Resumos
O preparo de solo para batata no Brasil é geralmente realizado com o emprego de grade aradora (preparo raso), máquina cujo uso frequente estabelece uma zona compactada abaixo de 20 cm. Em tese, a descompactação profunda pode aumentar a produtividade e reduzir a incidência de doenças no tubérculo e esses efeitos podem variar com a espécie de gramínea cultivada anteriormente à cultura da batata. O objetivo do presente trabalho foi avaliar a descompactação profunda associada ao cultivo de Panicum maximum cv. Tanzânia, Brachiaria brizantha cv. Marandu e milho (Zea mays) híbrido 'Dekalb 191' e, como testemunha, o preparo raso associado ao cultivo do mesmo híbrido de milho. O experimento foi conduzido em Piracicaba-SP, de dezembro de 2006 a outubro de 2008 no delineamento de blocos completos casualizados. A resistência à penetração no centro do canteiro, avaliada por meio de penetrômetro de impacto, foi inferior a 1,5 MPa até 40 cm de profundidade em todos os tratamentos e, na camada de 40 a 60 cm, esse valor no preparo raso (2,4 MPa) foi significativamente superior aos dos demais tratamentos, cujos valores variaram de 0,9 a 1,0 MPa. A produtividade de tubérculos no preparo raso foi de 28,3 t ha-1 e diferiu estatisticamente do maior valor obtido com a descompactação profunda (32,9 t ha-1). A proporção de tubérculos com diâmetro inferior a 4 cm foi superior no preparo raso (5,1%) em comparação ao preparo vertical com milho (2,9%) e B. brizantha (2,2%). A ocorrência de pragas, doenças e lenticelose (Diabrotica speciosa, 31,0% a 49,7%; Streptomyces scabies, 3,3% a 6,3%; Helminthosporium solani, 60,3% a 69%; Rhizoctonia solani, 1,3% a 4,3%; lenticelose, 6,0% a 15,7%), não foi afetada pelos tratamentos. A descompactação profunda reduziu a resistência à penetração do solo e proporcionou maior produtividade com menor ocorrência de tubérculos pequenos, mas não influenciou a ocorrência de pragas, doenças e lenticelose.
Solanum tuberosum; gramínea antecessora; doença; manejo do solo
The soil tillage for potato in Brazil commonly relies on harrow utilization (shallow tillage), which causes a compacted zone below 20 cm. Apparently, deep soil loosening improves productivity and reduces tuber disease incidence and these effects can vary according to the species of grass cultivated before the potato crop. The objective of this work was to study deep loosening associated to the cultivation of Panicum maximum cv. Tanzânia, Brachiaria brizantha cv. Marandu and maize (Zea mays) 'Dekalb 191' and the control (shallow tillage with the same maize genotype). The experiment was carried out in Piracicaba, São Paulo State, Brazil, from December 2006 to October 2008, in a complete randomized blocks design. The soil penetration resistance (SPR) value, evaluated by impact penetrometer in the center of the seed bed, was lower than 1.5 MPa up to 40 cm depth for all treatments and, in the 40-60 cm layer, the SPR value in the shallow tillage (2.4 MPa) was statistically higher than all other treatments, whose values ranged from 0.9 to 1.0 MPa. Tuber productivity in the shallow tillage was 28.3 t ha-1 and differed from the highest value among the deep soil loosening treatments (32.9 t ha-1). The proportion of tubers with less than 4 cm diameter in the shallow tillage (5.1%) was higher than the deep soil alleviation treatments with maize (2.9%) and B. brizantha (2.2%). The occurrence of tuber pests, diseases and lenticelose (Diabrotica speciosa, 31.0% to 49.7%; Streptomyces scabies, 3.3% to 6.3%; Helminthosporium solani, 60.3% to 69%; Rhizoctonia solani, 1.3% to 4.3%; lenticelose, 6.0% to 15.7%), was not influenced by the treatments. The deep soil loosening reduced soil penetration resistance and increased potato productivity, with lower rate of small tubers, but did not affect the occurrence of tuber pests, diseases and lenticelose.
