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Do YouTube à notícia: vulnerabilidade e agência nas representações de crianças produtoras de conteúdo

From YouTube to news: vulnerability and agency in the representations of children content creators

Resumo

Este texto se origina de pesquisa que investiga a relação entre visibilidade, infância e participação na internet. O estudo analisa as representações de youtubers crianças em uma amostra de 43 notícias coletadas por meio de um alerta do buscador Google, entre os anos de 2017 e 2019. Com base na compreensão da notícia como produto cultural e na visibilidade infantil como imagem social das crianças, a metodologia do trabalho se valeu dos princípios da análise de conteúdo. Os achados parciais indicam que o protagonismo infantil de que gozam nas mídias sociais, particularmente no YouTube, é problematizado pelo conteúdo noticioso analisado, gerando repercussões sociais que, embora não celebrem tal protagonismo, não deixam de reconhecer a condição de sujeito das crianças.

Palavras chave
infância e mídia; youtubers mirins; visibilidades infantis; imagem social da criança

Abstract

This article originates from research that investigates the relationship between visibility, childhood and participation on the internet. This paper analyzes the representations of children youtubers in a sample of 43 pieces of news collected through an alert of Google searcher between 2017 and 2019. Based on understanding of news as a cultural product and on children's visibility as a social image of kids, this work’s methodology is based on the principles of content analysis. The partial findings indicate that the protagonism that kids have in social media, particularly on YouTube, is problematized by the analyzed news content, generating social repercussions that do not celebrate such protagonism, and also do not fail to recognize children as subjects.

Keywords
childhood and media; kidfluencers; children’s visibilities; child’s social image

Introdução

O fenômeno das crianças produtoras de conteúdo para a internet segue ganhando impulso no Brasil, segundo país que mais acessa o YouTube no mundo e onde os chamados youtubers mirins acumulam milhões de seguidores em canais como: Maria Clara e JP, com 33 milhões de inscritos; Valentina Pontes (22,6 milhões); Planeta das gêmeas (14 milhões); Juliana Baltar (12,5 milhões); e Isaac do Vine (7,5 milhões)1 1 Números de julho de 2022. . Embora não haja um mapeamento exaustivo sobre o perfil das crianças youtubers brasileiras, alguns trabalhos recentes (ANDRADE; CASTRO, 2020ANDRADE, M.; CASTRO, G. Youtubers mirins e os vídeos unboxing: uma reflexão sobre a criança conectada nas tramas da publicidade contemporânea. Mídia e Cotidiano, v. 14, n. 1, p. 96-116, 2020. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/midiaecotidiano/article/view/38458>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; MARÔPO, SAMPAIO, MIRANDA, 2018MARÔPO, L.; SAMPAIO, I.; MIRANDA, N. Meninas no YouTube: participação, celebrização e cultura do consumo. Estudos em Comunicação, v. 1, n. 26, p. 175-195, 2018. Disponível em: <https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51905/1/2018_capliv_lsbmaropo.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; MONTEIRO, 2020MONTEIRO, M. C. Crianças e consumo digital: a publicidade de experiência na era dos youtubers. Curitiba: Appris, 2020.; MARÔPO, JORGE, TOMAZ, 2020MARÔPO, L.; JORGE, A.; TOMAZ, R. “I felt like I was really talking to you!”: intimacy and trust among teen vloggers and followers in Portugal and Brazil. Journal of Children and Media, v. 14, n. 1, p. 22-37, 2020. Disponível em: <https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/31684/Jocam_I%20felt%20like%20I%20was%20really%20talking%20to%20you%20intimacy%20and%20trust%20among%20teen%20vloggers%20and%20followers%20in%20Portugal%20and%20Brazil.pdf?sequence=1>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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) indicam que, entre os canais com mais inscritos e mais visualização, há uma prevalência de meninas com relação ao gênero, boa parte delas procedente do Sudeste, mas algumas do Nordeste e do Sul, desde locais periféricos até áreas de classe média. Se, por um lado, essa visibilidade atraiu fama e riqueza para crianças e adolescentes, por outro, repercutiu socialmente, produzindo debates sobre a própria condição da infância e a garantia de direitos das crianças.

Em 2019, o Google pagou uma multa de 170 milhões de dólares2 2 Disponível em: <https://tinyurl.com/mwxjcucy> Acesso em: 20 jul. 2022. depois de ter sido comprovada a coleta ilegal de dados pessoais de crianças pelo YouTube para direcionar a elas publicidade personalizada. Em 2020, a França se tornou o primeiro país no mundo a reconhecer para as crianças youtubers os mesmos direitos assegurados àquelas que exercem atividade artística.3 3 Disponível em: <https://tinyurl.com/996tcrxu> Acesso em: 20 jul. 2022. No mesmo ano, o Tribunal de Justiça de São Paulo condenou a Mattel do Brasil ao pagamento de dano moral coletivo no valor de 200 mil reais pela prática de publicidade infantil indireta no YouTube. As três decisões se basearam em leis de proteção que, por sua vez, estão amparadas na noção da criança como sujeito de direitos.

Esse entendimento, no Brasil, se firma em um aparato jurídico diverso que inclui, entre outros documentos, a Constituição de 1988, a Convenção sobre os Direitos das Crianças (1989), o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Marco Civil da Internet (2014) e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (2018). Postos em diálogo, esses instrumentos criam a base para a defesa dos direitos de crianças e adolescentes na internet, tocando em pontos como o direito à liberdade de expressão; a comunicação e informação; à privacidade; e a proteção, provisão e participação. Essa compreensão vem impulsionando outras ações, como a do Ministério Público do Rio de Janeiro, que instaurou, em 2020, um inquérito civil para “apurar possíveis violações de direitos de crianças e adolescentes, decorrentes da veiculação de vídeos e imagens na internet e eventual caracterização de trabalho infantil artístico”4 4 Disponível em: <https://tinyurl.com/2p4e3k55> Acesso em: 20 jul. 2022. e, em dezembro de 2021, realizou a audiência pública “Proteção de direitos de crianças e adolescentes na internet”5 5 Disponível em: <https://tinyurl.com/yeyvjjje>. Acesso em: 25 out. 2022. para levar o assunto a debate em demais setores da sociedade.

A intenção da investigação da qual este artigo se origina é compreender de que modo a visibilidade produzida por crianças protagonistas de vídeos do YouTube repercute socialmente nas compreensões contemporâneas de infância. Como essa visibilidade se manifesta para além do espaço dos canais e seus seguidores? Que debates, discussões e pautas ela suscita?

A investigação consiste em um estudo qualitativo das representações de youtubers crianças em notícias on-line (TOMAZ, 2019bTOMAZ, R. Entre a voz e a fala: youtubers mirins, celebridade e participação. In: XXVIII Encontro Anual da Compós, 2019, Porto Alegre. Anais [...]. Porto Alegre: Compós, 2019b. Disponível em: <https://compos.org.br/encontros-anuais/>. Acesso em: 9 nov. 2022.
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). Seu corpus é formado de material coletado de um alerta do buscador Google, ao longo de 24 meses, entre os anos de 2017 e 20196 6 O recorte temporal corresponde ao intervalo compreendido entre a conclusão de pesquisa anterior (AUTORA), em 2017, e o início da atual, em 2019. , com os termos youtubers e youtubers mirins. Esse material foi submetido a uma análise de conteúdo (MORAES, 1999MORAES, R. Análise de conteúdo. Revista Educação, v. 22, n. 37, p. 7-32, 1999. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4125089/mod_resource/content/1/Roque-Moraes_Analise%20de%20conteudo-1999.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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), realizada em três etapas: organização, categorização e interpretação. Os achados parciais indicam que o protagonismo infantil de que gozam as crianças nos sites de redes sociais é problematizado pelo conteúdo noticioso analisado, gerando repercussões sociais que, embora não celebrem tal protagonismo, não deixam de reconhecer a condição de sujeito das crianças. A apresentação do artigo está organizada em três tópicos que vão tratar: 1) da contextualização do fenômeno em um debate mais amplo sobre oportunidades e riscos; 2) do percurso teórico-metodológico; e 3) da análise e discussão dos resultados parciais.

