desses especialistas, como acontecimentos discursivos, se engendram uns aos outros e se disseminam em meio às práticas sociais, produzindo efeitos nos corpos. Um claro exemplo disso é o discurso legislativo que além do especialismo dos parlamentares, o Poder Legislativo delimita a “força de lei” do discurso que possui efeitos concretos na vida das pessoas envolvidas. Para um exemplo deste fato, podemos citar as transformações materiais que ocorreriam com a alteração de uma palavra na legislação, a troca da palavra dezoito por dezesseis no artigo 228 da Constituição Federal, que traria a transformação do corpo do adolescente para o corpo do adulto com a possibilidade da pena de prisão a partir de dezesseis anos (Vicente, 2018).
É com este viés que analisaremos os efeitos dos discursos contidos nos debates legislativos e nos projetos de lei, assim como, dialeticamente, nas atuações de advocacy4 dos movimentos sociais. Não procuraremos uma interioridade que coloque o sujeito, autor de propostas legislativas, a falar, a análise que pretendemos fazer se refere às práticas que fazem com que seja possível a emergência desses discursos analisados e quais os efeitos materiais que estas práticas engendram. Ao lançar a questão sobre “O que é um autor?”, Foucault desloca o conceito de autor para o que ele chama de função-autor, o nome do autor exerce uma função em relação ao discurso, serve para caracterizar certos discursos, para separar, agregar e dar importância a uns em face de outros. Em nossas sociedades existem alguns discursos que detém essa função-autor, enquanto outros não. Segundo Foucault (2001b, p. 274) essa divisão serve para
Indicar que esse discurso [do autor] não é uma palavra cotidiana, indiferente, uma palavra que se afasta, que flutua e passa, uma palavra imediatamente consumível, mas que se trata de uma palavra que deve ser recebida de uma certa maneira e que deve, em uma dada cultura, receber status.
Muitas vezes o sentido dos discursos de justificação de projetos de lei em muito se equivale ao sentido dos discursos que cotidianamente ouvimos acerca dos mais diversos assuntos. Estes discursos cujo destino poderia ser o das “palavras que se vão”, pretendem, por meio do Congresso Nacional, passar a ser lei e modificar o funcionamento das instituições. É neste instante que percebemos a presença da função-autor e ainda de uma função que poderíamos chamar, mais especificamente, de função-legal. Ainda que os discursos circulem em nossa sociedade nos mais diversos meios e entre diversas pessoas que falam e escrevem, o discurso do legislador é aquele que pretende atingir uma materialidade tal que se transformará em lei, e, logo, poderá ter efeitos materiais imediatos nas vidas de muitas pessoas.
O processo legislativo brasileiro e a incidência política
As relações de força que se engendram para produzir discursos com força de lei ocorrem, em especial, em um palco que é o Parlamento. Este é entendido como a “câmara ou conjunto de câmaras constituídos por representantes eleitos para exercerem o Poder Legislativo (federal, estadual, distrital ou municipal). No Brasil, o Parlamento federal é o Congresso Nacional, constituído pela Câmara dos Deputados e o Senado Federal”.5
Porém, não podemos imaginar que todas as relações de força envolvidas na produção de leis se restrinjam aos debates legislativos que ocorrem nas casas do parlamento. Como parte de uma democracia, o Congresso Nacional é escolhido por meio do voto popular nas eleições legislativas, fazendo com que a opinião pública e a atuação da sociedade civil tenham possibilidades de entrar nos jogos estratégicos discursivos do processo de produção das leis. Assim, é que foi denominado por advocay, ou o ativismo de incidência política, o ato de defender uma causa e mudar a percepção pública e política para influenciar os processos legislativos e as políticas públicas de um país (Breláz, 2007).
Além da importância de se poder denominar uma prática social, no intuito de articular e a ela dar visibilidade, abordar a prática de advocacy se mostra importante, pois ela pode se tornar um relevante instrumento de uma democracia que se queira participativa, conforme previsto por nossa Constituição Federal de 1988. Ou segundo Daniela Castro (2016, p. 20), “Advocacy é uma estratégia para trazer mudanças políticas ou comportamentais, propiciando que a sociedade influencie de forma concreta os rumos de uma Nação”.