Solanum tuberosum; previous grass crop; disease; soil management
PESQUISA RESEARCH
Carlos Francisco RagassiI; José Laércio FavarinII; Fábio Akio ShiraishiIII; Antônio Williams MoitaI; Henry SakoII; Paulo César T de MeloII
IEmbrapa Hortaliças, C. Postal 218, 70359-970 Brasília-DF; cragassi@cnph.embrapa.br; moita@cnph.embrapa.br
IIUSP-ESALQ, Depto Prod. Vegetal; C. Postal 9, 13418-900 Piracicaba-SP; jlfavari@esalq.usp.br; henrysk@uol.com.br; pctmelo@esalq.usp.br
IIIUSP-ESALQ, Depto Ciência do Solo; kioshiraishi@yahoo.com.br
RESUMO
O preparo de solo para batata no Brasil é geralmente realizado com o emprego de grade aradora (preparo raso), máquina cujo uso frequente estabelece uma zona compactada abaixo de 20 cm. Em tese, a descompactação profunda pode aumentar a produtividade e reduzir a incidência de doenças no tubérculo e esses efeitos podem variar com a espécie de gramínea cultivada anteriormente à cultura da batata. O objetivo do presente trabalho foi avaliar a descompactação profunda associada ao cultivo de Panicum maximum cv. Tanzânia, Brachiaria brizantha cv. Marandu e milho (Zea mays) híbrido 'Dekalb 191' e, como testemunha, o preparo raso associado ao cultivo do mesmo híbrido de milho. O experimento foi conduzido em Piracicaba-SP, de dezembro de 2006 a outubro de 2008 no delineamento de blocos completos casualizados. A resistência à penetração no centro do canteiro, avaliada por meio de penetrômetro de impacto, foi inferior a 1,5 MPa até 40 cm de profundidade em todos os tratamentos e, na camada de 40 a 60 cm, esse valor no preparo raso (2,4 MPa) foi significativamente superior aos dos demais tratamentos, cujos valores variaram de 0,9 a 1,0 MPa. A produtividade de tubérculos no preparo raso foi de 28,3 t ha-1 e diferiu estatisticamente do maior valor obtido com a descompactação profunda (32,9 t ha-1). A proporção de tubérculos com diâmetro inferior a 4 cm foi superior no preparo raso (5,1%) em comparação ao preparo vertical com milho (2,9%) e B. brizantha (2,2%). A ocorrência de pragas, doenças e lenticelose (Diabrotica speciosa, 31,0% a 49,7%; Streptomyces scabies, 3,3% a 6,3%; Helminthosporium solani, 60,3% a 69%; Rhizoctonia solani, 1,3% a 4,3%; lenticelose, 6,0% a 15,7%), não foi afetada pelos tratamentos. A descompactação profunda reduziu a resistência à penetração do solo e proporcionou maior produtividade com menor ocorrência de tubérculos pequenos, mas não influenciou a ocorrência de pragas, doenças e lenticelose.
Palavras-chave:Solanum tuberosum, gramínea antecessora, doença, manejo do solo.
