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Comunidades terapêuticas: “novas” perspectivas e propostas higienistas

Therapeutic communities: “new” outlooks and public health proposals

Resumo

Problemas decorrentes do uso/abuso de álcool e outras drogas agravam-se continuamente. Existem, atualmente, medidas polêmicas que visam a soluções imediatas, como o financiamento público das comunidades terapêuticas. Analisam-se, aqui, possíveis aproximações do legado higienista do início do século XX em questões que envolvem o uso/abuso de substâncias psicoativas com as propostas de intervenção das comunidades terapêuticas atuais. Realizou-se pesquisa com fontes primárias, inspirada na vertente do materialismo histórico. Entende-se que os problemas decorrentes do uso/abuso de drogas continuam deixando o ônus maior aos usuários, às pessoas ao redor e à saúde pública.

comunidades terapêuticas; políticas públicas; usuários de drogas; alcoólicos; higiene mental

Abstract

Problems related to alcohol and other substance abuse are on a steady rise. Certain controversial measures currently aim at immediate solutions, such as the public funding of therapeutic communities. The article draws comparisons between the legacy of early twentieth-century public health practices in psychoactive substance abuse and current proposals for intervention through therapeutic communities. The study researched primary sources from the perspective of historical materialism. Historically produced by society as a whole, problems stemming from substance abuse continue to place the greatest burden on users, the people around them, and public health.

therapeutic communities; public policy; drug users; alcoholics; mental health

Os tortuosos e centenários caminhos do mercado da “alegria”

Observamos que nos últimos anos o uso/abuso das drogas lícitas e ilícitas tem sido tema recorrente nas discussões que envolvem saúde, educação, assistência social, segurança pública, justiça, entre outras áreas. Certamente, a questão vem-se constituindo ao longo de décadas uma importante problemática e preocupação de diversos setores não só no Brasil, mas em diversos países do mundo. O Relatório Mundial sobre Drogas (UNODC, 2012UNODC. United Nations Office on Drugs and Crime. World Drug Report. Disponível em: http://www.unodc.org/unodc/en/data-and-analysis/WDR-2012.html. Acesso em: 8 ago. 2012. 2012.
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) informa que aproximadamente 27 milhões de pessoas apresentam problemas decorrentes do consumo de drogas ilícitas em todo o mundo, resultando em cerca de 200 mil mortes a cada ano. E, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, 2,5 milhões de pessoas morrem por ano em consequência do abuso do álcool (WHO, 2012WHO. World Health Organization. Facts and figures: management of substance abuse. Disponível em: http://www.who.int/substance_abuse/facts/en. Acesso em: 4 jan. 2012. 2012.
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).

Diante do clamor da sociedade e da mobilização de alguns segmentos em busca de soluções para o problema, verificamos que a questão acaba sendo muitas vezes tratada, especialmente pela mídia, de forma superficial, com viés moralista e preconceituoso, e, mais ainda, como se fosse um fenômeno da atualidade. Com isso, segundo Gomes e Capponi (2012)GOMES, Bruno Ramos; CAPPONI, Marília. Álcool e outras drogas: novos olhares, outras percepções. In: Conselho Regional de Psicologia 6ª Região (Org.). Álcool e outras drogas. São Paulo: CRPSP. p.9-13. 2012., inviabiliza-se o debate democrático e se desvincula o problema de seu contexto e desenvolvimento sócio-histórico.

Exemplo de que a preocupação com o uso/abuso de substâncias psicoativas não é exclusividade dos dias atuais é a mobilização dos higienistas junto à Liga Brasileira de Higiene Mental (LBHM) no início do século XX. Essa entidade era composta por profissionais de diversas áreas, especialmente da psiquiatria, e muitos foram os seus investimentos e campanhas à causa do combate ao alcoolismo, que afligia a sociedade brasileira naquele período.

Influenciado por acontecimentos de abrangência mundial, como a Primeira Guerra Mundial e a crise econômica de 1929, o Brasil no início do século XX experimentava importantes mudanças sociais e econômicas, entre elas a transição do trabalho escravo para o trabalho livre, a mudança da sociedade rural agrária para a urbano-industrial e o processo imigratório, que culminou em aumento progressivo dos centros urbanos, resultando em sérios problemas sociais e sanitários (Basbaum, 1997BASBAUM, Leôncio. História sincera da República: de 1889 a 1930. São Paulo: Alfa Omega. 1997.). Nesse contexto, o alcoolismo passou a ser visto como um importante problema de saúde, social e econômico. Diante dessa demanda, as propostas e intervenções dos higienistas possibilitaram, em grande parte, importantes avanços em termos de sanitarismo e saúde, ainda que entender a historicidade dessas questões não fosse o forte desse grupo (Moura, Boarini, 2012MOURA, Renata Heller de; BOARINI, Maria Lucia. A saúde da família sob as lentes da higiene mental. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.19, n.1, p.217-235. 2012.).

Lembramos que, além do álcool, o consumo de outras drogas, como o ópio, a cocaína e a morfina, bem como suas consequências, também era abordado pelos higienistas (Bittencourt, 1935BITTENCOURT, Januario. Noções sobre a etiologia das doenças mentais para um curso de enfermagem. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.8, n.1, p.38-50. 1935.; Lopes, 1934LOPES, Ignácio Cunha. A propósito das toxicomanias raras ou menos freqüentes entre nós. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.7, n.2, p.111-119. 1934.). Mas isso não parecia ser preocupação contundente naquela época, visto que o consumo dessas substâncias, que normalmente se dava em meio à população mais abastada economicamente, era bem menor se comparado ao álcool e, até o início do século XX, algumas dessas drogas, como a cocaína e a heroína, não eram consideradas ilícitas e os seus fins terapêuticos eram divulgados abertamente nos meios de comunicação (ARU, 2001ARU. Addiction Research Unit. Department of Psychology. University at Buffalo. Before prohibition: images from the preprohibition era when many psychotropic substances were legally available in America and Europe. Disponível em: http://wings.buffalo.edu/aru/preprohibition.htm. Acesso em: 15 set. 2012. 2001.
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).

Dentre as atividades da LBHM, destacamos as campanhas antialcoólicas, por meio das quais profissionais divulgavam seus estudos junto à imprensa, realizavam conferências e palestras nas escolas, faculdades, indústrias, igrejas e outros ambientes públicos, com o objetivo de educar a população sobre os males provocados pelo álcool, formas de prevenção e tratamento dos dependentes. A LBHM também discutia medidas de regulamentação e proibição da fabricação, comercialização e consumo dessa substância, propondo, por exemplo, o aumento dos impostos sobre o álcool e a proibição da sua venda aos domingos e feriados (Cunha, 1934CUNHA, Haroldo Leitão da. Trabalhos de anti-alcoolismo: discurso do professor Leitão da Cunha. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.7, n.4, p.312-316. 1934.; Kehl, 1931KEHL, Renato. O alcoolismo infantil no Brasil. Boletim de Eugenia, v.3, n.30, p.8. 1931.;Lopes, 1930aLOPES, Ernani. Trabalhos de anti-alcoolismo. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.3, n.3, p.91-94. 1930a.).

Assim, o histórico, a abrangência e a complexidade das questões que envolvem o uso de substâncias psicoativas, como podemos em parte observar pelo trabalho desenvolvido pelos higienistas no início do século XX, indicam-nos que precisamos avançar nas discussões e no enfrentamento dessa situação. Como defendido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2011bCFP. Conselho Federal de Psicologia. Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos: locais de internação para usuários de drogas. Brasília: Conselho Federal de Psicologia. Disponível em: http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/noticias/noticiaDocumentos/Relatorio_Inspecao_Direitos_Humanos.pdf. Acesso em: 4 dez. 2011. 2011b.
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, p.12), “a urgência do tema não pode prescindir da amplitude de nossas discussões”. Isso porque se por um lado temos as consequências desse consumo atropelando o cotidiano de todos, por outro verificamos a mobilização descompassada de governos e diversas áreas da sociedade civil em torno da questão, conforme discutem Pitta (2011)PITTA, Ana Maria Fernandes. Um balanço da reforma psiquiátrica brasileira: instituições, atores e políticas. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4579-4589. 2011. e Andrade (2011)ANDRADE, Tarcísio Matos de. Reflexões sobre políticas de drogas no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4665-4674. 2011..