Sobre oportunidades e riscos: contextualizando o fenômeno

A problematização da visibilidade das crianças na internet se insere em uma discussão mais ampla sobre as oportunidades e os riscos que se impõem a elas no on-line. Ao conduzir a pesquisa UK Children Go Online, pelo Departamento de Mídia e Comunicação da London School of Economics, Livingstone (2011, p. 14)LIVINGSTONE, S. Internet literacy: a negociação dos jovens com as novas oportunidades on-line. Matrizes, n. 2, p. 11-42, 2011. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/matrizes/article/view/38290>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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realizou uma etnografia para compreender a “domesticação da tecnologia” na primeira década do século XXI. O estudo concluiu que as oportunidades e os riscos são inerentes às relações engendradas pelas interações digitais das gerações mais jovens (LIVINGSTONE; BOBER, 2005LIVINGSTONE, S.; BOBER, M. UK Children Go Online: final report of key project finding. London: London School of Economics and Political Science, 2005.).

Os resultados do projeto UK Children Go Online demonstram essa relação entre usuário e interface das plataformas acessadas. Os pesquisadores identificaram, de um lado, a iniciativa dos usuários (informantes entre 9 e 19 anos) para acessar os ambientes digitais e aprender novas ferramentas para explorá-los. De outro, constataram diferenças demográficas (idade, gênero, etnia, classe etc.) e de literacidade (competências do uso da internet), as quais poderiam vulnerabilizá-los mais ou menos. Logo, as oportunidades encontradas (educação, participação cívica, comunicação com os pares, busca de informação etc.) não estavam dissociadas dos riscos (pornografia, racismo, assédio sexual, contato com estranhos, bullying etc.). A investigação revelou, nesse sentido, uma relação direta, concluindo que “[...] quanto mais oportunidades eles criam, mais eles encontram riscos, e quanto mais tentativas políticas de limitar os riscos, mais limitam as oportunidades.” (LIVINGSTONE e BRAKE, 2010LIVINGSTONE, S.; BRAKE, D. On the rapid rise of social networking sites: new findings and policy implications. Children & Society, n. 24, p. 75-83, 2010. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/48910003_On_the_Rapid_Rise_of_Social_Networking_Sites_New_Findings_and_Policy_Implications>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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, p. 79, tradução nossa). Curiosamente, “[...] o acesso e o uso não aumentam a probabilidade de riscos on-line em si mesmos, e a literacidade também não os reduz; ao contrário, os riscos on-line são um resultado das oportunidades.” (LIVINGSTONE, 2011LIVINGSTONE, S. Internet literacy: a negociação dos jovens com as novas oportunidades on-line. Matrizes, n. 2, p. 11-42, 2011. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/matrizes/article/view/38290>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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, p. 31).

Entre as oportunidades apontadas pela investigação está a de expressar-se, tornando tanto o consumo quanto a produção de conteúdo na internet estratégias de construção de si (ANDRADE; CASTRO, 2020ANDRADE, M.; CASTRO, G. Youtubers mirins e os vídeos unboxing: uma reflexão sobre a criança conectada nas tramas da publicidade contemporânea. Mídia e Cotidiano, v. 14, n. 1, p. 96-116, 2020. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/midiaecotidiano/article/view/38458>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; LIVINGSTONE e BRAKE, 2010LIVINGSTONE, S.; BRAKE, D. On the rapid rise of social networking sites: new findings and policy implications. Children & Society, n. 24, p. 75-83, 2010. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/48910003_On_the_Rapid_Rise_of_Social_Networking_Sites_New_Findings_and_Policy_Implications>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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, p. 76; MARÔPO, SAMPAIO, MIRANDA, 2018MARÔPO, L.; SAMPAIO, I.; MIRANDA, N. Meninas no YouTube: participação, celebrização e cultura do consumo. Estudos em Comunicação, v. 1, n. 26, p. 175-195, 2018. Disponível em: <https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51905/1/2018_capliv_lsbmaropo.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; TOMAZ, 2017TOMAZ, R. YouTube, infância e subjetividades: O caso Julia Silva. Educação, Cultura e Comunicação, v. 8, n. 16, p. 35-46, 2017. Disponível em: <http://unifatea.com.br/seer3/index.php/ECCOM/article/view/444>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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). Em uma revisão de estudos quantitativos, com dados referentes a Estados Unidos e Europa, Jiménez, García e Ayala chegaram a uma conclusão semelhante. Segundo eles, as práticas de produzir conteúdo são um modo eficiente de crianças e adolescentes constituírem-se socialmente, valendo-se da possibilidade que a plataforma oferece de “[...] permitir que uma pessoa se apresente aos outros” (2016, p. 71, tradução nossa). Para além disso, o consumo dos vídeos se mostrou importante na aquisição de ferramental para o desenvolvimento de novas formas de linguagem, uma vez que eles “[...] fazem dessa mídia uma fonte para aprender e desenvolver também sua própria criatividade, fundamentalmente dentro de seus círculos de pares.” (JIMÉNEZ, GARCÍA, AYALA, 2016JIMÉNEZ, A.; GARCÍA, B.; AYALA, M. C. Adolescents and YouTube: creation, participation and consumption. Prisma social, n. 1, p. 60-89, 2016. Disponível em: <https://revistaprismasocial.es/article/view/1314>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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, p. 80, tradução nossa).

Criando e postando narrativas de si e conteúdo de temas variados, as crianças têm a oportunidade de produzir cultura material e simbólica. A possibilidade de monetizar essas criações impulsionou uma mudança em sua natureza: de espontâneas para comerciais, uma vez que empresas se valem desse espaço para promover suas marcas e seus produtos e serviços. Isso foi crucial para que usuários do segmento infantil adequassem seus hábitos de compartilhamento aos modelos de negócio das plataformas digitais (JIMÉNEZ, GARCÍA, AYALA, 2016JIMÉNEZ, A.; GARCÍA, B.; AYALA, M. C. Adolescents and YouTube: creation, participation and consumption. Prisma social, n. 1, p. 60-89, 2016. Disponível em: <https://revistaprismasocial.es/article/view/1314>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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), saindo da produção cultural para uma atividade empreendedora (TOMAZ, 2019a______. O que você vai ser antes de crescer? Youtubers, infância e celebridade. Salvador: EdUFBA, 2019a.).

