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O corpo místico do ator experimental no cinema

The mystical body of the experimental film actor

Resumo

Fora do enquadramento estético e institucional do que se convencionou chamar de arte cinematográfica clássica, houve um pujante grupo de manifestações atorais no cinema — majoritariamente de vertente experimental — cujo programa foi levar para a dimensão performativa de seu métier uma tese que perpassa muito da teoria do ator (no teatro e no cinema): sua santidade, possessão ou misticismo. Este trabalho intenta, então, perfazer uma genealogia de formas atorais no cinema que figuravam essa tese da transcendentalidade do trabalho do ator por meio da iconografia cristã, degradada nesses filmes pelo seu entorno marcado por violência, fome e injustiça. Assim, anticlericalismo e herança das artes visuais servem de base metodológica para acessar essa proposta de genealogia das formas atorais experimentais no cinema em três principais vias temáticas: 1) a revelação; 2) a crucificação e figura crística; 3) a Pietá e a Mater Dolorosa.

Palavras chave
cinema experimental; ator cinematográfico; corpo místico; iconografia cristã

Abstract

Outside the aesthetic and institutional framework of what was conventionally called classic cinematographic art, there was a thriving group of film acting performances — mostly experimental — whose aesthetic program was to take a thesis that pervades much of the acting theory to its performative dimension (in theater and cinema): his holiness, possession, or mysticism. This work intends, then, to make up a genealogy of acting forms in cinema that generated this thesis of transcendentality of the actor's work through Christian iconography, but degraded by its surroundings marked by violence, hunger and injustice. Thus, anticlericalism and a heritage of the visual arts serve as a methodological basis for accessing this proposal of a genealogical study of experimental film acting forms in three thematic fields: 1) revelation; 2) the crucifixion and the Christic figure; 3) the Pieta and the Mater Dolorosa.

Keywords
experimental film; film actor; mystical body; Christian iconography

Introdução

Na história da relação das sociedades com o ator, relatada no livro The idea of the actor, William Worthen (1984)WORTHEN, W. B. The idea of the actor. Princeton: Princeton University Press, 1984. nos revela que os elementos que mais se interpõem ao espectador e ao trabalho do ator são o engano, a suspeita e certo grau de aversão pelo processo biológico de reprodução de um ser na tela. Essa operação de encantamento, de fascinação — mas também de turbulência e descrença que resvala para alguns teóricos no sobrenatural —, faz do ator, nas palavras de Roland Barthes (2007)BARTHES, R. O mito do ator possuído. In: ______. Escritos sobre teatro. 1. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 218–222., um ser possuído. O ator torna-se então grão-mestre feiticeiro e prestidigitador deste estranho não-lugar: entre o real e o suprarreal.

A possessão do ator pela personagem é a materialização in loco de uma possível arqueologia do próprio estatuto social do ator, desde as sociedades pré burguesas, em que o ator era considerado um ser civil e religiosamente excluído do restante da sociedade. Nas sociedades democráticas contemporâneas, o ator tornou-se o monstro sagrado: “exige-se doravante que o ator esteja possuído por sua personagem e, ao mesmo tempo, que dissimule os sinais dessa possessão” (BARTHES, 2007BARTHES, R. O mito do ator possuído. In: ______. Escritos sobre teatro. 1. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 218–222., p. 221). Barthes também nos lembra de que o mito da possessão torna a profissão do ator um sacerdócio e, por isso, subestimam-se o valor e a importância que a técnica, a disciplina e o trabalho têm. Esse mito é conveniente à indústria do entretenimento, já que “indica uma disposição física e psicológica de um homem que recebeu um dom que chega somente por decreto único de Deus, sem qualquer solicitação ou preparação de quem o recebe” (GARCIN-MARROU, 2014GARCIN-MARROU, F. La mise en scène de l'état de grâce dans le théâtre de Valère Novarina. Littérature, Paris, n. 176, p. 67-76, verão 2014. Disponível em: <https://www.cairn.info/revue-litterature-2014-4-page-67.htm#xd_co_f=YTJkNTU2NWMtZjZjYi00Y2JhLWE2YjYtYzU1MjIxY2U3OTg0~>. Acesso em: 30 maio 2022.
https://www.cairn.info/revue-litterature...
, p. 67, tradução nossa).

Se para Barthes o ator é um ser possuído pelo sacerdócio e pela personagem, Jerzy GrotowskiGROTOWSKI, J. Em busca de um teatro pobre. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992. (LUCET, 1992LUCET, S. JERZY Grotowski. In: AMIEL, V. et alii. (dir.) Dictionnaire critique de l’acteur. Rennes: Presses Universitaires de Rennes, 2012. p. 112–115., p. 24), encenador, diretor teatral e escritor, advogava a existência de um ator santo. Esse profissional “não mais vende o seu corpo, mas o oferece em sacrifício, vertendo-se à redenção”. O ator oferece publicamente seu corpo em um gesto pleno de generosidade, tentativa por vezes patética de atingir a verdade, “estado de total candura para nos descobrirmos, nos liberarmos, nos reencontrarmos” (LUCET, 2012LUCET, S. JERZY Grotowski. In: AMIEL, V. et alii. (dir.) Dictionnaire critique de l’acteur. Rennes: Presses Universitaires de Rennes, 2012. p. 112–115., p. 112, tradução nossa). Grotowski chega ao patamar hagiográfico de propor uma interface do corpo do ator ao corpo possuído de Barthes, definindo o ator como dotado de uma divindade que, por meio de sua arte, empreende ato de autossacrifício na perspectiva de um secular sagrado no teatro. O ator aproxima-se, então, de uma presença na tela (ou nos palcos) nomeada de estado de graça, ou seja, sinônimo

[...] de desempenho extraordinário ou como um controle perfeito do corpo (estamos perto do desempenho desportivo aqui) ou como um momento indescritível de intensa presença onde a realidade é transfigurada, como um estado de graça mística que pode ser descoberto nas obras de Inácio Loyola, Thére`se d’Avila, Jean de la Croix. Os três afirmam que a graça não pode ser adquirida, nem pela indústria, nem por esforço, mas que alguém pode “se dispor” por uma série de exercícios espirituais.

(GARCIN-MARROU, 2014GARCIN-MARROU, F. La mise en scène de l'état de grâce dans le théâtre de Valère Novarina. Littérature, Paris, n. 176, p. 67-76, verão 2014. Disponível em: <https://www.cairn.info/revue-litterature-2014-4-page-67.htm#xd_co_f=YTJkNTU2NWMtZjZjYi00Y2JhLWE2YjYtYzU1MjIxY2U3OTg0~>. Acesso em: 30 maio 2022.
https://www.cairn.info/revue-litterature...
, p. 67, destaque no original, tradução nossa).