As iniciativas dos governos, ao lançar planos, decretos, portarias relativas à política de álcool e outras drogas, constituem passos importantes no enfrentamento desse problema. No entanto, segundo Andrade (2011)ANDRADE, Tarcísio Matos de. Reflexões sobre políticas de drogas no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4665-4674. 2011., essas políticas vêm sendo instituídas num contexto de pânico social relacionado ao uso do crack. A falta de diálogo que ainda se observa entre instâncias federais, estaduais e municipais, nos âmbitos da saúde, segurança pública, assistência social, tem gerado ações caóticas, que têm como alguns dos principais propósitos, segundo Maierovitch (14 jan. 2012MAIEROVITCH, Walter. O terror higienista. Carta Capital. Disponível em: www.cartacapital.com.br/sociedade/o-terror-higienista. Acesso em: 19 jan. 2012. 14 jan. 2012.
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), a limpeza do território e a dispersão dos “indesejados” para a periferia. Como Delgado (2011)DELGADO, Paulo Gabriel Godinho. Democracia e reforma psiquiátrica no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4701-4706. 2011. nos alerta, apesar da gravidade da situação, não podemos usar o terror e o pânico gerados pela questão das drogas para legitimar a internação prolongada, própria da ultrapassada cultura manicomial.

De qualquer forma, se a sociedade não dispõe de forma eficaz de serviços de atenção psicossocial distribuídos nos territórios, se essa rede ainda é insuficiente para a demanda levantada pelas consequências do uso/abuso das drogas lícitas e ilícitas, a internação e o isolamento acabam encontrando aceitação social (Delgado, 2011DELGADO, Paulo Gabriel Godinho. Democracia e reforma psiquiátrica no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4701-4706. 2011.), junto com as instituições que os promovem, como as comunidades terapêuticas (CTs), que nos últimos anos passaram a receber financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS) e a fazer parte da rede de atenção em saúde mental (Brasil, 23 dez. 2011BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n.3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso decrack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: Ministério da Saúde. 23 dez. 2011.).

O apoio e o financiamento a essas instituições têm alimentado várias polêmicas e discussões por parte de entidades e categorias interessadas no assunto, das quais participam profissionais, estudiosos e autoridades, principalmente das áreas da saúde, justiça e assistência social. Tais discussões levantam a questão de que, em algumas situações, as medidas que vêm sendo tomadas em torno dos usuários de drogas constituem ações de caráter higienista (Maierovitch, 14 jan. 2012MAIEROVITCH, Walter. O terror higienista. Carta Capital. Disponível em: www.cartacapital.com.br/sociedade/o-terror-higienista. Acesso em: 19 jan. 2012. 14 jan. 2012.
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; Sadi, Nublat, 11 dez. 2011SADI, Andréia; NUBLAT, Johanna. Governo erra ao focar o crack, diz médico. Folha de S.Paulo. Cotidiano. Disponível em: www.folha.uol.com.br. Acesso em: 1 mai. 2012. 11 dez. 2011.
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), reforçando o quão atual é a relação desse ideário com a questão das drogas.

Diante do exposto, o objetivo do presente estudo é analisar possíveis aproximações do legado higienista em relação às questões que envolvem o uso/abuso de substâncias psicoativas, com as propostas de intervenção das CTs atuais. Obviamente, a análise de fenômenos referentes a períodos históricos distintos deve ser feita com muita cautela, visto que ideias e fatos de uma época passada não podem ser mecanicamente transpostos para a atualidade e interpretados exclusivamente sob as lentes do contexto atual (Gephe, 2013GEPHE. Grupo de Estudos e Pesquisas sobre o Higienismo e o Eugenismo. Disponível em: http://www.ppi.uem.br/gephe/. Acesso em: 26 fev. 2014. 2013.
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).

Assim, é importante ressaltar que a relação que estabelecemos entre as CTs atuais e as instituições do início do século XX estão circunscritas a algumas de suas características e fundamentos de seu modelo de atenção. Até porque não encontramos o termo comunidade terapêutica nos documentos elaborados naquele período e, como sugere De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003., essa expressão parece ter sido popularizada somente a partir da década de 1960, nos EUA.

De qualquer forma, partimos do pressuposto de que essa relação existe. Como já defendido por Queiroz (2001)QUEIROZ, Isabela Saraiva de. Os programas de redução de danos como espaços de exercício da cidadania dos usuários de drogas. Psicologia: Ciência e Profissão, v.21, n.4, p.2-15. 2001., uma leitura atenta das propostas de tratamento moral e das colônias agrícolas (século XIX e início do século XX), e das CTs e fazendas de recuperação atuais, possibilita a observação das semelhanças entre seus fundamentos, ideologias e visões de mundo.

Igualmente, consideramos que a recuperação da história enquanto cenário de construção do conhecimento é um dos compromissos da pesquisa e, nestes termos, nos possibilita observar e discutir possíveis avanços, limitações e repetições sobre a forma como o Estado e a sociedade contemporânea têm enfrentado o problema das drogas, que se agrava continuamente e traz a urgência de repensarmos esse fenômeno e as possíveis e necessárias estratégias de enfrentamento. Isso não significa apontar soluções imediatas para um problema que há décadas vem se configurando; tampouco meramente criticar as propostas existentes, mas aprender com os seus impasses e limites, já evidenciados pela história.

Para atender ao objetivo proposto, realizamos uma pesquisa bibliográfica e documental com materiais que abordam a questão do álcool e de outras drogas, desde o início do século XX até as discussões atuais, com enfoque nas CTs.

Na investigação das propostas dos higienistas, trabalhamos com fontes primárias da primeira metade do século XX, principalmente os Arquivos Brasileiros de Higiene Mental (de 1925 a 1947) – periódico publicado pela Liga Brasileira de Higiene Mental.

Para fundamentar a discussão sobre a questão das drogas na atualidade, levantamos alguns documentos oficiais relativos às políticas públicas sobre álcool e outras drogas, além de obras de autores contemporâneos que pesquisam no campo da saúde mental, como Amarante (1994AMARANTE, Paulo Duarte de Carvalho. Asilos, alienados e alienistas. In: Amarante, Paulo Duarte de Carvalho (Org.). Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz. 1994., 1995AMARANTE, Paulo Duarte de Carvalho. Revisitando os paradigmas do saber psiquiátrico: tecendo o percurso do movimento da reforma psiquiátrica. In: Amarante, Paulo Duarte de Carvalho (Org.). Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: SDE/Ensp. 1995.), Bezerra Júnior (2007)BEZERRA JÚNIOR, Benilton Carlos. Desafios da reforma psiquiátrica no Brasil. Revista de Saúde Coletiva, v.17, n.2, p.243-250. 2007., Delgado (2011)DELGADO, Paulo Gabriel Godinho. Democracia e reforma psiquiátrica no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4701-4706. 2011.,Pitta (2011)PITTA, Ana Maria Fernandes. Um balanço da reforma psiquiátrica brasileira: instituições, atores e políticas. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4579-4589. 2011. e outros. Para abordar o tema das CTs, trabalhamos principalmente com De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003., que é considerado um dos principais autores nesse assunto.

Destacamos ainda que as leituras e análises que realizamos para o desenvolvimento desse estudo foram inspiradas na vertente do materialismo histórico. Assim, pretendemos esboçar em nossa discussão o entendimento do uso/abuso de substâncias psicoativas como um fenômeno datado historicamente e construído socialmente.

A conversão institucionalizada

Antes de analisar o legado higienista nas questões que envolvem o uso de drogas e as propostas das CTs, entendemos ser necessário pontuar algumas características gerais dessas instituições, bem como algumas críticas a esse modelo por parte de autores contemporâneos. Na sequência, apresentaremos as discussões atuais em torno do seu financiamento pelo SUS.