A chance de figurar entre famosos e celebridades, tornar-se referência para os pares e ser socialmente reconhecido — antes de tornar-se adulto, terminar os estudos ou ter um ofício — ofereceu às crianças novas subjetividades e novos lugares de relevância social, comumente reservados aos mais velhos (TOMAZ, 2019a______. O que você vai ser antes de crescer? Youtubers, infância e celebridade. Salvador: EdUFBA, 2019a.). Contudo, também as expôs a riscos diversos, tais como perda da privacidade (NIETO, 2021NIETO, M. B. El sharenting y los derechos personalísimos del niño en Argentina. Revista Perspectivas de las Ciencias Económicas y Jurídicas, v. 11, n. 2, p. 17-32, 2021. Disponível em: <https://repositorio.uca.edu.ar/bitstream/123456789/11918/1/sharenting-derechos-pesonalisimos.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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); exploração comercial (MONTEIRO, 2020MONTEIRO, M. C. Crianças e consumo digital: a publicidade de experiência na era dos youtubers. Curitiba: Appris, 2020.); vigilância (ENRIQUEZ, 2017ENRIQUEZ, J. Are you tattooed… yet? In: UNICEF. The State of the world’s children 2017. Children in a Digital World. New York: UNICEF, 2017. p. 94-95.); danos à reputação e perda do direito ao esquecimento (LEAVER, 2021LEAVER, T. Balancing privacy: sharenting, intimate surveillance, and the right to be forgotten. In: GREEN, L.; HOLLOWAY, D.; STEVENSON, K. The Routledge Ccompanion to digital media and children. New York: Routledge, 2021. p. 235-244.); bullying e assédio sexual (BARBOSA; O’NEILL; PONTE, 2013BARBOSA, A.; O’NEILL, B.; PONTE, C. Risks and safety on the internet: Comparing Brazilian and European children. London: EU Kids Online | LSE, 2013.); e atividade laboral (ABIDIN, 2017ABIDIN, C. #familygoals: Family influencers, calibrated amateurism, and justifying young digital labor. Social Media+ Society, v. 3, n. 2, p. 1-15, 2017. Disponível em: <https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/2056305117707191>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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). A essa concepção, que coloca em relação oportunidades e riscos, está alinhada a pesquisa TIC Kids Online Brasil, realizada anualmente pelo Cetic.br desde 20127 7 Disponível em: <https://tinyurl.com/c53vbe7r> Acesso em: 20 jul. 2022. .

Desse modo, este trabalho expõe tensões inerentes às legítimas tentativas de crianças de participar das dinâmicas que organizam as sociedades em que estão inseridas e nas quais estão sujeitas aos mesmos constrangimentos estruturais dos adultos (BLUEBOND-LANGNER e KORBIN, 2007BLUEBOND-LANGNER, M.; KORBIN, J. E. Challenges and opportunities in the anthropology of childhoods: an introduction to “Children, Childhoods, and Childhood Studies”. American Anthropologist, v. 109, n. 2, p. 241-246, 2007. Disponível em: <https://anthrosource.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1525/aa.2007.109.2.241>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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, p. 242). Partindo dos debates já em curso sobre as problematizações que se estabelecem ante os usos que as crianças fazem das mídias digitais e as possibilidades de inserção social que acessam, este artigo propõe uma discussão sobre tal fenômeno no contexto brasileiro contemporâneo.

Notícia, representação e visibilidade: considerações teórico-metodológicas

Este tópico objetiva descrever as escolhas realizadas nas etapas de organização, categorização e interpretação da análise de conteúdo e delimitar os conceitos teóricos que orientam a discussão proposta pelo artigo. A etapa da organização consistiu em eliminar todas as notícias que não fizessem referência a crianças youtubers. Com isso, o corpus chegou ao volume de 95 notícias. Após uma segunda leitura, o material foi distribuído em dois eixos temáticos, definidos a priori: 1) as notícias que privilegiaram o enquadramento das crianças como protagonistas desse fenômeno; e 2) as notícias que privilegiaram o enquadramento das crianças como objetos de proteção em tais dinâmicas.

Na segunda etapa, o material foi relido para que fossem extraídas do objeto categorias temáticas a posteriori, isto é, sem formulação prévia. Ao todo, foram formuladas cinco categorias temáticas, das quais três informam a amostra deste trabalho: youtubers mirins e justiça, youtubers mirins e publicidade e youtubers mirins e riscos. Juntas, elas compõem o segundo eixo temático, formado por notícias que privilegiam o enquadramento das crianças como objeto de proteção, ou seja, que as retratam na perspectiva dos riscos a que estão expostas enquanto realizam a atividade de produzir vídeos para o YouTube8 8 Por questões de espaço, foram realizadas em outro artigo (TOMAZ, 2022) as discussões relativas às categorias youtubers mirins e produção cultural e youtubers mirins e protagonismo, do primeiro eixo de notícias, nas quais as crianças são enquadradas como protagonistas do fenômeno. . Depois desse recorte, a amostra totalizou 43 notícias. A etapa da interpretação, por fim, equivale à análise propriamente dita sobre os sentidos produzidos nas representações oferecidas pela amostra, análise esta que está amparada em noções específicas de notícia, representação e visibilidade.

Duas coisas precisam ser ditas sobre notícia. Quanto ao seu aspecto formal, o termo notícia faz referência ao material entregue pelo alerta do site buscador Google9 9 Disponível em: <https://tinyurl.com/2w4sz3hu> Acesso em: 20 jul. 2022. , ou seja, diz respeito à unidade ou ao conjunto de conteúdo identificado como noticioso pela referida ferramenta de busca. Dito de outra forma, é o que o Google apresenta como notícia. Em razão da fluidez da leitura, para evitar repetições, por vezes, o termo será aqui utilizado de modo intercambiável com texto e matéria, a despeito de suas asseguradas diferenças conceituais, no âmbito da teoria do jornalismo (LAGE, 2001LAGE, N. Ideologia e técnica da notícia. Florianópolis: UFSC - Insular, 2001.; ROSSI FILHO, 2001ROSSI FILHO, S. Graphos: glossário de termos técnicos em comunicação gráfica. São Paulo: Editorial Cone Sul, 2001.).

O segundo ponto diz respeito a seu aspecto analítico e trata da escolha de pensar essas notícias como um produto cultural (MOTTA, 2002MOTTA, L. G. Para uma antropologia da notícia. Intercom, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 11-41, 2002. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/418>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; MOTTA, COSTA, LIMA, 2004MOTTA, L. G.; COSTA, G.; LIMA, J. A. Notícia e construção de sentidos: análise da narrativa jornalística. Intercom, v. 27, n. 2, p. 31-51, 2004. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/1067>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; PONTE, 2004PONTE, C. Leituras das notícias: contributos para uma análise do discurso jornalístico. Lisboa: Livros Horizonte, 2004.; SILVA, 2005SILVA, G. Para pensar critérios de noticiabilidade. Estudos em jornalismo e mídia, v. 2, n. 1, p. 95-107, 2005. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/jornalismo/article/view/2091>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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), de modo que importem “menos pela absorção de seus significados imediatos e muito mais pelos sentidos culturais que disseminam” (MOTTA, 2002MOTTA, L. G. Para uma antropologia da notícia. Intercom, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 11-41, 2002. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/418>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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, p. 14). Isso porque as notícias funcionam como um sistema simbólico, dotado de fragmentos e sequências abertas tal qual os termos de uma sintaxe que precisa ser reconstruída até que a tarefa interpretativa se concretize. Com base em uma perspectiva antropológica, Motta, Costa e Lima (2004)MOTTA, L. G.; COSTA, G.; LIMA, J. A. Notícia e construção de sentidos: análise da narrativa jornalística. Intercom, v. 27, n. 2, p. 31-51, 2004. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/1067>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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propõem que a análise de notícias tome de empréstimo as contribuições da narratologia literária, de tal maneira que os fragmentos — identificados nos fatos e informações repetidos e reiterados ao longo de dias, semanas e meses em diferentes veículos e formatos — sejam costurados e, assim, ofereçam compreensões de dada realidade. Neste caso, a realidade de crianças que tenham alcançado alto nível de visibilidade midiática por meio de suas publicações na internet.