Assim é que temos como um marco da incidência política no Brasil, o Movimento Constituinte de 1987 que foi essencial para debatermos os rumos que gostaríamos de dar ao país após a longa ditadura civil-militar de 1964 a 1985 e os concretizarmos em uma carta de direitos que seria o farol guia do país a partir de então. O processo constituinte foi considerado dialógico, pois tivemos espaço para amplos debates que até hoje são importantes para consolidar direitos como o Sistema Único de Saúde (SUS), os direitos das crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente) e da juventude, além da definição constitucional da igualdade entre mulheres e homens, e outras reivindicações sociais que foram contempladas pelo legislador constituinte.
Entre tais lutas da sociedade civil organizada por direitos, também foi na constituinte de 1987 que tivemos um debate avançado sobre os direitos originários dos povos indígenas. Ao fim do debate constituinte, podemos dizer que os direitos indígenas foram contemplados, como uma importante conquista no texto da Constituição, superando a lógica assimilacionista6 e o viés de aculturação que sempre acompanhou as políticas anteriores voltadas para os povos originários.
A Carta Magna de 1988, portanto, a partir dos debates trazidos pelos povos originários, consolidou o capítulo VIII do Título VIII na Constituição, que logo mais será abordado com atenção. Mas isso não se deu sem luta, podemos citar como exemplo o discurso histórico de Ailton Krenak, na época presidente da União das Nações Indígenas (UNI),7 na constituinte. Krenak (2019) utilizou tinta de jenipapo durante o ato de fala para atrair a atenção, de modo irresistível, às duras palavras que proferia. Pela força que contém, citamos o discurso:
Nesse processo de luta de interesses, que têm se manifestado extremamente aéticos e eu espero não agredir com a minha manifestação, o protocolo dessa casa, mas eu acredito que os senhores não poderão ficar omissos, os senhores não terão como ficar alheios a mais essa agressão movida pelo poder econômico, pela ganância, pela ignorância do que significa ser um povo indígena, povo indígena tem um jeito de pensar, tem um jeito de viver, tem condições fundamentais para sua existência e para a manifestação da sua tradição, da sua vida e da sua cultura, que não colocam em risco e nunca colocaram a existência sequer dos animais que vivem ao redor das áreas indígenas, quanto mais de outros seres humanos. Eu creio que nenhum dos senhores poderiam nunca apontar atos, atitudes da gente indígena do Brasil que colocou em risco, seja a vida, seja o patrimônio de qualquer pessoa, de qualquer grupo humano nesse país. E, hoje nós somos o alvo de uma agressão, que pretende atingir na essência, a nossa fé, a nossa confiança, de que ainda existe dignidade, de que ainda é possível construir uma sociedade que sabe respeitar os mais fracos, que sabe respeitar aqueles que não tem o dinheiro para manter uma campanha incessante de difamação, que saiba respeitar um povo que sempre viveu à revelia de todas as riquezas, um povo que habita casas cobertas de palha, que dorme em esteiras no chão, não deve ser identificado de jeito nenhum como um povo que é o inimigo dos interesses do Brasil, inimigo dos interesses da nação e que coloca em risco qualquer desenvolvimento. O povo indígena tem regado com sangue cada hectare dos oito milhões de quilômetros quadrados do Brasil, os senhores são testemunhas disso, eu agradeço a presidência dessa casa, agradeço aos senhores e eu espero não ter agredido com as minhas palavras o sentimento dos senhores que se encontram nessa casa, obrigado! (Krenak, 2019, p. 421-422)
Assim foi que, após as diversas manifestações por distintos povos indígenas que na diferença se uniam em nome da luta pela posse das terras originárias, que em Brasília a votação se deu por maioria absoluta, aprovando a Emenda Constitucional apresentada popularmente pela UNI, consolidando o capítulo VIII do Título VIII da Constituição Federal de 1988 que agora citamos integralmente:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.
§ 7º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.
Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.