Segundo De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003., a ideia de comunidade terapêutica é verificada ao longo da história sob diferentes formatos. Em sua forma contemporânea, podemos dizer que surgiram duas grandes variantes dessas instituições: uma no campo da psiquiatria social, que consiste em unidades destinadas ao tratamento psicológico e guarda de pacientes psiquiátricos, dentro ou fora de ambientes hospitalares; e outra que são os programas de tratamento residencial para dependentes de álcool e outras drogas. São estes programas que constituem objeto do presente estudo.

Para o autor citado, a metodologia básica das CTs tem forte influência do modelo originário do grupo de Oxford, uma organização religiosa sediada em Nova York, fundada na década de 1920. Entre os ideais e práticas defendidos por esse grupo estavam a ética no trabalho, o cuidado mútuo, valores como honestidade e altruísmo, o reconhecimento dos defeitos de caráter e a reparação dos danos causados.

Na década de 1940, essa modalidade de intervenção se desenvolveu consideravelmente na Grã-Bretanha, inicialmente destinada ao tratamento de transtornos psiquiátricos, sendo posteriormente adaptada ao tratamento para usuários de drogas. Em 1953, essa proposta foi reconhecida quando o psiquiatra do exército inglês Maxwell Jones desenvolveu um modelo de internação para tratamento de soldados que estiveram na Segunda Guerra Mundial e que apresentavam traumas diversos (Raupp, Milnitisky-Sapiro, 2008RAUPP, Luciane; FEFFERMAN, Marisa; MORAIS, Maria de Lima Salum. A saúde pública e o atendimento aos usuários de crack. In: Boarini, Maria Lucia (Org.). Desafios na atenção à saúde mental. Maringá: Eduem. p.175-188. 2011.).

Durante os anos de 1950, as CTs tiveram repercussão como alternativa ao tratamento psiquiátrico manicomial, especialmente nos EUA. Por volta da década de 1960, surgiram as primeiras comunidades dedicadas exclusivamente ao tratamento da dependência de álcool e outras drogas, que tinham influência não só do grupo de Oxford, mas também dos princípios preconizados pelos Alcoólicos Anônimos, originado em 1935 (De Leon, 2003DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003.; Obid, 2007OBID. Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas. Tratamento/modelos/comunidade terapêutica. Disponível em: www.obid.senad.gov.br. Acesso em: 22 jan. 2012. 2007.
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).1

De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003. discute ainda que os primeiros responsáveis pelo tratamento em CTs eram os dependentes químicos e alcoólicos em recuperação, mas em seu formato mais recente essas instituições passaram a sofrer influência das áreas da educação, medicina, psiquiatria, direito, religião e ciências sociais. Apesar essas mudanças não terem modificado os princípios essenciais da abordagem das CTs, elas possibilitaram que a mesma deixasse de ser considerada uma abordagem de autoajuda esotérica e alternativa, para então ser entendida como uma “modalidade de atenção humana inserida na corrente principal” (p.27).

Com a multiplicação de iniciativas desse tipo na América do Norte, a experiência foi exportada para alguns países da Europa e, posteriormente, para a América Latina, Ásia e África. No Brasil, segundo Alves (2009)ALVES, Vânia Sampaio. Modelos de atenção a saúde de usuários de álcool e outras drogas: discursos políticos, saberes e práticas.Cadernos de Saúde Pública, v.25, n.11, p.2309-2319. 2009., as CTs, em sua maioria instituições não governamentais, iniciaram na década de 1970 e tiveram maior expansão na década de 1990. Para Costa (2009)COSTA, Selma Frossard. As políticas públicas e as comunidades terapêuticas nos atendimentos à dependência química. Serviço Social em Revista, v.11, n.2, p.1-14. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/ssrevista. Acesso em: 1 nov. 2011. 2009.
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, tais entidades foram implantadas antes da efetivação das políticas públicas sobre álcool e outras drogas no país, ocupando a lacuna deixada pelos serviços públicos.

No que se refere aos princípios que embasam o atendimento proposto pelas CTs, verifica-se em Raupp, Fefferman e Morais (2011)RAUPP, Luciane; MILNITISKY-SAPIRO, Clary. A “reeducação” de adolescentes em uma comunidade terapêutica: o tratamento da drogadição em uma instituição religiosa. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v.24, n.3, p.361-368. 2008. que o modelo moral é predominante no atendimento disponível na maioria delas. Como destacado por Araújo (15 ago. 2003ARAÚJO, Marcelo Ribeiro de. Comunidades terapêuticas: um ambiente de tratamento comum, mas pouco estudado no Brasil. Disponível em: http://apps.einstein.br/alcooledrogas/novosite/atualizacoes/as_137.htm. Acesso em: 1 ago. 2011. 15 ago. 2003.
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, s.p.), “a forma assumida por uma comunidade terapêutica reflete a filosofia subjacente da organização que a fundou”, podendo ser marcadas por princípios religiosos, técnicas de autoajuda, terapia comportamental, abordagens psicanalíticas, entre outras. Mas, “independente da linha adotada e do nível de especialização do atendimento, grande maioria delas tem por objetivo a abstinência completa de qualquer tipo de substância” (Araújo, 15 ago. 2003ARAÚJO, Marcelo Ribeiro de. Comunidades terapêuticas: um ambiente de tratamento comum, mas pouco estudado no Brasil. Disponível em: http://apps.einstein.br/alcooledrogas/novosite/atualizacoes/as_137.htm. Acesso em: 1 ago. 2011. 15 ago. 2003.
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, s.p.).

Pozas (1998)POZAS, Jesus Martin. Comunidades terapéuticas en España: evolución histórica, situación actual y perspectivas. Instituto para el Estudio de las Adicciones. Disponível em: http://www.lasdrogas.info. Acesso em: 22 jan. 2012. 1998.
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e De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003. reconhecem as influências genéticas, fisiológicas e químicas que predispõem o indivíduo à dependência, mas entendem que a pessoa é considerada primordialmente responsável pelo seu transtorno e recuperação. Também se entende que, embora as pessoas se distingam em termos demográficos, sociais e psicológicos, a maioria das que estão em CTs partilha determinadas características, ainda que situacionais, como: deficit de percepção e julgamento, dificuldade de tomar decisões e de resolver problemas, bem como falta de capacidades educacionais, de aprendizagem, vocacionais, sociais e interpessoais. Assim, as diferenças individuais que se observam podem modificar planos específicos de tratamento, mas não alteram a meta de mudar a pessoa por inteiro.

Sabino e Cazenave (2005SABINO, Natalí Di Martino; CAZENAVE, Silvia de Oliveira Santos. Comunidades terapêuticas como forma de tratamento para a dependência de substâncias psicoativas. Estudos de Psicologia, v.22, n.2, p.167-174. 2005., p.172) entendem que as CTs têm como objetivo possibilitar aos pacientes “amadurecimento pessoal” e reinserção social, permeados por valores como “espiritualidade, responsabilidade, honestidade, solidariedade”. Por outro lado, consideram que a metodologia de tratamento, que em geral é a internação em isolamento por alguns meses, requer mais estudos para se verificar se a readaptação social tende a suscitar recaídas nos dependentes.

Como defende De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003., para as CTs é fundamental separar o dependente de seu ambiente físico, social e psicológico, uma vez que este normalmente está associado à perda de controle e a um estilo de vida disfuncional. Assim, essa separação possibilita aos usuários estar longe das drogas, cuja facilidade de acesso constitui uma das principais razões para a desistência do tratamento, e permite que eles se vinculem gradativamente à CT e à sua filosofia de vida.