De acordo com Hall (2016)HALL, S. Cultura e representação. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio: Apicuri, 2016., os sistemas representacionais articulam sentidos, ou seja, colocam os signos em relação com o mundo material ou imaginário e, assim, constroem realidade. Trata-se de uma perspectiva construtivista, segundo a qual o mundo representado não corresponde a uma realidade anterior ou dada, mas emerge dessas relações engendradas pelos atores sociais em suas interações. Em razão disso, a “representação é concebida como parte constitutiva das coisas” (HALL, 2016HALL, S. Cultura e representação. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio: Apicuri, 2016., p. 25), e não algo a ser descoberto. Logo, realizar um estudo de representações, nessa perspectiva, não é desvelar verdades ocultas, mas apontar que sentidos constroem, sustentam e identificam, neste caso, as crianças youtubers, no âmbito de uma produção noticiosa.

Por fim, é necessário delimitar o enquadramento da visibilidade com base em dois aspectos. No primeiro, importa dizer que, embora a visibilidade seja a condição de estar visível, não se trata de condição inerente, mas, como explica Thompson (2008)THOMPSON, J. A nova visibilidade. Matrizes, n. 2, p. 15-38, abr. 2008. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/matrizes/article/view/38190/40930>. Acesso em: 24 nov. 2022.
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, de um resultado das interações sociais, de modo que as múltiplas relações, tais como as geracionais, em múltiplos ambientes, tais como o midiático, fomentam modos distintos de visibilidade para o mesmo indivíduo ou grupo. Isso significa dizer que a visibilidade que as crianças constroem em seus vídeos do YouTube não é necessariamente a mesma de que gozam em veículos noticiosos.

Quanto ao segundo ponto, Sarmento (2007)SARMENTO, M. J. Visibilidade social e estudo da infância. In: VASCONCELLOS, V.; SARMENTO, M. J. (orgs.). Infância invisível. Araraquara, SP: Junqueira & Marin Editores, 2007. p. 25-49. pensa na visibilidade das crianças como a condição de elas estarem visíveis socialmente. Ele toma de empréstimo a noção de imagens sociais das crianças e das infâncias, formulada por James, Jenks e Proust (1998)JAMES, A.; JENKS, C.; PROUT, A. Theorizing Childhood. Cambridge: Polity, 1998. para argumentar que essas imagens sociais revelam o modo como as sociedades as imaginam e, assim, as normatizam, classificam e organizam. Nesse sentido, este trabalho, ao analisar as representações oriundas do conteúdo noticioso sobre as crianças youtubers, verifica as imagens sociais produzidas sobre esse grupo, com base em um corpo de notícias.

De modo geral, essas notícias partem de informações que exprimem o crescente grau de visibilidade das crianças youtubers, materializada em número de seguidores e visualizações, por exemplo. No entanto, considerando que esta amostra está inserida no eixo temático das notícias que privilegiam o enquadramento delas como objeto de proteção, confirmou-se a expectativa de que abordassem tais manifestações de fama e sucesso na perspectiva da vulnerabilidade e não de um suposto empoderamento. O estudo mostrou que, a despeito de sinalizar as fragilidades relativas a essas atividades, o material analisado não reforça noções de passividade dos mais jovens. Ao contrário, reconhece sua condição de sujeito — principalmente, de sujeito de direitos — ante as assimetrias de poder que operam nas dinâmicas em que estão inseridos. Com isso, a análise permitiu inferir que a celebrada visibilidade das crianças na internet não se desloca automaticamente para outras instâncias, uma vez que essa posição de notabilidade pode ser problematizada, reconfigurada.

Sucesso, vulnerabilidade e direito: narrativas da infância contemporânea

O objetivo deste tópico é apresentar a análise e a discussão realizadas com base na amostra de 43 notícias, relativas ao eixo temático que privilegia o enquadramento da criança como objeto de proteção, formado por três categorias: youtubers mirins e justiça; youtubers mirins e publicidade; e youtubers mirins e riscos. Esta seção explora dois movimentos. O primeiro descreve os fragmentos que emergem do conteúdo noticioso disposto nas três categorias temáticas. O segundo discute os resultados, “recompondo histórias integrais e plenas de sentido”, a fim de atualizar as realidades (MOTTA, COSTA LIMA, 2004MOTTA, L. G.; COSTA, G.; LIMA, J. A. Notícia e construção de sentidos: análise da narrativa jornalística. Intercom, v. 27, n. 2, p. 31-51, 2004. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/1067>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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, p. 32). Logo, a análise da referida amostra consiste em identificar os elementos que compõem as representações das crianças youtubers e sequenciá-los em um esforço hermenêutico que explicite os sentidos antes dispersos, conforme metodologia proposta por Motta, Costa e Lima (2004)MOTTA, L. G.; COSTA, G.; LIMA, J. A. Notícia e construção de sentidos: análise da narrativa jornalística. Intercom, v. 27, n. 2, p. 31-51, 2004. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/1067>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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.

Pouco mais da metade da amostra é formada por publicações de veículos hegemônicos da imprensa, tanto de portais como UOL e Terra quanto de páginas de veículos originalmente impressos, como O Globo, Veja e Folha de S.Paulo. A outra metade é formada por veículos integralmente digitais, como sites que cobrem a vida de famosos ou voltados para interesses específicos (maternidade, educação, saúde, produtos culturais, tecnologia etc.). Com exceção de uma matéria da revista Capricho, nenhuma outra notícia entregue pelo alerta foi publicada por uma página voltada para crianças ou adolescentes.

Nesse sentido, as notícias aqui analisadas se dirigem, praticamente em sua totalidade, aos adultos — sejam eles os responsáveis em seus núcleos familiares, ou autoridades que devem coibir a publicidade abusiva ou atores sociais diversos, convocados a contribuir por meio de suas competências com a proteção das crianças. As notícias aparecem com mais frequência em áreas generalistas, reportando, por exemplo, processos ou ações civis; e nas de comportamento, orientando as famílias. A capacidade de gerar visualizações, inscrições e renda e de se constituir como um indivíduo produtivo, mesmo criança, em um contexto neoliberal, pauta os youtubers mirins em revistas como Exame, Época Negócios e até mesmo Pequenas Empresas Grandes Negócios. As representações que emergem de tais narrativas, portanto, também se vinculam aos interesses que sustentam os veículos que as publicam.