O ator adquire, assim, um estado de transluminação, de irradiação, na acepção de Anton Tchekhov, ocupando espaço no filme/palco que se aproxima da obscuridade, do inominável ou do indizível (porque dificilmente descritível pela linguagem verbal).1 1 Os exemplos continuam: Meyerhold quer que o ator, graças à biomecânica, atinja um grau de luminescência aos olhos do público na epifania criativa de atuar. Artaud, em O Teatro e seu duplo (1996, p. 266), diz que “é [...] porque o homem sai dele mesmo e se crê transformado, possuído, que o drama começa”.

Há um grupo de atores e atrizes que, durante a história do cinema fora dos enquadres da produção clássica, manifestou curiosidade estética que ligava essas teorias a certo interesse genuíno pela criação de uma gestualidade atoral mística. Assim, o trabalho do ator envolveria o engodo, a bruxaria/possessão e sua santidade calcados na reprodução ou representação de signos cristãos importados de outras matrizes das artes, majoritariamente a pintura (pós) renascentista europeia. O aspecto místico do jogo do ator tomou boa parte da história da teoria e da práxis teatral e cinematográfica. Ele se materializou em gestos, expressões faciais, posturas e tableaux vivants, que eram tentativas de figurar na tela o que se ouvia dos diretores- teóricos. O jogo do ator é considerado portador de tal aspecto metafísico do indizível — indo contra as fontes utilitárias da linguagem —, exibindo esse corpo místico por meio dos procedimentos e processos do próprio jogo atoral figurando signos cristãos. Assim, esses atores uniram na sua prática de trabalho uma ideia que os perpassa: a da sua santidade, possessão ou misticismo, com a reprodução e confluências de sua arte com signos comunicacionais cristãos.

Foi assim que, na arte do ator cinematográfico, majoritariamente os de vertente experimental, essas figurações da iconografia cristã colocaram na forma fílmica uma produção de mundo baseada no realismo de registro fotográfico (BAZIN, 1991BAZIN, A. O cinema: ensaios. São Paulo: Brasiliense, 1991.). O entrecho desses filmes, no entanto, vem envolto em ambiência humana degradada, desenhando um tabuleiro de forças sociais que oprimiam o sujeito, gerando um mundo distópico. Essa linhagem de figurações cristãs no cinema experimental vem coberta por um anticlericalismo por vezes resignado, por vezes agressivo; ora coberto pelo desejo humanista de redenção humana, ora pela crítica ferina aos estados que fazem vista grossa à fome e à injustiça.

Trabalha-se, portanto, com a hipótese de que esse ator santo, possuído, em estado de graça, místico, enfim, figura exatamente o esvaziamento, o distanciamento, a alienação ou o exaurimento da plenitude do sagrado da simbologia — e, por conseguinte, também da doutrina — cristã presente no cinema. Esses atores reempregam transtextualmente motifs da pintura religiosa cristã aqui amalgamadas ao anticlericalismo de vários artistas do cinema experimental. O tipo de engenharia mimética adotado constituía-se num realismo no registro dos fenômenos, mas apresentava nova ordem de valores. Estes eram implementados por vias de figuras de linguagem (ironia, sarcasmo) e/ou quebra de expectativas dos preceitos de ordem religiosas apresentada por outras matrizes da arte e do pensamento: majoritariamente a pintura. O ator experimental acopla, portanto, ao seu programa gestual certo etos criativo que pode ser explicado pela questão da figura do corpo: instrumento que, ao performar, gera imagem.

Este artigo intenta, portanto, analisar como a manutenção de algumas genealogias figurativas do jogo do ator e a reposição e a circulação recorrentes de clichês visuais de várias manifestações sígnicas cristãs fornecem elementos para uma possível história do estilo e dos métodos das formas atorais. Os cinemas que aqui servem de base analítica estão fora do enquadre ético- estético e também econômico e institucional do que a teoria cinematográfica tradicionalmente chama de cinema clássico ou cinema industrial (BORDWELL, STAIGER; THOMPSON, 2005BORDWELL, D.; STAIGER, J.; THOMPSON, K. The classical Hollywood cinema. Film style & mode of production to 1960. Londres: Routledge, 2005.).

As obras fílmicas e os realizadores sobre os quais este trabalho se debruça situam-se no espectro de obras analisadas em antologias fílmicas do cinema experimental, em cinco autores que servem de base para essa pesquisa: Vogel (1974)VOGEL, A. Film as a subversive art. Nova York: Random House, 1974., Sitney (1987)SITNEY, P. A. (ed.). The avant-garde film. A reader of theory and criticism. New York: Anthology Film Archives, 1987. (Anthology Film Archives Series n. 3), Mitry (1974)MITRY, J. Le cinéma expérimental: histoire et perspectives. Paris: Editions Seghers, 1974., Ferreira (2000)FERREIRA, Jairo. Cinema de invenção. São Paulo: Limiar, 2000. e Noguez (2010)NOGUEZ, D. Éloge du cinéma expérimental. Paris: Éditions Paris Expérimental, 2010.. Concentrei minhas análises em filmes que contivessem elementos humanos, figuração do ator e um (possível) enredo, o que no cinema experimental só perfaz parte de toda a sua história, marcada também por produções expressionistas abstratas e picturais, filmes cubistas, animações, obras estruturais, filmes flicker e não figurativistas. O corpus ao qual me ative ainda permanecia amplo, e minha chegada nas figurações do corpo místico se deu por método dedutivo-associativo. De posse das manifestações do modus operandi do ator experimental nos filmes citados, dentro das antologias mencionadas supra, chegou-se aos casos particulares das figurações místicas do ator. Longe de ser um trabalho de cunho exaustivo sobre o corpo místico do ator, os casos aqui fornecidos figuram uma espécie de panteão exemplar dessas figurações. Utilizaremos, então, diferentes manifestações do motif da iconografia cristã dentro de corpus amplo, mas relativamente fechado (cinemas não clássicos), para observar como esses filmes enriquecem essas manifestações, reposicionando-as contextualmente. Essas manifestações serão analisadas por meio da figura do ator em contraste — e retroalimentando-se — com o conjunto de elementos cenográficos e pró-fílmicos.

Além de propor prolegômenos do que este trabalho chama de ator místico, apresentarei uma genealogia da manifestação da iconografia cristã em três grandes grupos de figurações: 1) o olhar e o elevar das mãos aos céus, grupo de figurações que nomeio de revelação; 2) a crucificação e figura crística e; 3) a Pietá e a Mater Dolorosa. Longe de esgotar esse compêndio de manifestações da iconografia cristã no cinema, tais figurações atorais revelam a pujança da angústia criativa dos atores e atrizes. Estes revelam na fatura de tais filmes certa obsessão pela crítica, pela denúncia do hiato entre o estado institucional e o cotidiano avassalador do homem comum, da revelação da fome, da exclusão social, das arbitrariedades do patriarcado, entre outras questões. Isso confirma, nas matrizes visuais, a tese exaustivamente repetida da santidade ou possessão do ator durante a performance.