No estudo de Goffman (2008)GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Perspectiva. 2008. sobre “instituições totais”, verifica-se que a vinculação e o enquadramento aos pressupostos de uma instituição fechada levam o indivíduo a uma “mortificação do eu”, à perda de sua identidade e a intenso sofrimento. Valderrutén (2008)VALDERRUTÉN, María del Carmen Castrillón. Entre “teoterapias” y “laicoterapias”: comunidades terapéuticas en Colombia y modelos de sujetos sociales. Psicologia e Sociedade, v.20, n.1, p.80-90. 2008. discute o fato de que, semelhantes ao papel dos asilos como destino para leprosos e loucos de séculos anteriores, as CTs atuais, com suas práticas psicoterapêuticas e discursos moralizantes, constituem uma das formas contemporâneas de exclusão, para onde devem ir os seres humanos considerados “interditados”.

Em pesquisa realizada por Oliveira (2009)OLIVEIRA, Mírian Gracie Plena Nunes. Consultório de rua:relato de uma experiência. Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia, Salvador. 2009., verificou-se que, apesar das CTs serem as opções de tratamento mais conhecidas pelos usuários de drogas em situação de rua, aqueles que haviam passado por esse tipo de intervenção alegavam que o haviam abandonado em função da rigidez das normas dessas instituições, da rotina “enfadonha” de orações ao longo do dia, além da dificuldade de adaptação e permanência, já que a abstinência nem sempre é possível e desejada por todos os usuários.

Quanto à organização do tempo de tratamento observado nas CTs, apesar de algumas variações existentes, verificamos que em geral o processo é dividido em estágios, como triagem, desintoxicação, incorporação dos princípios e reinserção social. Trabalha-se normalmente com nove a 12 meses de internação. De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003. reconhece, porém, que a maioria dos residentes internados acaba saindo nos noventa dias de admissão, o que inviabiliza sua preparação efetiva para a vida na sociedade e, desse modo, o processo de mudança esperado.

Para Birman e Costa (1994)BIRMAN, Joel; COSTA, Jurandir Freire. Organização de instituições para uma psiquiatria comunitária. In: Amarante, Paulo Duarte de Carvalho (Org.).Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Fiocruz. p.41-72. 1994., as CTs, juntamente com os movimentos da psicoterapia institucional e psiquiatria comunitária, que se desenrolaram principalmente na década de 1960, tiveram início dentro do processo de crítica à estrutura asilar de tratamento dos transtornos mentais. Mas apesar de se diferenciar em alguns pontos, as modalidades de atenção que surgiram como contraponto ao modelo asilar contemplam em si a mesma ideia: de que promover a saúde mental consiste num processo de adaptação social.

Amarante (1995)AMARANTE, Paulo Duarte de Carvalho. Revisitando os paradigmas do saber psiquiátrico: tecendo o percurso do movimento da reforma psiquiátrica. In: Amarante, Paulo Duarte de Carvalho (Org.). Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: SDE/Ensp. 1995. complementa tal ideia, defendendo que, apesar de as CTs representarem uma proposta diferente dos manicômios, tais instituições não deram conta de resolver a questão da exclusão, e consequentemente do tratamento dos internos, uma vez que se criam condições ideais dentro da instituição que não se sustentam quando o egresso se depara com o mundo real.

Em um breve percurso pelos documentos oficiais que abordam as políticas públicas sobre álcool e outras drogas no Brasil, observamos que as CTs até 2010 estavam ligadas somente ao Sistema Único de Assistência Social,2 não fazendo parte da cobertura do SUS. Entretanto, tendo em vista o avanço do problema das drogas no país – especialmente do crack –, a rede de atenção psicossocial incompleta e as pressões da sociedade em geral clamando por uma solução, o Ministério da Saúde estipulou o apoio financeiro com recursos do SUS às CTs (Brasil, set. 2010BRASIL. Sistema Único de Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão Organizadora da 4a Conferência Nacional de Saúde Mental, Intersetorial. Relatório final da 4aConferência Nacional de Saúde Mental, Intersetorial. Brasília: Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde. 2010.).

Em 30 de junho de 2011, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovou a resolução da Diretoria Colegiada n.29 (Brasil, 30 jun. 2011BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada n.101, de 30 de maio de 2001. 30 maio 2001.), que substituiu a resolução n.101 (Brasil, 30 maio 2001BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada n.101, de 30 de maio de 2001. 30 maio 2001.), propondo modificações para que essa norma se adequasse à realidade das CTs e possibilitando, nesse sentido, a entrada dessas entidades no SUS. Em dezembro de 2011, as CTs foram oficialmente incluídas na rede de atenção psicossocial, através da portaria n.3.088 (Brasil, 23 dez. 2011BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n.3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso decrack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: Ministério da Saúde. 23 dez. 2011.).

Ainda no final de 2011, o governo federal lançou um plano com o sloganCrack, é possível vencer”, concentrando as ações em três eixos: cuidado, autoridade e prevenção (Brasil, 2012BRASIL. Governo Federal. Crack, é possível vencer. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/enfrentandoocrack/publicacoes/artigos. Acesso em: 26 jun. 2012. 2012.
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). Com isso, as CTs podem elaborar projetos para receber verbas federais, desde que atendam a alguns critérios, como a presença de um responsável técnico de nível superior legalmente habilitado, a permanência voluntária do interno na instituição, o respeito à sua crença religiosa, ideologia, orientação sexual (Brasil, 2014BRASIL. Observatório Crack, é possível vencer. Comunidades terapêuticas. Brasília: Ministério da Saúde. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/observatoriocrack/cuidado/comunidades-terapeuticas.html. Acesso em: 27 fev. 2014. 2014.
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).

Sabemos que a inclusão das CTs no SUS e outras medidas atuais relativas ao tratamento dos usuários de drogas têm levantado críticas e debates por parte de profissionais de saúde, conselhos de categorias profissionais e outras entidades interessadas.

O Conselho Federal de Medicina e a Associação Brasileira de Psiquiatria, por exemplo, contestaram as propostas de financiamento das CTs com recursos públicos, os quais deixam de ser investidos na ampliação da rede pública de saúde. Tais entidades destacaram também que muitas CTs substituem o tratamento médico por um programa terapêutico cuja eficácia não é comprovada cientificamente (Brasil, 2011BRASIL. Senado Federal. Médicos contestam comunidades terapêuticas.Em Discussão, ano 2, n.8, p.64-65. Disponível em: http://www.senado.gov.br/NOTICIAS/JORNAL/EMDISCUSSAO/dependencia-quimica.aspx. Acesso em: 28 ago. 2012. 2011.
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).

O Conselho Federal de Psicologia (2011a)CFP. Conselho Federal de Psicologia. Manifesto do CFP. Drogas: pelo tratamento sem segregação. Disponível em: http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/noticias/noticiaDocumentos/11_07_08_DROGAS_FINAL.pdf. Acesso em: 15 ago. 2011. 2011a.
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também se manifestou contra o financiamento das CTs pelo SUS, alegando que o cuidado dos usuários de drogas deve ser feito em liberdade, em uma rede diversificada e territorializada de serviços, que poderia contar com as equipes de saúde mental na atenção básica, com os centros de atenção psicossocial, unidades de acolhimento, consultórios de rua, leitos em hospitais gerais para os quadros de intoxicação e/ou abstinência grave e outros. Esses serviços, estando dentro dos pressupostos da reforma psiquiátrica, buscam preservar e resgatar os laços e o apoio sociofamiliar, diferente do que se observa nas CTs.

Segundo o psiquiatra Marcelo Kimati Dias (Drogas..., 24 jul. 2011DROGAS... Drogas e saúde pública: qual a dimensão do retrocesso? Debate com o psiquiatra Marcelo Kimati Dias. Blog Saúde Brasil. Disponível em: http://susbrasil.net/2011/07/24/twitcam-domingo-as-20hrs-drogas-e-saude-publica-qual-a-dimensao-do-retrocesso/. Acesso em: 5 jul. 2015. 24 jul. 2011.
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), com o financiamento dos leitos nas CTs não se fortalece a rede de atenção psicossocial, mas se cria uma rede paralela, não complementar. Nesse sentido, seria precipitado trazer tais entidades para a rede pública de saúde com o argumento de que os serviços atuais não estão dando certo, uma vez que, apesar de existirem há algum tempo, as próprias comunidades não deram provas de sua eficácia.

