Acessibilidade / Reportar erro

Modelos de desenvolvimento da inovação em pequenas e médias empresas do setor aeronáutico no Brasil e no Canadá

Resumo

O presente trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa cujo objetivo foi gerar conhecimentos mais detalhados sobre como ocorre o processo de desenvolvimento da inovação em pequenas e médias empresas (PME) do setor aeronáutico. Utilizam-se como base conceitual cinco modelos de inovação tecnológica oferecidos pela literatura: linear, linear reverso, coupling, de interações em cadeia e sistêmico. Os dados foram coletados em duas empresas brasileiras, subcontratadas de uma grande empresa brasileira do mesmo setor, e duas empresas canadenses, também subcontratadas de uma empresa de grande porte do setor, mas do Canadá. A abordagem metodológica utilizada foi a do estudo qualitativo de casos múltiplos. Os dados foram coletados com entrevistas semiestruturadas em profundidade e analisados com auxílio do software Atlas-ti em análises qualitativas dos tipos intracaso e intercaso. Elas focaram a comparação dos dados na busca de similaridades e diferenças reveladoras dos resultados válidos para o conjunto dos casos. Tais resultados são sintetizados em um modelo integrador explicativo do processo de inovação dos casos. O modelo compõe-se de cinco fases que consideram as necessidades dos clientes e a colaboração de fontes de informação vinculadas a universidades e a outras empresas da cadeia produtiva do setor aeronáutico.

Palavras-chave:
Inovação; Tecnologia; Modelo; Pequenas e Médias Empresas (PME); Setor aeronáutico

Abstract

This paper presents the results of an investigation that aimed to generate detailed knowledge on the process of innovation development in small and medium-sized enterprises (SMEs) of the aeronautical sector. As a theoretical foundation, five models of technological innovation were took: linear, reverse linear, coupling, interaction chain and systemic. Data were collected in two large Brazilian enterprises subcontracted by a larger Brazilian enterprise of the same sector, and two Canadian enterprises also subcontracted of a larger Canadian enterprise. The methodological approach was qualitative research of multiple cases. Data collected by semi-structured interviews were analyzed with Atlas-ti software in quantitative analysis of within case and cross case that focused the comparison of data in the search for similarities and differences which reveal valid results for the set of cases. These results are synthetized in an integrator model of the innovation that explains the process of the cases. This model has five phases that consider the client´s needs and the cooperation of sources of information associated to universities and other enterprises of the productive chain of the aeronautical sector.

Keywords:
Innovation; Technology; Model; Small and Medium-sized Enterprises (SMEs); Aeronautical sector

1 Introdução

Os processos de inovação são fundamentais para dar força competitiva às empresas. As inovações frequentemente são motivadas por intenções empreendedoras visando atender novas demandas de mercado, agregar valor a bens e serviços já oferecidos ao mercado ou oferecer novos ao mercado. Desse modo, tais processos refletem competências organizacionais que renovam o vigor competitivo e contribuem para a longevidade da empresa ( Freeman & Soete, 1997 Freeman, C., & Soete, L. (1997). The economics of industrial innovation (3rd ed.). Cambridge: The MIT Press. ; Leiponen & Helfat, 2010 Leiponen, A., & Helfat, C. E. (2010). Innovation, objectives, knowledge sources and benefits of breadth. Strategic Management Journal, 31(2), 224-236. http://dx.doi.org/10.1002/smj.807.
http://dx.doi.org/10.1002/smj.807 ...
).

Para que a inovação ocorra e gere seus frutos de modo otimizado em uma empresa, é necessário que se desenvolvam sistemas de gestão e de exploração do conhecimento das pessoas que lhe dão origem para que este seja adequadamente aplicado ao uso dos recursos organizacionais e assim viabilize o aperfeiçoamento de produtos e processos já oferecidos ao mercado ou, até mesmo, o surgimento de novos ( Leiponen & Helfat, 2010 Leiponen, A., & Helfat, C. E. (2010). Innovation, objectives, knowledge sources and benefits of breadth. Strategic Management Journal, 31(2), 224-236. http://dx.doi.org/10.1002/smj.807.
http://dx.doi.org/10.1002/smj.807 ...
; Musiolik et al., 2012 Musiolik, J., Markard, J., & Hekkert, M. (2012). Networks and Network Resources in Technological Innovation Systems: towards a conceptual framework for system building. Technological Forecasting and Social Change, 79(6), 1032-1048. http://dx.doi.org/10.1016/j.techfore.2012.01.003.
http://dx.doi.org/10.1016/j.techfore.20...
).

Para explicar a ocorrência da inovação, alguns autores desenvolveram modelos compostos de diferentes fases em que o conhecimento é gerido ( Barbieri, 2003 Barbieri, J. C. (2003). Organizações inovadoras: estudos e casos brasileiros. Rio de Janeiro: Editora FGV. ; Kline, 1978 Kline, S. J. (1978). Innovation is not a linear process. Research Management , 4(28), 36-45. ; Viotti & Macedo, 2003 Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Campinas: Editora Unicamp. ). Uma das vantagens de trabalhar com os modelos é a possibilidade de entendimento detalhado das origens do conhecimento utilizado como base para a inovação, tais como a pesquisa aplicada, a pesquisa científica e as necessidades do mercado ( Viotti & Macedo, 2003 Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Campinas: Editora Unicamp. ; Lobosco et al., 2011 Lobosco, A., Moraes, M. B., & Maccari, E. A. (2011). Inovação: uma análise do papel da Agência USP de Inovação na geração de propriedade intelectual e nos depósitos de patentes da Universidade de São Paulo. Revista de Administração da UFSM, 3(4), 406-424. ).

Os processos de desenvolvimento da inovação podem variar de empresa para empresa, sendo influenciados, entre outras coisas, pelo setor de atuação e pelo porte da empresa ( Conde & Araújo-Jorge, 2003 Conde, M. V. F., & Araújo-Jorge, T. C. (2003). Modelos e concepções de inovação: a transição de paradigmas, a reforma da C&T brasileira e as concepções de gestores de uma instituição pública de pesquisa em saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 8(3), 727-741. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232003000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-8123200...
). É em relação a esses fatores contingenciais que se define o foco de interesse do estudo aqui apresentado, que vem a ser as particularidades do processo de inovação em pequenas e médias empresas (PMEs) do setor aeronáutico. As PMEs apresentam uma estrutura mais enxuta e mais maleável quando comparadas a empresas de grande porte, podendo assim ser consideradas mais orgânicas do que mecânicas quanto a sua estrutura ( Mintzberg, 1989 Mintzberg, H. (1989). Mintzberg on management: inside our strange world of organizations . New York: The Free Press. ).

Dentre as diversas classificações de PMEs existentes, há as chamadas pequenas e médias empresas de base tecnológica (PMEBTs), as quais se servem de mão de obra altamente qualificada e poucos níveis hierárquicos, poucos departamentos (quando há algum) e proximidade com os clientes. Isso quer dizer que, em termos de processo de desenvolvimento da inovação e em comparação com empresas maiores, apresentam um potencial de gestão mais rápida do conhecimento para que sejam criados novos produtos e processos produtivos.

Adicionalmente, quanto ao setor aeronáutico, que é de interesse mais direto no estudo aqui apresentado, ele conta com particularidades, como apresentar com mais frequência redes de cooperação interorganizacional, utilizar intensamente o conhecimento desenvolvido em universidades, sofrer forte influência de órgãos governamentais de fomento à tecnologia e apresentar comumente proximidade física, no entorno de um grande cliente, entre grande parte das empresas que integram a mesma cadeia produtiva, além de ser, em termos econômicos, um setor de destaque para a geração de riqueza no país em que se encontra.

A revisão de literatura que sustenta o presente trabalho não nos permitiu identificar pesquisas que explicam o processo de desenvolvimento da inovação especificamente das PMEBTs do setor aeronáutico. Dada a importância do tema e a aparente ausência do seu tratamento na literatura, o presente trabalho se justifica por seu potencial de geração de novos conhecimentos relevantes com a busca de respostas para a seguinte pergunta de pesquisa: Como ocorre o processo de desenvolvimento da inovação em PMEs do setor aeronáutico? Cinco modelos de inovação tecnológica disponíveis na literatura foram explorados para facilitar o desenvolvimento da resposta para essa pergunta. Eles são apresentados a seguir.