O ator e o jogo místico

As manifestações do jogo do ator que representam símbolos cristãos confrontam o axioma proveniente de outras manifestações artísticas que figuram o corpo do personagem exibido sempre em ambiente sagrado ou celestial. O termo místico, que aqui adoto, designa certo modo de se expressar corporalmente, de fazer ou agir, produzir imagem e disposição ou modalidade metalinguística do jogo do ator. Ele opera vetor embreador (PAVIS, 2011PAVIS, P. A análise dos espetáculos. São Paulo: Perspectiva, 2011.), transportando a enunciação de um ícone imerso em outro palco de representações sociais, levando ao embate provocador em estado de permanente contraposição à tradição iconográfica cristã. No corpus de filmes que compõe este trabalho, as manifestações da simbologia cristã presentes no jogo do ator deslizam para violência sem precedentes, famílias disfuncionais, disputas domésticas que exibem o embuste da família patriarcal, assédios e para a denúncia da fome. Deslocadas de sua pragmática mais tradicional, principalmente em outras artes figurativas, o jogo experimental atoral retoma a polêmica proposta por Richard Horny (1983)HORNBY, R. Understanding acting. Journal of Aesthetics and Education, University of Illinois, v. 17, n. 3, p. 19-36, outono 1983., quando este elenca os dois tipos de ambiência em que a arte do ator é inserida: os místicos e os racionalistas. Os primeiros são considerados possuir um dom revelador, santo e epifânico, enquanto os últimos são aqueles cujo ideal do trabalho do ator se mostra resultado muito mais dos seus atributos externos (gestos, expressões faciais, atributos físicos).

A introdução de um elemento temático controverso — fome, incesto, drogas — em figurações religiosas gerou o que Patrice Pavis (2011)PAVIS, P. A análise dos espetáculos. São Paulo: Perspectiva, 2011. chamou de corpo místico do ator: corpo que revela a mística religiosa, mas rebaixa o entorno dela, endossando o efeito alegórico das figurações ao ressignificá-lo. O termo corpo místico do ator é aqui emprestado do trabalho de Pavis quando diz que o gesto de adoração de Harpagão (Louis de Funès) em O avarento (Louis de Funès e Jean Girault, 1980) liga a figuração do personagem para o que ele chama de confrontação do contexto da devoção para imitações satíricas e burlescas.

São figurações que subvertem o contexto religioso e divino da adoração para paródias, subversões de sentido, ironias e choques. Harpagão [...] ouve uma estranha música diegética e extradiegética ao mesmo tempo, um coro religioso que nos remete ao quadro A visão de São João o Divino (de El Greco), em que o santo tem as mãos levantadas — gesto que figura a revelação, a adoração e a pureza encarnada. Só que aqui Harpagão é sovina, emagrecido como um morcego tentacular, irritadiço, mal-humorado, sempre a discutir minúcias para que o seu dinheiro não seja desperdiçado em pequenezas mundanas

(OLIVEIRA, 2020OLIVEIRA, S. O dominío experimental no jogo do ator cinematográfico. São Paulo, Rebeca, ano 09, n. 01, p. 187-206, jan.-jun. 2020.b, p. 201).

O jogo experimental do ator leva para meandros lodosos esses temas controversos da figuração da iconografia cristã, aqui distanciados de uma conformação mais tradicional e justapostos a paródias, drogas e temas domésticos mais mundanos. O trabalho técnico do ator quando figura o gesto místico não é mais fruto de uma pragmática ortodoxa, mas revelado no seu embuste de aplicá-lo a ambientes disfuncionais.

Figura 1
Revelação da santidade e gesticulação paródica de Harpagão.
Figura 2
O avarento

Assim sendo, faz-se necessário lembrar a profunda ruptura estética do gesto do ator experimental com os atores realistas-naturalistas do cinema clássico: estes impunham na grafia do gesto significado que lhe era inerente, circunscrevendo de maneira radical o leque hermenêutico do espectador. Uma das potencialidades mais acintosas das figurações no jogo do ator no cinema experimental é sua tendência de repor a profunda vocação transtextual dos artefatos de arte, fazendo uso de um enorme arcabouço de elementos gráficos, sonoros e citacionais emprestados de outras manifestações artísticas. As artes, então, se impregnam de falas, imagens, sons e gestos, oxigenando essas figurações.

Essa cena de O avarento tem inegável herança burlesca, ligando a vida do- méstica cheia de acontecimentos mundanos com a ideia da figuração da revelação cristã. Ao justapor essa revelação aqui exibida de forma subversiva e cômica, o filme desfigura a ideia comum que temos da glória, tornando-se, assim, profundamente afrontadora com o contexto sagrado. São figurações seculares ao relacionarem alegoricamente dois temas tão diversos (a fé cristã com questões que revolvem a vida econômica familiar), “pondo o corpo místico do ator em rota de colisão com uma figuratividade atoral mais assentada em codificação tradicional, realista [ou idealista] do mito” (OLIVEIRA, 2020b______. O dominío experimental no jogo do ator cinematográfico. São Paulo, Rebeca, ano 09, n. 01, p. 187-206, jan.-jun. 2020b., p. 202).

Se tomarmos, por exemplo, a figuração da cerimônia de lava-pés pelo ator Antero de Oliveira em Cara a cara (Júlio Bressane, 1967), constata-se que diretor e ator têm um modus operandi que confirma a conexão da tese do corpo místico com a produção experimental no cinema. A cerimônia do lava-pés foi retratada nessa obra em versão pouco ortodoxa em relação à tradição cristã, quando Raul (Antero de Oliveira), funcionário público apaixonado por uma moça da alta sociedade (Helena Ignez), está em uma cena doméstica com sua mãe (Vanda Lacerda), lavando amavelmente os pés dela. Originária dos ritos exemplares de Cristo, ação mandatária aos apóstolos que exprime a obrigatoriedade da humildade e hospitalidade dos anfitriões, a cerimônia de lava-pés aqui é inserida tendo sua conotação religiosa e prática social questionadas quando, em uma justaposição de planos que acontece logo depois, surge a moça amada lavando seus pés, quebrando a santidade do ato, justaposição imagética que sugere fetiche erótico do ritual.

Figura 3
A cerimônia do lava-pés em Cara a cara: o erótico e o fúnebre. Fonte: Captura de tela do filme Cara a cara (Júlio Bressane, 1967BRESSANE, J. Fotodrama. Rio de Janeiro, Imago, 2005.).