O mesmo argumenta que o incentivo às CTs com recursos públicos constitui um retrocesso com consequências muito sérias, uma vez que sinaliza a ideia de que deve existir um local específico para atender aos usuários de drogas, isolados de sua comunidade, o que contribui ainda mais para sua estigmatização. Além disso, os serviços que se pautam unicamente na abstinência acabam tendo uma adesão baixa por parte dos usuários.

Acrescentamos que a última Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em 2010, teve como um dos motes principais a garantia de que o cuidado dos usuários de álcool e outras drogas ocorra em rede diversificada de ações e serviços de base comunitária e territorial, defendendo-se então o não credenciamento pelo SUS de serviços especializados em alcoolismo e drogadição que impliquem internação de longa permanência (Brasil, 2010BRASIL. Sistema Único de Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão Organizadora da 4a Conferência Nacional de Saúde Mental, Intersetorial. Relatório final da 4aConferência Nacional de Saúde Mental, Intersetorial. Brasília: Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde. 2010.).

Como sugerem alguns autores, como Bezerra Júnior (2007)BEZERRA JÚNIOR, Benilton Carlos. Desafios da reforma psiquiátrica no Brasil. Revista de Saúde Coletiva, v.17, n.2, p.243-250. 2007., Daúd Júnior (2011)DAÚD JÚNIOR, Nacile. Considerações histórico-conceituais sobre a instituição psiquiátrica no Brasil e a desinstitucionalização do “doente mental”. In: Boarini, Maria Lucia (Org.). Desafios na atenção à saúde mental. Maringá: Eduem. p.93-126. 2011. e Luzio (2011)LUZIO, Cristina Amelia. Atenção psicossocial: reflexões sobre a reforma psiquiátrica e o cuidado em saúde mental. In: Boarini, Maria Lucia (Org.). Desafios na atenção à saúde mental. Maringá: Eduem. p.145-174. 2011., apesar de a rede de atenção comunitária ter sido ampliada no Brasil nos últimos anos, os dispositivos existentes ainda estão longe de dar conta de toda a demanda de atendimento aos usuários de álcool e outras drogas. Sendo assim, abre-se um espaço para a entrada de outros serviços no sistema público de saúde, como as CTs, que, segundo Pitta (2011)PITTA, Ana Maria Fernandes. Um balanço da reforma psiquiátrica brasileira: instituições, atores e políticas. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4579-4589. 2011., têm a oferecer apenas o enclausuramento do problema.

Discussões que atravessam décadas

Buscamos, nesse momento, abordar as concepções dos higienistas sobre questões que envolvem o uso/abuso de substâncias psicoativas, analisando o legado desse ideário em relação aos princípios das CTs e às discussões atuais acerca do álcool e de outras drogas.

Em linhas gerais, observamos que o uso/abuso do álcool ou de outras substâncias psicoativas, para os higienistas, estava relacionado a algum tipo de desvio, desajustamento, conflito ou inutilidade por parte do dependente (Lima, 1944LIMA, Claudio Araujo. Semana anti-alcoólica. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.15, n.1, p.84-86. 1944.). Para Carlos Augusto Lopes (1944LOPES, Carlos Augusto. Alcoolismo e higiene mental. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.15, n.1, p.105-107. 1944., p.105-106), no alcoolismo “esquece-se facilmente de tudo, a inteligência torna-se embotada, o raciocínio preguiçoso. A noção do cumprimento do dever, respeito à família, responsabilidade e honra desaparecem ... Torna-se ele, então, peso morto para a sociedade, inútil e nocivo à pátria”.

Aos dependentes de cocaína e ópio também era atribuído um determinado perfil psicológico, que em geral traziam a pecha de “espíritos débeis”, desequilibrados psiquicamente, portadores de taras degenerativas ou “loucos morais”, como destacou Cunha Lopes (1925LOPES, Ernani. Contra o alcoolismo: em favor da higidez mental.Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.1, n.1, p.148-166. 1925., p.122-123). Diante desse quadro, Carlos Penafiel, médico psiquiatra e membro da Comissão de Legislação Social da Câmara dos Deputados (1923, citado por Ernani Lopes, 1925LOPES, Ernani. Contra o alcoolismo: em favor da higidez mental.Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.1, n.1, p.148-166. 1925.), defendia que uma medida importante seria retirar os filhos de pais notoriamente ébrios e entregar as crianças para famílias honestas, sóbrias e trabalhadoras.

Verificamos, assim, que a imagem pejorativa e disfuncional dos usuários de drogas parece não ter sofrido alterações ao longo da história. De Leon (2003)DE LEON, George. A comunidade terapêutica: teoria, modelo e método. São Paulo: Loyola. 2003., por exemplo, aponta o perfil clínico típico das pessoas que utilizam drogas e frequentam as CTs, identificando nesses usuários disfunções sociais e interpessoais, problemas no âmbito educacional, na sua capacidade de percepção e julgamento.

Outro ponto que também não é exclusividade das discussões atuais é a associação entre o uso de substâncias psicoativas e a criminalidade. Segundo Juliano Moreira (1925)MOREIRA, Juliano. A seleção individual de imigrantes no programa da higiene mental. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.1, n.1, p.109-115. 1925., a internação de um dependente de drogas no manicômio, o mais cedo possível, era fundamental para prevenir os crimes que ele pudesse vir a causar. Em 1931, Moraes Mello publicou alguns estudos que indicavam o álcool como principal fator das causas da criminalidade e que a violência aumentava consideravelmente nos dias de folga, quando o consumo do álcool era maior (Tavares, 1931TAVARES, R. O alcoolismo em São Paulo. Boletim de Eugenia, v.3, n.30, p.7-8. 1931.).

Assim, no entendimento de grande parte dos higienistas, os problemas que envolviam a vida dos dependentes de álcool e outras drogas decorriam do seu vício. Da mesma forma, como discute Silveira (Nassif, 17 jan. 2012NASSIF, Maria Inês. Crack é usado por miseráveis porque é barato (Entrevista com Dartiu Xavier da Silveira). Carta Maior. Política. Disponível em: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19395. Acesso em: 19 jul. 2013. 17 jan. 2012.
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), a vulnerabilidade social em que vivem os usuários decrack e outras drogas na atualidade normalmente é vista como consequência desse consumo; enquanto que, por uma perspectiva sócio-histórica, esse consumo deveria ser entendido como sintoma dos problemas sociais.

Essa falta de estrutura social, na lógica da exclusão, acaba por legitimar a internação prolongada dos usuários de drogas em hospitais psiquiátricos e CTs, internação essa que, em meio ao pânico gerado pelas questões atuais docrack e outras drogas, encontra fácil aceitação social (Andrade, 2011ANDRADE, Tarcísio Matos de. Reflexões sobre políticas de drogas no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4665-4674. 2011.; Delgado, 2011DELGADO, Paulo Gabriel Godinho. Democracia e reforma psiquiátrica no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4701-4706. 2011.; Pitta, 2011PITTA, Ana Maria Fernandes. Um balanço da reforma psiquiátrica brasileira: instituições, atores e políticas. Ciência e Saúde Coletiva, v.16, n.12, p.4579-4589. 2011.). No início do século XX não era muito diferente. As dificuldades sociais em que vivia a população também ajudavam a justificar a internação prolongada dos pacientes psiquiátricos, com a diferença de que naquele período a história ainda deixava dúvidas sobre a eficácia do isolamento dessas pessoas.