Além de público-alvo das notícias, os adultos são, na amostra analisada, os detentores das vozes autorizadas a falar do fenômeno na quase totalidade das 43 notícias. A ausência da voz infantil nessas matérias chama a atenção ante uma prevalência da escuta de responsáveis, educadores, psicólogos, advogados e especialistas de diferentes áreas, que conferem autoridade nos assuntos que dizem respeito ao melhor interesse dos mais jovens. Isso ratifica o que estudos vêm constatando sobre a dificuldade de encontrarmos crianças como fonte em discursos jornalísticos, voltados ou não para elas (FURTADO; DORETTO, 2020FURTADO, T.; DORETTO, J. Criança cidadã?: os manuais de redação e as orientações sobre infância e adolescência. Mídia e Cotidiano, v. 14, n. 1, p. 32-54, 2020. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/midiaecotidiano/article/view/38436>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; DORETTO; FURTADO, 2018DORETTO, J.; FURTADO, T. A “invasão” das crianças no discurso jornalístico: a representação não desejada da infância. E-Compós, v. 21, n. 2, 2018. DOI: https://doi.org/10.30962/ec.1471. Disponível em: <https://www.e-compos.org.br/e-compos/article/view/1471>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; MARÔPO, 2009MARÔPO, L. A mediação na construção de uma identidade de direitos da infância: representações jornalísticas de crianças e adolescentes em Portugal e no Brasil. Tese (Doutorado em Ciências da Comunicação) – Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2009.). Essa tendência estaria ligada ao lugar de menos prestígio que os mais novos ocupam na hierarquia social; à recorrência no uso dos estereótipos infantis; às demandas produtivistas e comerciais das redações; e à dificuldade dos jornalistas não só em acessar as crianças como também a compreender sua linguagem (MARÔPO, 2015MARÔPO, L. Crianças como fontes de informação: um desafio de inclusão do jornalismo. Vozes e diálogos, v. 14, n. 2, p. 5-17, 2015. Disponível em: <https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/11611/1/Crian%C3%A7as%20como%20fontes%20de%20informa%C3%A7%C3%A3o%20-%20pp.%205-17.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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). Embora a problemática deste trabalho não verse sobre os desafios para a inserção das vozes infantis no jornalismo, sinalizar esse debate ajuda a caracterizar a complexidade das discussões aqui propostas.

A despeito de as notícias analisadas partirem de dados que atestam a visibilidade e o consequente sucesso de algumas crianças que protagonizam canais no YouTube, a leitura que fazem do fenômeno enfatiza algumas de suas problematizações. Na categoria justiça, foram encontradas notícias sobre ações no Brasil e no exterior que questionam, sobretudo, a presença da publicidade dirigida a crianças nos vídeos infantis do YouTube sem qualquer tipo de regulamentação; o modo como a plataforma administra os dados pessoais delas; o exercício laboral dos menores de idade; e a possibilidade de classificação indicativa.

Embora haja duas matérias que tratem do cenário internacional, o corpus se refere, de maneira ampla, ao contexto brasileiro e, em sua quase totalidade, a ações do Ministério Público em diferentes estados do país, palco de ações judiciais movidas, principalmente, por organizações não governamentais10 10 As quatro ações referidas no texto tiveram a participação do Instituto Alana, voltado para a promoção dos direitos das crianças, particularmente no âmbito de uma cultura do consumo. Das 43 matérias analisadas, 11 fizeram referência à entidade, indicando a importância da ação civil nessas pautas. que denunciaram a publicidade velada nos vídeos infantis e a coleta de dados pessoais das crianças sem conhecimento e consentimento dos responsáveis, por meio do consumo midiático nas plataformas digitais. Esse grupo de notícias enfatiza a violação de direitos garantidos às crianças e aponta para a atuação da sociedade civil e da justiça no combate aos abusos identificados. Elas dão conta de uma percepção da visibilidade como causa de danos.

Figura 1
Notícia da categoria youtubers mirins e justiça.

Na categoria publicidade, as matérias enfatizam a exposição de marcas e produtos nos vídeos infantis sem que fique claro seu teor publicitário. A prática fere a resolução nº 163 do Conanda — que trata da “abusividade do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente” (BRASIL, 2014BRASIL. Resolução 163 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, n. 65, p. 4, 4 de abr. 2014.) —, e o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 1990BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 setembro de 1990. Institui o Código de proteção e defesa do consumidor. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: <https://tinyurl.com/4ucatxzf>. Acesso em: 07 ago. 2020.
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) — que proíbe toda forma de publicidade abusiva, valendo-se de condições peculiares, como a idade, para descaracterizar o anúncio. As matérias sinalizam, particularmente, a preocupação de pais, educadores e psicólogos com o incentivo ao consumismo que emerge do discurso publicitário nesse ambiente. Esse corpo de textos trata do oportunismo das empresas em inserir suas marcas em conteúdos infantis, naturalizando seu consumo e valendo-se da dificuldade de distinguir comunicação mercadológica de conteúdo de entretenimento.

Figura 2
Notícia da categoria youtubers mirins e publicidade.

A categoria riscos, de modo geral, trata dos perigos relacionados às atividades de youtubers mirins e das possibilidades de enfrentá-los. Por um lado, fala-se em tomar cuidado com a cultura dos likes, preparar-se para lidar com a frustração das crianças e estar atento a conteúdos nocivos como aqueles ligados à pedofilia. Por outro, discute-se formas de enfrentar tais ameaças por meio de softwares que filtram esses conteúdos, da remodelagem dos algoritmos, do uso de moderadores humanos de conteúdo, da classificação indicativa ou da produção de guias para navegação de crianças no YouTube. As matérias, endereçadas aos responsáveis, mostram como as oportunidades encontradas pelas crianças nessas atividades estão invariavelmente ligadas a riscos diversos, levando-se em conta que quanto mais as crianças produzem e ganham visibilidade, mais interlocutores alcançam e, consequentemente, a mais interpelações estão sujeitas.

Figura 3
Notícia da categoria youtubers mirins e riscos.

A descrição das três categorias temáticas que integram a presente amostra oferece um rol de questões propícias ao aprofundamento do fenômeno analisado, no âmbito das pesquisas em comunicação. Por exemplo: a violação dos direitos infantis em dinâmicas da internet, a responsabilidade de plataformas e anunciantes, as práticas de consumo, a comunicação mercadológica endereçada a crianças e adolescentes, a literacia midiática digital e as sociabilidades infantojuvenis em culturas plataformizadas. Este artigo vai se valer dos diversos elementos dispersos no conteúdo noticioso analisado como fragmentos a serem articulados na construção de uma narrativa possível sobre as crianças youtubers.

A produção sociodiscursiva das categorias descritas acima, como já se percebe, problematiza a celebrada imagem de crianças falantes, carismáticas e bem-sucedidas. Essa imagem social (SARMENTO, 2007SARMENTO, M. J. Visibilidade social e estudo da infância. In: VASCONCELLOS, V.; SARMENTO, M. J. (orgs.). Infância invisível. Araraquara, SP: Junqueira & Marin Editores, 2007. p. 25-49.) é resultado de uma série de articulações que compreendem os usos que elas fazem das redes sociotécnicas (OTHON; COELHO, 2020OTHON, R.; COELHO, M. G. Infância capitalizada nos processos comunicacionais em rede: estudo exploratório sobre o consumo midiático de crianças entre 10 e 12 anos. Mídia e Cotidiano, v. 14, n. 1, p. 74-95, 2020. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/midiaecotidiano/article/view/38421>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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), o projeto de negócio das plataformas (ANDRADE; CASTRO, 2020ANDRADE, M.; CASTRO, G. Youtubers mirins e os vídeos unboxing: uma reflexão sobre a criança conectada nas tramas da publicidade contemporânea. Mídia e Cotidiano, v. 14, n. 1, p. 96-116, 2020. Disponível em: <https://periodicos.uff.br/midiaecotidiano/article/view/38458>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; MONTEIRO, 2020MONTEIRO, M. C. Crianças e consumo digital: a publicidade de experiência na era dos youtubers. Curitiba: Appris, 2020.) e a compreensão da visibilidade como um valor premente nas sociedades contemporâneas (TOMAZ, 2019a______. O que você vai ser antes de crescer? Youtubers, infância e celebridade. Salvador: EdUFBA, 2019a.). Nas notícias analisadas, em vez de crianças supostamente empoderadas, surgem usuários vulnerabilizados. Essa vulnerabilidade aparece com, pelo menos, dois aspectos: inerente à criança, um sujeito em fase peculiar de desenvolvimento; e contextual, produzida quando a criança é inserida em um ambiente mercantilizado no qual é interpelada por imperativos de consumo — seja para consumir, seja para promover.