No que tange à questão do registro, da fatura fílmica, Cara a cara é um filme que propõe outra leitura da cerimônia, já que o gesto do ator místico não põe em relevo somente a sua maquinação, mas também os campos diegético e extradiegético em que ele é efetivado, tornando-se, assim, gesto relacional dentro do seu jogo.2 2 Importante ressaltar a leitura que Ismail Xavier tem dessa cena do lava-pés, ligando o gesto do ator ao tempo de ideias do filme: a ditatura civil-militar brasileira das décadas de 1960–80: “A provocação tem como alvo as tradições cristãs associadas aos donos do poder; quer dar expressão ao leque de subculturas dos grupos marginalizados, em choque direto com um provincianismo que, naquele momento, recebia um impulso militar” (XAVIER, 1997, p. 56). Costa (2000, p. 86)COSTA, C. O cinema marginal: a imagem-oscilação e a imagem-inação . In: ______. Cinema brasileiro (Anos 60 – 70): dissimetria, oscilação e simulacro. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2000. p. 84–107. nos lembra da complexidade do espaço no cinema de Bressane (e, por conseguinte, nos experimentais), já que é “afirmação da ambiguidade da imagem fílmica: fascinação pelo longínquo absoluto e dissimulado e dissimulação do longínquo em relação ao próximo, à ação mesma”. Mais ainda ambígua é a extrema devoção da cerimônia, executada pelo ator Antero de Oliveira nos gestos cuidadosos durante o lava-pés com o corpo já doente da mãe, mãe que ele assassina nas cenas finais do filme, dando ao ritual católico o seu lado mais sombrio, pois não será mais uma cerimônia que evoca humildade e devoção, mas uma solene despedida.

Esse corpo do ator considerado santificado, possuidor de luz própria, que o transforma em figura mística, pode tomar, no entanto, via de ação alegórica para materializar sua aura em mundos que Deleuze (1985, p. 160)DELEUZE, G. Cinema 1. A imagem-movimento. São Paulo: Brasiliense, 1985. nomeou de originários, pois povoados de tal “violência ou crueldade, com sua dupla repartição social, ‘pobres-ricos’, ‘gente de bem — gente ruim’”. Tomemos como exemplo as tramas nos filmes de Luís Buñuel, majoritariamente opressivas, em que até os santos ou homens de bem são nocivos, porque parasitas de um mundo perverso que canibalizam:

[...] aterrorizante porque mais sutil, mais insidioso, mais próximo da hiena e do abutre que sabem esperar — a invasão do pobre ou do criado, sua investida no meio rico, e sua maneira especial de esgotá-lo: [...] mas ainda os mendigos e a criada de Viridiana. Nos pobres ou nos ricos, as pulsões têm o mesmo objetivo e o mesmo destino: despedaçar, arrancar os pedaços, acumular os dejetos, constituir o grande campo de detritos, e se reunirem todas em uma única e mesma pulsão de morte.

(DELEUZE, 1985DELEUZE, G. Cinema 1. A imagem-movimento. São Paulo: Brasiliense, 1985., p. 165).

Viridiana (Silvia Pinal) é uma jovem noviça que decide visitar o tio, idoso e necrófilo, na sua luxuosa mansão campestre. Tudo no corpo de Pinal revela sua doutrina asceta: sua tez clara, voz baixa e postura estudada de humildade, pureza e decência. Em Viridiana (Luís Buñuel, 1961), a violenta crítica ao cristianismo se dá nesse embate do corpo esvaziado da noviça inútil, desconhecedora da fé que segue, serva que dá as costas a Deus na primeira provação que lhe é impingida. Neste mosaico de cores pesadas que o anticonformismo de Buñuel esboça, a Santa Ceia (Leonardo da Vinci, ca. 1495), signo arquetípico de um cristianismo primevo e idílico, é justaposta à cena de estupro da noviça, que o filme deixa anfibologicamente nebuloso.

Figura 4
Perversa Santa Ceia de Buñuel.

Esse tableau vivant na figuração da Santa Ceia desumaniza a visão artística da miséria, repõe no mesmo cadinho existencial crentes e ateus, pobres e ricos, puros e cínicos: “momento imortal na história do cinema, a sátira mordaz de Buñuel da Santa Ceia, interpretada durante orgia gastronômica e sexual de mendigos e miseráveis. [...] Viridiana, em vez de salvar suas almas, perde a sua própria, na cena do ménage à trois da última cena” (VOGEL, 1974VOGEL, A. Film as a subversive art. Nova York: Random House, 1974., p. 294, tradução nossa). A protagonista, que mostrava de início uma personalidade pudica próxima do sublime, se perde em um mundo onde a salvação, seja o que isto significar, é só uma luz opaca no fim do túnel.

Quando se afirma anteriormente sobre a ambiência do realismo cinematográfico na arquitetura desses filmes, pretende-se levar adiante a hipótese de que esse realismo fotográfico revela cenas em que o mundo ultracatólico e distópico está imerso em um ambiente cuja aparência é de relativa ordem e tranquilidade, mas que verdadeiramente está em estado de convulsão. O corpo do ator nesses filmes tece uma interface de analogias entre a ideia de misticismo que permeia o arcabouço teórico e prático do teatro e do cinema e os ambientes distópicos das cenas nas quais esses estados se efetivam. A ideia é, portanto, transformar a abordagem teórica do corpo místico em dimensão performativa dos atores, uma mobilização física, ética e estética do ator, levando o texto a ser encarnado nesses corpos cuja presença e energia propõem equilíbrio ou balanço entre a ideia/enunciação e sua corporificação pelo jogo do ator.

A figura da revelação

Por um momento, o personagem toma consciência de que algo ocorreu, experiência repentina de conhecimento que lhe veio bruscamente, sem fonte intelectual conhecida ou percebida, e que, pelo inusitado e sublime da transmissão, crê fortemente que algo divino transcorreu. Essa ligação direta entre humano e divino, corpo e transcendência, faz o ator agir como se reconhecendo a origem dessa epifania; ele(a) ergue os braços, espalma as mãos em devoção e reconhecimento do ato concedido ou indica os céus, em um ato comunicativo dêitico. Seus braços são estendidos, para cima ou para os lados, as palmas das mãos ficam expostas, abertas em sinal de disposição de crença e até de adoração. A revelação é parte de todo um ritual de aceitação da verdade, última peça de enigma que agora o personagem consegue ver na sua plenitude, na sua inteireza. Obviamente, o ator figura o corpo do personagem disposto para a aceitação dessa iluminação, e a revelação é a materialização de inspiração para a qual o ator/personagem trabalhou arduamente para conquistar.