ABSTRACT
The soil tillage for potato in Brazil commonly relies on harrow utilization (shallow tillage), which causes a compacted zone below 20 cm. Apparently, deep soil loosening improves productivity and reduces tuber disease incidence and these effects can vary according to the species of grass cultivated before the potato crop. The objective of this work was to study deep loosening associated to the cultivation of Panicum maximum cv. Tanzânia, Brachiaria brizantha cv. Marandu and maize (Zea mays) 'Dekalb 191' and the control (shallow tillage with the same maize genotype). The experiment was carried out in Piracicaba, São Paulo State, Brazil, from December 2006 to October 2008, in a complete randomized blocks design. The soil penetration resistance (SPR) value, evaluated by impact penetrometer in the center of the seed bed, was lower than 1.5 MPa up to 40 cm depth for all treatments and, in the 40-60 cm layer, the SPR value in the shallow tillage (2.4 MPa) was statistically higher than all other treatments, whose values ranged from 0.9 to 1.0 MPa. Tuber productivity in the shallow tillage was 28.3 t ha-1 and differed from the highest value among the deep soil loosening treatments (32.9 t ha-1). The proportion of tubers with less than 4 cm diameter in the shallow tillage (5.1%) was higher than the deep soil alleviation treatments with maize (2.9%) and B. brizantha (2.2%). The occurrence of tuber pests, diseases and lenticelose (Diabrotica speciosa, 31.0% to 49.7%; Streptomyces scabies, 3.3% to 6.3%; Helminthosporium solani, 60.3% to 69%; Rhizoctonia solani, 1.3% to 4.3%; lenticelose, 6.0% to 15.7%), was not influenced by the treatments. The deep soil loosening reduced soil penetration resistance and increased potato productivity, with lower rate of small tubers, but did not affect the occurrence of tuber pests, diseases and lenticelose.
Keywords:Solanum tuberosum, previous grass crop, disease, soil management.
Desde 1920, quando passou a ser cultivada no Brasil em escala comercial, o manejo da cultura da batata baseou-se em práticas agrícolas importadas de países de clima temperado (Fioreze, 2005), como, por exemplo, o preparo de solo baseado em revolvimento com grade aradora em área total, que favorece a formação de uma camada compactada abaixo da camada arável (Tokeshi et al., 1997). Essa camada se forma devido à destruição da estrutura do solo (Thornton et al., 2008) e à subsequente movimentação vertical de argila, que se deposita em subsuperfície (Carvalho Junior, 1995). A taxa de infiltração de água é limitada quando a frente de molhamento encontra camadas compactadas, as quais apresentam reduzida condutividade hidráulica e, dessa forma, a presença desse tipo de camada proporciona acúmulo de água livre (encharcamento) na região das raízes após chuva ou irrigação (Copas et al., 2008). Há, ainda, relatos de podridões radiculares associadas à compactação e posterior encharcamento do solo (Joubert & Labuschagne, 1998; Labuschagne & Joubert, 2006).
Na cultura da batata, o excesso de água reduz o rendimento e a qualidade dos tubérculos, além de acentuar o dano causado por doenças (Thornton et al., 2008). A alta umidade leva à formação de um filme de água sobre o tubérculo e faz com que sua superfície se torne anaeróbica, fato que inibe a sua resistência natural às infecções, além de estabelecer um ambiente favorável a doenças bacterianas, como a canela preta (Pectobacterium atrosepticum) e a podridão do tubérculo (Pectobacterium carotovorum) (De Boer, 2008).
Solo demasiadamente úmido causa a abertura das lenticelas, desordem fisiológica denominada lenticelose, e o tubérculo se torna mais suscetível a infecções, pois a lenticelose permite a entrada de patógenos (De Boer, 2008).
A compactação do solo também afeta a batateira de outras maneiras. Como o movimento de água e de ar se torna restrito, sua disponibilidade às plantas fica limitada.
As raízes não se desenvolvem e não penetram bem no solo e, assim, ficam localizadas superficialmente. Além disso, a planta necessita utilizar mais energia para o crescimento das raízes e dos tubérculos, o que reduz a energia disponível para o crescimento dos demais órgãos.
A restrição do sistema radicular às camadas superficiais do solo limita a capacidade de obtenção de nutrientes e a resistência a períodos de estresse hídrico. Dessa forma, as plantas se tornam menos vigorosas e o rendimento em tubérculos é prejudicado (Thornton et al., 2008).
O sistema radicular das culturas apresenta diferentes graus de tolerância à compactação, porém, todas as plantas respondem a um valor crítico, acima do qual seu crescimento é restrito (Lapen et al., 2001; Radford et al., 2001). Esse valor apresenta pequena variação, como 1,5 MPa (Grant & Lafond, 1993; Stalham et al., 2007) e 2,0 MPa (Taylor et al., 1966; Silva et al., 1994; Tormena et al., 1998).