De modo amplo, as notícias analisadas se baseiam na compreensão de que o assédio dos agentes do mercado constitui uma “prática danosa” (Bebê, 11/01/2019)11 11 Disponível em: <https://tinyurl.com/ww2b86yh> Acesso em: 27 jul. 2022. , levando em conta que “A criança nessa fase está em pleno desenvolvimento neurológico, cognitivo, precisa de mais estímulos” (O Estado de S. Paulo, 06/05/2018)12 12 Disponível em: <https://tinyurl.com/5cutcf4j> Acesso em: 27 jul. 2022. . Associados a isso aparecem diferentes tipos de risco, como: “causar frustração e contribuir para difundir a ideia, para o público infantil, de que a felicidade é devida ao consumo permanente” (BBC/UOL, 10/08/2018)13 13 Disponível em: <https://tinyurl.com/996tcrxu> Acesso em: 27 jul. 2022. , ou levá-las a “deixar de fazer atividades como brincar para ver outra pessoa brincando” (Folha de S.Paulo, 11/09/2018)14 14 Disponível em: <https://tinyurl.com/2s3yvmc> Acesso em: 27 jul. 2022. , além de mantê-las “expostas ao estresse do trabalho comum” (Portal FGV, 11/04/2018)15 15 Disponível em: <https://tinyurl.com/yckhckpr> Acesso em: 27 jul. 2022. . Assim, as imagens sociais dos protagonistas de vídeos infantis começam a sofrer ranhuras que reconfiguram sua visibilidade.

Seguindo esse enquadramento, a participação digital das crianças estaria sendo cooptada pelos interesses de empresas, marcas e profissionais de marketing: “os apresentadores infantis também estão vulneráveis à influência das empresas anunciantes” (UOL, 02/01/2019)16 16 Disponível em: <https://tinyurl.com/2yap7yes> Acesso em: 27 jul. 2022. ; “Diversas empresas, aproveitando-se da hipervulnerabilidade tanto da criança youtuber como da criança espectadora, passaram a enviar seus produtos” (Crescer, 04/01/2019)17 17 Disponível em: <https://tinyurl.com/3jk6m49a> Acesso em: 27 jul. 2022. . As crianças que protagonizam os vídeos são retratadas sob uma óptica que enfatiza não sua fama, mas suas fragilidades diante das ações que as tornam “verdadeiros promotores de vendas” (G1, 03/01/2019)18 18 Disponível em: <https://tinyurl.com/46ausf4j> Acesso em: 27 jul. 2022. . É nesse contexto que oportunidades e riscos estão em relação. Contudo, as matérias analisadas se diferenciam na leitura do fenômeno quanto a Livingstone e Bober (2005)LIVINGSTONE, S.; BOBER, M. UK Children Go Online: final report of key project finding. London: London School of Economics and Political Science, 2005. em dois aspectos. Primeiro, equiparando risco e dano e, segundo, estabelecendo uma relação de causalidade — e não de proporcionalidade —, uma vez que elas tendem a apontar um nexo causal entre oportunidades e danos.

Os textos justificam essa “hipervulnerabilidade presumida da criança” (Folha de S.Paulo, 05/04/2019)19 19 Disponível em: <https://tinyurl.com/yajr53hb> Acesso em: 27 jul. 2022. por meio de argumentos como: “até os 12 anos de idade a criança não consegue entender que a publicidade tem um caráter persuasivo” (Gazeta Online, 29/07/2018)20 20 Disponível em: <https://tinyurl.com/3czet3mf> Acesso em: 27 jul. 2022. , ou “crianças não sabem diferenciar a publicidade do conteúdo” (Portal FGV, 11/04/2018)21 21 Cf. nota 15. . Tais alegações reforçam a publicidade como fermento desse risco publicidade esta que, como vimos acima, aparece na amostra como tema propriamente dito, como causa de ações judiciárias em favor da criança e como ameaça em relação ao consumismo entre crianças e adolescentes. A noção de uma hipervulnerabilidade tem suas raízes no âmbito da infância moderna e vem obtendo coerência simbólica desde o início do século XX, quando ganha força a concepção de uma infância “[...] inocente, carente de proteção e governabilidade através da educação e da atenção especializada [...]” (MARRE, 2013MARRE, D. De infancias, niños y niñas. In: LLOBET, V. (org.). Pensar la infancia desde América Latina: um estado de la cuestión. Buenos Aires: CLACSO, 2013. p. 9-25., p. 10, tradução nossa).

Além da inocência, James e James (2014)JAMES, A.; JAMES, A. Key concepts in childhood studies. London: Sage, 2014. identificam que a ideia de falta de competência também sustenta o entendimento de uma vulnerabilidade inerente à criança. Para eles, essa naturalização está baseada em um “[...] desenvolvimentismo biológico e psicológico.” (JAMES e JAMES, 2014JAMES, A.; JAMES, A. Key concepts in childhood studies. London: Sage, 2014., p. 132, grifo e tradução nossa). Ao fazer essa afirmação, todavia, os pesquisadores da sociologia da infância não negam a condição peculiar das crianças, mas defendem que a vulnerabilidade não é um traço natural delas e sim uma condição que se forma mediante um conjunto de variáveis. Com isso, querem dizer que a vulnerabilidade não existe em si mesma. Ela se concretiza sempre em um contexto de riscos. Um castelo, por exemplo, pode ser forte em relação às condições de sua construção, mas vulnerável diante de determinado cerco ou ataque. Logo, a vulnerabilidade existe quando as condições de defesa são insuficientes ante um ataque sofrido. Desse modo, é possível dizer que a vulnerabilidade das crianças youtubers e das demais consumidoras de seu conteúdo está ancorada nas condições fragilizadas de defesa quanto a uma série de assédios, particularmente comerciais.

Em um primeiro momento, essa produção discursiva parece descaracterizar as crianças como sujeitos, uma vez que são retratadas como sugestionáveis e — quase naturalmente — influenciáveis. Entretanto, os argumentos oferecidos nas matérias indicam que o fato de as crianças serem retratadas como vulneráveis não as desqualifica como atores sociais. Ao contrário, tal condição é constantemente afirmada quando a temática se ancora no combate às “violações de direitos de crianças” e ao “abuso com crianças e adolescentes” (UOL, 02/01/2019)22 22 Cf. nota 16. e, ainda, na promoção da “proteção da vida privada das crianças” (Exame, 09/04/2018)23 23 Disponível em: <https://tinyurl.com/2juc65bw> Acesso em: 27 jul. 2022. ou “para que [...] sejam legitimados a sua capacidade de expressão e o direito à participação em produções midiáticas” (O Povo, 03/07/2019)24 24 Disponível em: <https://tinyurl.com/yf49h5wp> Acesso em: 27 jul. 2022. . Logo, as garantias asseguradas às crianças são enunciadas não só como formas de denunciar danos e riscos, mas também como estratégia para combatê-los. Diante de oportunidades e riscos se colocam, portanto, os direitos.