Em algumas manifestações do gesto da revelação no cinema experimental, essa comunicação entre humano e divino faz parte de um complexo gestual, tomando conformações e vários possíveis significados. O primeiro deles seria o que Bressane (2005, p. 48-49)BRESSANE, J. Fotodrama. Rio de Janeiro, Imago, 2005. chama de “a mão civilizada: a mão que a aponta para o vazio, para o gasoso, para o etéreo, o abstrato, mão final”; esse grupo de gestos do personagem que, ao apontar o dedo indicador para os céus, procura a origem das explicações do mundo que ele pouco compreende. Assim, o ator aponta o dedo e olha para os céus, “traz para o quadro, para a representação, um feixe de contradições, de perturbações, de afecções, de incompreensões, imagem-páthos de seu tempo, de seu mundo, de sua existência...” (BRESSANE, 2005BRESSANE, J. Fotodrama. Rio de Janeiro, Imago, 2005., p. 48). Blue Moses (Stan Brakhage, 1962) é um filme que discute, no jogo do ator, as ideias de Bertolt Brecht sobre o distanciamento do espectador e a distância da verdade que o espetáculo cinematográfico materializa. O gesto da mão civilizada foi produzido pelo ator Robert Benson, no mesmo procedimento de questionar o espetáculo aos modos de Brecht. Um ator que fala ao espectador, portanto, põe em relevo os dados materiais do espetáculo (maquiagem, vestuário, luz, câmera) e aponta o dedo indicador para os céus para clamar por eclipse solar que canhestramente é produzida pela película do filme não exposta, parodiando ao mesmo tempo a iconografia cristã e o questionável realismo do cinema clássico.

O gesto da revelação permite também representar pedido à entidade simbólica superior, quando de provação profunda, ou quando o personagem se vê diante de algo muito superior a si, como a justiça. Este foi o caso de Dura Lex (Lev Kuleshov, 1926), quando a personagem Edith Nelson (Aleksandra Khokhlova) tem de encenar o julgamento do homem que assassinou dois de seus amigos. O problema é que ela está isolada do mundo civilizado, em ambiente hostil e agressivo (Território de Yukon, América do Norte), e o julgamento que organizam está muito aquém do que a civilização considera ser justo e imparcial: o veredito é que o assassino deve ser executado por enforcamento.

Figura 5 a 7
Julgamento com cartas marcadas.

A cena da execução de Dura Lex, com os movimentos espasmódicos de Khokhlova com os braços magros, tomada por ímpeto gestual hierático, cinicamente encenado, é indicação aos céus e também maldição de sua falta de sorte e sofrimento. Seus braços se tornam análogos físicos aos galhos esqueléticos e retorcidos da árvore que abrigará a forca da execução. Gesto-epíteto, na acepção de Damour (2016)______. Montgomery Clift: le premier acteur moderne. Strasbourg: ACCRA/Université de Strasbourg, 2016. (Collection Cahiers Recherche Études Actorales n. 2)., da adoração e de deferência, combinado com uma pitada de pavor pelo assassinato travestido de justiça, por meio do julgamento e da execução. Este motif do braço estendido e das mãos espalmadas pode também ser lido como súplica aos céus por uma luz, providência divina diante do horror da justiça aplicada às avessas.

O gesto aqui não é deformado na sua execução, ele segue a premissa de que, nesses filmes, o ator utiliza a produção gestual calcada no naturalismo de feitura, com deslocamentos ou pequenas deformações (o idioleto de James Naremore) que não trazem qualquer ruído para o processo de reconhecimento.3 3 Naremore (1988, p. 4) considera que o idioleto na atuação é um grupo de traços (traits) do trabalho atoral frequentemente aplicado em obras cinematográficas e copiado por artistas impressionistas. Como exemplo, temos o gesto de passar os dedos nos lábios de Jean-Paul Belmondo em Acossado (Jean-Luc Godard, 1960). A poética gestual de Khokhlova indica um pedido de revelação (mística?) de uma verdade oculta, anseia ampliar a visão e o visível, só que a atriz o produz em um ambiente que causa fratura entre gesto e circulação sedimentada de sentido, já que executado em arredores marcados pelo cinismo do julgamento anômalo. A verdade ou a revelação na filosofia, aletheia, pode ser aplicada à performance de Khoklova em sentido inverso: “a revelação de si mesmo sob o encobrimento, a maneira com a qual se revela ao se dissimular” (MAURIN, 2001MAURIN, F. Performance et punctum. In: FARCY, G.-D.; PRÉDAL, R. (dir.). Brûler les planches, crever l’écran: la présence de l’acteur. Saint-Jean-de-Védas: L’Entretemps Éditions, 2001. p. 209-225., p. 222, tradução nossa).

O corpo crístico do ator

A figura do Cristo, do homem de carne e osso à figura-símbolo prometida à ressurreição, foi sempre esboçada no cinema mainstream como fadada à pobreza, associada fortemente à virtude social da caridade e à democratização por vezes perversa da sua crucificação. Sua obra redentora, estudada pela soteriologia, trata Jesus como figura reveladora do páthos humano, das nossas fragilidades imanentes. As figuras crísticas que este trabalho escolhe analisar, no entanto, repõem discussão já esboçada no trabalho de Georges Didi-Huberman (2012, p. 112)DIDI-HUBERMAN, G. Peuples exposés, peuples figurants. L’Oeil de l’Histoire. Paris: Les Éditions de Minuit, 2012. (Collection Paradoxe n. 4)., que descreve a multidão que segue a figura crística como “habitado por um populacho — desta vez monstruoso, ignóbil, grotesco — que cerca agressivamente a santa humilhação de Cristo a caminho da cruz”, como demonstra o quadro A crucificação de Cristo, de Hieronymus Bosch.

Figura 8
A ralé que circunda o périplo crístico.

O populacho diabólico mencionado por Didi-Huberman pode ser transposto, sem prejuízo de compreensão, para a ambiência rebaixada da sociedade moderna ocidental como representada pelo cinema e ator experimentais. Se a representação da ralé no quadro de Bosch a transforma em seres grotescos, portadores de desvio social, a sociedade ocidental moderna transforma o homem em vítima, marginal no seu próprio meio.

Foi o que aconteceu com os personagens Stracci e Lula, que criaram crucificações com motivos semelhantes em tramas cujos ambientes eram bastante distintos nas suas propostas de registro: Stracci era ator e trabalhava em um set de cinema, enquanto Lula era um jovem desocupado de classe média. O primeiro foi interpretado pelo ator Mario Cipriani, escolhido para ser figurante em um filme (A crucificação de Cristo) dentro de outro filme (Ro.Go.Pa.G): ele interpretaria um dos ladrões crucificados ao lado de Jesus Cristo. A produção do filme dentro de outro filme trata Stracci com desumanidade, fazendo que ele ficasse exposto sobre a cruz durante horas para as tomadas das cenas, provocando sua morte por problemas digestivos. Esse é o entrecho do episódio La ricota, dirigido por Pier Paolo Pasolini, episódio do filme Ro.Go.Pa.GRelações humanas (1963). Já em Meteorango kid, o herói intergaláctico (André Luiz Oliveira, 1969), Lula, personagem do ator Antônio Luiz Martins, jovem de classe média, vai ao funeral de seu melhor amigo (Duda) com insuportável sentimento de remorso por tê-lo insultado em público em razão de sua homossexualidade, fazendo que ele cometesse suicídio. Paralelamente a essa descrição nada edificante de Lula, há o seu périplo pelas drogas e alienação da sociedade e da família moralmente deterioradas.