Em uma série de experimentos na Inglaterra, verificou-se que a compactação do solo atrasou a emergência, reduziu a taxa de expansão da área foliar, a interceptação de luz e o ciclo da batateira; esses fatores combinados prejudicaram o rendimento em tubérculos (Stalham et al., 2007). Naquele trabalho, a densidade de raízes e a profundidade máxima de enraizamento foram reduzidas, particularmente onde a compactação apresentava-se em camadas mais superficiais.
Nos sulcos de plantio, intensivamente preparados, a taxa de penetração das raízes da batateira foi de 2 cm dia-1 e reduziu-se à metade em locais com resistência à penetração de 1,5 MPa (Stalham et al., 2007).
Com a finalidade de oferecer condições físicas e biológicas suficientemente adequadas para a cultura da batata, foi desenvolvido o conceito de descompactação profunda de solo avaliado no presente trabalho. Esse sistema consistiu no uso de implementos de ação profunda, tráfego dirigido (Young et al., 1993) e cultivo de gramíneas previamente ao plantio da batata.
A presente pesquisa testou a hipótese de que a descompactação profunda, além de aumentar a produtividade, reduziria a incidência de doenças nos tubérculos e que esses efeitos poderiam variar com a espécie de gramínea cultivada anteriormente à batata. Especificamente, a pesquisa visou comparar o sistema de preparo raso de solo, baseado em grade aradora, ao sistema de descompactação profunda associado ao cultivo de diferentes gramíneas (Panicum maximum cv. Tanzânia, Brachiaria brizantha cv. Marandu e Zea mays híbrido 'Dekalb 191') quanto à resistência do solo à penetração (RSP), produtividade e incidência de doenças na batata (Solanum tuberosum), cultivada em sucessão às gramíneas.
MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi realizada em Piracicaba-SP, latitude 22º42' S, longitude 47º38' W a 569 m de altitude em Nitossolo Eutrófico típico, textura argilosa, irrigado por aspersão. Anteriormente à sua instalação, o campo havia sido cultivado com feijão (Phaseolus vulgaris) e, nessa cultura, houve incidência generalizada de tombamento das plântulas, ou damping off, como consequência do ataque de Rhizoctonia solani. Verificou-se, também, que em teor de água correspondente à capacidade de campo, a área apresentava resistência à penetração superior a 2,0 MPa, restritiva ao crescimento radicular, desde a camada superficial, o que permitiu caracterizar o solo como compactado.
A análise de solo da camada de 0 a 20 cm de profundidade, realizada por meio da metodologia descrita em Malavolta (2006), determinou saturação por bases de 66%, pH (CaCl2)= 5,2; matéria orgânica= 28 g dm-3; P= 60 mg dm-3; H+Al, K, Ca, Mg e capacidade de troca de cátions 38; 7,2; 49; 16 e 110 mmolc dm-3, respectivamente.
O experimento foi constituído por seis repetições e quatro tratamentos, sendo, um deles, a sucessão milho (Zea mays híbrido 'Dekalb 191') - batata (Solanum tuberosum cv. Atlantic) em preparo raso de solo (testemunha). Nos outros três, empregou-se o sistema de descompactação profunda com as diferentes sucessões de culturas: (1) Panicum maximum cv. Tanzânia - batata; (2) Brachiaria brizantha cv. Marandu - batata; e (3) milho - batata, sendo, esse último, diferente da testemunha apenas pelo sistema de preparo de solo.
Seguiu-se o delineamento de blocos completos casualizados. No entanto, para a variável resistência à penetração, utilizou-se o delineamento de parcelas subdivididas, cujas subparcelas foram constituídas pelas faixas de profundidade. As unidades amostrais consistiram de duas linhas de plantio de 7 m de comprimento, com espaçamento de 90 cm entre linhas e 30 cm entre plantas na linha.