Como podemos perceber após a leitura do texto constitucional, aos povos originários foi reconhecido mais que o direito à terra, mas também à organização social e à cultura indígena o que garante a diversidade e extensão necessária da ocupação fundiária. São alterações constitucionais que operam uma mudança de paradigma, com o abandono da perspectiva de aculturação presente nas legislações anteriores, afirmando “a multiculturalidade e plurietnicidade do Estado brasileiro e o pertencimento imemorial dos Territórios Indígenas, de acordo com seus usos e costumes” (Guedes; Shafër; Lara, 2020, p. 181). É dever da União demarcar as terras indígenas, proteger e fazer respeitar todos os bens que lá existam, pois foi garantido na Constituição Federal de 1988 o reconhecimento do Indigenato.
O Indigenato
Mas foi um movimento imenso. Imagine o movimento fantástico que aconteceu nos últimos três, quatro séculos, trazendo milhares e milhares de pessoas de outras culturas para cá. Então meu povo Krenak, assim como nossos outros parentes das outras nações, nós temos recebido a cada ano esses povos que vêm para cá, vendo eles chegarem no nosso terreiro. Nós vimos chegar os pretos, os brancos, os árabes, os italianos, os japoneses. Nós vimos chegar todos esses povos e todas essas culturas. Somos testemunhas da chegada dos outros aqui. Ailton Krenak 8
A Constituição Federal de 1988, no artigo 231, se refere expressamente aos direitos originários das terras que os indígenas tradicionalmente ocupam, não deixando espaço para dúvida ou interpretação: as terras indígenas são aquelas que povos originários habitam desde que o Brasil existe. Isso faz com que não haja necessidade de título de posse ou propriedade, uma vez que antes mesmo desses institutos existirem no Brasil, os povos indígenas já ocupavam a terra. Essa postulação, que diferencia o direito congênito dos indígenas da ocupação posterior da terra, ficou conhecida como Indigenato.
O Indigenato tem origem remota, foi descrito em 1902 por João Mendes Junior (1912), advogado à época e, posteriormente, ministro do Supremo Tribunal Federal. Desde então, já se entendia que os povos indígenas não necessitavam comprovar a posse das terras que ocupam, pois eles têm a posse originária, anterior mesmo ao surgimento do Estado de Direito e, logo, anterior ao que a gente chamou posteriormente de registro imobiliário. João Mendes Junior (1912) já em 1902 nos apontava que, para aqueles que adquirem uma terra há que se exigir o registro, não há que se exigir a quem sempre a teve, pois trata-se de um direito congênito, diverso de um direito adquirido. “O indigenato não é um facto9 dependente de legitimação, ao passo que a ocupação, como facto posterior depende de requisitos que o legitimem” (Mendes Junior, 1912, p. 58). E ele segue:
Não se concebe que os indios tivessem adquirido, por simples occupação, aquillo que lhes é congênito e primário, de sorte que, relativamente aos indios estabelecidos, não ha uma simples posse, ha um titulo imediato de domínio; não ha, portanto, posse a legitimar, há dominio a reconhecer e direito originário e preliminarmente reservado (Mendes Junior, 1912, p. 59).
Portanto, compreende-se, desde o início da república no Brasil, que as terras indígenas devem permanecer, por direito, na posse e usufruto dos povos originários, sem necessidade de comprovação de registro. Assim, consolidou-se o conceito de Terra Indígena (TI) que se trata de um tipo específico de posse, diferente da propriedade privada, pois tem natureza originária e coletiva, devendo a União demarca-las e proteger a extensão da terra e os bens nela presentes. A Constituição Federal de 1988 previu a obrigação do Estado de demarcar essas terras em um prazo de cinco anos após a promulgação. O processo de Demarcação das Terras Indígenas, se dá em cinco etapas: 1) Identificação e delimitação da área reivindicada pelos indígenas, ela se dá pela FUNAI, por meio de uma equipe multidisciplinar liderada por um antropólogo; 2) a Declaração por parte do Ministério da Justiça e Segurança Pública; 3) a Demarcação Física pela FUNAI; 4) a Homologação pelo Presidente da República; 5) o Registro pela FUNAI na Secretaria do Patrimônio da União (Brasil, 2024a).