Esses dois filmes exibem a ideia metafórica e regressiva da cena de crucificação de Stracci e Lula: o martírio desses personagens pode também ser considerado fator que torna místico o corpo do ator, pois são martírios de prisioneiros cujos corpos foram torturados. As encenações da crucificação ou encapsulam ou dominam essas tramas, cujos corpos crucificados apresentam, durante a constatação da morte, o tipo de figuração que permeia boa parte dos cinemas experimentais. A ritualística cristã é, portanto, exibida como núcleo de “rituais que não faz mais sentido existir dentro de [um] mundo em que a importância do ser humano só é constatada quando este serve às necessidades da aparência da sociedade, constatando o rito como mero acessório vazio” (OLIVEIRA, 2020OLIVEIRA, S. O ator experimental no cinema: mimese-jogo nas fronteiras da re-presentação. Aniki, Lisboa, v. 07, n. 2, p. 26 – 47, 2020a.a, p. 32).

Didi-Huberman (2012)DIDI-HUBERMAN, G. Peuples exposés, peuples figurants. L’Oeil de l’Histoire. Paris: Les Éditions de Minuit, 2012. (Collection Paradoxe n. 4). fala de uma crucificação pictórica interpretada pelo ator em cenários periféricos, terrenos baldios habitados por subproletários esquálidos, deserdados de qualquer nação que lhes tenha parido. Esse ambiente é tão trágico quanto o da crucificação dos evangelhos: flerta-se com a morte como componente do jogo do ator, como o faquir circense que efetivamente figura a fome — fome esta que ele verdadeiramente sente —em um jogo metalinguístico que faz lembrar Fernando Pessoa (1942)PESSOA, F. Poesias. (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1942 (15. ed. 1995).: uma fome que figura, mas fome esta que verdadeiramente se sente.

Filmes como O profeta da fome (Maurice Capovilla, 1970) revelam o ator místico em que o que impera é a impregnação sinestésica do pesadelo, aqui figurado pelo faquir interpretado por José Mojica Marins4 4 Adelino João da Silva (Silki) foi um faquir que fazia apresentações em circos, praças públicas e ruas suburbanas. Sua principal atração era ficar longos períodos sem comer. Foi tema também de minissérie televisiva, interpretado pelo ator José de Abreu. Silki ficava em um esquife de vidro na Praça da Sé, sem água nem comida por dias a fio. Esse faquir que atraía multidões inspirou Maurice Capovilla a filmar O profeta da fome, e cuja vida está também retratada em Fakir, documentário dirigido por Helena Ignez (2019). , que expõe o corpo entre a vida e a morte na busca ferrenha por migalhas que o sacie até a próxima refeição: semelhante ao cristo que “levou todos os corpos de seu corpo a existir no grau máximo dessa dor”, segundo Antonin Artaud em seus Cadernos de Rodez (apud COELHO, 1982COELHO, T. Antonin Artaud. São Paulo: Brasiliense, 1982., p. 40). Tal dimensão do sofrimento explica muito o valor dessas figurações, assegurando à paisagem do corpo e do rosto humanos a parcela do poder hierático justaposta ao corpo profano da multidão que assiste ao espetáculo, nesse conflito que parece permear as aparições atorais e o corpo religioso dominado pela dor: figurada e real.

A Mater Dolorosa

Algo que permeia as aparições do corpo místico do ator nesses cinemas experimentais é a profunda ambiguidade em que são figuradas. A fatura pode até ser conceituada como clássica na engenharia do gesto atoral, contudo, sua relação com os elementos que lhes são justapostos ou contrapostos faz desabar esse ambiente de aparente ordem religiosa. Nessa lógica figurativa, o gesto da dor da mãe que chora a morte do filho, com as mãos ora espalmadas, ora constritas contra o peito, tornou-se clichê gestual.

Na seara dos formalismos que grassaram o mundo cinematográfico nos anos 1920, o gesto da dor das duas mulheres anônimas que choram profundamente a morte do marinheiro Vakulinchuk (Aleksandr Antonov), em O encouraçado Potenkim (Sergei Eiseinstein, 1925), torna-se, então, o oposto do que este trabalho professa, e, por isto, valioso como contraponto para a nossa genealogia do corpo místico. Em vez de obscurecer a figuração pela ironia e o confronto sacrílego, torná-la ambígua pela montagem ou degradá-la pelo ambiente que a rodeia, Eisenstein tem o que Barthes chama de decorativismo na estética gestual do ator. Ele demole a polissemia, escolhe produzir um sentido quase duro, fixo, imposto ao corpo do ator, enfatizando uma função econômica de sua performance:

[O ator] profere a verdade. De maneira extremamente clássica, o luto vem das cabeças inclinadas, das expressões de sofrimento, da mão sobre a boca sufocando um soluço, mas quando tudo isso foi dito, muito adequadamente, um traço decorativo o diz novamente: a sobreposição das duas mãos esteticamente dispostas em uma ascensão delicada, maternal, floral em direção ao encolhimento do rosto. Dentro do detalhe geral (as duas mulheres), outro detalhe espelha o inscrito; derivado de uma ordem pictórica como citação dos gestos presentes nos ícones e na Pietá, [este] não distrai, mas acentua o sentido.

(BARTHES, 1977______. Image, music, text. Londres: Fontana Press, 1977., p. 56).

Esse realismo declarado, confesso, tenta trazer para o filme O encouraçado Potemkin uma conexão com a verdade: “verdade do gesto nos momentos importantes da vida”, que Barthes (1977, p. 56)______. Image, music, text. Londres: Fontana Press, 1977. nos lembra das palavras de Baudelaire. A verdade, aqui, nos chama a atenção para a profunda significação do confronto entre classes sociais que o filme enseja, revolução que para Eiseinstein denota a extração de qualquer ambiguidade da encenação.

Figura 9
Pietá e a mimese do estereótipo cristão.