O entendimento da criança como sujeito, detentora de uma voz que demanda estruturas que garantam sua audibilidade, é tributário de um conjunto de possibilidades de natureza histórica, cultural, social, econômica e política. De acordo com Ariès (1981)ARIÈS, P. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, [1960]1981., a construção social da infância moderna, ao mesmo tempo que jogou luz sobre as crianças, as invisibilizou, na medida em que as deslocou do espaço público da produção para o espaço privado e institucionalizado do lar e da escola, respectivamente. Ao serem afastadas dos perigos do mundo adulto, elas também se ausentaram dos espaços de decisão. Com base na tese de Ariès, Qvortrup (2014)QVORTRUP, J. Visibilidades das crianças e da infância. Linhas Críticas, v. 20, n. 41, p. 23-42, 2014. Disponível em: <https://periodicos.unb.br/index.php/linhascriticas/article/view/4250#:~:text=S%C3%A3o%20utilizados%2C%20para%20a%20discuss%C3%A3o,que%20seus%20significados%20variam%20historicamente>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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acredita que se, por um lado, a presença irrestrita das crianças no espaço público anteriormente tornava-as, muitas vezes, vulneráveis a todo tipo de perigo, exploração e violência; por outro, sua domesticação as alijou dos processos de participação social, tendo em vista que as invisibilizou, afetando diretamente sua participação social e política.

É ao longo do século XX que a coexistência da proteção e da participação, aparentemente paradoxal, se tornará gradativamente uma demanda social e política (SIROTA, 2001SIROTA, R. Emergência de uma sociologia da infância: evolução do objeto e do olhar. Cadernos de Pesquisa, v. 112, n. 2, p. 7-31, 2001. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/cp/a/X8n4RcnLnhdybsVSwNG5Twv/?lang=pt>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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; BLUEBOND-LANGNER e KORBIN, 2007BLUEBOND-LANGNER, M.; KORBIN, J. E. Challenges and opportunities in the anthropology of childhoods: an introduction to “Children, Childhoods, and Childhood Studies”. American Anthropologist, v. 109, n. 2, p. 241-246, 2007. Disponível em: <https://anthrosource.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1525/aa.2007.109.2.241>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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), levando ao estabelecimento de dois pressupostos que marcam a emergência dos childhood studies: a infância como construção social e a criança como sujeito. Desse modo, a infância tornou-se também um lugar de agência, e sua investigação, bem como percepção, ganhou uma nova lente, a do paradigma das competências (CASTRO, 1998CASTRO, L. R. (org.). Infância e adolescência na cultura do consumo. Rio de Janeiro: Nau Editora, 1998., 2013______. O futuro da infância e outros escritos. Rio de Janeiro: Faperj, Sete Letras, 2013.). Esse entendimento, além de valioso para a vida das crianças na contemporaneidade, dá sustentação para que a demanda por participação delas esteja cada vez mais alinhada com a demanda por proteção. Marre (2013)MARRE, D. De infancias, niños y niñas. In: LLOBET, V. (org.). Pensar la infancia desde América Latina: um estado de la cuestión. Buenos Aires: CLACSO, 2013. p. 9-25. defende que os processos comunicacionais amalgamaram os diferentes elementos que convergiram para esse entendimento, considerando que a visibilidade das crianças nas últimas décadas foi impulsionada pela circulação sem precedentes de imagens delas e de suas infâncias em dispositivos midiáticos.

O que se constata é que, embora enfático quanto à vulnerabilidade das crianças que produzem e consomem vídeos no YouTube, o conteúdo noticioso analisado não deixa de abordá-las como sujeitos de direitos nem de reconhecer, ainda que de modo menos intenso, sua atuação social, ao dizer que “é surpreendente pensar que ele arregimentou a quantia milionária ao, basicamente, fazer propagandas para que crianças queiram comprar os mais variados brinquedos” (Época, 07/12/2018)25 25 Disponível em: <https://tinyurl.com/mrx4p5us> Acesso em: 27 jul. 2022. ; que “ela faz parte do seleto, mas crescente grupo de influenciadores digitais mirins”; que recebeu o “prêmio de Maior Influenciador Mirim” ou que “é a responsável por administrar o próprio canal no YouTube” (El País Brasil, 03/09/2018)26 26 Disponível em: <https://tinyurl.com/mrc47yz2> Acesso em: 27 jul. 2022. . É importante ressaltar que tais leituras sinalizam uma noção de agência que responde em muito a expectativas depositadas nos modelos de subjetividade neoliberal, fermentada pelas dinâmicas de alta performance (EHRENBERG, 2010EHRENBERG, A. O culto da performance: da aventura empreendedora à depressão nervosa. Aparecida, SP: Ideias & Letras, 2010.). Seu reconhecimento vem da capacidade de produzir fama e riqueza. Todavia, se, por um lado, a vulnerabilidade das crianças não impede sua agência quanto às oportunidades de participar da esfera digital; por outro, essa mesma agência não é suficiente para debelar a vulnerabilidade e garantir um ambiente protegido.

Oportunidades e riscos, agência e vulnerabilidade seguem se imbrincados neste fenômeno: “A motivação das crianças pode ser desde se comunicar, expressar sentimentos e criatividade, até ter por trás peso de competição e necessidade de ser popular [...] especialistas apontam a necessidade de os pais pesarem os prós e contras” (O Povo, 03/07/2019)27 27 Cf. nota 24. . No trecho abaixo, uma mãe reconhece as competências do filho sem, contudo, ter certeza do equilíbrio entre o que ele está ganhando e, ao mesmo tempo, perdendo.

— A meta dele é ter 1 milhão de inscritos. Tenho preocupações, claro. No início, tinha a questão da exposição da imagem. Mas o envolvimento de toda a família é grande. Meu outro medo é perder o lado criança, porque ele encara como trabalho. Isso me assusta. Era brincadeira, mas agora está sério. Ele espera receber coisas, fazer parcerias com marcas, monetizar os vídeos — avalia Rita, até ser interrompida.

— Espero ganhar dinheiro com isso, por isso me esforço. Não é só youtuber, é criação, gosto de criar — afirma Rafael

(Gaúcha ZH, 12/10/2018)28 28 Disponível em: <https://tinyurl.com/2dm3h6rm>. Acesso em: 27 jul. 2022. .

Um assunto central para os estudos da infância é compreender como a agência das crianças convive com sua vulnerabilidade, ou seja, como reconhecer as competências das crianças sem ignorar suas fragilidades como alguém que precisa de amparo. Ou ainda, como abordar uma infância cada vez mais reconhecidamente agente enquanto se atesta que as crianças vivem repetidamente episódios de abandono e maus tratos em diferentes contextos. A problemática se impõe para a comunicação, visto que as crianças ocupam e usam cada vez mais as mídias digitais.

Marôpo, Sampaio e Miranda (2018, p. 179)MARÔPO, L.; SAMPAIO, I.; MIRANDA, N. Meninas no YouTube: participação, celebrização e cultura do consumo. Estudos em Comunicação, v. 1, n. 26, p. 175-195, 2018. Disponível em: <https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51905/1/2018_capliv_lsbmaropo.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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se depararam com essa questão ao investigarem o fenômeno midiático dos youtubers mirins no âmbito da cultura digital e do consumo. O objetivo foi compreender quais forças moventes sustentam essa modalidade de participação de crianças e adolescentes. Mesmo não sendo seu foco, o trabalho ilumina a tensão entre agência e vulnerabilidade ao identificar, por um lado, “como as youtubers mirins utilizam variadas fontes, recontextualizando e transformando diferentes produtos culturais e ao mesmo tempo contribuindo para criar uma nova identidade infantil feminina” e, por outro, “a atuação das youtubers enquanto uma atividade (semi) profissional condicionada por interesses comerciais das marcas que as patrocinam, e que trazem ameaças como perda de privacidade, exploração do trabalho infantil e estímulo ao consumismo”. Buscando fugir de uma simples dicotomia entre pânico moral e celebração da fama, os pesquisadores abordam a questão em perspectiva mais ampla, indicando que se trata menos de oposição e dicotomia e mais de um tensionamento entre agentes e estruturas.

