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A psicologia nos manuais de didática, a didática dos manuais de psicologia: inovações pedagógicas na fronteira entre as disciplinas (Brasil, 1900-1960)

Psicología en los libros de texto de didáctica, didáctica en los libros de texto de psicología: innovaciones educativas en la frontera de las disciplinas (Brasil, 1900-1960)

Psychology in textbooks, didactics in psychology textbooks: Educational innovations at the frontier of disciplines (Brazil, 1900-1960)

La psychologie en manuels de didactique, la didactique en manuels de psychologie: innovations pédagogiques à la frontière des disciplines (Brésil, 1900-1960)

Resumo

No intuito de compreender como as ideias de inovação pedagógica são dadas a ler aos professores, este artigo analisa manuais de Didática e Psicologia usados na Escola Normal entre 1900 e 1960. A pesquisa mapeia os autores desses livros, analisando também seus prefácios, sumários e conteúdos. Isso permite notar ideias e conceitos comuns aos manuais das diferentes disciplinas. Mesmo depois da divisão delas em matérias mais autônomas, nos anos 1930, a proximidade dos conteúdos permanece. Em alguns casos, os mesmos autores dedicam-se ao ensino e à escrita de manuais de Didática e de Psicologia; também é possível observar que certos temas, enunciados e autores de referência atravessam as suas fronteiras, em especial aqueles relacionados ao movimento da Escola Nova. Nota-se uma certa primazia da Psicologia sobre a Didática e outras áreas afins nos programas da Escola Normal, como foi o caso da Pedagogia, da Metodologia e da Prática de Ensino.

Palavras-chave:
manuais de ensino; discursos pedagógicos; Escola Normal

Resumen

Para comprender cómo las ideas de innovación pedagógica se ponen a disposición de los docentes, este artículo analiza los manuales de Didáctica y Psicología utilizados en la Escola Normal entre 1900 y 1960. La investigación mapea a los autores de estos libros, analizando también sus prefacios, resúmenes y contenidos. La separación entre estas asignaturas no estuvo siempre delimitada en los planes de estudio. Incluso después de su división en disciplinas autónomas en los años 30, las fronteras permanecieron permeables. En algunos casos, los mismos autores se dedicaron a la escritura de manuales de Didáctica y Psicología. Ciertos temas, enunciados y autores de referencia cruzaron sus fronteras, especialmente aquellos relacionados con la Escuela Nueva. Se nota una cierta supremacía de la Psicología sobre la Didáctica y otras áreas afines en los programas de la Escuela Normal, como fue el caso de la Pedagogía, la Metodología y la Práctica de la Enseñanza.

Palabras clave:
manuales de la enseñanza; discursos pedagógicos; Escuela Normal

Abstract

In order to understand how ideas of pedagogical innovation are made available to teachers, this article analyzes Didactics and Psychology manuals used in Normal Schools between 1900 and 1960. The research maps the authors of these books, also analyzing their prefaces, summaries and contents. Within the perspective of pedagogical disciplines history, it aims at highlighting that the separation of those subjects has not always been marked in the syllabuses. Even after they became autonomous subjects, in the 1930s, the borders remained porous. In some cases, the same authors have written Didactics and Psychology manuals. It was also possible to observe that certain themes, statements and reference authors crossed their discipline boundaries, especially those related to New School movement. It is noted that there is a certain prevalence of Psychology over Didactics and other areas in Normal School programs, as it happened to Pedagogy, Methodology and Teaching Practice.

Keywords:
teaching manuals; pedagogical discourses; Normal Schools

Résumé

Afin de comprendre comment les idées d'innovation pédagogique sont mises à la disposition des enseignants, cet article analyse les manuels de didactique et de psychologie utilisés à l'École Normale entre 1900 et 1960. La recherche cartographie les auteurs de ces livres, analysant également leurs préfaces, résumés et contenus. La séparation entre ces disciplines n'a pas toujours été délimitée dans le cours. Même après leur division en disciplines plus autonomes dans les années 1930, les frontières sont restées poreuses. Dans certains cas, les mêmes auteurs se sont consacrés à la rédaction de manuels de didactique et de psychologie. Certains thèmes, mots et auteurs de référence traversaient leur frontières, notamment ceux liés au mouvement de l'École Nouvelle. Il y a une certaine primauté de la psychologie sur la didactique et d'autres domaines connexes dans les programmes des écoles normales, comme c'était le cas pour la pédagogie, la méthodologie et la pratique pédagogique.

Mots-clés:
connaissances pédagogiques; Disciplines de l'École Normale; frontières de la didactique et de la psychologie; nouveautés pédagogiques

A história da formação de professores tem no estudo dos conteúdos ensinados na Escola Normal um campo fértil para compreender a maneira pela qual se constituem os saberes profissionais do magistério, especialmente aqueles que, segundo Maurice Tardif (2000TARDIF, M. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários: elementos para uma epistemologia da prática profissional dos professores e suas conseqüências com relação à formação do magistério. Revista Brasileira de Educação , jan-mar/2000, nº 13, p. 5-24.), dizem respeito aos conhecimentos pedagógicos. Este artigo analisa um conjunto razoavelmente representativo de manuais que dão conta dessa parte mais específica da docência, atentando para livros de Didática e Psicologia. O intuito é examinar o que coube a cada disciplina do curso ensinar aos futuros professores e como o tema da inovação pedagógica se fez presente em ambas, constituindo uma zona de intersecção entre elas, em que a fronteira a separá-las se mostrava porosa. Sabe-se que quando foi criada no Brasil, na década de 1830, a Escola Normal ensinava os conteúdos do ler, escrever e contar, ou seja, ela dava conta do mesmo programa a ser reproduzido pelas normalistas com seus alunos da escola primária (TANURI, 2000TANURI, Leonor. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, n.14, mai-ago/2000, p.61-68,). A Psicologia e a Didática (esta última com as vizinhanças que estabeleceu com a Pedagogia, a Metodologia e a Prática de Ensino no decorrer dos anos nos programas da Escola Normal) corresponderam a disciplinas de progressivo destaque sobretudo a partir da década de 1930, com seu caráter mais profissionalizante e voltado para as questões de ensino e educação (SILVA, 2018SILVA, Vivian Batista da. Saberes em viagem nos manuais pedagógicos: construções da escola em Portugal e no Brasil (1870-1970). São Paulo: Editora UNESP, 2018.).

Os manuais de ensino são um dos componentes da disciplina (CHERVEL, 1990CHERVEL, A. História das disciplinas escolares. Teoria & Educação, 2, 1990, p.177-229.; SILVA, 2018SILVA, Vivian Batista da. Saberes em viagem nos manuais pedagógicos: construções da escola em Portugal e no Brasil (1870-1970). São Paulo: Editora UNESP, 2018.; SILVA, 2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019.), pois estão relacionados a uma série de outros textos, oficiais ou programáticos aos quais eles se submetem; aos planos de ensino dos professores, feitos muitas vezes a partir da consulta aos manuais; às produções dos alunos. Eles poderiam ser chamados também de livros didáticos, portadores “dos conhecimentos básicos das diversas disciplinas que compuseram e ainda compõem o saber a ser difundido no interior das escolas” (GATTI JR., 1997GATTI JR, Décio. Livros didáticos, saberes disciplinares e cultura escolar: primeiras aproximações. História da educação. Vol. 1, n. 2. jul-dez/1997. Disponível: https://seer.ufrgs.br/asphe/article/view/30663
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, p. 31). Em sua tese de doutorado (GATTI JR., 1998GATTI JR, Décio. Livro didático e ensino de história: dos anos sessenta aos nossos dias. Tese de doutorado: PUCSP, 1998., p. 9-10), o autor assinala que esses livros são “os fiéis depositários dos saberes provenientes das diferentes disciplinas escolares”. Thomas S. Popkewitz (2000POPKEWITZ, Thomas. Lutando em defesa da alma. Porto Alegre: Artmed, 2000.) percebe que os livros didáticos são mais do que sistematizadores de um conhecimento, são um objeto que pretende determinar o que e como se vai aprender. Eles exercem seu papel na regulação das práticas escolares, na fragmentação do conhecimento e na direção do modo de pensar dos alunos.

Usados nas aulas das Escolas Normais para ensinar a ensinar, os manuais de ensino assumem uma dimensão especial da cultura escolar, que, como diria Agustín Escolano (2000ESCOLANO, A. Las culturas escolares del siglo XX. Encuentros y desencuentros. Revista de Educación, nº extraordinario, 2000, p.201-218.), refere-se à cultura científica ou pedagógica. Tais saberes têm “um sentido amplo que engloba os conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões) e as atitudes dos docentes, ou seja, aquilo que foi muitas vezes chamado de saber, de saber-fazer e de saber-ser”. (TARDIF, 2000TARDIF, M. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários: elementos para uma epistemologia da prática profissional dos professores e suas conseqüências com relação à formação do magistério. Revista Brasileira de Educação , jan-mar/2000, nº 13, p. 5-24., p. 212-213). Esses saberes podem provir de várias fontes, de sua vida familiar e pessoal, de sua formação escolar anterior, dos programas e livros didáticos usados nas escolas onde trabalham, de suas experiências profissionais e também de sua formação específica para o magistério. É justamente nessa última dimensão que podemos incluir os manuais de Didática e Psicologia, fontes privilegiadas para notar a presença das fronteiras propriamente disciplinares, suas linhas divisórias e a possível porosidade entre elas.

Embora os títulos aqui considerados não correspondam a todos os manuais de Didática e Psicologia usados nas Escolas Normais brasileiras durante o século XX1 1 Os trabalhos realizados por SILVA 2 (2019) foram feitos a partir do levantamento de 55 manuais de Didática, Pedagogia, Metodologia e Prática de Ensino publicados no Brasil entre 1870 e 1970. O material foi localizado a partir da busca em acervos de São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. LIMA (2020), por sua vez, percorreu 51 títulos de Psicologia usados nas Escolas Normais. , os 11 livros em pauta são especialmente importantes para o presente artigo porque evidenciam as conexões entre a Didática e a Psicologia, uma vez que seus autores escreveram tanto sobre Didática ou Pedagogia quanto sobre Psicologia em títulos separados, como fizeram Theobaldo Miranda Santos, Onofre de Arruda Penteado Júnior e Afro do Amaral Fontoura. Não se deve deixar de assinalar aqueles que trataram dos vários temas das disciplinas num único título, a exemplo de Valentim Magalhães e Lourenço Filho. Por fim, a leitura dos livros de Didática permite notar temas comuns àquilo que é tratado pela Psicologia, de modo a trazer para os textos que orientam o ofício de ensinar as referências tidas como mais legítimas. O quadro a seguir apresenta os títulos examinados (Quadro 1).

Quadro 1-
Manuais de ensino, seus títulos, autores e disciplinas (elaborado pelas autoras)

Nesses livros usados nas aulas de Didática e de Psicologia da Escola Normal, o que separa e o que aproxima efetivamente a Didática da Psicologia? Seria possível identificar analogias, temas, ideias ou outros traços comuns entre elas? Ou, diferentemente, as fronteiras entre elas são sempre claras e distintas? Com essas perguntas, nossa problemática recai sobre os modelos disciplinares com os quais os professores foram ensinados a ensinar. Para respondê-las, não se poderia deixar de esclarecer o conceito de disciplina e sua inserção no campo de estudos delineado por André Chervel (1990CHERVEL, A. História das disciplinas escolares. Teoria & Educação, 2, 1990, p.177-229.) num dos clássicos sobre o tema. Nesse sentido, mais do que “matérias” ou “conteúdos” de ensino, o termo pode remeter também para o controle e correção dos comportamentos dos alunos na escola. Na perspectiva que mais interessa aqui, a disciplina corresponde aos “tópicos do ensino”, à instrução que o aluno recebe do mestre, a uma espécie de “ginástica intelectual” realizada por meio de exercícios, exposições e encadeamentos de ideias, podendo até mesmo ser objeto da própria Pedagogia.

Considerando os casos específicos da Didática e da Psicologia, isso equivale a afirmar que eles são frutos da constituição da Escola Normal, criados por ela, nela e para ela (CHERVEL, 1990CHERVEL, A. História das disciplinas escolares. Teoria & Educação, 2, 1990, p.177-229.). Não decorrem simplesmente de uma simplificação das áreas de origem. Tais disciplinas combinam conteúdos mais ou menos encadeados em si, mobilizando objetos, métodos e práticas pedagógicas. Como qualquer outra disciplina escolar, ao selecionar conhecimentos, combiná-los, estabelecer uma ordem a eles, eleger formas de transmissão, “transforma os ensinos em aprendizagens”, graças ao caráter criativo e original do sistema escolar (CHERVEL, 1990CHERVEL, A. História das disciplinas escolares. Teoria & Educação, 2, 1990, p.177-229., p.182). É assim que se traçam os limites das disciplinas em cada época, imprimindo a cada uma delas uma problemática própria.

Entretanto, será que, ao se atentar para a Didática e a Pedagogia, não se poderia notar também alguns traços e aproximações em comum? Algumas pistas são dadas pelo encontro entre pesquisas já realizadas por manuais usados nas aulas da Escola Normal, mais especificamente sobre os manuais de Psicologia da Educação (LIMA, 2020LIMA, Ana Laura Godinho. A vontade de psicologia na formação de professores. 2019. 204 f. Tese (Livre Docência em História da educação ) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-11052021-122702 . Acesso em: 22 jan. 2024.
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) e aqueles que versam sobre questões diretamente ligadas ao ensino (SILVA, 2018SILVA, Vivian Batista da. Saberes em viagem nos manuais pedagógicos: construções da escola em Portugal e no Brasil (1870-1970). São Paulo: Editora UNESP, 2018., 2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019., 2020SILVA, Vivian Batista da. Projetos e heranças da escola moderna nos manuais pedagógicos (1870-1970). Curitiba: Appris Editora , 2020.)8 8 A confluência desses estudos e os seus atuais desdobramentos inserem-se num Projeto Temático financiado pela FAPESP e coordenado na FEUSP pelas professoras Diana Vidal e Carlota Boto. O título do Projeto e Saberes e práticas em fronteiras: por uma história transnacional da educação (1810-...) (Processo n. 2018/26699-04). . Desde quando as disciplinas profissionalizantes começaram a ter uma presença mais forte nos programas da Escola Normal, nos idos de 1930 aproximadamente (SILVA, 2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019.), os títulos desses livros destacaram os nomes das disciplinas: Lições de Pedagogia , Noções de Didática Geral, PsychologiaSAMPAIO DÓRIA, Antonio. Psychologia. São Paulo: Tipografia do Instituto Anna Rosa, 1926.9 9 A grafia original localizada no manual de ensino foi mantida. ; Psicologia Educacional e Noções de Psicologia educacional são exemplos de títulos de manuais de Psicologia e de Didática/Pedagogia que examinamos a seguir. Ao mesmo tempo, ao percorrer os sumários dos manuais, são notáveis listas de temas que são próximos ou se repetem. É dessa maneira que nos livros de Psicologia destinados à formação de professores são tratados temas pertinentes também à Didática, tais como: a atenção, o hábito, a aprendizagem, a linguagem, o desenho, os métodos inovadores de ensino.

Se a separação entre a Didática e a Psicologia nem sempre é visível, vale a pena retomar André Chervel mais uma vez, chamando a atenção para o fato de que as disciplinas “não estão sozinhas em jogo” (1990CHERVEL, A. História das disciplinas escolares. Teoria & Educação, 2, 1990, p.177-229., p.182). Há possíveis elos entre diferentes disciplinas, no que tange aos temas estudados e a um modo de relação com o saber. Trata-se de uma espécie de “atravessamento das fronteiras”. Alguns conteúdos podem estar presentes tanto numa disciplina como na outra. Os autores que escrevem sobre uma delas também se dedicam à outra. Explicações semelhantes são assim compartilhadas tanto do ponto de vista da Didática quanto do ponto de vista da Psicologia, partilhando uma “comunidade de sentido”. São, portanto, constitutivas da Didática e da Psicologia como disciplinas escolares e de suas fronteiras.

Essa noção de espaço delimitado é tradicionalmente colocada nas teorias que explicam a composição dos territórios nacionais e também pode ser útil aqui. Ao remontar à Geografia Política do século XIX e à consolidação dos Estados-Nação, Carla Holanda da Silva (2009SILVA, Carla Holanda. Território: uma combinação de enfoques - material, simbólico e espaço de ação social. Geografar, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 98-115, jan./jun. 2009., p. 100) ressalta os esforços de formação de um “espaço de poder demarcado, controlado e governado e, assim, fixo”. Como bem explica Benedict Anderson (2006ANDERSON, Benedict. Imagined Communities: Reflections on the Origin and Spread of Nationalism. London: Verso, 2006.), as fronteiras conformam um “vínculo imaginário” entre aqueles que compartilham o mesmo território e sua história. No caso dos espaços nacionais, destaca-se a naturalização de um limite entre o “nós” e o “eles” (MASSEY, 2008MASSEY, Doreen B. Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008.), estabelecendo uma barreira física e também simbólica para separar e hierarquizar quem está dentro e quem está fora. Se os territórios nacionais confinam, identificam e hierarquizam (MASSEY, 2008MASSEY, Doreen B. Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008.), considerações semelhantes podem ser postas para o caso das fronteiras disciplinares. Mais do que elencar conteúdos, encadeá-los, estabelecer-lhes uma lógica de compreensão e um modo de ensiná-los, as delimitações das disciplinas escolares dizem respeito àquilo que corresponde aos seus saberes, materiais e bibliografia. Na sua história, destacam-se disciplinas mais valorizadas e com espaços mais notáveis nos programas de ensino e na formação dos alunos (CHERVEL, 1990CHERVEL, A. História das disciplinas escolares. Teoria & Educação, 2, 1990, p.177-229.).

No que tange à Didática e à Psicologia, as fronteiras disciplinares estão intimamente vinculadas ao percurso histórico das Ciências da Educação. Essa dinâmica mais vasta remete ao final do século XIX, época de constituição do campo educacional e de uma pedagogia científica (NÓVOA, 1995NÓVOA, António. (1995) Uma educação que se diz nova. IN: CANDEIAS, A; NÓVOA, A; FIGUEIRA, M. H. Sobre a Educação Nova: Cartas de Adolfo Lima a Álvaro Viana de Lemos. Educa, Lisboa.). As heranças desse debate ainda estão presentes nos estudos educacionais e nos cursos de formação de professores, pois dizem respeito a uma ambiguidade ainda familiar entre nós. Talvez não seja exagerado afirmar uma certa primazia da Psicologia sobre a Didática e outras áreas afins nos programas da Escola Normal, como foi o caso da Pedagogia, da Metodologia e da Prática de Ensino.

Nessa perspectiva, a Didática é entendida como uma espécie de derivado da Psicologia. Esta assume assim um lugar basilar e a Didática configura como uma área de “aplicações de segunda mão”, como já sugeria Ferdinand Buisson em 1896 (NÓVOA, 1995NÓVOA, António. (1995) Uma educação que se diz nova. IN: CANDEIAS, A; NÓVOA, A; FIGUEIRA, M. H. Sobre a Educação Nova: Cartas de Adolfo Lima a Álvaro Viana de Lemos. Educa, Lisboa.). Pode-se supor que os atravessamentos de fronteiras entre as disciplinas são perspectivas interdisciplinares e, ao mesmo tempo, expressões do destaque da Psicologia em detrimento da Didática e das outras disciplinas que também estão mais diretamente ligadas ao ensino nos planos de estudos da Escola Normal? Convém saber ainda de que maneira as Ciências da Educação, especialmente a Didática e a Psicologia, chegam à Escola Normal. De que maneira esses conhecimentos habitam os modos pelos quais os professores compreendem e projetam seu ofício?

Um aspecto relevante para se compreender o atravessamento da fronteira entre a Psicologia e a Didática é o fato de que houve professores que lecionaram as duas disciplinas nas Escolas Normais e, entre esses, alguns se dedicaram à escrita de manuais para ambas. Neste artigo, a análise se concentra sobre esses livros, redigidos por autores que atravessaram a fronteira, com o objetivo de verificar se e como o tema das inovações pedagógicas comparecem tanto em uma quanto em outra, evidenciando a porosidade da fronteira entre elas. Busca-se perceber ainda se é possível identificar especificidades no modo como os enunciados sobre esse tema foram formulados no âmbito da Psicologia e da Didática, se se ajustaram aos requisitos de uma e outra disciplina ou se, em vez disso, caracterizam uma região de interseção na qual seus discursos se confundem. Para a compreensão desse aspecto, a análise inspira-se nas considerações feitas por Foucault em A Ordem do Discurso (2010/1970) sobre o modo como as disciplinas estabelecem certas exigências na formulação de seus próprios enunciados.

A Didática atravessada pela Psicologia

A Didática constituiu-se como uma das principais disciplinas de formação pedagógica do professor. Assim como ela, a Pedagogia, a Metodologia e a Prática de Ensino foram lugares dos programas destinados a ensinar a ensinar (SILVA, 2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019.). Uma série de estudos já realizados (TANURI, 2000TANURI, Leonor. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, n.14, mai-ago/2000, p.61-68,; VILLELA, 2000VILLELA, H. Da palmatória à lanterna mágica: a Escola Normal da Província do Rio de Janeiro entre artesanato e a formação profissional (1868-1876). Tese de doutorado: FEUSP, 2000.; SILVA, 2018SILVA, Vivian Batista da. Saberes em viagem nos manuais pedagógicos: construções da escola em Portugal e no Brasil (1870-1970). São Paulo: Editora UNESP, 2018., 2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019.) evidencia que por um longo período, a Didática teve um lugar secundário, seja por ocupar um pequeno tempo nos estudos das normalistas, seja por não ser reconhecida como uma área de conhecimento mais científica e legítima, reduzindo-se muitas vezes ao receituário de como proceder em sala de aula (CARVALHO, 1998CARVALHO, Marta. A Escola Nova e o impresso. In: FARIA FILHO, Luciano (org.) Modos de ler, formas de escrever. Belo Horizonte: Autêntica, 1998, p.65-86.). Quando da criação das primeiras Escolas Normais no Brasil, nas décadas de 1830 e 1840, a Didática sequer figurava como uma disciplina autônoma. A Lei provincial do Rio de Janeiro no. 1.127 de 1849 determinava nos planos de estudos a Aritmética, a Metrologia, a Álgebra, as Noções Gerais de Geometria teórica, os Elementos de Cosmografia e as Noções de Geografia e História. O currículo dava conta do programa a ser reproduzido pelas normalistas com seus alunos da escola primária e a parte mais profissionalizante ficava a cargo da Pedagogia e dos Métodos de Ensino, disciplina de caráter essencialmente prescritivo (TANURI, 2000TANURI, Leonor. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, n.14, mai-ago/2000, p.61-68,; VILLELA, 2000VILLELA, H. Da palmatória à lanterna mágica: a Escola Normal da Província do Rio de Janeiro entre artesanato e a formação profissional (1868-1876). Tese de doutorado: FEUSP, 2000.). Nesse momento, o magistério era entendido sobretudo como uma “vocação”.

Tal imagem foi redimensionada em diferentes partes do mundo graças ao nascimento intelectual e institucional da Ciência da Educação nos anos de 1880. De acordo com Nanine Charbonnel (1998CHARBONNEL, N. Pour une critique de la raison éducative. Berne: Peter Lang, 1998.), o intuito era incorporar a Pedagogia aos avanços científicos. O primeiro momento, situado nas décadas finais do século XIX, afirma a Pedagogia como algo que pode ser ensinado. Em seguida, durante as décadas iniciais do século XX, a chamada Pedagogia Experimental configura entre as chamadas Ciências da Educação e pressupõe a primazia da Psicologia: “O silogismo é simples: a Psicologia é uma ciência; a pedagogia é a Psicologia aplicada; logo a pedagogia é uma ciência” (NÓVOA, 1995NÓVOA, António. (1995) Uma educação que se diz nova. IN: CANDEIAS, A; NÓVOA, A; FIGUEIRA, M. H. Sobre a Educação Nova: Cartas de Adolfo Lima a Álvaro Viana de Lemos. Educa, Lisboa., p.29, grifos nossos).

Em 1900, as Lições de Pedagogia reúnem aulas de Valentim Magalhães, professor da matéria na Escola Normal. Toda a primeira parte do livro foi dedicada à Psicologia, cujos saberes foram mobilizados para extrair daí orientações sobre como proceder com o aluno e suas aprendizagens. Assim como ocorria à época no amplo conjunto das produções educacionais (CHARBONNEL, 1988CHARBONNEL, N. Pour une critique de la raison éducative. Berne: Peter Lang, 1998., p.28), as lições de Valentim situavam-se entre argumentos que explicavam a natureza humana, mas também visavam estabelecer regras e escolhas para o trabalho docente, o que era entendido como a parte cabível à Pedagogia. Nesse sentido, alerta que:

Infelizmente tanto os pais como os mestres não ligam a essas verdades [da Psicologia] a devida importância: por indolência mental ou por ignorância, consentem que as crianças adquiram hábitos prejudiciais que físicos, quer morais, e que mais tarde vão embaraçar enormemente a ação educativa de uns e de outros. Esquecem-se de que a criança é uma argamassa mole, maleável como o cimento, mas que, como ele, endurece e guarda a forma, as depressões, os vincos que se lhe imprimem. (MAGALHÃES, 1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900., p.20-21).

O manual de Magalhães (1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900.) explicou as noções de “alma” e “espírito” segundo as várias escolas filosóficas. Mobilizou essas noções para concluir que “a palavra alma ou espírito representa o conjunto dos fenômenos psicológicos, o conjunto dos fatos interiores, das faculdades humanas, e significa o oposto aos fenômenos fisiológicos (MAGALHÃES, 1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900., p.11). Também diferenciou o denominado “instinto” daquilo que nomeou como “vontade”. Distinções dessa natureza serviram para afirmar que:

Importantíssimo é o papel da vontade na educação. O educador deve ter sempre em vista a necessidade de fazer da criança um ser racional, consciente e autônomo. O aforismo pedagógico antigo: “Criança não tem vontade” está provado que envolve um erro grosseiro e pernicioso. A criança não deve ter vontades, mas sim vontade; deve querer, devemos ensiná-la a “saber querer”. ... a Psicologia entrou em fase nova, tendo abandonado os domínios nebulosos do racionalismo indefinido, para tomar por fase a observação direta dos fenômenos psicológicos, o conjunto dos fatos anteriores quando procura estabelecer o seu determinismo por meio da experimentação. (MAGALHÃES, 1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900., p.50-51).

Ao apresentar suas lições, Valentim Magalhães destacou seu caráter inovador à época.

... a Psicologia entrou em fase nova, tendo abandonado os domínios nebulosos do racionalismo indefinido, para tomar por fase a observação direta dos fenômenos psicológicos, o conjunto dos fatos anteriores quando procura estabelecer o seu determinismo por meio da experimentação. (MAGALHÃES, 1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900., p.11).

Ele quis “remediar a falta de compêndio - visto que nenhum foi adotado, por nenhum preencher todas as condições exigidas” para as aulas de Pedagogia. Na “Nota Preliminar” na qual expressou essa carência, o autor explicou também ter impresso as “lições ditadas às alunas, no decurso do ano de 1899, seguindo, mais ou menos, o programa impresso quanto à disposição e seqüência das matérias parciais”. Anuncia também ter se valido das “obras de Compayré, A. Rayot, Laloi e Picavet” (MAGALHÃES, 1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900., páginas sem número)

Entendidas como derivações do conhecimento científico, a Didática e outras disciplinas pedagógicas da Escola Normal foram ganhando maior espaço no caso brasileiro, sobretudo na década de 1930, graças à expressiva expansão do número de escolas e ao debate em torno de sua importância para a formação do magistério (TANURI, 2000TANURI, Leonor. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, n.14, mai-ago/2000, p.61-68,). Não se poderia deixar de mencionar também a força do movimento da Escola Nova, que se encontrava naquele momento em ampla expansão. Um dos livros mais usados nas aulas das normalistas foi a Introdução ao estudo da Escola Nova (2004), atualmente reconhecido como a “Bíblia dos educadores”. À página 11 da 14ª. edição do livro, em 2002, os editores lembraram que o movimento em destaque no manual era extremamente revolucionário. Em suas palavras, a Escola Nova era “quase que, em Educação, equivalente à reformulação do Sistema Solar de Copérnico e Galileu: o aluno passa a ser o centro do processo educativo, protagonista do processo ensino-aprendizagem, construtor do próprio conhecimento”.

A Introdução ao estudo da Escola Nova veio a lume pela primeira vez em 1930, reunindo as palestras de seu autor, Lourenço Filho, sobre as bases do movimento e as contribuições das várias ciências para a educação. Para Lourenço Filho (1930LOURENÇO FILHO, Manoel Bergström. Introdução aos estudos da Escola Nova. RJ: Editora UERJ, 2014.) o intuito era sintetizar as bases científicas para edificar uma escola pública e ordenada pelo Estado para se destinar a todos. Outros manuais pedagógicos publicados à época deixaram transparecer, já em seus títulos e índices, a atenção sobre esse movimento de renovação escolar (AUTORA 2, 2019), mas os modos pelos quais os autores se apropriaram e divulgaram o tema não eram idênticos ou concordantes entre si. Em Técnica da Pedagogia Moderna, manual publicado à mesma época, Everardo Backheuser (1934BACKHEUSER, Everardo, Manual de pedagogia moderna. RJ: Editora Globo, 1934.) anunciou o que considerava ser a “correta” sistematização do escolanovismo, explicando seus problemas teóricos e práticos à luz do catolicismo (AUTORA 2, 2019).

As páginas da Introdução ao estudo da Escola Nova (LOURENÇO FILHO, 1930LOURENÇO FILHO, Manoel Bergström. Introdução aos estudos da Escola Nova. RJ: Editora UERJ, 2014.) e da Técnica da Pedagogia Moderna (BACKHEUSER,1934BACKHEUSER, Everardo, Manual de pedagogia moderna. RJ: Editora Globo, 1934.) expressaram uma disputa pelo controle ideológico e organizacional da escola entre os chamados “católicos” e os “pioneiros”. Marta Carvalho (1998CARVALHO, Marta. A Escola Nova e o impresso. In: FARIA FILHO, Luciano (org.) Modos de ler, formas de escrever. Belo Horizonte: Autêntica, 1998, p.65-86.) esclarece que o primeiro grupo foi representado por nomes como os de Everardo Backheuser e outros membros do laicato intelectual da Igreja Católica. Lourenço Filho representou, por sua vez, os signatários do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova (1932) e dirigentes da Associação Brasileira de Educação atuantes no Governo junto a reformas educacionais. O antagonismo entre esses agrupamentos foi estimulado pela criação do Ministério da Educação e Saúde, em 1930, o que significou um esforço mais sistemático de estruturação do sistema de ensino no país e a possibilidade de ocupar postos de atuação. Tanto os “católicos” quanto os “pioneiros” utilizaram o impresso como uma das estratégias para ordenar o discurso e a prática dos professores (CARVALHO, 1998CARVALHO, Marta. A Escola Nova e o impresso. In: FARIA FILHO, Luciano (org.) Modos de ler, formas de escrever. Belo Horizonte: Autêntica, 1998, p.65-86.).

Exemplificando os embates em torno das compreensões da Escola Nova, vale a pena assinalar como as palavras de Backheuser descrevendo os princípios da “escola única”:

a) para ambos os sexos - donde a escola de co-educação; b) para todas as classes sociais independentemente da situação financeira do país - donde escola neutra e leiga; c) para todas as opiniões políticas e para todos os credos religiosos - donde escola neutra e escola leiga (BACKHEUSER, 1934BACKHEUSER, Everardo, Manual de pedagogia moderna. RJ: Editora Globo, 1934., p. 68)

Comentando o que ele classifica como “problemas”, o autor do manual sublinhou os malefícios da educação conjunta de meninos e meninas, a partir de estudos sobre as diferenças de desenvolvimento entre os dois sexos, acentuadas na fase da adolescência, e concluiu: “Estes fatos que a ciência psicológica revela têm comprovação prática em quantos ensinam em estabelecimentos secundários mistos” (BACKHEUSER, 1934BACKHEUSER, Everardo, Manual de pedagogia moderna. RJ: Editora Globo, 1934., p.72). Suas palavras marcaram suas posições e sugerem o fervor das discussões entre “católicos” e “pioneiros” do qual os conteúdos dos manuais de ensino não escaparam.

Isso obriga a considerar a complexidade da difusão do movimento escolanovista, da qual os manuais de ensino aqui examinados são produtos. A Escola Nova tem seus conceitos-chave, defendendo o ensino como um bem público, ministrado próximo à natureza, tanto para meninos como para meninas, com o uso de métodos ativos, em nome da autonomia dos alunos. Foi apresentado como uma espécie de “revolução copernicana da escola”, pois tirava o professor do lugar de “principal detentor do conhecimento” e das atividades na sala de aula. Embora tenha empolgado educadores em diferentes partes do mundo, a Escola Nova gerou múltiplas filiações, articuladas a diversos envolvimentos ideológicos e práticas educativas (NÓVOA, 1995NÓVOA, António. (1995) Uma educação que se diz nova. IN: CANDEIAS, A; NÓVOA, A; FIGUEIRA, M. H. Sobre a Educação Nova: Cartas de Adolfo Lima a Álvaro Viana de Lemos. Educa, Lisboa.). Isso explica porque, entre os manuais de ensino publicados na década de 1930 no Brasil, as compreensões de Lourenço Filho e Everardo Backheuser foram opostas em muitos aspectos. Com suas diferentes contribuições, esses manuais aproximam-se pelo intuito de edificar os conhecimentos pedagógicos e de imprimir à formação docente um caráter mais científico. Como pondera António Nóvoa (1995NÓVOA, António. (1995) Uma educação que se diz nova. IN: CANDEIAS, A; NÓVOA, A; FIGUEIRA, M. H. Sobre a Educação Nova: Cartas de Adolfo Lima a Álvaro Viana de Lemos. Educa, Lisboa.), esse movimento significou ao mesmo tempo a edificação e a morte da Pedagogia como ciência, pois evidenciou mais a Psicologia como área de conhecimento legítima para os educadores.

Após a década de 1930, ainda que os títulos de Didática e outros diretamente relacionados a questões gerais de ensino tenham expressado uma preocupação relativamente inédita para o momento, pois mais atenta a questões de planejamento e uso de técnicas pedagógicas, eles não deixaram de partir de uma ideia ampla consolidada pelo escolanovismo, a de que o professor não deve ser o centro das atenções da vida escolar. As Noções de Didática Geral (1955SANTOS, Theobaldo Miranda. Noções de Didática Geral. 6a. ed., São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1955.), de Theobaldo Miranda Santos, bem como a Didática geral (1963PENTEADO JUNIOR Onofre de Arruda . Didática Geral. São Paulo: Editora Obelisco, 1963.) assinada por Onofre de Arruda Penteado Júnior e o livro de mesmo título assinado por Afro do Amaral Fontoura (1965FONTOURA, Afro do Amaral. Didática Geral. Rio de Janeiro: Aurora, 1965.) partilham em suas páginas da crença nos métodos ativos de ensino e em momento algum conclamam a velha “escola tradicional”. A renovação do ensino tão proclamada pelo escolanovismo continuou a se fazer presente nos discursos da Didática que, neste momento, era uma das disciplinas mais importantes da Escola Normal, dividindo-se entre a chamada Didática Geral e aquela que adentrava as especificidades de cada área curricular do ensino primário e desdobra-se, por exemplo, na Didática da Matemática, da Geografia ou das Ciências (SILVA, 2018SILVA, Vivian Batista da. Saberes em viagem nos manuais pedagógicos: construções da escola em Portugal e no Brasil (1870-1970). São Paulo: Editora UNESP, 2018., 2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019.).

Os manuais de ensino da segunda metade do século XX privilegiaram o planejamento das aulas, a ordenação dos conteúdos a serem ensinados, o uso de métodos didáticos e a avaliação do rendimento dos alunos. Essa foi uma tendência da literatura educacional como um todo, em nível mundial (NÓVOA, 1987NÓVOA, A. Le temps des professeurs. Lisboa: INIC, 1987.) e, no Brasil, foi denominada de movimento da “tecnicização do ensino” (MACHADO, 1980MACHADO, Nilson. O tecnicismo e a hipertrofia do psico-pedagógico. Cadernos PUC, n.3, mar/1980, p.11-27.; NAGLE, 1976NAGLE, Jorge. Educação e Sociedade na Primeira República. São Paulo: EPU/Edusp, 1976.). Os livros caracterizam-se por uma escrita mais sintética, prescritiva e com frases de fácil entendimento. Nesse sentido, eles construíram um modelo de “professor-funcionário do Estado”, a quem coube seguir planos de lição e métodos didáticos prescritos nos manuais ou em outros textos oficiais de orientação do trabalho pedagógico. Tratava-se de formar o magistério para a sala de aula, afirmando a Didática como uma disciplina do “saber-fazer” (SILVA, 2015).

Enfim, a análise das páginas dos livros de Didática e outras disciplinas diretamente ligadas ao ensino, como foi o caso da Pedagogia, permite compreender como elas ocuparam os planos de estudo da Escola Normal. Os títulos aqui examinados foram exemplares do conjunto de manuais usados no curso desde 1900 até a substituição dessas escolas, em 1971, pelas chamadas Habilitações Específicas para o Magistério. Por um lado, esses livros testemunharam a conquista de um espaço cada vez maior para o estudo dos saberes especificamente profissionalizantes da docência. O número de títulos publicados no Brasil foi cada vez maior nesse período (SILVA, 2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019.). Por outro lado, esses manuais circunscreveram-se mais a um receituário. Embora tenham se transformado ao longo do tempo, ora destacando a suposta vocação do magistério, ora evocando os princípios da Escola Nova, ora privilegiando as técnicas de ensino, os manuais de Didática foram entrelaçando saberes que, atravessados o tempo todo pela Psicologia, conferiram a ela a legitimidade e a fundamentação de seus discursos.

A Psicologia atravessada pela Didática

Como a Psicologia ensinada nos cursos de formação docente tornou-se atravessada pela Didática?

Cabe lembrar que, na Escola Normal de São Paulo, a Psicologia foi ensinada inicialmente como parte de outras disciplinas, tais como pedagogia e educação moral, antes de se tornar uma matéria independente e alcançar uma posição de destaque na formação dos professores em 1920. Nas reformas educativas que se realizaram nos anos 1920 em diversos estados brasileiros, a Psicologia foi sendo introduzida, até ser oficialmente inserida nos currículos das escolas normais por meio de decreto em 1928, junto com a Didática, a pedagogia, a história da educação, a sociologia, a higiene e a puericultura (ANTUNES, 2007ANTUNES, Mitsuko Aparecida. A Psicologia no Brasil: leitura histórica sobre sua constituição (5a. ed.). São Paulo: Unimarco/Educ, 2007.). Na mesma época, a quantidade de publicações dedicadas ao estudo das questões educacionais ampliou-se expressivamente no Brasil, favorecendo a disseminação dos conhecimentos especializados (NAGLE, 1976NAGLE, Jorge. Educação e linguagem. SP: Edarte, 1976a.). No âmbito da Biblioteca de Educação, dirigida por Lourenço Filho, a Psicologia foi contemplada desde o início, por meio de traduções de obras estrangeiras, dentre as quais Psychologia experimental (1927), de Henri Piéron; A escola e a Psicologia experimental (1928), de Édouard Claparède; Testes para a medida do desenvolvimento da inteligência (1929), de Alfred Binet e Th. Simon e da publicação de livros de autores brasileiros, tais como Temperamento e caráter sob o ponto de vista educativo (1928), de Henrique Geenen e Introdução ao Estudo da Escola Nova (1930), do próprio Lourenço Filho (JACÓ-VILELA, 2012JACÓ-VILELA, Ana Maria. História da Psicologia no Brasil: uma narrativa por meio de seu ensino. In Psicologia: ciência e profissão. v.32, p.28-43, 2012. Número especial., p. 37; MONARCHA, 1997MONARCHA, Carlos. Lourenço Filho: outros aspectos, mesma obra. Campinas: Mercado de Letras, 1997.).

É importante lembrar que o estudo da Psicologia nas escolas normais foi impulsionado pelo movimento da Escola Nova que, como se sabe, pretendeu realizar uma profunda renovação do ensino, ao postular que a criança deveria passar a ocupar o centro da atividade pedagógica, e não mais o professor. Conforme as proposições da Escola Nova, a atividade e os interesses das crianças passavam a orientar o aprendizado e não mais o ensino de conteúdos preparados pelos adultos. Os conhecimentos assimilados na prática e as descobertas realizadas a partir da formulação de problemas da vida real, investigados por meio de procedimentos científicos conduzidos de modo cooperativo eram valorizados como modos de formar indivíduos responsáveis e autônomos, capazes de governarem a si próprios e participarem vivamente na sociedade democrática. De acordo com a feliz expressão criada por Marcelo Rito (2015RITO, Marcelo. Carne recortada, almas expostas: da visualização escolanovista à utopia do homem aprimorável. Tese (Doutorado em Educação). São Paulo: Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2015.), consagrava-se a utopia do homem aprimorável. Nos discursos escolanovistas, a Psicologia aparecia como fundamento científico da Escola Nova, a escola que se pretendia moderna e democrática, que tornava interdependentes o desenvolvimento individual e o progresso social. A Psicologia era considerada uma ciência nova, recém-separada da filosofia e situada entre a sociologia e a biologia. Dedicava-se a esclarecer os processos de desenvolvimento da criança e a identificar e mensurar as capacidades individuais. Embora não coubesse à Psicologia determinar os fins da escola, cumpria-lhe instruir os educadores sobre o como adaptar o ensino aos estudantes das diferentes idades, de modo a atingir os seus objetivos. É justamente em função desse propósito que a Psicologia se aproximava da Didática, buscando conferir-lhe fundamentação científica.

Em trabalho anterior dedicado a análise de 51 manuais de Psicologia voltados à formação docente publicados no Brasil ao longo do século XX (LIMA, 2020LIMA, Ana Laura Godinho. A vontade de psicologia na formação de professores. 2019. 204 f. Tese (Livre Docência em História da educação ) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-11052021-122702 . Acesso em: 22 jan. 2024.
https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-1...
), explicitaram-se algumas das mudanças na composição desses livros. Até os anos 1970, os autores eram em sua maioria professores das escolas normais, muitos dos quais haviam realizado estudos no exterior para ampliar e aprofundar os seus conhecimentos. Observa-se a grande quantidade de referências aos autores estrangeiros cujas obras eram citadas a partir do original em inglês, francês, espanhol e alemão, evidenciando que os professores de Psicologia que ensinavam nas escolas normais conheciam a produção científica internacional, que se empenharam em divulgar entre os professores brasileiros.

Os autores dos manuais mais antigos, publicados até os anos 1930 eram formados em medicina, direito e filosofia. Da década de 1940 a 1960 os manuais são escritos em sua maioria por autores e autoras formados nas escolas normais e a partir da década de 1970 tornam-se comuns os livros escritos por egressos e egressas das faculdades de pedagogia, Psicologia, história ou filosofia, em alguns casos em mais de um curso superior.

Nas décadas iniciais do século XX, os manuais apresentavam geralmente o aspecto de um curso, de modo que cada capítulo correspondia aproximadamente ao conteúdo de uma aula. A estrutura típica dos que foram publicados até os anos 1930 costumava incluir:

a introdução, dedicada à apresentação da Psicologia, sua história e seus métodos de investigação; um capítulo dedicado à base orgânica dos fenômenos psíquicos ou ao estudo das sensações; uma quantidade variável de capítulos para a descrição dos fenômenos psicológicos da afetividade, inteligência e vontade, incluindo-se, em alguns casos, um capítulo dedicado à linguagem e outro à criança anormal e um capítulo final para a explanação do caráter e da personalidade, entendidos como síntese dos elementos anteriores. A partir dos anos 1930, surgiram capítulos dedicados ao desenvolvimento e à influência da hereditariedade e do meio (LIMA, 2020LIMA, Ana Laura Godinho. A vontade de psicologia na formação de professores. 2019. 204 f. Tese (Livre Docência em História da educação ) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-11052021-122702 . Acesso em: 22 jan. 2024.
https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-1...
, p. 75).

A partir daí, intensifica-se a preocupação em explorar nos manuais as aplicações pedagógicas dos conhecimentos psicológicos, que ganham mais espaço em suas páginas.

A seguir, a partir da análise oito livros de Psicologia destinados à formação docente, escritos por autores que também escreveram livros de Didática, busca-se evidenciar os modos de atravessamentos entre as disciplinas, no que diz respeito aos temas tratados e autores referidos.

Lições de pedagogia (1900), cuja primeira parte é dedicada à Psicologia. Segundo Valentim Magalhães, o livro corresponde, à impressão das suas lições ditadas às alunas da Escola Normal em 1899. Nenhum compêndio fora adotado, pois nenhum atendia às exigências do programa. Neste livro, assim como nos que serão comentados a seguir, a aproximação entre a Psicologia e a Didática se evidencia mais claramente na parte dedicada à formação dos hábitos que, segundo se afirmava, era um tema da Psicologia de especial relevância para a educação:

Tem pois o hábito uma importância capital para a educação, por ser a habitualidade uma força que, como todas as outras de natureza física - a água, o fogo, o vento - aproveitada para o bem produz verdadeiros prodígios, mas desviada para o mal pode ser causa de irreparáveis calamidades (MAGALHÃES, 1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900., p. 20).

Dessa constatação, formulada no campo da Psicologia, o autor derivava a seguinte advertência para os pais e professores: “Deve haver o maior escrúpulo da parte do educador em arraigar os hábitos bons e evitar os maus, porque deles depende a direção e o aproveitamento da vontade”.

O tema da relação entre educação e hábito também está presente no Compêndio de Psicologia: problemas de Psicologia educacional. No capítulo dedicado a essa questão, Onofre de Arruda Penteado Junior assim se pronuncia (1949, p. 66): “Não podemos dizer propriamente que exista uma educação do hábito, mas com mais acerto diremos que a educação é um hábito” (destaques do autor). O autor ainda busca estabelecer as implicações dessa ideia para a prática docente, afirmando a necessidade da constância quando se tratava de incutir um novo hábito, de favorecer um novo aprendizado.

Assim, o professor novato, inexperiente, que pretende ensinar uma criança a escrever, mas fizer cada dia uma forma de letra, não conseguirá fixá-la. O excitante deve ser sempre o mesmo. É a lei da persistência da imagem, que deve ser sempre a mesma. Do contrário, não se fixa a forma. Um pequeno traço que se faça antes de um a minúsculo, e que não existia em apresentações anteriores, pode levar a criança a não identificar a palavra que antes havia identificado. É o que já verificamos na nossa prática escolar. Muda-se a configuração, não se torna possível o reconhecimento por parte da criança. Do que vemos, conclui-se que o mestre deve conhecer e respeitar os princípios capitais da formação do hábito, se quiser ser bem sucedido em seu trabalho (PENTEADO JUNIOR, 1949PENTEADO JUNIOR Onofre de Arruda . Compêndio de Psicologia: problemas de Psicologia educacional para o uso das escolas normais. 2a. ed. do autor, São Paulo, 1949., p. 65).

Testes ABC: para a verificação da maturidade necessária à aprendizagem da leitura e da escrita (1933 LOURENÇO FILHO, Manoel Bergström . Testes ABC: para a verificação da maturidade necessária à aprendizagem da leitura e da escrita. 13a. ed. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2008.), de Lourenço Filho e Ensaio de Biotipologia Educacional (1941), de Everardo Backheuser, podem ser examinados lado a lado, como um par de livros dedicados a propor modos de classificar os alunos a partir de critérios biopsicológicos tendo em vista favorecer a adaptação do ensino às características individuais.

É bem sabido que a escala métrica de inteligência para medir o quociente de inteligência, criada por Binet e Simon no início do século XX, teve como motivação inicial propor um recurso para a prevenção do fracasso escolar (GOULD, 2003GOULD, Stephen Jay. A Falsa Medida do Homem. São Paulo: Martins Fontes, 2003.). De maneira análoga, os testes ABC desenvolvidos por Lourenço Filho, paralelamente à sua atuação como professor de Psicologia na Escola Normal, foram criados como um instrumento para evitar o fracasso na alfabetização e, desse modo, resolver o problema da elevada taxa de reprovação na primeira série primária, que ficava em torno de 40% na cidade de São Paulo, nos anos de 1928 a 1930. Conforme já se explicitou em artigo anterior acerca desses testes, tratava-se de uma inovação criada no campo da Psicologia experimental como uma contribuição à organização do trabalho docente tendo em vista o sucesso na alfabetização (LIMA, 2007LIMA, Ana Laura Godinho. Testes ABC: proposta de governo de uma população problemática. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, Campinas, v. 11, n. 1, p. 145-152, jan./jun. 2007. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-85572007000100016&lng=pt&nrm=iso . Acesso em: 22 jan. 2024.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
).

Os testes ABC constituem um bom exemplo de como preocupações próprias do campo da Didática foram formuladas como problemas para a Psicologia, para a superação dos quais a Psicologia procurou responder por meio da elaboração de recursos como testes e outras formas de diagnósticos das capacidades individuais dos estudantes.

O Ensaio de Biotipologia Educacional, de Everardo Backheuser é outro livro que exemplifica essa forma de aproximação entre a Didática e a Psicologia na formação docente. Divide-se em duas partes: Parte Geral e Parte Educacional. Na primeira parte, os tópicos tratados correspondem à matéria típica dos compêndios de Psicologia e inclui conteúdos como: a personalidade; teorias psicológicas, funções psíquicas e diferentes biotipologia, que correspondiam a classificações dos indivíduos a partir de critérios biológicos e psicológicos. É na segunda parte, dedicada às considerações sobre os usos pedagógicos das fichas psicológicas do aluno, que encontramos o atravessamento da Didática no discurso da Psicologia, mais especificamente nos tópicos “Homogeneização das classes” e “Corretivos pedagógicos”, quando o autor se refere ao “desempenho da missão educativa” e convida os professores a um exame de consciência, a fim de observar se o baixo rendimento escolar dos alunos não se deve a “métodos de ensino menos adequados a despertar-lhes o interesse”. Nesse caso, pondera, não se está diante de deificientes escolares, mas trata-se da “culpa exclusiva, e infelizmente, frequente, da atrasada pedagogia do mestre”. à guisa de síntese, o autor acrescentava, relacionando a Psicologia do aluno à Didática do mestre: “O exame de consciência do desempenho de sua missão educativa atinge, portanto: a) a desatenção por ele concedida à caracterização bio e psicológica do aluno; b) aos métodos pedagógicos obsoletos ou contra-indicados” (BACKHEUSER, 1941, p. 229).

Noções de Psicologia Educacional, de Theobaldo Miranda Santos organiza-se segundo a estrutura típica dos manuais da disciplina já descrita, mas traz como diferencial a cada capítulo uma seção intitulada orientação educacional, em que o autor procura evidenciar as consequências da matéria estudada no capítulo para o trabalho dos professores, aproximando-se da Didática. Assim, no capítulo dedicado ao desenvolvimento mental, por exemplo, temos o seguinte enunciado, típico do discurso escolanovista, o qual também poderia ser encontrado em um manual de Didática: “A criança e o adolescente devem ser considerados não como simples miniaturas do adulto, mas como seres que apresentam, em cada etapa de sua evolução caracteres próprios e reações específicas que lhes emprestam uma fisionomia psicológica particular” (SANTOS, 1955SANTOS, Theobaldo Miranda. Noções de Psicologia Educacional. 6a. ed., São Paulo: Companhia Editora Nacional , 1955., p. 121). Já no capítulo dedicado à aprendizagem, encontramos esse outro enunciado, o qual também poderia figurar na Didática: “Nada mais anti-pedagógico do que a uniformidade de planos de estudo, de técnica de ensino, de duração de cursos e de tratamento disciplinas para alunos de desenvolvimento intelectual, de capacidade de aprendizagem e de tipo caracterológico diversos” (SANTOS, 1955SANTOS, Theobaldo Miranda. Noções de Psicologia Educacional. 6a. ed., São Paulo: Companhia Editora Nacional , 1955., p. 146)

Finalmente, pode-se examinar lado a lado também os dois volumes da Psicologia Educacional, de Afro do Amaral Fontoura, que compõem parte da série A Escola Viva, da Biblioteca Didática Brasileira. A série indicada reúne livros de sua autoria dedicados às seguintes disciplinas: Fundamentos da Educação; Sociologia Educacional; Metodologia do Ensino Primário; Psicologia Geral; Psicologia Educacional; Prática de Ensino; Planejamento no Ensino Primário e Didática Geral.

O primeiro volume de sua Psicologia Educacional é dedicado à Psicologia da criançaFONTOURA, Afro do Amaral. Psicologia educacional. 1a. parte. Psicologia da Criança. 17a. ed., Rio de Janeiro, Aurora, 1969.. Depois de três capítulos introdutórios dedicados à apresentação da Psicologia educacional, da Psicologia da criança e da Psicologia genética, passa à exposição das etapas do desenvolvimento infantil: a primeira infância, de 0 a 3 anos, a segunda infância, de 3 a 7 anos e assim por diante até a adolescência, dos 12 aos 18 anos. Dedica ainda um capítulo à criança problema e os capítulos seguintes examinam dimensões específicas do desenvolvimento: a consciência, os “fenômenos intelectivos”, os “fenômenos afetivos”, os “fenômenos ativos”, a linguagem e o desenho. O segundo volume da Psicologia Educacional de Afro do Amaral Fontoura divide-se em dois: Parte 2 - Psicologia da aprendizagem e Parte 3 - Psicologia diferencialFONTOURA, Afro do Amaral. Psicologia educacional. 2a. e 3a. partes. Psicologia da Aprendizagem; Psicologia Diferencial. 11a. ed., Rio de Janeiro, 1966.. Pode-se dizer que os dois volumes dessa obra são inteiramente atravessados pela Didática. Os capítulos apresentam orientações pedagógicas a partir dos conhecimentos da Psicologia apresentados, que costumam ser reunidas em um tópico intitulado como “Orientação Pedagógica: Como devo proceder na minha escola. O Álbum pedagógico. Exercícios e experiências” (FONTOURA, 1968, p. XIV).

No capítulo dedicado à terceira infância, por exemplo, no tópico dedicado à orientação pedagógica, encontra-se a seguinte recomendação:

crédito de confiança: Dissemos que a partir dos sete anos - a chamada idade da razão - a criança começa e formular juízos próprios, não aceitando qualquer coisa que lhe digam. Ela compara as afirmações dos pais e mestres com a de outros conhecidos e a dos próprios colegas. Por isso, é muito importante, nessa fase, que os professores e pais não percam o ‘crédito de confiança’ de que gozam junto à criança. Tanto os pais quanto as professoras devem evitar qualquer mentira, nas coisas que dizem ao garoto, embora, muitas vezes, tenham que “ajeitar” a verdade, para não chocar o tenro espírito infantil. Nem se deve mentir, nem se deve dizer a verdade dura e rude” (FONTOURA, 1968, p. 132).

A partir do exame desses manuais de Psicologia, observa-se que a Didática atravessou a Psicologia de dois modos: no modo de exposição da matéria, tendo em vista tornar o seu ensino mais eficiente e como repositório de questões a serem respondidas por meio da investigação psicológica sobre a criança, seu desenvolvimento e seu aprendizado, as quais, por sua vez, geraram conhecimentos e orientações pedagógicas ofertadas aos professores.

Conclusão

Ao identificar zonas de intersecção entre a Didática e a Psicologia tal como apareceram nos manuais usados nas aulas dessas disciplinas da Escola Normal, o presente artigo identificou discursos educacionais presentes tanto numa matéria quanto na outra. No início do século XX, não havia uma divisão entre essas disciplinas. As Lições de Pedagogia, de Valentim Magalhães (1900MAGALHÃES, Valentim. Lições de pedagogia. Parte 1: Psychologia. Rio de Janeiro: Laemmert Editores, 1900.), também reuniam em suas páginas os tópicos de Psicologia. Mesmo quando as disciplinas foram se separando nos programas de ensino e nos títulos dos manuais, elas comungaram seu entusiasmo pelo movimento da Escola Nova. Assim, partilharam de autores, ideias e referências comuns por um longo período de tempo. Sobretudo na década de 1930, quando o escolanovismo foi explicado aos futuros professores, passando pelos anos 1940, 1950 e 1960, nenhum dos títulos examinados, seja os de Didática ou os de Psicologia, se colocaram contra noções-chave do movimento, como é o caso da criatividade da criança, da autonomia, da aprendizagem ativa. É justamente por meio do atravessamento dessas ideias em diferentes disciplinas que reside a inovação pedagógica.

É interessante observar ainda um movimento circular entre as duas disciplinas, uma vez que a forma Didática que se procura dar aos manuais de Psicologia já incorporava conhecimentos da Psicologia ofertados à Didática sobre como os estudantes aprendem e como se deveria ajustar o ensino às necessidades dos alunos.

Pode-se identificar dois enunciados gerais que se sucedem nos discursos da Psicologia, os quais atravessam a fronteira entre a Psicologia e a Didática. O primeiro deles pode ser apresentado como: “Em educação, o fundamental é cultivar os bons hábitos e extirpar os maus” e o segundo, mais identificado ao tema das inovações pedagógicas a partir do movimento da Escola Nova pode ser formulado nos seguintes termos: “os professores devem adaptar o ensino às características psicológicas dos alunos”10 10 O modo como esse enunciado comparece no discurso da Psicologia educacional foi analisado detidamente em artigo anterior (AUTORA, 2017). [1].

Ao analisar uma educação que se diz renovada, António Nóvoa (1995NÓVOA, António. (1995) Uma educação que se diz nova. IN: CANDEIAS, A; NÓVOA, A; FIGUEIRA, M. H. Sobre a Educação Nova: Cartas de Adolfo Lima a Álvaro Viana de Lemos. Educa, Lisboa.) mencionou a “melhor geração pedagógica de sempre”, composta por nomes como Ferrière, Claparéde, Dewey, Montessori e Piaget. A bibliografia ensinada nos manuais de Didática e Psicologia fizeram a divulgação dessas ideias nas Escolas Normais (SILVA, 2018SILVA, Vivian Batista da. Saberes em viagem nos manuais pedagógicos: construções da escola em Portugal e no Brasil (1870-1970). São Paulo: Editora UNESP, 2018.; LIMA, 2020LIMA, Ana Laura Godinho. A vontade de psicologia na formação de professores. 2019. 204 f. Tese (Livre Docência em História da educação ) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-11052021-122702 . Acesso em: 22 jan. 2024.
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). Evidentemente, são autores que trouxeram diferentes contribuições ao debate sem necessariamente partilhar dos mesmos postulados. O que os uniu no discurso educacional e nos manuais de ensino foi a força das críticas à chamada “escola tradicional”, onde as decisões cabem ao professor, com técnicas de cópia, recitações, memorizações e pouco espaço para o desenvolvimento da autonomia dos alunos. Nenhum escolanovista se colocou contra a tão desejada “criatividade da criança”, mas as compreensões desse postulado variaram, o que revelou a polissemia do conceito (NÓVOA, 1995NÓVOA, António. (1995) Uma educação que se diz nova. IN: CANDEIAS, A; NÓVOA, A; FIGUEIRA, M. H. Sobre a Educação Nova: Cartas de Adolfo Lima a Álvaro Viana de Lemos. Educa, Lisboa.).

Se as ideias da Escola Nova variaram de acordo com seu contexto de produção, suas traduções nos manuais de Didática e Psicologia continuaram produzindo novas apropriações. Enquanto um dos produtos da disciplina escolar, esses textos feitos para as aulas dos futuros professores resumiram a bibliografia de uma forma simples e de fácil entendimento. Isso operou uma espécie de “discurso do consenso”, no qual apagaram-se as discussões e os possíveis embates entre os autores mencionados (SILVA, 2018SILVA, Vivian Batista da. Saberes em viagem nos manuais pedagógicos: construções da escola em Portugal e no Brasil (1870-1970). São Paulo: Editora UNESP, 2018.). Do ponto de vista da Didática, o escolanovismo desdobrou-se basicamente em normativas técnicas, mais um “saber-fazer”. Na perspectiva da Psicologia, as formulações dos manuais caminharam por conceitos científicos e pelas orientações relativas ao controle dos alunos e de seus comportamentos.

Dessa maneira, o atravessamento das fronteiras entre as duas disciplinas derivou de um lugar comum onde se defenderam as amplas premissas da Escola Nova. Em outras palavras, foi a ideia de inovação pedagógica que uniu a Didática e a Psicologia e da qual, ao mesmo tempo, emanaram as especificidades de cada uma delas: a legitimação científica dos argumentos coube mais à Psicologia; a prescrição das formas de ensinar foi papel assumido mais claramente pela Didática. Convém questionar em que medida tais enquadramentos contornaram as competências dos professores, dividindo os manuais entre aqueles que ensinaram a ensinar e aqueles que trataram da ciência.

Outra questão refere-se a uma espécie de naturalização da necessidade de se inovar o magistério. Como diriam Julio Aquino e Carlota Boto (2019AQUINO, J. G.; BOTO, C. Inovação pedagógica: um novo-antigo imperativo. Educação, Sociedade & Culturas. Porto, n. 55, 2019., p. 28), “esse afã inovacionista consistiria justamente naquilo que obstaculiza a própria capacidade de mudança”. Os receios relativos à chamada “escola tradicional” povoaram os manuais de ensino e, portanto, o início da formação dos professores. Desde os anos iniciais do século XX até o final da década de 1960, a permanência dessa desconfiança desloca a originalidade do discurso escolanovista e compõe uma espécie de “onda novidadeira em educação” (AQUINO e BOTO, 2019AQUINO, J. G.; BOTO, C. Inovação pedagógica: um novo-antigo imperativo. Educação, Sociedade & Culturas. Porto, n. 55, 2019., p. 28), marcada também por uma certa primazia da Psicologia sobre a Didática.

Referências

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  • 1
    Os trabalhos realizados por SILVA 2 (2019SILVA, Vivian Batista da. Livros que ensinam a ensinar: um estudo sobre os manuais pedagógicos brasileiros (1930-1971). Curitiba: Appris Editora, 2019.) foram feitos a partir do levantamento de 55 manuais de Didática, Pedagogia, Metodologia e Prática de Ensino publicados no Brasil entre 1870 e 1970. O material foi localizado a partir da busca em acervos de São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. LIMA (2020LIMA, Ana Laura Godinho. A vontade de psicologia na formação de professores. 2019. 204 f. Tese (Livre Docência em História da educação ) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-11052021-122702 . Acesso em: 22 jan. 2024.
    https://doi.org/10.11606/T.48.2020.tde-1...
    ), por sua vez, percorreu 51 títulos de Psicologia usados nas Escolas Normais.
  • 2
    Valentim Magalhães, foi professor de português e pedagogia na Escola Normal do Rio de Janeiro e, como resultado dessa experiência, publicou, em 1900, Lições de pedagogia, cuja primeira parte é dedicada à Psicologia.
  • 3
    Lourenço Filho foi um educador brasileiro de presença destacada no campo educacional. Signatário do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, foi professor na Escola Normal de Piracicaba e na Escola Normal de São Paulo. Como Diretor Geral da Instrução Pública, empreendeu a reforma do ensino no Ceará em 1922. Dirigiu a Biblioteca de Educação da Companhia Melhoramentos de 1926 a 1970, exerceu os cargos de Diretor Geral da Instrução Pública de São Paulo, Diretor do Instituto de Educação do Distrito Federal, Presidente da Associação Brasileira de Educação e Diretor Geral do Departamento Nacional de Educação, entre outros. Organizou e dirigiu o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos e foi o responsável pela criação da sua Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, em 1944.(CATANI, 2018CATANI, Denice Barbara. Lourenço Filho (1897-1970): uma vida dedicada à educação. In REGO, Teresa Cristina. Educadores brasileiros: ideias e ações de nomes que marcaram a educação nacional. Curitiba: CRV, 2018.). Em sua vasta produção intelectual no campo da educação, destacam-se os livros Introdução ao Estudo da Escola Nova e Testes ABC, aqui examinados.
  • 4
    Quando escreveu o Manual de Pedagogia Moderna (1934BACKHEUSER, Everardo, Manual de pedagogia moderna. RJ: Editora Globo, 1934.) Everardo Backheuser (1879-1951) era Presidente da Comissão Nacional da Educação e Saúde. Embora sua formação inicial tenha sido em Engenharia, teve marcada atuação na área educacional, notadamente como membro da Confederação Católica Brasileira de Educação (ROSA, 2017ROSA, Maristela. Escolanovismo católico backheusiano. Tese de doutorado: UDESC, 2018.).
  • 5
    Onofre de Arruda Penteado Junior foi catedrático de Didática Geral e Especial na seção de Pedagogia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo.
  • 6
    Theobaldo Miranda Santos (1904-1971) foi um educador católico que lecionou Psicologia Educacional no curso de Pedagogia da Faculdade de Filosofia do Instituto de Santa Úrsula. Seu livro Noções de Psicologia Educacional sistematiza o conteúdo de seu curso na instituição. (SANTOS, 1955SANTOS, Theobaldo Miranda. Noções de Psicologia Educacional. 6a. ed., São Paulo: Companhia Editora Nacional , 1955.).
  • 7
    Afro do Amaral Fontoura foi um educador católico, professor da Universidade Católica do Rio de Janeiro e diretor da Biblioteca Didática Brasileira, que publicou livros de sua autoria dedicados a diversas disciplinas para a formação de professores, no âmbito da série Escola Viva (FONTOURA, 1963FONTOURA, Afro do Amaral. Didática Geral. Rio de Janeiro: Aurora, 1965.).
  • 8
    A confluência desses estudos e os seus atuais desdobramentos inserem-se num Projeto Temático financiado pela FAPESP e coordenado na FEUSP pelas professoras Diana Vidal e Carlota Boto. O título do Projeto e Saberes e práticas em fronteiras: por uma história transnacional da educação (1810-...) (Processo n. 2018/26699-04).
  • 9
    A grafia original localizada no manual de ensino foi mantida.
  • 10
    O modo como esse enunciado comparece no discurso da Psicologia educacional foi analisado detidamente em artigo anterior (AUTORA, 2017).

Editado por

Editora responsável:

Patrícia Weiduschadt

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    18 Jan 2023
  • Aceito
    27 Out 2023
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