Na pintura renascentista, a figura da Madonna e sua criança era exemplo de retrato portentoso da repressão social estampada na ética gestual materna, expressão plena de ternura. O amor ofertado generosamente é a imagem talvez mais exaustivamente estampada nos lares das famílias cristãs, majoritariamente ocidentais. Se essa figura maternal proba, imagem virginal da pureza de sentimentos, é exibida em ambiente incestuoso, a alegoria cai por terra, instalando o choque. No filme Twice a man (Gregory Markopoulos, 1962-1964) o personagem do ator Paul Kilb é um jovem atormentado pela homossexualidade, por aparições repetidas de sua mãe (Olympia Dukakis), numa família fustigada por relações obscuramente esclarecidas. O sfumato simulado da imagem, pela bruma do setting, e a atriz com seus gestos lentos sugerem o transe e o ambiente onírico das visões do filho atormentado. Numa de suas visões, a mãe surge num gesto maternal popular na iconografia cristã: a Mater Dolorosa é aqui uma mãe-madrasta incestuosa, e nela reside tal constatação que colide com o aviltamento e infâmia que a doutrina cristã se acostumou a proferir.

Figura 10
Mater Dolorosa incestuosa.
Figura 11
Madonna addolorata

Num filme repleto de símbolos — o espelho, o quarto, a cama —, Dukakis cria uma Mater Dolorosa anômala e decaída, comprovando a hipótese aqui delineada de que o ator experimental tem por objetivo, quase uma vocação, de tomar essas imagens-emblemas, repondo seu sentido em outras esferas de significação: da mística para as relações-tabu, certa imputação de decrepitude moral, sempre sob a óptica da doutrina cristã.

Como a Mater Dolorosa, a figura da Pietá é uma espécie de alegoria da oferta do eu para o mundo, oferenda do corpo e da energia que é feita de modo centrífugo. Ambas evocam essa doação do corpo materno para expressão gestual da dor e do consolo. Sua gentileza flui do coração: sua dor pela morte ou dor do filho é a mais pungente possível. É desse amor que tudo faz sentido. Os cinemas experimentais operam a imagem da Pietá com o que Brenez (2007)BRENEZ, N. Abel Ferrara. Urbana, Chicago: University of Illinois Press, 2007. chama de reversibilidade dos valores figurativos, pois, em muitos desses filmes, o que é alto é realmente baixo; o que se passa como sujo é na verdade limpo; o que parece íntimo está realmente apartado; o que é desconhecido é conhecido; o que é infame é verdadeiramente respeitado; e assim por diante. Não há valorações a priori dessas figuras, que precisam ser vistas dentro do contexto que habitam.

Nessas encenações, o chão que suporta esses mundos é instável, pois os artistas experimentais fazem os ícones assentados em noção clara colidir com a rudeza do choque provocador. Se a figuração nos conduz ao reversível, não é de admirar que o consolo maternal da Pietá à dor do filho venha por meio das mãos de um homem em relação a outro: dois bandidos em fuga da polícia no filme O anjo nasceu (Júlio Bressane, 1969). O ambiente aviltado aqui é o das perseguições policiais, violência urbana sem explicações sociológicas e sem diagnósticos prontos. Nesse filme de Bressane, não há traços psicológicos ou indagações totalizantes, pois a “marginalidade, favelas, crimes [...] desvestem-se de circunscrição social — a crise atual, é existencial” (MATOS, 1995MATOS, O. C. F. A ordem e seus avessos. Júlio Bressane: A cidade dos homens, a cidade de Deus. In: VOBOROW, B.; ADRIANO, C. Júlio Bressane – Cinepoética. São Paulo: Massao Ohno, 1995. p. 19-26., p. 21).

O plano fixo gera o tableau que compõe a cena da consolação, fazendo ressoar esse dado da tradição iconográfica cristã no ponto exato onde se configura o páthos da situação-limite das personagens, a unidade de experiência capaz de fazer emergir, no universo isolado, precário, sangrento e sem saída de sua carreira, esta fulguração simbólica

(XAVIER, 1992_____. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo e cinema marginal. São Paulo: Brasiliense, 1992., p. 211).

A reversão em O anjo nasceu se dá pela utilização da iconografia cristã em homens tidos como párias, pelo seu suplício contra a justiça, marcado aqui pelo ferimento na perna do bandido branco Santamaria (vivido por Hugo Carvana). O próprio nome do bandido, pela obviedade da conexão, já carrega o filme de Bressane para o campo das alegorias das quais trata este trabalho: o corpo místico do ator imerso em terreno pantanoso.

Considerações finais

Este trabalho exibiu de que modo a angústia criativa de diretores, encenadores e teóricos teatrais e cinematográficos foi materializada por atores no que Pavis nomeou de o corpo místico do ator. Por certo, não foi mera coincidência tantos teóricos e encenadores — Barthes, Artaud, Grotowski, entre outros — citarem a santidade ou a bruxaria operada por atores, nas telas, como resultado de pura técnica de feitiçaria ou encantamento.5 5 Jean-Jacques Roubine (2002) confirma a tese da figura do ator como um ser adjacente à ideia do etéreo, do inefável. O ator seria hoje o que os deuses, as feiticeiras, os mitos e os xamãs foram outrora, só que estes não poderiam se adaptar aos tempos modernos. O jogo do ator sempre foi espaço de obscuridade e ambiguidade, sendo que essa dimensão transcendental do ator perpassa a história da teoria que lhe concerne, e as aparições do corpo místico são as criações atorais que dão forma figurativa a essas concepções. O corpo místico do ator preferencialmente figura uma transposição icônica da tradição religiosa cristã para a tridimensionalidade sugerida da imagem cinematográfica. Só que nesses filmes aqui comentados, o jogo do ator atende a outras demandas, pois “faria sentido dentro de uma disposição da natureza ou dentro de uma ordem certamente alheia ao cristianismo estampado na decoração das casas” (XAVIER, 1992_____. Alegorias do subdesenvolvimento: cinema novo, tropicalismo e cinema marginal. São Paulo: Brasiliense, 1992., p. 234).

Este trabalho lida com um conceito que atinge um nível contrário do que se chama de anagógico, ou seja, quando parte da ideia abstrata da aura, da graça, para o campo das dimensões performativas do ator, para o jogo em si, para sua mobilização física nas telas. Só que os atores e atrizes citados neste texto encarnam o discurso e a iconografia cristãos em outra chave, dando origem a uma verdade outra, colocando ambos em terreno lodoso. A verdade absoluta dá lugar aqui à ambiguidade, ao deslizante, à multiplicidade de comportamentos sociais — muitos considerados até aberrantes —, à incongruência entre representações religiosas e sua ambiência apodrecida pela corrupção moral, econômica, social e institucional, revelando essa dissimetria entre representação e entorno.