Infelizmente, o prazo de cinco anos previsto pelo texto constitucional para a demarcação das Terras Indígenas não foi cumprido e ainda hoje em 2025 temos uma parte insuficiente de terras demarcadas, fato que abriu espaço para o surgimento de outras disputas discursivas, conforme veremos a seguir. Segundo dados coletados pelo CIMI - Conselho Indígena Missionário, O Estado resultou inerte em 40% das terras indígenas que deveriam estar demarcadas.
Existem atualmente 1296 terras indígenas no Brasil. Este número inclui as terras já demarcadas (401), em alguma das etapas do procedimento demarcatório (306), terras que se enquadram em outras categorias que não a de terra tradicional (65) ou, ainda, terras sem nenhuma providência do Estado para dar início à sua demarcação (530) (CIMI, online [s.d]).
Tal fato demonstra que o processo de demarcação, mesmo após a garantia constitucional, não ocorre sem resistência. A morosidade na demarcação abriu espaço para o surgimento de discursos como o do Marco Temporal, que é um grande retrocesso na conquista de direitos e também uma tentativa de usurpar as terras indígenas e legitimar a violência de séculos que foi, e ainda é, praticada.
O Marco Temporal
Como se o mundo das coisas ditas e queridas não tivesse conhecido invasões, lutas, rapinas, disfarces, astucias. Michel Foucault (2001c , p. 26)
No palco das lutas em que os discursos se encontram, outras teses também se apresentam tentando transformar as práticas. Em breves palavras, a tese do Marco Temporal pretende ser uma revisão do Indigenato, e pretende apontar um marco temporal para considerar a demarcação das Terras Indígenas, ou seja, pretende rever a história do Brasil e considerar que as terras a serem demarcadas serão aquelas em que os povos originários estivessem na data de 05 de outubro de 1988, dia da promulgação da Constituição, promovendo a tentativa de um apagamento de mais de cinco séculos de história, dos banimento, usurpação de espaço e violência física e apagamento cultural dos povos originários do Brasil.
A tese do Marco Temporal surge no debate jurídico do processo de demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, mais especificamente na decisão do Supremo Tribunal Federal em 2009, decisão esta que, em um primeiro olhar, significou uma vitória dos povos originários, já que, finalmente, a demarcação da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol foi julgada procedente. Entretanto, já naquela época, analistas mais atentos (Yamada; Villares, 2010) alertavam que as condicionantes surgidas na consolidação dos votos dos ministros poderiam gerar controvérsias para as demarcações de Terras Indígenas que ainda viriam a ocorrer. Foi nessa querela que surgiu a tese do Marco Temporal que ainda hoje em 2025, mais de um século depois da concepção do Indigenato, é utilizada no jogo de forças discursivas para restringir a demarcação das Terras Indígenas e legitimar o esbulho e a violência.
A pergunta que devemos nos fazer é: o que se pretende apagar quando se diz que a história valerá apenas a partir de 1988?
É sabido que, sem a devida demarcação e proteção do Estado brasileiro às Terras Indígenas, grupos grileiros, empresariais e latifundiários (CIMI, online [s.d]) não pouparam violência para remover comunidades indígenas das terras em que ocupavam, resultando que em 1988 muitos povos haviam sido banidos de seu território, fazendo com que o Marco Temporal seja um reforço dessa violência, já que irá legitimar a violência que foi utilizada para a remoção e o deslocamento dessas comunidades.
Entretanto, uma violência em especial, faz com que a delimitação do marco temporal seja ainda mais cruel, uma vez que ela parte do próprio Estado brasileiro. Sabemos hoje por meio dos registros históricos dos relatórios da Comissão Nacional da Verdade (CNV, 2014), que muitos indígenas não estavam em suas terras originárias em outubro de 1988 porque haviam sido removidos violentamente em ações sistemáticas do regime militar de 1964-1985.