O que se vê nesse cenário é que, tão logo as crianças atinjam espaços de influência que comprovam suas competências como interlocutoras da cultura da qual são produto e produtoras (TOMAZ, 2017TOMAZ, R. YouTube, infância e subjetividades: O caso Julia Silva. Educação, Cultura e Comunicação, v. 8, n. 16, p. 35-46, 2017. Disponível em: <http://unifatea.com.br/seer3/index.php/ECCOM/article/view/444>. Acesso em: 25 nov. 2022.
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), rapidamente as tramas do mercado se instalam em sua produção, incorporando-se eficazmente em seus discursos. Ao publicar um vídeo que produziram e gravaram, elas descobrem que podem transformá-los em ganho e se beneficiar individualmente da participação que lograram na plataforma. Assim, a agência de uma criança youtuber afeta seu cotidiano, uma vez que a concepção dela como interlocutor e ator social gera-lhe uma série de interpelações. Entre essas interpelações, destacam-se os imperativos de consumo e de adesão a uma narrativa que celebra o sujeito neoliberal de alto desempenho, favorecendo seu alinhamento a uma série de projetos individualistas em detrimento de ações que iluminem variadas demandas geracionais.

Desse modo, ao representarem as crianças usuárias do YouTube, particularmente as que produzem vídeos, como crianças vulneráveis, as narrativas noticiosas analisadas apontam a necessidade de discutir mais detidamente seu protagonismo, sem celebrá-lo de forma acrítica, mas também sem desqualificá-lo. James e James (2014)JAMES, A.; JAMES, A. Key concepts in childhood studies. London: Sage, 2014. consideram problemática uma vulnerabilidade naturalizada, que não parte das contradições sociais, mas da homogeneização das crianças, como se todas estivessem expostas aos mesmos riscos, o tempo todo, na mesma intensidade. Por essa razão, defendem análises que identifiquem o processo por meio do qual as noções de vulnerabilidade são construídas, por levarem em conta que “[...] isso afeta nossos entendimentos e nossas representações das crianças e das infâncias.” (JAMES; JAMES, 2014JAMES, A.; JAMES, A. Key concepts in childhood studies. London: Sage, 2014., p. 133, tradução nossa).

Considerações finais

O modo como uma sociedade entende o que é a infância e o que é ser criança determina as possibilidades e os constrangimentos a que os indivíduos em seus primeiros anos de vida estarão expostos. Logo, suas representações — carregadas de coerência simbólica — são objetos profícuos para a compreensão dos diferentes mecanismos por meio dos quais as infâncias são socialmente construídas (TOMAZ, 2022______. Olha quem está falando! Tensões entre visibilidade e audibilidade no protagonismo infantil digital. Famecos, aceito em 2022, no prelo.). Neste trabalho, as representações dos youtubers mirins na mídia noticiosa on-line foram tomadas como objeto empírico com o objetivo de entender como a visibilidade dessas crianças se manifesta para além dos canais onde é comumente celebrada.

O estudo dessas representações, com base no conteúdo noticioso sobre esse fenômeno, consistiu na análise de 43 notícias — oriundas de um alerta do Google, entre 2017 e 2019, e organizadas da perspectiva da criança como objeto de proteção. Orientada pela compreensão da notícia como produto cultural (MOTTA, 2002MOTTA, L. G. Para uma antropologia da notícia. Intercom, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 11-41, 2002. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/418>. Acesso em: 25 nov. 2022.
https://revistas.intercom.org.br/index.p...
; PONTE, 2004PONTE, C. Leituras das notícias: contributos para uma análise do discurso jornalístico. Lisboa: Livros Horizonte, 2004.; SILVA, 2005SILVA, G. Para pensar critérios de noticiabilidade. Estudos em jornalismo e mídia, v. 2, n. 1, p. 95-107, 2005. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/jornalismo/article/view/2091>. Acesso em: 25 nov. 2022.
https://periodicos.ufsc.br/index.php/jor...
) e da visibilidade infantil como imagem social das crianças (JAMES, JENKS, PROUT, 1998JAMES, A.; JENKS, C.; PROUT, A. Theorizing Childhood. Cambridge: Polity, 1998.; SARMENTO, 2007SARMENTO, M. J. Visibilidade social e estudo da infância. In: VASCONCELLOS, V.; SARMENTO, M. J. (orgs.). Infância invisível. Araraquara, SP: Junqueira & Marin Editores, 2007. p. 25-49.), a metodologia do trabalho se valeu dos princípios da análise de conteúdo (MORAES, 1999MORAES, R. Análise de conteúdo. Revista Educação, v. 22, n. 37, p. 7-32, 1999. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4125089/mod_resource/content/1/Roque-Moraes_Analise%20de%20conteudo-1999.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2022.
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.p...
). A análise culminou em um esforço interpretativo dos sentidos provenientes de fragmentos informativos dispersos (MOTTA, 2002MOTTA, L. G. Para uma antropologia da notícia. Intercom, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 11-41, 2002. Disponível em: <https://revistas.intercom.org.br/index.php/revistaintercom/article/view/418>. Acesso em: 25 nov. 2022.
https://revistas.intercom.org.br/index.p...
; MOTA, COSTA, LIMA, 2004), o que permitiu a construção narrativa de uma infância vulnerável, mas agente, no âmbito das sociabilidades digitais.

Neste trabalho, a visibilidade, comumente materializada em altos números de seguidores e de visualização de canais infantis do YouTube, apareceu com novos contornos — notadamente de vulnerabilidade. Ao priorizar a imagem da criança vulnerável em detrimento da famosa, o conteúdo noticioso analisado dá pistas de que os processos comunicacionais diversos são capazes de reconfigurar visibilidades, fazendo-as comunicar, por exemplo, fragilidade, em vez de empoderamento. Este é um achado por meio do qual é possível dar continuidade à pesquisa que originou o artigo.

A investigação também revelou que nomear as vulnerabilidades das crianças protagonistas de vídeos no YouTube não significa, necessariamente, esvaziá-las de agência, mas identificar os constrangimentos a que estão sujeitas, como indivíduos em situação geracional peculiar. Não se trata, portanto, de negar a participação das crianças na internet, mas de reconhecer as contradições que surgem das interações travadas por elas. A realidade dos riscos e das oportunidades, da proteção e da participação, da vulnerabilidade e da agência, desse modo, não precisa ser pensada em termos de oposição, uma vez que investigá-las na perspectiva de sua coexistência e de sua inter-relação complexifica o debate em vez de simplificar a questão em dicotomias.

Considerando que as vulnerabilidades não são naturais ou inerentes, mas produzidas em dinâmicas contextuais (JAMES; JAMES, 2014JAMES, A.; JAMES, A. Key concepts in childhood studies. London: Sage, 2014.), o trabalho aponta para outro aspecto a ser desenvolvido pela pesquisa: o alto grau de penetração da lógica comercial em conteúdos infantis do YouTube fomenta a vulnerabilidade de crianças usuárias desse ambiente. Disfarçada de conteúdo de entretenimento (MONTEIRO, 2020MONTEIRO, M. C. Crianças e consumo digital: a publicidade de experiência na era dos youtubers. Curitiba: Appris, 2020.), a comunicação mercadológica dribla possíveis resistências ao seu estabelecimento — incluindo mecanismos legais — e penetra com crescente facilidade no cotidiano das crianças que consomem e produzem no YouTube.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Jul 2022
  • Aceito
    04 Nov 2022
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