Nessa exposição de corpos profanadores da iconografia cristã, este trabalho elenca algumas dessas manifestações como espécie de amostra do vasto e profundo campo de experimentações dentro do jogo do ator cinematográfico. Não se pode esquecer que os três subitens da dimensão performativa do corpo místico do ator aqui descritos — a revelação, o corpo crístico e a Mater Dolorosa — tiveram outras manifestações no cinema experimental6 6 O corpo crístico e a imagem da crucificação foram usados como objeto expressivo no filme Sem essa, Aranha (Rogério Sganzerla, 1970), quando Helena Ignez figura uma profanação do corpo crucificado de Cristo, ao tocar uma imagem posta no chão com os pés nus. André Gardies (1980) dá aos acessórios o nome de objetos expressivos, ou seja, qualquer objeto cênico que ator/ atriz usa e que, de uma certa maneira, esclarece ou potencializa aspectos de seu jogo ou de sua persona, que à primeira vista estão para nós invisíveis. : vale a pena lembrar a crucificação do homem sacrificado pela desilusão, alienação e exaustão da ideologia do personagem Jaroslav Lukas (Jan Kacer) em Coragem de todo dia (Evald Schorm, 1964). Nesta que ficou conhecida como a renascença checa, o ator Jan Kacer figura o corpo crístico como declínio do homem ocidental, consumido pela desilusão política ou pela droga, marcado pela corrupção de vários matizes que assola o mundo que habitam. Não podemos esquecer a figuração da Mater Dorolosa — gesto da oração e de rogar clemência — de Helena Ignez (personagem Isabel), jovem presa em família com patriarca necrófilo em Barão Olavo, o horrível (Júlio Bressane, 1970) e do louvor ou súplica de Russell Collins em Pie in the sky (Ralph Steiner, 1935), filme que fala da fome e da pobreza envoltas em louvor cristão.

Esses atores e atrizes, espraiados pela geografia e história do cinema, repõem em outros campos de discussão a relação do homem comum com a religião que majoritariamente amalgama os valores morais da sociedade ocidental. A dimensão redentora da figuração, contudo, é dessacralizada, em justaposições e confrontos entre corpo do ator e sociedade, que nesses filmes é sempre efetivado em chave herética. Em A idade do ouro, (Luis Buñuel, 1930), bispos católicos são justapostos a escorpiões, em um processo de desfamiliarização que explica o corpo místico como transmutação do entrecho do filme no qual a manifestação acontece, promovendo uma permutação do que é considerado superior pela estrutura religiosa , revertendo sua noção para o que é rasteiro.

A concepção do caráter místico do ator é fruto do pensamento que permeia a teoria: os termos são diferentes, mas a ideia é a mesma. A razão pela qual os próprios atores levaram essa ideia de misticismo de seu métier para as figurações cristãs é aqui fruto de conjecturas: Vogel (1974)VOGEL, A. Film as a subversive art. Nova York: Random House, 1974. falava do anticlericalismo do cinema experimental e Damour (2014DAMOUR, C. La déploration, de Sarah Bernhardt à Al Pacino: permanence et migration d’une posture codifiée (arts visuels, théâtre, cinéma). Revue Cinémas, Montreal, v. 25, n. 1, p. 17–37, outono 2014.; 2007)______. De l’iconographie religieuse à l’imagerie universelle: les références à la Pietà dans le cinéma hollywoodien. Ligeia, Paris, v. 2, n. 77-80, p. 111–119, 2007. advogava a herança figurativa das artes visuais e certo veio antropológico do jogo do ator que esses artistas experimentais do cinema expõem. Ao doar seu corpo para encarnar outrem, o ator místico desvenda o primordial cristão da figuração, revela o sublime pela presença física de seu corpo e impõe uma possível verdade que, às vezes, não está presente no símbolo.

Titulo

  • 1
    Os exemplos continuam: Meyerhold quer que o ator, graças à biomecânica, atinja um grau de luminescência aos olhos do público na epifania criativa de atuar. Artaud, em O Teatro e seu duplo (1996, p. 266)ARTAUD, A. O teatro e seu duplo. Lisboa: Fenda Edições, 1996., diz que “é [...] porque o homem sai dele mesmo e se crê transformado, possuído, que o drama começa”.
  • 2
    Importante ressaltar a leitura que Ismail Xavier tem dessa cena do lava-pés, ligando o gesto do ator ao tempo de ideias do filme: a ditatura civil-militar brasileira das décadas de 1960–80: “A provocação tem como alvo as tradições cristãs associadas aos donos do poder; quer dar expressão ao leque de subculturas dos grupos marginalizados, em choque direto com um provincianismo que, naquele momento, recebia um impulso militar” (XAVIER, 1997XAVIER, I. O cinema moderno brasileiro – Cinema novo, cinema marginal. Cinemais: Revista de Cinema e outras questões audiovisuais, Campos dos Goytacazes, n. 4, p. 39–64, 1997., p. 56).
  • 3
    Naremore (1988, p. 4)NAREMORE, James. Acting in the cinema. Berkeley, Los Angeles: University of California Press, 1988. considera que o idioleto na atuação é um grupo de traços (traits) do trabalho atoral frequentemente aplicado em obras cinematográficas e copiado por artistas impressionistas. Como exemplo, temos o gesto de passar os dedos nos lábios de Jean-Paul Belmondo em Acossado (Jean-Luc Godard, 1960).
  • 4
    Adelino João da Silva (Silki) foi um faquir que fazia apresentações em circos, praças públicas e ruas suburbanas. Sua principal atração era ficar longos períodos sem comer. Foi tema também de minissérie televisiva, interpretado pelo ator José de Abreu. Silki ficava em um esquife de vidro na Praça da Sé, sem água nem comida por dias a fio. Esse faquir que atraía multidões inspirou Maurice Capovilla a filmar O profeta da fome, e cuja vida está também retratada em Fakir, documentário dirigido por Helena Ignez (2019).
  • 5
    Jean-Jacques Roubine (2002)ROUBINE, J.-J. A arte do ator. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. confirma a tese da figura do ator como um ser adjacente à ideia do etéreo, do inefável. O ator seria hoje o que os deuses, as feiticeiras, os mitos e os xamãs foram outrora, só que estes não poderiam se adaptar aos tempos modernos.
  • 6
    O corpo crístico e a imagem da crucificação foram usados como objeto expressivo no filme Sem essa, Aranha (Rogério Sganzerla, 1970), quando Helena Ignez figura uma profanação do corpo crucificado de Cristo, ao tocar uma imagem posta no chão com os pés nus. André Gardies (1980)GARDIES, A. L’acteur dans le système textuel du film. Etudes littéraires, Québec, v. 13, n. 1, p. 71-108, 1980. Disponível em: <http://id.erudit.org/iderudit/500510ar>. Acesso em: 14 ago. 2014.
    http://id.erudit.org/iderudit/500510ar...
    dá aos acessórios o nome de objetos expressivos, ou seja, qualquer objeto cênico que ator/ atriz usa e que, de uma certa maneira, esclarece ou potencializa aspectos de seu jogo ou de sua persona, que à primeira vista estão para nós invisíveis.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2022
  • Aceito
    31 Out 2022
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