Dentre os massacres realizados pelo regime militar, o jurista Flávio Pereira (2018, p. 184), com base no relatório da Comissão Nacional da Verdade, cita alguns dos principais:
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Retirada violenta e transferência integral de grupos indígenas de suas terras tradicionais;
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deslocamento de crianças indígenas;
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distribuição de materiais usáveis contaminados por vírus mortais para os indígenas;
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bombardeio e ataque com armas químicas na comunidade dos Cita-Larga (3.500 mortos identificados) e na Waimiris Atroaris (2650 mortos identificados) que de 3 mil, em 1985, eram apenas 350 sobreviventes;
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criação de prisões, ambientes de tortura, trabalhos forçados e locais de execuções de povos indígenas (como o reformatório Krenac no Estados de Minas Gerais, considerado um campo de concentração com trabalho escravo, tortura e aculturação forçada);
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realização de obras de infraestrutura em territórios tradicionais (por exemplo BR-174).
A tese do Marco Temporal conscientemente ignora que comunidades indígenas ancestrais inteiras foram removidas e violentamente expulsas de seus territórios antes de 1988, fato que as impossibilitavam de estar fisicamente nas terras tradicionais na data da promulgação da Constituição Federal de 1988 (Portela; Menezes Júnior; Silva, 2024).
A atualidade dos debates legais sobre as terras indígenas no Brasil
A tese do Marco Temporal teve uma longa trajetória nos debates judiciais após a decisão que a fez surgir em 2009 e até ser considerada inconstitucional como requisito para a demarcação de Terras Indígenas em 2023. Reproduzimos aqui os dados coletado por Portela, Menezes Júnior e Silva (2024, p. 5-6):
Surgida no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009, foi consolidada no Parecer n. GMF-05 da Advocacia-Geral da União (AGU) em 2017, com base no julgamento da Ação Popular (PET) n. 3.388 sobre a demarcação da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol, que envolvia a Portaria MJ n. 534/2005 e o Decreto Presidencial de 15 de abril de 2005 [...] A matéria teve seu desfecho final no STF em sessão do dia 27 de setembro de 2023, com um resultado de nove votos a dois, o que tornou inválida a tese jurídica.
Foram poucos os dias em que o desfecho da tese do Marco Temporal pareceu ter sido dado na decisão que em 2023 o STF a declarou inconstitucional. Em pouco tempo, o Congresso Nacional resolveu entrar em cena, mantendo a tensão em torno do debate e, em menos de um mês, em 20 outubro de 2023, tivemos a aprovação do PL 490/2007 que retoma o Marco Temporal em confronto direto com a decisão do Supremo Tribunal Federal. O presidente Lula ainda vetou o dispositivo da lei que prevê o Marco Temporal, mas em 28 de dezembro o veto foi derrubado e a Lei 14701/2023 entrou em vigor.
A entrada em vigor da Lei n. 14.701/2023 é o maior retrocesso aos nossos direitos desde a redemocratização e resulta no derramamento de sangue indígena em todo o país. O assassinato da Pajé Nega Pataxó Hã-Hã-Hãe pelo atentado de milicianos contra a retomada do território Caramuru-Paraguaçu, na Bahia, é exemplo disso. A nova lei proporciona a “legalização” de crimes e premia os invasores dos territórios. Apenas no primeiro mês da Lei n. 14.701/2023, a expansão do agronegócio e o arrendamento de terras para monoculturas e garimpo causaram 09 assassinatos de indígenas e 23 conflitos em territórios localizados em 07 estados e 05 biomas (APIB, 2024).
Por ser uma história do presente, ainda não temos uma resposta final, as lutas sociais, que passam pelo plano discursivo, ainda estão em acontecimento, portanto o que nos cabe agora é fazer uma análise dos efeitos discursivos e das condições de possibilidade do campo analisado até aqui.
Necropolítica e a proteção ancestral dos povos indígenas à terra e à vida
Nós, povos indígenas, somos o próprio tempo. Somos encantadores desse tempo que é como uma serpente, com muitas curvas, uma história que não pode ser simplificada como uma linha reta. Quem poderia imaginar que, após mais de cinco séculos de colonização e extermínio, estaríamos aqui, firmes como nossas florestas, entoando nossos cantos e tocando nossos maracás, em resistência pela vida e pelo bem viver de toda a sociedade. 20 anos de Acampamento Terra Livre! O primeiro, realizado em 2004, reuniu 240 indígenas. Hoje, em Brasília, estamos aqui com cerca de 9 mil pessoas, representando mais de 200 povos, que vieram de todas as regiões e biomas desse território brasileiro para dizer: ‘NOSSO MARCO É ANCESTRAL! SEMPRE ESTIVEMOS AQUI!’ (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil - APIB, 2024).