Nesse sentido, para Gustavo de Rezende (1934)REZENDE, Gustavo de. A propósito da alta dos internados em hospitais de psicopatas. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.7, n.3, p.222-225. 1934., a alta dos pacientes internados em manicômios deveria ser muito bem ponderada, já que o meio familiar ao qual voltariam os egressos muitas vezes não lhes forneceria condições adequadas para a manutenção do seu tratamento. Na lei antialcoólica proposta pela LBHM em 1931, consta como prioridade, dentro dos serviços assistenciais, a criação de reformatórios para alcoolistas e toxicômanos e o amparo das famílias dessas pessoas no meio social (LBHM, 1931LBHM. Liga Brasileira de Higiene Mental. Editorial. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.3, n.8, p.122. 1930.). Para Cunha Lopes (1925)LOPES, Ernani. Contra o alcoolismo: em favor da higidez mental.Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.1, n.1, p.148-166. 1925., a internação dos dependentes, além de necessária, deveria ser obrigatória para evitar que esses indivíduos cometessem crimes ou que se perdessem moralmente por completo. E, dependendo do seu estado mental, a sociedade deveria recorrer até à interdição ampla ou limitada dessas pessoas.

Vale acrescentar que, para os higienistas, as medidas de controle do avanço do alcoolismo e o tratamento dos dependentes deveriam partir tanto das entidades públicas como da iniciativa privada. Leitão da Cunha (1934)CUNHA, Haroldo Leitão da. Trabalhos de anti-alcoolismo: discurso do professor Leitão da Cunha. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.7, n.4, p.312-316. 1934., como exemplo, afirmou a importância de se incentivarem iniciativas particulares na organização do combate ao alcoolismo. Assim, como defendido por Delgado, Macedo, Cordeiro e Rodrigues (Brasil, 2004), a prática de se retirar do Estado a responsabilidade pela atenção e tratamento dos usuários de drogas, como tem ocorrido com o incentivo às CTs atuais pelo setor público, tem raízes históricas e estruturais.

De qualquer forma, mesmo sem dados concretos que atestassem a efetividade da internação prolongada, essa era uma forma conveniente de se realizar a higiene social, como exemplificamos pelos seguintes dizeres de Penafiel (1923, citado por Ernani Lopes, 1925LOPES, Ernani. Contra o alcoolismo: em favor da higidez mental.Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.1, n.1, p.148-166. 1925., p.148):

É exato que o resultado obtido por estes asilos, tanto na Suíça como na América do Norte, não tem sido grande coisa, pois vale mais ou menos pelo seguinte: doentes curados, um terço; saídas com risco de recaídas, um terço; doentes que saem incuráveis, outro terço. Em todo caso trata-se de um bom paliativo, a que no interesse coletivo e dos próprios doentes a sociedade precisa recorrer.

E como lembrado por Silva Filho (2007)SILVA FILHO, João Ferreira da. A medicina, a psiquiatria e a doença mental. In: Tundis, Silvério Almeida; Costa, Nilson do Rosário (Org.).Cidadania e loucura: políticas de saúde mental no Brasil. Petrópolis: Vozes. p.75-102. 2007., essa necessidade urgente e absoluta de internação da pessoa com transtorno mental, visando a sua própria segurança, de seus familiares e da sociedade como um todo, era ainda mais urgente para aqueles pertencentes às classes mais pobres da população.

Acompanhando a defesa da internação e do isolamento, como medidas principais preconizadas por grande parte dos higienistas para tratamento dos dependentes de álcool e outras drogas, tínhamos o proibicionismo como perspectiva predominante em relação ao uso de substâncias psicoativas. Muckermann (1929)MUCKERMANN, Hermann. Eugenia e alcoolismo (continuação e conclusão).Boletim de Eugenia, v.1, n.8, p.5-6. 1929. defendia que uma das formas para combater os danos do alcoolismo seria a proibição do uso do álcool no período de desenvolvimento do homem até o fim da sua maturidade. Henrique Roxo (1925)ROXO, Henrique. Trabalhos originais: higiene mental.Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.1, n.2, p.1-9. 1925. e Carlos Werneck (1929)WERNECK, Carlos. Trabalhos de antialcoolismo: discurso do dr. Carlos Werneck. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.2, n.2, p.87-90. 1929.demonstraram a sua convicção em relação à necessidade de se instituir a lei seca no Brasil, apesar de reconhecerem que essa opinião não era unânime na sociedade brasileira e em diversos países do mundo, nem mesmo entre a classe médica.

Outro ponto que buscamos destacar, semelhante às CTs atuais, é o trabalho como terapêutica utilizada nos asilos e colônias do início do século XX. A LBHM defendia, em 1934, que uma de suas aspirações era a criação de casas de trabalho para “doentes mentais” convalescentes, como já existiam na Itália. Ferrer (citado por Lopes, 1933LOPES, Ernani. Consideraciones sobre el trabajo en los alienados.Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.6, n.4, p.316-324. 1933., p.322), abordando a questão da “laborterapia”, discutia inclusive a importância de se instituir nos manicômios a possibilidade de os internos subirem na hierarquia do trabalho que desempenhavam, iniciando com atividades mecânicas mais simples e passando progressivamente a outras mais complexas. Esse mesmo autor falava também sobre a necessidade de o enfermeiro viver junto dos internos, dentro dos próprios estabelecimentos, “para melhor observação do asilado, em todos os momentos da vida manicomial” (p.322).

Juliano Moreira (1929MOREIRA, Juliano. Trabalhos originais: reformatórios para alcoolistas. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.2, n.2, p.61-63. 1929., p.62), por sua vez, defendia a construção de reformatórios para alcoolistas, nos quais o trabalho manual, especialmente aquele voltado para as atividades agrícolas, seria empregado como principal terapêutica.

O sanatório especial deve ser construído de modo a ser um verdadeiro reformatório, com instalações próprias a manter os internados em atividade laboriosa, tendente a distraí-los o mais possível de suas tendências a se intoxicarem. Oficinas várias para os que tiverem maior aptidão para trabalhos manuais ou para os que para isto tiverem predileção. Essas oficinas serão a um tempo um centro de orientação profissional e uma verdadeira escola de aptidão a tal ofício. Como, porém, estamos em um país agrícola, maior deve ser a parte colonial do estabelecimento.

A valorização do trabalho como terapêutica obviamente não era uma proposta descontextualizada, mas incorporada à ideologia do nascente capitalismo brasileiro. Como discutido por Heitor Resende (2007RESENDE, Heitor. Política de saúde mental no Brasil: uma visão histórica. In: Tundis, Silvério Almeida; Costa, Nilson do Rosário (Org.).Cidadania e loucura: políticas de saúde mental no Brasil. Petrópolis: Vozes. p.15-73. 2007., p.48), a capacidade para o trabalho, naquela sociedade, era um dos marcos para se estabelecerem os limites do normal e do anormal, dos cidadãos e “pré-cidadãos”. Portanto, a prática psiquiátrica teria que se empenhar para devolver ao meio social indivíduos tratados e aptos para o trabalho.

Por outro lado, já no início do século XX também havia aqueles que questionavam o valor terapêutico do trabalho para os “alienados”.3 Del Greco (citado porLopes, 1932LOPES, Ernani. O significado psicológico-terapêutico do trabalho no tratamento dos doentes mentais. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.5, n.1, p.87-88. 1932.) levantou algumas objeções nesse sentido, apontando que o trabalho na maioria dos asilos era mecânico, coercitivo e sem relação com as disposições psicológicas dos internos. Segundo esse autor, para obter resultados favoráveis, seria necessário proporcionar aos “doentes” ocupações de caráter coletivo e em harmonia com algumas das tendências neles predominantes.

Do mesmo modo, encontramos na atualidade críticas ao trabalho empregado aos residentes nas CTs, uma vez que esse recurso muitas vezes não é utilizado com fins terapêuticos, mas como forma de manter o funcionamento da própria instituição, como verificado pelo Conselho Federal de Psicologia (2011b)CFP. Conselho Federal de Psicologia. Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos: locais de internação para usuários de drogas. Brasília: Conselho Federal de Psicologia. Disponível em: http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/noticias/noticiaDocumentos/Relatorio_Inspecao_Direitos_Humanos.pdf. Acesso em: 4 dez. 2011. 2011b.
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.