O preparo de solo e a semeadura das culturas para sucessão com a batata foram realizados em dezembro de 2006 e 2007 e o preparo de solo e plantio da batata, no final de maio de 2007 e 2008. As avaliações, no entanto, foram realizadas apenas durante a cultura da batata no segundo ano (2008).
Na semeadura das gramíneas, foi feita adubação com 150 kg ha-1 de nitrogênio (N) e 150 kg ha-1 de P2O5 e, para a batata, aplicou-se 160, 160 e 390 kg ha-1 de N, K2O e P2O5, respectivamente, 5 kg ha-1 de boro (B) e 10 kg ha-1 de zinco (Zn).
O preparo de solo para a semeadura das gramíneas iniciou-se com uma trituradora acoplada à tomada de força do trator, utilizada para picar os restos vegetais, seguido por uma enxada rotativa encanteiradora sob alta rotação, que revolveu e pré-incorporou os restos vegetais a 20 cm de profundidade. Essas operações foram realizadas em todos os tratamentos, inclusive na testemunha. No preparo raso, entre a operação da trituradora e da enxada rotativa, foi feita uma operação com grade aradora, a 20 cm de profundidade. Nos tratamentos com a descompactação profunda, uma rotativa encanteiradora de baixa rotação cortou o solo a 40 cm de profundidade e incorporou o material vegetal. Depois disso, fez-se uma subsolagem no centro do canteiro, a 80 cm de profundidade e, então, procedeu-se à semeadura das gramíneas. Em abril de 2007 e 2008, a massa das gramíneas foi picada e permaneceu na superfície do solo por 45 a 60 dias. Após essa etapa, realizou-se a mesma sequência de operações de preparo de solo feita para as gramíneas e, no final de maio, efetuou-se o plantio semi-mecanizado da batata. Depois de 15 dias, quando os brotos emergiram, realizou-se a amontoa. As dimensões hipotéticas da descompactação profunda em comparação ao preparo raso de solo estão esquematizadas na Figura 1. Todas as operações envolvidas no preparo de solo foram realizadas com o solo em condição friável, ou seja, em grau de umidade em que esse não se deformava plasticamente, como aconteceria em alto teor de água, mas que permitia a quebra do torrão, o que não aconteceria com o solo extremamente seco.
A resistência do solo à penetração (RSP) foi avaliada por meio de penetrômetro de impacto, modelo IAA/ Planalsucar- Stolf (Stolf et al., 1983) e, com o auxílio do software "Impact Penetrometer Stolf Model" versão 2.0, foram obtidos os valores de RSP em MPa a cada 20 cm de profundidade. Para reduzir os erros devidos à diferença na umidade do solo, a avaliação foi feita em um único dia, aos 60 dias após o plantio (fase de tuberização da batata), com teor de água no solo correspondente à capacidade de campo. As análises foram realizadas em cada parcela, em três pontos sobre o canteiro, distantes 45 cm um do outro, até 1,0 m de profundidade. Como os canteiros possuíam 1,80 m de largura, os pontos localizados nas posições 45 e 135 cm corresponderam exatamente às linhas de plantio e o ponto central, localizado a 90 cm, correspondeu à linha subsolada. Dessa forma, para análise dos dados, utilizou-se a média entre os valores das posições 45 e 135 cm, sendo, essa variável, denominada RSP na linha de plantio. A RSP no ponto central do canteiro (90 cm) foi analisada isoladamente. As análises estatísticas foram realizadas pelos testes F e Duncan a 5% de significância, no esquema de parcelas subdivididas, em que foram considerados os tratamentos como parcela principal e a profundidade (de 20 em 20 cm) como subparcela.
Após a colheita e a determinação da massa, foram amostrados 50 tubérculos por parcela, a partir dos quais se avaliou visualmente a ocorrência de danos causados por pragas e doenças. As doenças avaliadas foram sarna comum (Streptomyces scabies), sarna prateada (Helminthosporium solani) e rizoctoniose (Rhizoctonia solani). A avaliação do ataque de pragas constou apenas dos sintomas de ataque da larva-alfinete (Diabrotica speciosa) e os sintomas de desordem fisiológica (lenticelose).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A resistência do solo à penetração (RSP) na linha de plantio apresentou incremento conforme se aumentou a profundidade (Figura 2) e não foi influenciada pelos tratamentos.