Conhecemos o conceito de biopolítica formulado por Michel Foucault (2005b) e o definiremos, em breves palavras, como a política de governamentalidade sobre a vida das populações, ou o poder atuando na regulação dos diversos aspectos da vida a partir de dados populacionais, sobre a natalidade, mortalidade, longevidade, sexualidade, nutrição para buscar um equilíbrio global e conduzir a vida, aumentando a produção de valor a partir dos corpos úteis e dóceis (Foucault, 2001d) inseridos nas instituições disciplinares, em uma integração do biopoder e da disciplina.
Em um diálogo direto com tais estudos de Michel Foucault, o camaronês Aquille Mbembe (2018) volta o olhar para um aspecto da biopolítica, já que o desloca para a relação imperialista/colonial da qual fazemos parte. Portanto, em contextos como o nosso, em um país de colonização violenta, escravocrata, desenvolvida a partir do regime de plantation, a política populacional atua não simplesmente para conduzir a vida, mas a partir da morte de determinados grupos, em um racismo de estado, que Foucault (2002) já apontava nas análises que desembocaram no Estado nazista. Assim, Mbembe (2018) prioriza a análise dessa face da biopolítica, que denomina de necropolítica, em que a soberania, como o direito de matar, ou como “a capacidade de definir quem importa e quem não importa, quem é “descartável” e quem não é” (Mbembe, 2018, p. 33), se entrelaça ao poder disciplinar e ao biopoder e atua para exercer um controle sobre a vida e a morte dos habitantes de um território ocupado.
Mbembe (2018) nos mostra que, muito além do racismo de estado que entrelaçou a soberania e o direito de morte no holocausto europeu, a morte como política é a história do colonialismo, tanto na escravidão quanto no genocídio dos povos originários. É verdade que Michel Foucault (2002) já nos apontava esse fato quando frisou que o racismo de Estado, condição primária do exercício da Soberania como direito de matar, vai se desenvolver primeiramente a partir da colonização, ou do “genocídio colonizador” (Foucault, 2002, p. 307) nas palavras do autor. E aqui apontamos o apagamento da história, da cultura e da vida dos indígenas no Brasil como a construção de uma política governamental genocída que já foi colonial, que já foi do governo militar, assim como do poder executivo nos anos do governo de Jair Bolsonaro (2019-2022)10 e agora é assumida pelo poder legislativo que pretende retirar a terra e a possibilidade de vida dos povos indígenas no Brasil por meio da consolidação do Marco Temporal no discurso legal.
Nas palavras de Célia Xakriabá (Dantas, 2021):11
No nosso território estamos morrendo por causa do PL da Grilagem, por causa do genocídio instalado. É um genocídio legislado, que usa a estrutura do Estado Brasileiro para matar. Os territórios indígenas estão sendo devastados, invadidos. No entanto, enquanto o Congresso Nacional projeta para nós o projeto da morte, nós projetamos o projeto da vida. Enquanto eles projetam a voz do ódio no Congresso Nacional, nós projetamos o canto e a força da ancestralidade.
Para fazer coro com as palavras da professora e ativista Célia Xakriabá, citamos um levantamento feito pelo projeto MapBiomas - realizado com base em imagens de satélites e em inteligência artificial - que mostrou que, entre 1991 e 2021, as áreas mais preservadas do Brasil foram as terras indígenas. Nesses territórios, o desmatamento e a perda de floresta foi de apenas 1,2% no período de 30 anos, que provavelmente se deu a partir de grilagens e invasões. (Brasil, 2024b). As terras indígenas se mostram, portanto, muito importantes para a manutenção da biodiversidade e o equilíbrio climático do planeta, tão urgentes, como os desastres ambientais nos mostram a cada dia. Portanto, a luta contra a necropolítica, que há mais de cinco séculos os povos originários enfrentam, se mostra na atualidade também uma luta pela preservação da vida, uma luta pela vida de todo o planeta. Para que possamos continuar existindo é urgente que se proteja quem protege as terras e a natureza das mudanças climáticas, é urgente que projetos de lei e leis como a que legitima o Marco Temporal sejam interrompidas, consideradas definitivamente inconstitucionais.