No início do século XX, como alternativa para melhorar a sua situação financeira, alguns hospitais-colônias adotavam o método de trabalho para os internos, com o objetivo de arrecadar verbas para o custeio das despesas da instituição. Apesar de ser usado o argumento de que não se tratava de um trabalho forçado, mas uma ocupação suave e benéfica para a saúde, os internos reclamavam da exploração que sofriam ao trabalhar sem remuneração direta (Caldas, 1935CALDAS, Mirandolino. Assistência a psicopatas em municípios-manicômios. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.8, n.1, p.89-106. 1935.).

Segundo Resende (2007RESENDE, Heitor. Política de saúde mental no Brasil: uma visão histórica. In: Tundis, Silvério Almeida; Costa, Nilson do Rosário (Org.).Cidadania e loucura: políticas de saúde mental no Brasil. Petrópolis: Vozes. p.15-73. 2007., p.51), outra contradição observada na adoção do trabalho, que em geral era agrícola, dentro das colônias, estava no fato de que “a nova e dinâmica lavoura cafeeira exportadora paulista pedia braços, é certo, mas é duvidoso que o hospício pudesse lhe fornecer o material humano eficiente e disciplinado de que necessitava”. Isso sem falar na crescente industrialização e urbanização pelas quais passava o país, que tornavam a reeducação para o trabalho rural um anacronismo.

Ademais, observamos que não é só pelo emprego do trabalho nas instituições de tratamento dos dependentes que as propostas dos higienistas se aproximam das intervenções realizadas nas CTs atuais. Flávio de Souza (1943SOUZA, Flavio de. Perigos da embriaguez. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.14, n.1, p.81-85. 1943., p.84) apresentou como seriam as casas de saúde para recuperação dos dependentes do álcool, abordando os tratamentos psiquiátrico, psicológico e moral pelos quais deveria passar o paciente durante a internação:

Aí ele será submetido à cura de abstinência, fará tratamento para as perturbações orgânicas nele encontradas e se sujeitará ao tratamento moral, feito não somente pelo médico especializado, mas também pelo pessoal do próprio estabelecimento, onde, além da abstinência completa, ele terá adequada psicoterapia, leituras especiais, contendo histórias, monografias e publicações a respeito dos desperdícios que o álcool é capaz de produzir.

Oswaldo de Camargo (1944CAMARGO, Oswaldo de. A higiene mental e o clero na luta antialcoólica. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.15, n.1, p.93-99. 1944., p.96) também apresentou um modelo de hospital-colônia já em funcionamento nos EUA em 1944, o qual poderia servir de exemplo para o Brasil.

Nesses estabelecimentos é feito acurado estudo da personalidade de cada paciente, e o tratamento compreende, sobretudo, o seguinte: fisioterapia, psicoterapia, terapêutica ocupacional pelo trabalho, reeducação, recreação, terapêutica pelo reflexo condicionador ... localização desta (instituição) em zona rural, detenção legal por um período indeterminado, essencial para o sucesso do tratamento.

Cumpre apontar que não encontramos relatos que mencionem o trabalho sistemático com a religião, característico de grande parte das CTs brasileiras, no tratamento dispensado aos internos dos hospitais-colônias do início do século XX.

Mas apesar das diferenças entre as instituições do passado e as atuais, e com o devido cuidado que devemos ter ao analisar fenômenos distantes no tempo, foi possível observar por meio desta pesquisa vários pontos defendidos pelos higienistas no início do século XX que convergem para as propostas das CTs. Pontos esses pautados fundamentalmente no isolamento, na internação prolongada e no proibicionismo em relação ao uso de álcool e outras drogas.

Apesar disso, assim como em qualquer momento histórico, outras propostas e necessidades ajudaram a compor a história e, nesse caso, os rumos da assistência aos usuários de drogas. Alguns estudiosos do início do século XX, que também faziam parte da LBHM, apresentavam críticas ao modelo manicomial, como exemplificado por Ernani Lopes (1930b)LOPES, Ernani. Trabalhos de anti-alcoolismo. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.3, n.7, p.247-251. 1930b., ao discutir como o tratamento dispensado aos alcoolistas internados nos hospícios não trazia resultados, e por Mirandolino Caldas (1935CALDAS, Mirandolino. Assistência a psicopatas em municípios-manicômios. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.8, n.1, p.89-106. 1935., p.95), que fez o seguinte questionamento: “De que vale toda a liberdade de ambulatória de que desfrutam dentro das Colônias, se o ambiente dessas Colônias é artificial e não satisfaz as exigências da vida normal do homem!?” Esse mesmo autor argumentava ainda que apenas um pequeno número de “doentes mentais” e alcoolistas oferecia perigo à coletividade e, portanto, a maioria deles poderia ser tratada preservando-se o seu vínculo familiar e social.

Podemos dizer que esses pensadores apontavam, então, para outra forma de atender as pessoas com transtornos mentais e usuários de substâncias psicoativas. Atenção essa que se aproximava de uma assistência intersetorial e buscava a convivência social e familiar dos egressos do manicômio. Caldas (1935)CALDAS, Mirandolino. Assistência a psicopatas em municípios-manicômios. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.8, n.1, p.89-106. 1935. apresentou, aliás, modelos de assistência aos “alienados” propostos em outros países, como o modelo de sociedade cooperativa do médico argentino Vidal Abal, que contribuiria para desonerar o governo dos altos custos que tinha para manter os hospitais psiquiátricos.

Desse modo, apesar do saber médico predominante no ideário higienista, grande parte dos profissionais que compunham a LBHM entendia o alcoolismo não exclusivamente como uma doença médica, mas, sobretudo, como um problema social (LBHM, 1930LBHM. Liga Brasileira de Higiene Mental. Editorial. Arquivos Brasileiros de Higiene Mental, v.3, n.8, p.122. 1930.). E, assim, parte dos higienistas já defendia um tratamento às pessoas com transtornos mentais e dependentes de álcool e outras drogas diferente daquilo que o modelo manicomial tinha a oferecer, seja por vislumbrar, de fato, condições mais humanas nessa atenção, seja por entender que o tratamento ambulatorial poderia ser menos custoso que a internação prolongada nos hospícios.

Também não podemos deixar de mencionar que essa nova concepção sobre as práticas psiquiátricas foi ganhando corpo com o desenvolvimento da psicofarmacologia, especialmente a partir de meados da década de 1950, quando os distúrbios mentais puderam ser mais facilmente controlados (Silva Filho, 2007SILVA FILHO, João Ferreira da. A medicina, a psiquiatria e a doença mental. In: Tundis, Silvério Almeida; Costa, Nilson do Rosário (Org.).Cidadania e loucura: políticas de saúde mental no Brasil. Petrópolis: Vozes. p.75-102. 2007.).

Enfim, resgatar o conhecimento produzido por esse grupo de pensadores do início do século XX nos ajuda a compreender um pouco mais da história da atenção aos usuários de drogas e da própria reforma psiquiátrica no Brasil, que, segundo Amarante (1994)AMARANTE, Paulo Duarte de Carvalho. Asilos, alienados e alienistas. In: Amarante, Paulo Duarte de Carvalho (Org.). Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz. 1994., tem em suas bases o conjunto de medidas proposto pelos psiquiatras no início do século XX, começando pela implantação do modelo de colônias na assistência às pessoas com transtornos mentais.

Considerações finais

Encaminhando para as considerações finais desse estudo, sem contudo pretendermos esgotar essa discussão, lembramos primeiramente que, apesar de os cenários do início do século XX e o atual serem diferentes em certo ponto, foi possível estabelecer paralelos entre as propostas de atenção aos usuários de substâncias psicoativas de ambos os períodos. Propostas essas que, em geral, fazem parte de um modelo pautado no isolamento e em ações de caráter proibicionista.

Em contraposição a essa perspectiva, observamos que nos últimos anos a redução de danos tem conquistado espaço na política sobre drogas.4 No entanto, a perspectiva proibicionista ainda se faz presente, associada a propostas, leis e normativas recentes, que veiculam os interesses de uma vertente moralista bem atuante junto ao poder público.