Tendência de aumento com a profundidade também foi verificada para a RSP no centro do canteiro. Entretanto, incremento significativo só ocorreu a partir da faixa de 40 a 60 cm de profundidade no preparo raso e a partir da faixa de 60 a 80 cm nos tratamentos com descompactação profunda (Figura 3).
Ao se considerar o valor de 1,5 MPa (Stalham et al., 2007) como crítico para o desenvolvimento radicular da batateira, verifica-se que, na linha de plantio, até a faixa de 20 a 40 cm de profundidade, não houve limitação para o crescimento radicular da cultura em nenhum dos tratamentos. Já na camada imediatamente inferior (40 a 60 cm), todos os tratamentos proporcionaram valores superiores ao crítico o que, em parte, pode ser atribuído ao adensamento natural do Nitossolo, verificado normalmente a partir de 50 cm.
Na linha central do canteiro, o preparo raso proporcionou limitação ao crescimento radicular a partir da faixa de 40 a 60 cm de profundidade, ao passo que nos tratamentos com descompactação profunda, essa limitação só ocorreu a partir da camada de 60 a 80 cm de profundidade.
Observa-se que, nas linhas de plantio, a resistência à penetração na faixa de 20 a 40 cm não diferiu entre os tratamentos, embora o preparo raso de solo só tenha sido feito até 20 cm de profundidade. Isso sugere que a pressão exercida pela roda do trator na região lateral aos canteiros durante as operações mecanizadas potencializou o efeito de readensamento do solo preparado e indica que, para se obter maior benefício da descompactação profunda, essa deve ser realizada o mais distante possível da linha de tráfego, que deve ser fixa na área, conforme o método denominado zero traffic, ou tráfego dirigido (Dickson et al., 1992; Young et al., 1993).
Benefícios à cultura da batata proporcionados pela melhoria das condições físicas do solo na linha de plantio foram anteriormente relatados, tais como aumento de produtividade de 10% (de 53,9 para 59,8 t ha-1) (Bishop & Grimes, 1978) ou de 14% (Dickson et al., 1992) e, embora na presente pesquisa os tratamentos não tenham influenciado a RSP na linha de plantio, a descompactação profunda se mostrou interessante para a cultura da batata, visto que a produtividade total de tubérculos (Tabela 1) diferiu significativamente entre o preparo raso de solo associado ao cultivo de milho (28,3 Mg.ha-1) e a descompactação profunda, também com cultivo de milho (32,9 Mg.ha-1). Deve-se considerar, entretanto, que essa diferença só foi significativa ao nível de 11% pelo teste F.
A produtividade superior, obtida com a descompactação profunda, está provavelmente relacionada aos menores valores de RSP na região central do canteiro, principalmente na faixa de 40 a 60 cm de profundidade. Nesse sentido, outro trabalho demonstrou a capacidade da batateira em explorar uma região do solo livre de compactação, também localizada externamente à linha de plantio (Young et al., 1993). Naquele trabalho, o espaço entre rodas de um mesmo eixo (bitola) dos tratores foi modificado para 2,8 m, de forma que, entre as linhas de tráfego, coubessem três linhas de plantio, espaçadas em 0,81 m. Aqueles autores não encontraram diferença entre as plantas provenientes das linhas laterais (adjacentes às linhas de trânsito) e as coletadas na linha central, que não sofreu influência do pisoteio, e isso se deveu à exploração do solo da região central pelas raízes das plantas laterais (Young et al., 1993).