2 Referencial teórico

2.1 Teorias e modelos sobre o processo de desenvolvimento da inovação

O ambiente competitivo que caracteriza o entorno da gestão dos negócios vem obrigando as empresas, tanto de grande quanto de médio e pequeno portes, a competirem com base nos processos inovativos ( Rodrigues et al., 2011 Rodrigues, L. C., Heringer, B. H. F., & França, A. L. (2011). Padrões de inovação em multinacional de base tecnológica. Revista Inteligência Competitiva, 1(2), 198-204. ). Vem também obrigando as instituições de ensino superior a aperfeiçoarem a educação favorável à inovação, como aquela relacionada ao empreendedorismo e à gestão de pequenas empresas – aperfeiçoamento que enfrenta sérios desafios no Brasil ( Lima et al., 2015 Lima, E., Lopes, R. M., Nassif, V., & Silva, D. (2015). Opportunities to improve entrepreneurship education: contributions considering brazilian challenges. Journal of Small Business Management, 53(4), 1033-1051. http://dx.doi.org/10.1111/jsbm.12110.
http://dx.doi.org/10.1111/jsbm.12110 ...
). Em todos os setores da economia, o princípio da inovação vem orientando os esforços das estratégias pelo domínio de seus modelos de inovação ( Anderson & Tushman, 1990 Anderson, P., & Tushman, M. L. (1990). Technological descontinuities and dominant designs: a cyclical model of technological design. Administrative Science Quarterly , 35(4), 604-633. http://dx.doi.org/10.2307/2393511.
http://dx.doi.org/10.2307/2393511 ...
). Desse modo, a consciência de que a inovação é essencial para qualquer organização moderna parece não ser novidade para a maioria dos dirigentes de grandes, médias e pequenas empresas. Porém, o que não é consenso é qual seria o melhor caminho para se adquirir e se associar a inovação ao modelo de gestão de negócios, fazendo com que este seja mais lucrativo.

Dado este contexto, Longanezi et al. (2008) Longanezi, T., Coutinho, P., & Bomtempo, J. V. M. (2008). Um modelo referencial para a prática da inovação. Journal of Technology Management & Innovation, 3(1), 74-83. elencam três aspectos que devem ser levados em consideração na implementação de um processo de desenvolvimento da inovação: (i) adoção de um modelo referencial capaz de representar o processo na maior abrangência possível; (ii) utilização de técnicas de gestão de processos que integrem as diferentes áreas e estágios necessários no processo; e (iii) desenvolvimento de ferramentas específicas para dar suporte às decisões dos gestores.

No entanto, Moreira & Queiroz (2007) Moreira, D. A., & Queiroz, A. C. S. (Eds.). (2007). Inovação organizacional e tecnológica. São Paulo: Thomson Learning. e Rodrigues et al. (2011) Rodrigues, L. C., Heringer, B. H. F., & França, A. L. (2011). Padrões de inovação em multinacional de base tecnológica. Revista Inteligência Competitiva, 1(2), 198-204. apontam a dificuldade de organizar o processo de desenvolvimento da inovação. Os autores explicam que a dificuldade reside na inexistência de um esquema classificatório que consiga reunir todos os tipos de inovação em face das variações, em natureza e processos inovativos. Os autores destacam que é difícil fazer um mapeamento mental do processo, quer pela falta de consenso sobre as variáveis mais importantes que possam ser relacionadas à inovação, quer pela inconsistência das estratégias de pesquisa da inovação que se aplicam indistintamente ao objeto de estudo que é a inovação.

Várias teorias foram desenvolvidas a fim de analisar e compreender a natureza da inovação e como ela ocorre, evitando-se tais dificuldades. De modo geral, cada uma delas está associada à corrente de pensamento que era predominante quando foi desenvolvida ( Galanakis, 2006 Galanakis, K. (2006). Innovation process: make sense using systems thinking. Technovation , 26(11), 1222-1232. http://dx.doi.org/10.1016/j.technovation.2005.07.002.
http://dx.doi.org/10.1016/j.technovatio...
; Ortt & Van Der Duin, 2008 Ortt, J. R., & Van Der Duin, P. A. (2008). The evolution of innovation management towards contextual innovation. European Journal of Innovation Management, 11(4), 522-538. http://dx.doi.org/10.1108/14601060810911147.
http://dx.doi.org/10.1108/1460106081091...
). Rothwell (1994) Rothwell, R. (1994). Towards the fifth-generation innovation process. International Marketing Review, 11(1), 7-31. http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491.
http://dx.doi.org/10.1108/0265133941005...
sintetizou as correntes em cinco modelos sobre como ocorre o processo de desenvolvimento da inovação:

  1. 1

    Modelo linear (também chamado de technology push e de science pushprimeira geração ): foi dominante na década de 1950 até metade da década de 1960. Considera a inovação como um processo linear simples, no qual os avanços científicos e tecnológicos empurram um produto novo ao mercado. Essa teoria concentra-se em descobertas científicas. De acordo com Viotti & Macedo (2003) Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Campinas: Editora Unicamp. e Nobelius (2004) Nobelius, D. (2004). Towards the sixth generation of R&D management. International Journal of Project Management, 22(5), 369-375. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijproman.2003.10.002.
    http://dx.doi.org/10.1016/j.ijproman.20...
    , o modelo descreve que há investimento em ciência que gera um estoque de conhecimento científico no país, estoque que é então utilizado pelas empresas na inovação, que leva ao desenvolvimento econômico-social, conforme apresenta a Figura 1 ;

    Figura 1
    Modelo Linear de Inovação (Technology Push ou Science Push). Fonte: Adaptado de Rothwell (1994) Rothwell, R. (1994). Towards the fifth-generation innovation process. International Marketing Review, 11(1), 7-31. http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491.
    http://dx.doi.org/10.1108/0265133941005...
    e Viotti & Macedo (2003) Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Campinas: Editora Unicamp. .

  2. 2

    Modelo linear reverso (também conhecido como market pull ou demand pullsegunda geração ): foi dominante entre meados da década de 1960 e início da década de 1970; também representa um processo linear, no qual a inovação é estimulada pelas necessidades do mercado ou por problemas operacionais das empresas ( Rothwell, 1994 Rothwell, R. (1994). Towards the fifth-generation innovation process. International Marketing Review, 11(1), 7-31. http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491.
    http://dx.doi.org/10.1108/0265133941005...
    ; Barbieri, 2003 Barbieri, J. C. (2003). Organizações inovadoras: estudos e casos brasileiros. Rio de Janeiro: Editora FGV. ), mostrando que a busca dos conhecimentos necessários ao processo de inovação não é obrigatoriamente provocada pelo interesse na pesquisa científica nem apenas em processos internos às empresas que a realizam, conforme é ilustrado na Figura 2 ;

    Figura 2
    Modelo Linear Reverso (Market Pull ou Demand Pull ). Fonte: Adaptado de Rothwell (1994) Rothwell, R. (1994). Towards the fifth-generation innovation process. International Marketing Review, 11(1), 7-31. http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491.
    http://dx.doi.org/10.1108/0265133941005...
    e Barbieri (2003) Barbieri, J. C. (2003). Organizações inovadoras: estudos e casos brasileiros. Rio de Janeiro: Editora FGV. .

  3. 3

    Modelo coupling de inovação ( terceira geração): foi dominante entre as décadas de 1970 e início de 1980 e reconheceu que os modelos push e pull, combinados, se aproximam mais da realidade ( Cooper, 1994 Cooper, R. G. (1994). Perspective third-generation new product processes. Journal of Product Innovation Management, 11(1), 3-14. http://dx.doi.org/10.1016/0737-6782(94)90115-5.
    http://dx.doi.org/10.1016/0737-6782(94)...
    ; Rothwell, 1994 Rothwell, R. (1994). Towards the fifth-generation innovation process. International Marketing Review, 11(1), 7-31. http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491.
    http://dx.doi.org/10.1108/0265133941005...
    ). Esse novo modelo é uma combinação entre os dois anteriores, mostrando uma forte ligação das áreas de marketing e de P&D, conforme apresentado na Figura 3 . O processo de inovação se apresenta como sequencial, mas não necessariamente contínuo. Ele pode ser dividido em uma série de etapas interdependentes e retornos para a fase anterior. As ligações intraorganizacionais e as influências externas criam uma complexa rede, interligando as diferentes funções da empresa, a comunidade científica e tecnológica e o mercado;

    Figura 3
    Modelo Coupling do Processo de Inovação. Fonte: Adaptado de Rothwell (1994) Rothwell, R. (1994). Towards the fifth-generation innovation process. International Marketing Review, 11(1), 7-31. http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491.
    http://dx.doi.org/10.1108/0265133941005...
    .

  4. 4

    Modelo de interações em cadeia (quarta geração ): foi dominante no início da década de 1980 e meados de 1990 e desenvolvido por Kline (1978) Kline, S. J. (1978). Innovation is not a linear process. Research Management , 4(28), 36-45. . Stal (2007) Stal, E. (2007). Inovação tecnológica, sistemas nacionais de inovação e estímulos governamentais à inovação. In D. A. Moreira & A. C. S. Queiroz (Eds.), Inovação organizacional e tecnológica . São Paulo: Thomson Learning. argumenta que os modelos anteriores apresentam uma falha justamente por sua concepção linear e, portanto, são insuficientes para explicar o que efetivamente ocorre no interior das organizações. A falha foi suprida por esse modelo de interações em cadeia, pois nele são enfatizadas as interações entre as diferentes fases do processo, especialmente na cadeia central de inovação. Conforme a Figura 4 , as flechas no interior da cadeia central ilustram a trajetória típica do modelo linear, todavia, nesse modelo elas são acrescidas das flechas significando que essas etapas não possuem limites rígidos, havendo permeabilidade entre elas;

    Figura 4
    Modelo de Interações em cadeia. Fonte: Adaptado de Kline (1978) Kline, S. J. (1978). Innovation is not a linear process. Research Management , 4(28), 36-45. .

  5. 5

    Modelo sistêmico de inovação (quinta geração): conhecido também como modelo do processo de integração de sistemas. Desenvolvido pela Organisation for Economic Co-operation and Development ( OECD, 1999 Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD. (1999). Managing national innovation systems. Paris: OCDE. ) em meados da década de 1990, é dominante até os dias de hoje. É baseado no processo da quarta geração, porém destaca a necessidade de mudança contínua. Mostra que as empresas não inovam sozinhas ( OECD, 1999 Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD. (1999). Managing national innovation systems. Paris: OCDE. ), mas, em geral, no âmbito de um sistema de redes de relação com outras empresas, aproveitando as infraestruturas de pesquisa pública e privada que existirem (universidades e institutos de pesquisa), sob influência das economias nacional e internacional e do sistema normativo ( Viotti & Macedo, 2003 Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Campinas: Editora Unicamp. ). Essas inter-relações são ilustradas na Figura 5 .

    Figura 5
    Modelo Sistêmico de Inovação. Fonte: Adaptado de OECD (1999) Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD. (1999). Managing national innovation systems. Paris: OCDE. e Viotti & Macedo (2003) Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Campinas: Editora Unicamp. .

A partir do modelo sistêmico de inovação descrito acima, consideram-se as universidades como um dos pilares do processo inovativo, o que corrobora a concepção da hélice tríplice. Como o conhecimento é cada vez mais um insumo importantíssimo para o desenvolvimento socioeconômico, é natural que as universidades, enquanto espaços institucionais de geração e de transmissão de conhecimento, sejam entendidas como agentes sociais de destaque ( Lobosco et al., 2011 Lobosco, A., Moraes, M. B., & Maccari, E. A. (2011). Inovação: uma análise do papel da Agência USP de Inovação na geração de propriedade intelectual e nos depósitos de patentes da Universidade de São Paulo. Revista de Administração da UFSM, 3(4), 406-424. ).

As cinco gerações de representação do processo de inovação indicam que a perspectiva inovativa atrelada à pesquisa e desenvolvimento (P&D) está se alterando e adaptando ao contexto das grandes mudanças organizacionais ( Nobelius, 2004 Nobelius, D. (2004). Towards the sixth generation of R&D management. International Journal of Project Management, 22(5), 369-375. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijproman.2003.10.002.
http://dx.doi.org/10.1016/j.ijproman.20...
).

2.2 Pequenas e médias empresas dos setores aeronáuticos brasileiro e canadense

Atualmente, o setor aeronáutico é um dos maiores e mais inovadores setores da Região Metropolitana do Vale do Paraíba Paulista e Litoral Norte (RMVALE), Brasil, e da Região Metropolitana de Montreal, Canadá. No ambiente internacional, essas duas regiões são consideradas as mais importantes do mundo nesse setor, assim como Wichita, nos Estados Unidos, e Toulouse, na França.

Como contribuintes para a força econômica dessa indústria têm-se as PMEs. Essas empresas têm uma grande concentração em uma mesma localidade, desempenhando um importante papel no desenvolvimento econômico e social da região em que se encontram e também de seu país, gerando inovações em produtos de alto valor agregado, além de gerar empregos qualificados e estimular o processo de desenvolvimento de C&T. Uma característica importante das PMEs do setor aeronáutico é que elas são bastante sensíveis ao ambiente macroeconômico e ao desempenho comercial da empresa-âncora, como a Embraer, no caso brasileiro, e a Bombardier, no caso canadense.

O relatório anual apresentado pela Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil ( AIAB, 2013 Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil – AIAB. (2013). Números da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil. São José dos Campos: AIAB. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiab.org.br/portugues/index.php?option=com_content&task=view&id=13&Itemid=26
http://www.aiab.org.br/portugues/index....
) e pela Associação das Indústrias Aeroespaciais do Canadá (Association des Industries Aérospatiales du CanadáAIAC, 2013 Association des Industries Aérospatiales du Canadá – AIAC. (2013). Le Rapport: l’état de l’industrie aérospatiale canadienne. Canada: AIAC. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canadas_Aerospace_Industry/Industry_Statistics/StateOfCdnAeroIndustry2013_FINAL_FR.pdf
http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canada...
) mostrou que o crescimento das PMEs do setor aeronáutico está diretamente relacionado à infraestrutura econômica da região, ao fácil acesso ao capital de risco, tanto privado quanto público, e ao apoio governamental nas três esferas do poder. Atualmente, no Brasil, principalmente nas cidades de São José dos Campos, Taubaté e Caçapava, todas situadas no Estado de São Paulo, há cerca de 330 PMEs do setor aeronáutico, e aproximadamente 75 são subcontratadas da Embraer. Já no Canadá, há aproximadamente 400 PMEs do setor aeronáutico e cerca de 250 são subcontratadas da Bombardier, localizadas principalmente nas cidades de Montreal, Mirabel, Laval e Longueuil ( AIAB, 2013 Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil – AIAB. (2013). Números da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil. São José dos Campos: AIAB. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiab.org.br/portugues/index.php?option=com_content&task=view&id=13&Itemid=26
http://www.aiab.org.br/portugues/index....
; AIAC, 2013 Association des Industries Aérospatiales du Canadá – AIAC. (2013). Le Rapport: l’état de l’industrie aérospatiale canadienne. Canada: AIAC. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canadas_Aerospace_Industry/Industry_Statistics/StateOfCdnAeroIndustry2013_FINAL_FR.pdf
http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canada...
).

Tais PMEs apresentam um faturamento individual mensal entre 500 mil e 3 milhões de dólares americanos e empregam, em média, 13.800 e 23.650 profissionais no Brasil e no Canadá respectivamente. A participação no PIB das PMEs do setor aeronáutico na RMVALE e na Região Metropolitana de Montreal é representativa, já que são responsáveis por 35% e 47% do PIB das regiões respectivamente ( AIAB, 2013 Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil – AIAB. (2013). Números da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil. São José dos Campos: AIAB. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiab.org.br/portugues/index.php?option=com_content&task=view&id=13&Itemid=26
http://www.aiab.org.br/portugues/index....
; AIAC, 2013 Association des Industries Aérospatiales du Canadá – AIAC. (2013). Le Rapport: l’état de l’industrie aérospatiale canadienne. Canada: AIAC. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canadas_Aerospace_Industry/Industry_Statistics/StateOfCdnAeroIndustry2013_FINAL_FR.pdf
http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canada...
).

As PMEs subcontratadas de ambas as grandes empresas de cada país estão organizadas em três níveis: a) inteligência, b) especialidade, e c) capacidade. As PMEs subcontratadas de inteligência são organizações nas quais as atividades são complexas, os produtos têm um alto valor agregado, os recursos focam atividades estratégicas, e estão diretamente ligadas à empresa contratante. É importante ressaltar que as PMEs são consideradas parceiras estratégicas do seu principal cliente, e a prestação de serviço oferecida por elas (P&D, design, projeto e fabricação) é integrada à subcontratante. Em razão dessas características, há evidências de que as PMEs subcontratadas de inteligência apresentam um grau elevado de dependência econômica em relação ao seu principal cliente. Essa dependência restringe suas ações estratégicas e empreendedoras.

Já as PMEs subcontratadas de especialidade são organizações nas quais as atividades organizacionais são consideradas de apoio ao sistema produtivo da empresa contratante. Apresentam uma expertise técnica elevada, seus produtos têm alto valor agregado e são consideradas parceiras táticas da contratante principal. As PMEs subcontratadas de capacidade, por sua vez, são organizações cujas atividades não estão diretamente vinculadas ao sistema produtivo da empresa contratante, seus produtos têm um baixo valor agregado e sua relação com o seu cliente principal é de curto prazo.

Para melhor compreensão, pode-se dizer que a relação de subcontratação é como uma relação industrial cliente-fornecedor, na qual o cliente é o contratante principal que estabelece as especificações técnicas e procedimentos de recepção do produto feito pelo fornecedor ( Billaudot & Julien, 2003 Billaudot, B., & Julien, P. A. (2003). Organisation Industrielle et sous-traitance: du fordisme à l’entreprise-réseau. In P. A. Julien, L. Raymond, R. Jacob & G. Abdul-Nour (Eds.), L’entreprise-réseau: dix ans d’expérience de la Chaire Bombardier Produits Récrèatifs (pp. 47-95). Québec: Presses de l'Université du Québec. ).

O grande valor desse segmento de empresas não diz respeito apenas ao número total de estabelecimentos que inclui. O setor aeronáutico oferece outras contribuições, pois desempenha uma importante função socioeconômica por absorver mão de obra qualificada, gerando empregos e renda, apresenta demanda que impulsiona o desenvolvimento e o aprendizado de tecnologia avançada em instituições de ensino, desenvolve tecnologia e inovações que atendem relevantes necessidades no mercado, cria polos ou arranjos produtivos locais que favorecem a economia regional, auxilia na formação de uma classe regional de empreendedores e estabelece relações de proximidade entre empresas e seus proprietários-dirigentes e empregados. A proximidade física, além de reduzir os custos de coordenação, facilita a interação entre os atores e, por essa via, favorece a aprendizagem e o compartilhamento do conhecimento e valores propícios à excelência em suas atividades. Isso se vê comumente em aglomerados regionais de empresas tecnológicas, como ocorre com produtoras de software na região de Blumenau – SC ( Lima, 2005 Lima, E. (2005). Microdinâmicas da difusão de inovações entre micro, pequenas e médias empresas. In P. P. H. Wilhelm & M. Amal (Eds.), Arranjos produtivos locais: estratégias de cooperação e desenvolvimento (pp. 83-120). Blumenau: Nova Letra. Recuperado em 2 de maio de 2017, de https://www.researchgate.net/profile/Edmilson_Lima2/publications
https://www.researchgate.net/profile/Ed...
).

3 Métodos

No intuito de elaborar um estudo robusto, utilizou-se a metodologia de estudo de casos múltiplos segundo as recomendações de Eisenhardt (1989) Eisenhardt, K. M. (1989). Building theories from case study research. Academy of Management Review, 14(4), 532-550. http://dx.doi.org/10.5465/amr.1989.4308385.
http://dx.doi.org/10.5465/amr.1989.4308...
. O estudo abordou a realidade de quatro PMEBTs do setor aeronáutico, sendo duas brasileiras e duas canadenses, e descreveu os modelos de processo de desenvolvimento da inovação utilizados por elas. A escolha dos casos é um aspecto muito importante, porque define as características do desenho da pesquisa; uma amostra apropriada possibilita controlar as variações externas e definir os limites de consideração dos resultados para outros contextos ( Eisenhardt, 1989 Eisenhardt, K. M. (1989). Building theories from case study research. Academy of Management Review, 14(4), 532-550. http://dx.doi.org/10.5465/amr.1989.4308385.
http://dx.doi.org/10.5465/amr.1989.4308...
).

A amostra de PMEs estudadas é apresentada no Quadro 1 . Os casos foram escolhidos intencionalmente, com base nas contribuições que eles poderiam fornecer ao estudo. A amostra caracterizou-se como teórica e intencional. Para a seleção da amostra, cada empresa participante tinha, entre as características básicas, os seguintes traços:

Quadro 1
Composição da Amostra de PMEs estudadas.
  • Natureza: empresas de base tecnológica, subcontratadas de uma empresa de grande porte que desenvolve projetos de aeronaves regionais;

  • Porte: pequeno (20 a 99 empregados) e médio (100 a 499);

  • Localização: RMVALE e Região Metropolitana de Montreal;

  • Trajetória dos Negócios: setor aeronáutico; e

  • Tempo de Constituição: com mais de 5 anos de funcionamento.

O procedimento de coleta de dados da pesquisa baseou-se principalmente em entrevistas semiestruturadas e em profundidade com os proprietários-dirigentes e diretores das PMEBTs do setor aeronáutico, com duração de aproximadamente 2h40min, e foram gravadas, evitando a perda de informações. Essa técnica qualitativa ajudou a obter e a explorar dados em profundidade e a considerar as percepções e experiências dos entrevistados. Os dados coletados nas entrevistas foram triangulados com dados secundários extraídos de relatórios das empresas participantes e da AIAB e AIAC.

Os dados coletados foram analisados em duas etapas: análise intracaso e análise intercaso. A análise intracaso é aquela que descreve, compreende e explica o que acontece em um contexto único e limitado, ou seja, em um único caso ( Miles & Huberman, 1994 Miles, B. M., & Huberman, A. M. (1994). Qualitative data analysis: an expanded sourcebook (2nd ed.). Thousand Oaks: Sage. ). Para Lima (2010) Lima, E. (2010). Teorizando a partir de dados qualitativos em Administração. Pretexto, 1(11), 73-93. , essa forma de análise tem por objetivo colocar em destaque os conteúdos conceituais que se mostram mais importantes para descrever e explicar um determinado fenômeno, tornando-se cada caso da amostra separadamente. Por outro lado, a análise intercaso tem por objetivo descrever, compreender, explicar e cruzar os conteúdos conceituais, os processos e os resultados de um determinado fenômeno em um contexto de múltiplos casos e, assim, desenvolver uma compreensão mais detalhadas de todos os casos da amostra ( Miles & Huberman, 1994 Miles, B. M., & Huberman, A. M. (1994). Qualitative data analysis: an expanded sourcebook (2nd ed.). Thousand Oaks: Sage. ).

Os dados obtidos nas entrevistadas foram analisados e estudados utilizando o software Atlas-ti. Essa ferramenta facilita a organização, a codificação e a classificação dos dados qualitativos ( Bandeira-de-Mello, 2006 Bandeira-de-Mello, R. (2006). Softwares em pesquisa qualitativa. In C. K. Godoi, R. Bandeira-De-Mello & A. B. Silva (Eds.). Pesquisa qualitativa em estudos organizacionais: paradigmas, estratégias e métodos (pp. 429-460). São Paulo: Saraiva. ; Lima, 2010 Lima, E. (2010). Teorizando a partir de dados qualitativos em Administração. Pretexto, 1(11), 73-93. ; Mühr, 1995 Mühr, T. (1995). Atlas/ti, release 1.1 E. In E. A. Weitzman & M. B. Miles (Eds.), Computer programs for qualitative data analysis (pp. 217-229). Thousand Oaks: Sage. ). O Atlas-ti é um software utilizado em pesquisas qualitativas para analisar dados atribuindo-se códigos a trechos de dados para efetuar comparações, buscando-se o entendimento e a explicação de um dado fenômeno ( Bandeira-de-Mello, 2006 Bandeira-de-Mello, R. (2006). Softwares em pesquisa qualitativa. In C. K. Godoi, R. Bandeira-De-Mello & A. B. Silva (Eds.). Pesquisa qualitativa em estudos organizacionais: paradigmas, estratégias e métodos (pp. 429-460). São Paulo: Saraiva. ; Lima, 2010 Lima, E. (2010). Teorizando a partir de dados qualitativos em Administração. Pretexto, 1(11), 73-93. ; Mühr, 1995 Mühr, T. (1995). Atlas/ti, release 1.1 E. In E. A. Weitzman & M. B. Miles (Eds.), Computer programs for qualitative data analysis (pp. 217-229). Thousand Oaks: Sage. ).

Na pesquisa aqui apresentada, para complementar a codificação dos dados necessária na identificação de similaridades e diferenças intra e intercaso das características do fenômeno estudado, fez-se uso de metamatrizes de cluster como modo de organização de resultados parciais ( Miles & Huberman, 1994 Miles, B. M., & Huberman, A. M. (1994). Qualitative data analysis: an expanded sourcebook (2nd ed.). Thousand Oaks: Sage. ). Esse procedimento foi uma fase determinante da análise, uma vez que permitiu a visualização simplificada e eficaz dos dados, ajudou a planejar outras fases da análise e facilitou a utilização direta das informações coletadas, aumentando a consistência dos resultados finais do estudo.