Observamos também que, no âmbito geral, o usuário de drogas, principalmente as ilícitas, continua associado a algo pejorativo, que deve ser escondido, isolado, sob o pretexto de se fazer “tratamento”, como verificamos nos pressupostos defendidos por boa parte dos higienistas. Como apontado por Costa-Rosa (2012COSTA-ROSA, Abílio da. Subjetividade e uso de drogas. In: Conselho Regional de Psicologia 6ª Região (Org.). Álcool e outras drogas. São Paulo: CRPSP. p.75-90. 2012., p.75), “ao mesmo tempo em que a loucura vai assumindo fisionomias mais familiares que não justificam seu isolamento social, eis que surgem prontos para a clausura manicomial os novos protagonistas”.

E as práticas utilizadas nos dispositivos que atualmente são chamados para resolver o problema – como as CTs – remetem-nos aos encaminhamentos adotados nos antigos asilos, colônias e reformatórios do início do século XX. Instituições essas, como verificamos em nosso estudo, que foram questionadas por integrantes do próprio movimento higienista, e cuja eficácia, historicamente, não apresenta registros de resultados positivos.

E a própria história nos indica ainda que os modelos e práticas de saúde que preconizam a segregação e internação prolongada, compulsória em muitos casos, de usuários de drogas e de outros indesejados parecem ter destino certo. Usando as palavras de Lima Barreto (1961BARRETO, Afonso Henriques de Lima. O cemitério dos vivos.São Paulo: Brasiliense. 1961., p.179), “os loucos são de proveniências as mais diversas; originam-se, em geral, das camadas mais pobres da nossa gente pobre. São pobres imigrantes italianos, portugueses, espanhóis e outros mais exóticos, são negros roceiros”.

Desse modo, se a clientela principal dos hospícios do início do século XX era formada por miseráveis, marginais, desempregados, imigrantes desocupados, índios, negros, “degenerados”, toda sorte de pessoas que poderiam ameaçar a ordem pública (Amarante, 1994AMARANTE, Paulo Duarte de Carvalho. Asilos, alienados e alienistas. In: Amarante, Paulo Duarte de Carvalho (Org.). Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz. 1994.; Resende, 2007RESENDE, Heitor. Política de saúde mental no Brasil: uma visão histórica. In: Tundis, Silvério Almeida; Costa, Nilson do Rosário (Org.).Cidadania e loucura: políticas de saúde mental no Brasil. Petrópolis: Vozes. p.15-73. 2007.), o alvo principal das medidas atuais de internação compulsória continua sendo a “escória” da sociedade, os desocupados da atualidade, em geral pessoas menos favorecidas social e economicamente, em um claro processo de limpeza das ruas, como apontado por Maierovitch (14 jan. 2012)MAIEROVITCH, Walter. O terror higienista. Carta Capital. Disponível em: www.cartacapital.com.br/sociedade/o-terror-higienista. Acesso em: 19 jan. 2012. 14 jan. 2012.
www.cartacapital.com.br/sociedade/o-terr...
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Ainda que o movimento pela reforma psiquiátrica tenha ganhado repercussão e, em tese, sejam esses os princípios que devem embasar o atendimento aos usuários de álcool e outras drogas, os hospitais psiquiátricos e demais instituições de internação prolongada continuam sendo admitidos dentro das políticas públicas de saúde mental e apoiados pela sociedade. Como discutido por Zenoni (2000)ZENONI, Alfredo. Qual instituição para o sujeito psicótico?Abrecampos, v.1, p.12-31. 2000., antes de existir para tratar o sujeito, a instituição de internamento serve a uma necessidade social, de assisti-lo e colocá-lo a distância.

Aliado ao aumento do uso/abuso de álcool e outras drogas, segundo Alves (2009ALVES, Vânia Sampaio. Modelos de atenção a saúde de usuários de álcool e outras drogas: discursos políticos, saberes e práticas.Cadernos de Saúde Pública, v.25, n.11, p.2309-2319. 2009., p.2316), “a explicação para este esforço de conciliação entre racionalidades divergentes no que se refere ao conteúdo e à organização das práticas de saúde pode ser remetida ao conflito de interesses entre representantes dos diferentes modelos assistenciais no país”.

Pontuamos ainda que o financiamento público das CTs, em detrimento do fortalecimento da rede pública de atenção aos usuários de álcool e outras drogas, soma-se a um conjunto de forças por parte de alguns setores que tentam enfraquecer o SUS (Borges et al., 2012BORGES, Fabiano Tonaco et al. Anatomia da privatização neoliberal do Sistema Único de Saúde: o papel das organizações sociais de saúde. São Paulo: Cultura Acadêmica. 2012.), que é uma importante conquista social, mas que não se coaduna ao modelo de sociedade vigente, a qual privilegia as ações da iniciativa privada. Com menos investimento de recursos em dispositivos públicos, aumentam-se as dificuldades para o seu pleno funcionamento e, com isso, incrementam-se as justificativas para a terceirização e privatização de outros serviços dessa natureza.

Por fim, queremos destacar que diferentes forças, interesses e necessidades, de cunho social, político e econômico, vêm tecendo a complexa história da saúde pública brasileira e da atenção aos usuários de drogas. Sabemos que os problemas decorrentes do uso/abuso de substâncias psicoativas, seja no Brasil ou em qualquer parte do mundo, não se restringem à esfera da segurança pública, da educação ou da saúde, que historicamente, em nosso entendimento, tem arcado com a maior parte dessa conta. As questões de cunho político-econômico também devem perpassar as discussões e as propostas de enfrentamento dessa problemática, questões essas que têm constituído importantes entraves às ações que priorizam a saúde e o desenvolvimento da autonomia dos usuários.

Assim, seja no apogeu do movimento higienista no Brasil ou na atualidade, interesses de alguns setores continuam atuando na manutenção de práticas que promovem a internação e o isolamento dos usuários de álcool e outras drogas, como a história vem nos mostrando por meio dos asilos, manicômios, hospitais-colônias, comunidades terapêuticas.

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  • ZENONI, Alfredo. Qual instituição para o sujeito psicótico?Abrecampos, v.1, p.12-31. 2000.

NOTAS

  • 1
    Esses e outros princípios estão explicitados nas cartilhas “Doze passos”, “Doze tradições” e “Doze conceitos”, demonstradas pela Junta de Serviços Gerais de Alcoólicos Anônimos do Brasil, disponibilizadas em http://www.alcoolicosanonimos.org.br.
  • 2
    A Norma Operacional Básica orienta sobre as ações da rede socioassistencial de proteção básica e especial, na qual se enquadram os serviços voltados para os usuários de substâncias psicoativas (Brasil, 2005BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Norma Operacional Básica. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. 2005.).
  • 3
    Entendemos que os “alienados” eram as pessoas com transtornos mentais, dependentes de substâncias psicoativas e outros que poderiam perturbar a ordem social e que faziam parte da clientela dos asilos, manicômios e demais instituições de internamento no início do século XX (Amarante, 1994AMARANTE, Paulo Duarte de Carvalho. Asilos, alienados e alienistas. In: Amarante, Paulo Duarte de Carvalho (Org.). Psiquiatria social e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz. 1994.).
  • 4
    A redução de danos passou a ser considerada no Brasil, fundamentalmente a partir da década de 1990, uma importante estratégia de ação junto às políticas públicas de atenção aos usuários de álcool e outras drogas. Por essa perspectiva, as intervenções propostas têm como objetivo minimizar os danos à saúde, os prejuízos sociais e econômicos vinculados ao consumo de drogas, sem com isso proibi-lo, partindo-se do pressuposto de que o consumo de drogas faz parte da história da humanidade e que a ideia de uma sociedade completamente livre de drogas é utopia (Brasil, jan. 2011BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas. Saúde mental no SUS: as novas fronteiras da reforma psiquiátrica. Brasília: Ministério da Saúde. jan. 2011.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    Ago 2013
  • Aceito
    Abr 2014
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