Ao se considerar o preço da saca de batata como R$ 50,00, o aumento da receita bruta devido ao incremento na produtividade de 4,6 t ha-1, obtido com a descompactação profunda, seria de R$ 4.600,00 por hectare. Observa-se, no entanto, que tal ganho financeiro só é vantajoso quando o incremento no custo das atividades de preparo de solo não supera esse valor, o que depende de fatores como o preço do combustível e o estado de compactação ou adensamento do solo. Por outro lado, benefícios principalmente de ordem ambiental podem advir da descompactação profunda, tais como o aumento da infiltração de água e a consequente redução da erosão do solo, que é um problema preocupante na cultura da batata.
A proporção, em massa, de tubérculos pertencentes à classe "Diversas" (diâmetro inferior a 4 cm) diferiu estatisticamente entre preparo raso (5,1%) e descompactação profunda com milho (2,9%) e capim braquiária (2,2%) (Tabela 1). Já a proporção de tubérculos na classe "Comercial" (diâmetro de 4 a 10 cm) e "Superior" (diâmetro maior que 10 cm) não apresentou diferença entre os tratamentos. Os valores médios para a classe comercial variaram de 91,4% na descompactação profunda com capim braquiária a 83,4% no preparo raso com milho e, para a classe superior, de 11,4% no preparo raso com milho a 5,3% na descompactação profunda com o capim tanzânia.
Verifica-se, dessa forma, o potencial da descompactação profunda em aumentar não somente a produtividade, mas também a qualidade dos tubérculos, o que corrobora resultados de outros trabalhos em que se obteve, por exemplo, aumento de 4,6% (3,8 t ha-1) na produtividade em tubérculos de tamanho superior, sem que a produtividade total sofresse aumento, ou, ainda, aumento de 5,6 t ha-1 na produtividade de tubérculos de tamanho superior, com incremento na produtividade total de apenas 4,2 t ha-1 (Sojka et al., 1993).
As quantidades de tubérculos com sintomas de ataque de pragas, doenças e lenticelose não diferiram estatisticamente entre os tratamentos e apresentaram altos coeficientes de variação, que foram superiores a 30%, com exceção à sarna prateada (16,7%). Embora a ocorrência média de Diabrotica speciosa (37,3%) e Helminthosporium solani (64,0%) tenha sido elevada, sintomas de Rhizoctonia solani (2,8%) e Streptomyces scabies (4,8%) foram encontrados em menos de 5% dos tubérculos. Verificou-se, numericamente, maior ocorrência de D. speciosa nos tratamentos em que se cultivou milho, certamente porque essa cultura é também hospedeira do inseto. Em outros trabalhos verificou-se redução de doenças em diversas culturas, relacionada à melhoria da drenagem proporcionada pela descompactação profunda (Joubert & Labuschagne, 1998; Labuschagne & Joubert, 2006; Copas et al., 2008) e, dessa forma, não se descarta, por hipótese, a possibilidade de se verificar influência do preparo de solo sobre a ocorrência de pragas e doenças após um maior número de plantios de batata, superior ao realizado neste trabalho (dois anos). Ressalta-se, ainda, a importância do monitoramento do grau de umidade do solo, para verificação da ocorrência de encharcamento e também de sua duração.
Do exposto, evidencia-se que a descompactação profunda proporcionou menor resistência à penetração do solo na região central do canteiro, especialmente na camada de 40 a 60 cm de profundidade, o que esteve associado a maiores produtividades da cultura da batata independentemente da gramínea antecessora, embora não tenha influenciado a ocorrência de danos por pragas, doenças e lenticelose nos tubérculos.
AGRADECIMENTOS
À MAFES Equipamentos Agrícola pela criação e disponibilização das máquinas para a descompactação profunda de solo e plantio da batata, à CAPES e à FAPESP (processo nº 2007/05562-6) pela concessão de bolsa de pós-graduação ao primeiro autor.
(Recebido para publicação em 22 de junho de 2009; aceito em 4 de novembro de 2009)
(Received in June 22, 2009; accepted in November 4, 2009)
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Efeito da descompactação profunda de solo na produção da cultura da batata
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
17 Maio 2010 -
Data do Fascículo
Dez 2009
Histórico
-
Aceito
04 Nov 2009 -
Recebido
22 Jun 2009