Metamatrizes de cluster são quadros que organizam uma série de acontecimentos ou eventos concretos, ordenados cronologicamente e classificados em categorias ou dimensões ( Miles & Huberman, 1994 Miles, B. M., & Huberman, A. M. (1994). Qualitative data analysis: an expanded sourcebook (2nd ed.). Thousand Oaks: Sage. ). Elas visam tornar inteligível em um mesmo espaço de visualização um conjunto de informações que, de outro modo, não se evidenciariam facilmente.

4 Análise intracaso dos dados

Esta seção apresenta a análise intracaso das quatro empresas estudadas. Aqui estão retratados os principais elementos que ajudaram a responder à pergunta de pesquisa, que tem como foco gerar novos conhecimentos sobre o processo de desenvolvimento da inovação em PMEs do setor aeronáutico.

4.1 Empresa empreendimentos aeronáuticos

Focada no fornecimento de soluções avançadas de design e engenharia para a indústria de aviação, a empresa foi fundada em 1998 na cidade de São José dos Campos – SP, Brasil. Sua criação foi motivada pela vontade do fundador em estruturar um negócio que pudesse executar projetos de engenharia e fabricar produtos aeronáuticos. Desse modo, ele concentrou seus esforços no desenvolvimento e na produção de trens de pouso, item de alto valor agregado das aeronaves.

Como fornecedor de soluções de trem de pouso, a PME é a principal subcontratada de inteligência para o trem de pouso da aeronave T-25 Tucano. Tem longa tradição em inovação, pois continua a expandir sua linha de produtos e serviços para atender à criação de novas soluções de aviação que utilizam as mais avançadas tecnologias e materiais. Tem um grupo diretivo e técnico de grande experiência. Alguns contam com mais de 25 anos de atuação na indústria aeronáutica, principalmente na Embraer, e já foram responsáveis pelo desenvolvimento de diversos e importantes projetos aeronáuticos.

A partir dos dados obtidos nas entrevistas, a Figura 6 apresenta o modelo de desenvolvimento da inovação da empresa Empreendimentos Aeronáuticos.

Figura 6
Modelo de Desenvolvimento da Inovação da Empreendimentos Aeronáutico. Fonte: Elaborado pelos autores do presente artigo.

A leitura da Figura 6 aponta duas fontes de informação que alimentam o processo de desenvolvimento da inovação no departamento de P&D. Elas são: (a) demanda do cliente: é a solicitação do cliente para o desenvolvimento de um novo produto com o objetivo de aumentar a produtividade e competitividade; e (b) pesquisa aplicada: inclui projetos de pesquisa que representam investigação direcionada para a descoberta de novos conhecimentos e que têm objetivos comerciais específicos com respeito a determinados produtos e processos.

O trecho de entrevista a seguir traz uma breve explicação da primeira parte do modelo de inovação da empresa Empreendimentos Aeronáuticos, apresentado na Figura 6:

Como 70% da nossa receita bruta vêm de um único cliente, muitas vezes nosso processo de desenvolvimento de uma determinada inovação inicia-se com a solicitação dele. Mas essa não é a nossa única forma de inovar. Como temos uma equipe de engenheiros aeronáuticos muito criativos, a criação de um novo produto surge também de pesquisas elaboradas por eles. É por meio da pesquisa aplicada que eles [os engenheiros] contribuem para a solução de problemas ou necessidades concretas e imediatas encontradas na realidade do nosso setor.

Na segunda parte do modelo de inovação, verifica-se que os novos conhecimentos científicos e tecnológicos, que são formados no departamento de P&D, nascem do relacionamento coordenado e dinâmico da empresa analisada com empresas da cadeia produtiva aeronáutica e entidades de pesquisa, desenvolvimento e inovação (P,D&I). A empresa mantém acordos de P&D com o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e com centros de pesquisa do Centro Técnico Aeroespacial (CTA).

Esses novos conhecimentos são transformados em um projeto analítico que abrange todas as etapas do processo de desenvolvimento da inovação. Depois, elaboram-se projetos mais detalhados que englobam o desenvolvimento experimental do produto, quando se iniciam os testes dos protótipos. Se estes forem aprovados, faz-se a produção do novo produto.

Os entrevistados ressaltam que a inovação é um fator central da empresa, e a tecnologia constitui uma das bases da gestão estratégica, orientando a questão fundamental de como estabelecer uma vantagem competitiva e como garantir a sobrevivência da empresa.

4.2 Empresa Aero Brasil

A empresa foi fundada em 2005 por dois ex-estudantes do ITA, com capital totalmente brasileiro. Focada no desenvolvimento de sistemas aeronáuticos, foi o primeiro empreendimento apoiado pela Incubadora de Negócios do Instituto Tecnológico de Aeronáutico (Incubaero).

Desde sua criação, atua no suporte ao desenvolvimento de sistemas robóticos em projetos da Embraer e do Ministério da Defesa Brasileiro e participou do Projeto dos Veículos Aéreos Não Tripulados (VANT), sob gerência do Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial (CTA). Atualmente, é uma empresa de pequeno porte subcontratada de especialidade de uma grande empresa do setor aeronáutico. Sabe-se que o desenvolvimento da inovação e seu processo são os principais objetivos da empresa Aero Brasil. Com base nos relatos dos entrevistados, foi elaborada a Figura 7 , que apresenta o modelo de desenvolvimento da inovação da empresa.

Figura 7
Modelo de Desenvolvimento da Inovação da Aero Brasil. Fonte: Elaborado pelos autores do presente artigo.

Conforme mostra a Figura 7 , o modelo de inovação da empresa Aero Brasil é linear. De acordo com Viotti & Macedo (2003) Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Campinas: Editora Unicamp. , esse tipo de modelo é o mais antigo dentre os modelos de inovação. Na concepção linear, a mudança técnica é compreendida como uma sequência de estágios em que novos conhecimentos advindos da pesquisa científica levam a processos de invenção a serem seguidos por atividades de pesquisa aplicada e desenvolvimento tecnológico, resultando, ao final da cadeia, na geração de novos produtos e processos comercializáveis ( Conde & Araújo-Jorge, 2003 Conde, M. V. F., & Araújo-Jorge, T. C. (2003). Modelos e concepções de inovação: a transição de paradigmas, a reforma da C&T brasileira e as concepções de gestores de uma instituição pública de pesquisa em saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 8(3), 727-741. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232003000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-8123200...
).

Conforme relatos dos entrevistados, a fonte de informação que alimenta o processo de desenvolvimento de inovação da empresa Aero Brasil é a pesquisa aplicada. Nessa etapa, no departamento de P&D, há um alto investimento intelectual e financeiro na geração de novas ideias – e isso pode levar a empresa a precisar de auxílio financeiro de outras organizações, como algum órgão público de financiamento ou investidor anjo ( Moraes et al., 2013 Moraes, M., Lobosco, A., & Lima, E. (2013). Expectations of FINEP and São Paulo Anjos Agents concerning the use of venture capital in technology-based small and medium enterprises. Journal of Technology Management & Innovation, 8, 92-104. ). O trecho da entrevista a seguir descreve essa etapa:

A principal fonte de cooperação que alimenta o nosso processo de desenvolvimento de inovação é a participação em grupos de pesquisa do ITA. Lá, nós conseguimos detectar quais são os estudos mais recentes na nossa área.

Após o desenvolvimento das ideias geradas na pesquisa, iniciam-se as fases mais complexas do processo de desenvolvimento da inovação, o desenvolvimento experimental e depois os testes dos protótipos, conforme explicam os entrevistados. Nessas duas etapas, a empresa depende de muitos recursos financeiros e, muitas vezes, a captação desses recursos é feita com a FINEP. Como mostra a Figura 7 , as etapas de P&D, desenvolvimento das ideias, desenvolvimento experimental e testes dos experimentos interagem entre si, constantemente, até a aprovação do protótipo.

Após a aprovação do protótipo, passa-se para a fase de produção e comercialização. Por último, vem a participação na feira de aviação, que ocorre todos os anos na França, e na Expo Aero Brasil, que acontece na cidade de São José dos Campos (SP), Brasil. Essas feiras são consideradas pelos proprietários-dirigentes como as melhores maneiras de captar novos clientes no setor aeronáutico.

Para os entrevistados, a inovação é a sustentação, o crescimento contínuo e a perenidade da Aero Brasil. A inovação é o que a mantém viva até os dias de hoje, é a base de sua visão estratégica.

4.3 Altitude Aerospace

A Altitude Aerospace é uma empresa canadense localizada em Montreal e foi fundada em 2005, movida pela vontade da fundadora em estruturar um negócio que atendesse à crescente demanda de serviços de engenharia para aeronaves regionais.

Atualmente, a empresa é líder em engenharia aeronáutica, especializada na concepção, análise estrutural e certificação tanto para o desenvolvimento de novas aeronaves quanto para a manutenção de frotas. Estabeleceu uma sólida reputação com a Bombardier, montadora de aeronaves regionais, colaborando no desenvolvimento de grandes subconjuntos, tais como: fuselagem, caixas de asa, divisórias, portas estruturais e cockpits .

Trata-se de uma empresa de pequeno porte subcontratada de especialidade da Bombardier. Sua missão é fornecer serviços de engenharia de qualidade aos clientes, auxiliá-los no desenvolvimento de novos produtos com a participação de uma equipe local de engenharia e desenvolver novos produtos com retorno rápido do investimento. A inovação e seu processo de desenvolvimento são os principais pilares do modelo de negócio da empresa.

Com base nos dados coletados, a Figura 8 apresenta o modelo linear de inovação da Altitude Aerospace.

Figura 8
Modelo de Desenvolvimento da Inovação da Empresa Altitude Aerospace. Fonte: Elaborado pelos autores do presente artigo.

Os relatos indicam que os projetos de inovação são apostas no futuro, repleto de incertezas e seus riscos. Para reduzir tais incertezas, a empresa realiza o desenvolvimento da inovação em quatro fases, que se interagem entre si, descritas a seguir.

  1. 1

    Idealização da inovação: é a fase mais criativa do modelo de inovação. A entrevistada argumenta que as ideias inovadoras não nascem prontas. A idealização pode ocorrer de duas formas: solicitação do cliente para o desenvolvimento de um novo produto e pesquisa direcionada para a descoberta de novos conhecimentos com objetivo comercial;

  2. 2

    Geração de ideias: é uma fase de refinamento das ideias. Os dados coletados evidenciam que é uma fase importante, pois há interação entre os funcionários e há o compartilhamento de informações para gerar ideias. Oportunidades de negócios podem ser criadas nessa fase;

  3. 3

    Desenvolvimento e experimentação: é uma fase de altos investimentos em P&D, criação e experimentação de projetos-piloto. Os relatos indicam que o desenvolvimento e a experimentação reduzem as incertezas e aceleram a criação de uma gestão estratégica voltada para a tecnologia desenvolvida. A entrevistada completa dizendo que, quanto mais cedo a inovação emergir, mais rápido a empresa irá ganhar vantagem competitiva. A empresa realiza projetos-piloto, simulações e testes para averiguar a aderência das soluções antes de levá-las ao mercado;

  4. 4

    Comercialização: é a última fase do modelo de desenvolvimento da inovação da Altitude Aerospace. Após aprovação dos projetos-piloto, iniciam-se a venda dos novos produtos e a prestação de novos serviços.

O processo do desenvolvimento da inovação na empresa está integrado ao sistema regional de inovação da Região Metropolitana de Montreal, atuante na disseminação da cultura da inovação como diferencial competitivo das empresas aeronáuticas. O sistema de inovação busca gerar conhecimento e competência sobre como ocorre o processo em que emergem as inovações tecnológicas, servindo à criação de novos produtos e processos de produção ( Sáenz & García Capote, 2002 Sáenz, T. W., & García Capote, E. (2002). Ciência, inovação e gestão tecnológica. Brasília: CNI/IEL/SENAI, ABIPTI. ).

Segundo a entrevistada, a inovação é a aplicação prática da criatividade na Altitude Aerospace e, assim, a criatividade tem importante papel no aumento dos resultados da empresa. Também para ela, é preciso ter foco, priorizar o que é realmente importante e ter disciplina na execução dos projetos em busca da inovação.

4.4 Mechtronix

Em meio à revolução dos microprocessadores, a National Research Council (NRC – Conselho Nacional de Pesquisa) lançou um desafio aos estudantes das universidades canadenses de engenharia para construir um simulador de voo usando a tecnologia dos microprocessadores. Em razão disto, a Universidade Concordia, localizada em Montreal, selecionou cinco alunos que participavam de projetos de P&D. Fernando Petruzzielo, Joaquim Frazao, Marco Petruzziello, Thomas Allen e Xavier Henri Hervé completaram com sucesso o projeto, e assim nasceu a empresa Mechtronix, em 1987.

Especializada em design, engenharia e fabricação de máquinas inteligentes, a empresa de médio porte é considerada uma subcontratada de especialidade da Bombardier Aerospace e da Bombardier Transportation. Com base nos relatos dos dirigentes, a Mechtronix tem 72% da sua receita bruta atrelada a essas duas empresas.

A partir dos dados obtidos nas entrevistas, a Figura 9 apresenta o modelo de desenvolvimento da inovação da empresa Mechtronix. Para os entrevistados, o processo de desenvolvimento da inovação consiste na colaboração entre a empresa e seus parceiros estratégicos, principalmente as universidades e centros de treinamento. Veem o desenvolvimento da inovação como um processo que transforma oportunidade em produto.

Figura 9
Modelo de Desenvolvimento da Inovação da Empresa Mechtronix. Fonte: Elaborado pelos autores do presente artigo.

A análise da Figura 9 descreve que o desenvolvimento da inovação inicia-se com a geração de ideias, que surgem graças ao conhecimento científico gerado nas universidades parceiras (como a Universidade Concordia, Universidade de Toronto e a Universidade da China) e do conhecimento tecnológico produzido nas empresas parceiras, como a Bombardier Aerospace, a Bombardier Transportation e a Tecnam. O trecho da entrevista a seguir traz uma breve explicação da fase de geração de ideias para a inovação:

A inovação nasce de uma nova ideia. Assim, fazemos reuniões periódicas com os nossos parceiros. Nestes encontros, geramos em média 100 ideias novas. Depois essas ideias passam por um refinamento até chegar à inovação.

Após o refinamento das ideias, o processo de desenvolvimento da inovação passa para a pesquisa aplicada. Essa fase inclui os projetos de pesquisas realizados em conjunto com as universidades e empresas parceiras. Para a empresa, a pesquisa aplicada corresponde à descoberta de novos conhecimentos científicos e tecnológicos com um objetivo comercial específico.

Os projetos de pesquisa passam para a fase de desenvolvimento e experimentação. Os relatos indicam que é uma fase crucial da inovação, por incluir a racionalização do projeto inovador com o objetivo de se transformar a ideia em produto. Esse estágio engloba o planejamento, os testes fundamentados e a adaptação dos processos de produção.

Após a aprovação na fase de experimentação, o produto está pronto para a etapa da comercialização. Os relatos dos entrevistados mostram que nessa etapa há integração entre os departamentos de produção e de marketing. Explicam que o modelo de inovação ajuda no compartilhamento da energia dos envolvidos e contribui para o planejamento das ações estratégicas. Com o objetivo de colaborar, compartilhar e contruir novos conhecimentos, a Mechtronix associa as parcerias estratégicas e o desenvolvimento da inovação com a produção colaborativa.

Para os entrevistados, a produção colaborativa desempenha um papel primordial na criação de novos produtos, pois as informações são transferidas de agente para agente, ou seja, da empresa para os seus parceiros e vice-versa. A colaboração entre as organizações introduz uma importante mudança no paradigma competitivo, na medida em que considera que a competição no mercado ocorre, de fato, no nível das cadeias produtivas e não apenas no das unidades isoladas de negócio ( Canongia et al., 2001 Canongia, C., Lamb, C. M. S. R., Carvalho, C. S. D. P., & Silva, V. S. (2001). Convergência da inteligência competitiva com construção de visão de futuro: proposta metodológica de sistema de informação estratégica (SIE). Revista de Ciência da Informação, 2(3), 1-15. ).

5 Análise intercaso dos dados

Nesta seção, são apresentadas as principais semelhanças e diferenças do processo de desenvolvimento da inovação a partir da comparação dos casos estudados, destacando-se os dados de maior relevância para a resposta à pergunta de pesquisa. Estes estão dispostos na metamatriz do Quadro 2 , construída segundo recomendações de Miles & Huberman (1994) Miles, B. M., & Huberman, A. M. (1994). Qualitative data analysis: an expanded sourcebook (2nd ed.). Thousand Oaks: Sage. .

Quadro 2
Comparação do Processo de Desenvolvimento da Inovação nos Casos Estudados.

A leitura do Quadro 2 indica que as empresas Aero Brasil e Altitude Aerospace, ambas de pequeno porte, apresentam um modelo linear do processo de desenvolvimento da inovação. O modelo, para ambas, revela um processo sequencial e hierárquico. Já as empresas Empreendimentos Aeronáuticos e Mechtronix, ambas de médio porte, apresentam um modelo de interações em cadeia do processo de desenvolvimento da inovação. Na percepção dos entrevistados de ambas as empresas, a inovação é um processo complexo de interações entre os agentes que nele atuam, entre os quais as universidades, os centros de pesquisas e o mercado.

Na primeira etapa do processo de desenvolvimento da inovação, verificou-se que as empresas Empreendimentos Aeronáuticos e Altitude Aerospace apresentam semelhanças, ou seja, ambas possuem duas fontes de informação que alimentam esse processo: a demanda do cliente e a pesquisa aplicada. Já as empresas Aero Brasil e Mechtronix idealizam a inovação pela geração de ideias que dão origem à pesquisa aplicada.

Ainda analisando a primeira etapa, notou-se que apenas as empresas Empreendimentos Aeronáuticos e Mechtronix geram novos conhecimentos científicos e tecnológicos. Para a empresa brasileira, esses novos conhecimentos nascem do relacionamento coordenado e dinâmico com empresas da cadeia produtiva aeronáutica e entidades de PD&I: ITA, UFMG e CTA. Para a empresa canadense, os novos conhecimentos científicos são gerados por parceiros como a Universidade Concordia, Universidade de Toronto e Universidade da China, e o conhecimento tecnológico é desenvolvido nas empresas parceiras, como a Bombardier Aerospace, Bombardier Transportation e Tecnam.

Uma diferença encontrada na primeira etapa é que apenas a empresa Mechtronix associa a geração de ideias e novos conhecimentos científicos e tecnológicos com a produção colaborativa. Para ela, a produção colaborativa desempenha um papel primordial na criação de novos produtos, já que as informações são transferidas da empresa para os seus parceiros e vice-versa.

Ao analisar as etapas 2 e 3, verificou-se que todas as empresas estudadas elaboram projetos detalhados que englobam o desenvolvimento experimental do produto. Na etapa 2, que implica altos investimentos em P&D, iniciam-se os testes dos protótipos e, enfim, se forem aprovados, inicia-se, na etapa 3, a produção e a comercialização do produto em questão.

Uma última diferença encontrada refere-se à na empresa Altitude Aerospace. Nela, notou-se que o processo de desenvolvimento da inovação está inserido em um sistema regional de inovação diferentemente dos demais casos.

5.1 Modelo de inovação para o setor aeronáutico

O modelo de desenvolvimento de inovação das PMEs do setor aeronáutico, apresentado na Figura 10 , mostra que as PMEBTs não inovam sozinhas. Em geral, inovam no âmbito de um sistema de rede de relações com universidades, centros de pesquisa e diferentes empresas, tanto de grande quanto de pequeno e médio portes, participantes da cadeia produtiva aeronáutica e aeroespacial.

Figura 10
Modelo de Desenvolvimento da Inovação das PMEs do Setor Aeronáutico. Fonte: Elaborado pelos autores do presente artigo.

A leitura da Figura 10 mostra que o processo de inovação não ocorre de modo linear. Envolve vaivéns nas suas relações interativas, inclusive entre ciência, tecnologia, aprendizagem, produção, política e demanda. Essa abordagem transcende a cadeia de causa e efeito que se inicia com a P&D e termina com mudanças de produção e de atuação no mercado impulsionadas pela inovação. Segundo o que mostram os dados analisados, o desenvolvimento da inovação das PMEs do setor aeronáutico estudadas é estimulado pelas necessidades dos clientes e pela pesquisa aplicada. Considerando ambas as coisas, a direção das PMEs realiza o levantamento de dados sobre as viabilidades produtiva, econômica e humana de se desenvolver algo novo, sendo a geração e o desenvolvimento de ideias uma atividade central dos processos de inovação.

Com a consolidação dessas ideias, as PMEs desenvolvem protótipos e ocorrem o desenvolvimento experimental e os testes de protótipos, podendo ocorrer novas ideias também ao longo desses processos. Com base no Manual de Frascati ( OECD, 2002 Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD. (2002). Manual Frascati: propuesta de norma práctica para encuestas de investigación y desarrollo experimental (Fundación Española para la Ciência y Tecnologia, Trad.). Paris: OCDE. ), o desenvolvimento experimental é o trabalho sistemático, delineado a partir do conhecimento preexistente, obtido pela pesquisa e/ou experiência prática, e aplicado na produção de novos materiais, produtos e aparelhagens, no estabelecimento de novos processos, sistemas e serviços, e ainda no substancial aperfeiçoamento dos já produzidos e estabelecidos.

A aprovação do protótipo dá sinal verde para a produção e a comercialização do novo produto. Devido ao alto valor agregado dos produtos desenvolvidos no setor aeronáutico, as atividades dessa nova fase contribuem sobremaneira para o desenvolvimento regional, por precisar contar com uma densidade relativamente alta de mão de obra qualificada e que, por essa característica, deve ser bem remunerada.

6 Considerações finais

Para Conde & Araújo-Jorge (2003) Conde, M. V. F., & Araújo-Jorge, T. C. (2003). Modelos e concepções de inovação: a transição de paradigmas, a reforma da C&T brasileira e as concepções de gestores de uma instituição pública de pesquisa em saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 8(3), 727-741. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232003000300007.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-8123200...
, as atividades de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I), com o advento da economia baseada no conhecimento, se deslocaram para o centro do debate público e das prioridades políticas dos governos. Nos últimos anos, a eficiência e efetividade dos modelos de inovação tecnológica inseridos em sistemas de inovação tornaram-se o foco de preocupação e de estudos, visando alcançar maior compreensão de sua dinâmica para se construir indicadores que pudessem fornecer um panorama do estado atual da C,T&I, antecipar as consequências dos avanços científicos e da mudança tecnológica e avaliar as demandas e resultados das atividades inovadoras.

Entretanto, a extrema complexidade dos processos envolvidos nessas atividades e a intensidade e multiplicidade de conexões entre seus diferentes elementos dificultam sobremaneira a construção de modelos sintéticos que forneçam um panorama do estado da C,T&I ou que sejam capazes de identificar os nexos causais entre ciência, tecnologia, economia e sociedade.

Este estudo dá contribuições, mesmo que modestas, para superar tais dificuldades, dado o seu objetivo de gerar novos conhecimentos sobre o processo de desenvolvimento da inovação em PMEs do setor aeronáutico. Com os resultados obtidos, pode-se afirmar que as PMEBTs do setor aeronáutico não inovam sozinhas, mas no âmbito de um sistema de rede de relações com universidades, centros de pesquisa e diversas empresas, tanto de grande como de pequeno e médio porte, participantes da cadeia produtiva aeronáutica e aeroespacial. Assim, a inovação tecnológica é um processo colaborativo contínuo envolvendo as atividades de gestão, coordenação, aprendizagem, negociação investigação de necessidades dos clientes, aquisição de competências e gestão de desenvolvimento de novos produtos.

Pode-se dizer que o modelo de desenvolvimento da inovação das PMEs do setor aeronáutico é um modelo interativo que combina interações no ambiente interno de cada empresa e interações com instituições que estão no sistema regional de inovação, tais como universidades, centros de pesquisa e empresas.

Por fim, as contribuições deste artigo foram no contexto acadêmico, ou seja, o estudo contribuiu para avanços nas pesquisas realizadas no Brasil nas áreas de gestão da inovação. Outra contribuição foi relacionar o processo de inovação com as particularidades das pequenas e médias empresas do setor aeronáutico, ou seja, desenvolveu-se a sistematização de um modelo de análise que contribuiu para o melhor entendimento sobre como ocorre o processo de desenvolvimento da inovação em PMEs do setor aeronáutico brasileiro e canadense.

  • Como citar: Moraes, M. B., Campos, T. M., & Lima, E. (2019). Modelos de desenvolvimento da inovação em pequenas e médias empresas do setor aeronáutico no Brasil e no Canadá. Gestão & Produção , 26(1), e2002. https://doi.org/10.1590/0104-530X2002-19
  • Suporte financeiro: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

Referências

  • Anderson, P., & Tushman, M. L. (1990). Technological descontinuities and dominant designs: a cyclical model of technological design. Administrative Science Quarterly , 35(4), 604-633. http://dx.doi.org/10.2307/2393511.
    » http://dx.doi.org/10.2307/2393511
  • Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil – AIAB. (2013). Números da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil São José dos Campos: AIAB. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiab.org.br/portugues/index.php?option=com_content&task=view&id=13&Itemid=26
    » http://www.aiab.org.br/portugues/index.php?option=com_content&task=view&id=13&Itemid=26
  • Association des Industries Aérospatiales du Canadá – AIAC. (2013). Le Rapport: l’état de l’industrie aérospatiale canadienne Canada: AIAC. Recuperado em 29 de julho de 2013, de http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canadas_Aerospace_Industry/Industry_Statistics/StateOfCdnAeroIndustry2013_FINAL_FR.pdf
    » http://www.aiac.ca/uploadedFiles/Canadas_Aerospace_Industry/Industry_Statistics/StateOfCdnAeroIndustry2013_FINAL_FR.pdf
  • Bandeira-de-Mello, R. (2006). Softwares em pesquisa qualitativa. In C. K. Godoi, R. Bandeira-De-Mello & A. B. Silva (Eds.). Pesquisa qualitativa em estudos organizacionais: paradigmas, estratégias e métodos (pp. 429-460). São Paulo: Saraiva.
  • Barbieri, J. C. (2003). Organizações inovadoras: estudos e casos brasileiros Rio de Janeiro: Editora FGV.
  • Billaudot, B., & Julien, P. A. (2003). Organisation Industrielle et sous-traitance: du fordisme à l’entreprise-réseau. In P. A. Julien, L. Raymond, R. Jacob & G. Abdul-Nour (Eds.), L’entreprise-réseau: dix ans d’expérience de la Chaire Bombardier Produits Récrèatifs (pp. 47-95). Québec: Presses de l'Université du Québec.
  • Canongia, C., Lamb, C. M. S. R., Carvalho, C. S. D. P., & Silva, V. S. (2001). Convergência da inteligência competitiva com construção de visão de futuro: proposta metodológica de sistema de informação estratégica (SIE). Revista de Ciência da Informação, 2(3), 1-15.
  • Conde, M. V. F., & Araújo-Jorge, T. C. (2003). Modelos e concepções de inovação: a transição de paradigmas, a reforma da C&T brasileira e as concepções de gestores de uma instituição pública de pesquisa em saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 8(3), 727-741. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232003000300007.
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232003000300007
  • Cooper, R. G. (1994). Perspective third-generation new product processes. Journal of Product Innovation Management, 11(1), 3-14. http://dx.doi.org/10.1016/0737-6782(94)90115-5.
    » http://dx.doi.org/10.1016/0737-6782(94)90115-5
  • Eisenhardt, K. M. (1989). Building theories from case study research. Academy of Management Review, 14(4), 532-550. http://dx.doi.org/10.5465/amr.1989.4308385.
    » http://dx.doi.org/10.5465/amr.1989.4308385
  • Freeman, C., & Soete, L. (1997). The economics of industrial innovation (3rd ed.). Cambridge: The MIT Press.
  • Galanakis, K. (2006). Innovation process: make sense using systems thinking. Technovation , 26(11), 1222-1232. http://dx.doi.org/10.1016/j.technovation.2005.07.002.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.technovation.2005.07.002
  • Kline, S. J. (1978). Innovation is not a linear process. Research Management , 4(28), 36-45.
  • Leiponen, A., & Helfat, C. E. (2010). Innovation, objectives, knowledge sources and benefits of breadth. Strategic Management Journal, 31(2), 224-236. http://dx.doi.org/10.1002/smj.807.
    » http://dx.doi.org/10.1002/smj.807
  • Lima, E. (2005). Microdinâmicas da difusão de inovações entre micro, pequenas e médias empresas. In P. P. H. Wilhelm & M. Amal (Eds.), Arranjos produtivos locais: estratégias de cooperação e desenvolvimento (pp. 83-120). Blumenau: Nova Letra. Recuperado em 2 de maio de 2017, de https://www.researchgate.net/profile/Edmilson_Lima2/publications
    » https://www.researchgate.net/profile/Edmilson_Lima2/publications
  • Lima, E. (2010). Teorizando a partir de dados qualitativos em Administração. Pretexto, 1(11), 73-93.
  • Lima, E., Lopes, R. M., Nassif, V., & Silva, D. (2015). Opportunities to improve entrepreneurship education: contributions considering brazilian challenges. Journal of Small Business Management, 53(4), 1033-1051. http://dx.doi.org/10.1111/jsbm.12110.
    » http://dx.doi.org/10.1111/jsbm.12110
  • Lobosco, A., Moraes, M. B., & Maccari, E. A. (2011). Inovação: uma análise do papel da Agência USP de Inovação na geração de propriedade intelectual e nos depósitos de patentes da Universidade de São Paulo. Revista de Administração da UFSM, 3(4), 406-424.
  • Longanezi, T., Coutinho, P., & Bomtempo, J. V. M. (2008). Um modelo referencial para a prática da inovação. Journal of Technology Management & Innovation, 3(1), 74-83.
  • Miles, B. M., & Huberman, A. M. (1994). Qualitative data analysis: an expanded sourcebook (2nd ed.). Thousand Oaks: Sage.
  • Mintzberg, H. (1989). Mintzberg on management: inside our strange world of organizations . New York: The Free Press.
  • Moraes, M., Lobosco, A., & Lima, E. (2013). Expectations of FINEP and São Paulo Anjos Agents concerning the use of venture capital in technology-based small and medium enterprises. Journal of Technology Management & Innovation, 8, 92-104.
  • Moreira, D. A., & Queiroz, A. C. S. (Eds.). (2007). Inovação organizacional e tecnológica São Paulo: Thomson Learning.
  • Mühr, T. (1995). Atlas/ti, release 1.1 E. In E. A. Weitzman & M. B. Miles (Eds.), Computer programs for qualitative data analysis (pp. 217-229). Thousand Oaks: Sage.
  • Musiolik, J., Markard, J., & Hekkert, M. (2012). Networks and Network Resources in Technological Innovation Systems: towards a conceptual framework for system building. Technological Forecasting and Social Change, 79(6), 1032-1048. http://dx.doi.org/10.1016/j.techfore.2012.01.003.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.techfore.2012.01.003
  • Nobelius, D. (2004). Towards the sixth generation of R&D management. International Journal of Project Management, 22(5), 369-375. http://dx.doi.org/10.1016/j.ijproman.2003.10.002.
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.ijproman.2003.10.002
  • Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD. (1999). Managing national innovation systems Paris: OCDE.
  • Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD. (2002). Manual Frascati: propuesta de norma práctica para encuestas de investigación y desarrollo experimental (Fundación Española para la Ciência y Tecnologia, Trad.). Paris: OCDE.
  • Ortt, J. R., & Van Der Duin, P. A. (2008). The evolution of innovation management towards contextual innovation. European Journal of Innovation Management, 11(4), 522-538. http://dx.doi.org/10.1108/14601060810911147.
    » http://dx.doi.org/10.1108/14601060810911147
  • Rodrigues, L. C., Heringer, B. H. F., & França, A. L. (2011). Padrões de inovação em multinacional de base tecnológica. Revista Inteligência Competitiva, 1(2), 198-204.
  • Rothwell, R. (1994). Towards the fifth-generation innovation process. International Marketing Review, 11(1), 7-31. http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491.
    » http://dx.doi.org/10.1108/02651339410057491
  • Sáenz, T. W., & García Capote, E. (2002). Ciência, inovação e gestão tecnológica Brasília: CNI/IEL/SENAI, ABIPTI.
  • Stal, E. (2007). Inovação tecnológica, sistemas nacionais de inovação e estímulos governamentais à inovação. In D. A. Moreira & A. C. S. Queiroz (Eds.), Inovação organizacional e tecnológica . São Paulo: Thomson Learning.
  • Viotti, E., & Macedo, M. (2003). Indicadores de ciência, tecnologia e inovação no Brasil Campinas: Editora Unicamp.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Mar 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    02 Maio 2017
  • Aceito
    16 Jan 2018
Universidade Federal de São Carlos Departamento de Engenharia de Produção , Caixa Postal 676 , 13.565-905 São Carlos SP Brazil, Tel.: +55 16 3351 8471 - São Carlos - SP - Brazil
E-mail: gp@dep.ufscar.br