Considerações finais
Vimos ao longo do texto como a história que perpassa as relações discursivas é repleta de lutas que atingem a materialidade da vida e possuem efeitos direto no social. Priorizamos, em especial, a análise das relações discursivas que pretendem ter força de lei por meio do Congresso Nacional. Os povos originários no Brasil entraram na ordem do discurso para resistir ao esbulho de suas terras e garantir a preservação das Terras Indígenas por meio da constitucionalização do Indigenato, que hoje está expresso no artigo 231 da Constituição Federal.
A Constituição Federal em 1988 previu um prazo de cinco anos para a demarcação das Terras Indígenas, prazo que não foi respeitado, fato que abriu espaço para discursos como o da tese do Marco Temporal, que legitima a violência perpetrada contra os indígenas durante séculos e, em especial, nos anos anteriores à promulgação da Constituição Federal.
Hoje sabemos da dificuldade enfrentada pelos povos originários para ver a demarcação das Terras Indígenas, uma vez que a Bancada Ruralista no Parlamento, que age em nome dos grandes latifundiários do país, conseguiu colocar em vigor a Lei 14701/2023, denominada pelos povos originários de Lei do Genocídio Indígena. Por outro lado, também sabemos da dificuldade que o nosso planeta enfrenta a cada dia com desastres naturais por conta da devastação e do desmatamento. Portanto, a demarcação das Terras Indígenas que ficariam protegidas por seus guardiões é o que nos resta para continuarmos existindo, como já nos disse a G.R.E.S Acadêmicos do Salgueiro (2024), “a chance que nos resta é um Brasil Cocar”.
Referências
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Para entender como Foucault delimitou cada um destes procedimentos interiores e exteriores do discurso, conferir Foucault (2005a), ou para uma formulação nossa um pouco mais extensa sobre o assunto, conferir Vicente (2018).
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O termo acesso aqui se refere não ao fato de as pessoas falarem ou deixarem de falar, mas aos efeitos que podem ser produzidos a partir dessas falas. A mesma palavra “fogo” dita em alto tom por um bombeiro possuirá efeitos diversos dessa palavra dita por outra pessoa comum. Do mesmo modo, a palavra “culpado” dita por um juiz em um julgamento possui efeitos materiais diversos daqueles que se dão caso a palavra saia da boca de uma criança na escola.
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4
Conceituaremos o termo mais adiante no texto.
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A lógica assimilacionista e de aculturação dos povos originários parte do pressuposto que a maneira adequada de lidar com os indígenas brasileiros seria fazendo-os assimilar a cultura ocidental e aculturá-los, ou seja, que o modo de vida indígena deixe de existir, desta forma mostrando a outra face do genocídio, que é o epistemicídio.
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A UNI - União dos Povos Indígenas - nasce da necessidade das jovens lideranças indígenas entrarem na luta para garantir direitos na Constituição de 1988. “Traçou pela primeira vez na história um quadro jurídico novo para a regulamentação das relações do Estado com as sociedades indígenas contemporâneas, rompendo com uma tradição de quase cinco séculos de política integracionista, ela reconhece aos índios o direito a prática de suas formas culturais próprias” (UNI, 2023).
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Cf. GELEDÉS (2013). Narrativa Krenak: o eterno retorno do encontro. Disponível em: https://www.geledes.org.br/narrativa-krenak-o-eterno-retorno-do-encontro/.
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Reproduzimos literalmente o texto, conservando a grafia do português da época.
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10
Para os dados sobre a violência institucional contra os povos indígenas no período, consultar o relatório do CIMI (online). Disponível em: https://cimi.org.br/terras-indigenas/.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
18 Ago 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
09 Jan 2025 -
Revisado
25 Mar 2025 -
Revisado
01 Abr 2025 -
Aceito
03 Jul 2025


Fonte da imagem: ClimaInfo. Disponível em: