Resumo
O resgate da memória e a história de trabalho-educação é um processo em curso, no Brasil, que avança na medida em que se ampliam os estudos sobre história da educação que incluam o tema trabalho-educação. Neste texto, tratamos de duas mediações, a imposição do trabalho e a negação da educação. Temos por base o contexto como totalidade social, a crítica à economia política, os fundamentos do mundo do trabalho e os trabalhadores e a reflexão sobre a relação presente e passado, a memória e a história como produção social da existência. O objetivo principal é resgatar estudos da história de trabalho-educação, primeiro, da educação de crianças pobres em instituições correcionais e educativas; segundo, da educação profissional e técnica nos sistemas de ensino. Evidenciam-se a subalternidade do trabalho imposto e os limites sociais da educação oferecida aos filhos dos trabalhadores.
Palavras-chave:
história de trabalho-educação; imposição do trabalho; negação da educação; educação profissional; memória
RESUMEN
La recuperación de la memoria y de la historia de la educación-trabajo es un proceso en curso en Brasil, que avanza a medida que los estudios sobre la historia de la educación se amplían para incluir el tema de la educación-trabajo. En este texto abordamos dos mediaciones, la imposición del trabajo y la negación de la educación. Nos basamos en el contexto como totalidad social, la crítica a la economía política, los fundamentos del mundo del trabajo y de los trabajadores y la reflexión sobre la relación presente y pasado, la memoria y la historia como producción social de la existencia. El objetivo principal es rescatar estudios de la historia de la educación-trabajo, primero, de la educación de los niños pobres en instituciones correccionales y educativas; en segundo lugar, la educación profesional y técnica en los sistemas educativos. La subalternidad del trabajo impuesto y los límites sociales de la educación ofrecida a los hijos de los trabajadores son evidentes.
Palabras clave:
historia del trabajo-educación; imposición del trabajo; negación de la educación; educación profesional; memoria
ABSTRACT
The recovery of memory and the history of work-education is an ongoing process in Brazil, which is advancing as studies on the history of education are expanded to include the theme of work-education. In this text, we deal with two mediations, the imposition of work and the denial of education. We are based on the context as a social totality, the critique of political economy, the foundations of the world of work and the workers and the reflection on the present and past relationship, memory and history as the social production of existence. The main objective is to rescue studies of the history of work-education, first, of the education of poor children in correctional and educational institutions; second, professional and technical education in education systems. The subalternity of imposed work and the social limits of the education offered to workers' children are evident.
Keywords:
work-education history; imposition of work; denial of education; professional education; memory
RÉSUMÉ
La récupération de la mémoire et de l'histoire de l'éducation par le travail est un processus en cours au Brésil, qui progresse à mesure que les études sur l'histoire de l'éducation qui incluent le thème de l'éducation par le travail se développent. Dans ce texte, nous traitons de deux médiations : l'imposition du travail et la négation de l'éducation. Il s'appuie sur le contexte en tant que totalité sociale, la critique de l'économie politique, les fondements du monde du travail et des travailleurs et la réflexion sur la relation entre le présent et le passé, la mémoire et l'histoire en tant que production sociale de l'existence. L'objectif principal est de retrouver des études sur l'histoire de l'éducation ouvrière, d'une part, l'éducation des enfants pauvres dans les institutions correctionnelles et éducatives et, d'autre part, l'éducation professionnelle et technique dans les systèmes scolaires. La subalternité du travail imposé et les limites sociales de l'éducation offerte aux enfants d'ouvriers sont mises en évidence.
Mots-clés:
histoire de l'éducation ouvrière; imposition du travail; déni d'éducation; éducation professionnelle; mémoire
Introdução
Este texto expressa a continuidade de projetos sobre a história de trabalho-educação.1 Os estudos reiteram, na história do presente, as bases seculares de precárias condições de vida, de baixa remuneração do trabalho e de educação limitada para a grande maioria da população pobre.2A desigualdade social pauta-se pela concentração de renda e pela cultura da superioridade étnico-racial, social e intelectual de uma minoria. A imposição do trabalho e a negação da educação plena e de qualidade são duas mediações fundamentais que caracterizam a sociedade brasileira. Estudos de historiadores e de outros cientistas sociais e educadores evidenciam os caminhos percorridos.
Até onde pudemos pesquisar, o resgate da memória e a história de trabalho-educação é um processo em curso no Brasil que avança na medida em que se ampliam os estudos de história da educação que incluam o tema trabalho-educação.
Neste texto, as análises efetuadas partem do contexto da sociedade brasileira, como totalidade social. Queremos dizer que todos os objetos, fenômenos e sujeitos sociais devem ser contextualizados, ou seja, compreendidos no conjunto das múltiplas relações sociais que lhes dão forma e significado (Kosik, 1978). Contribuem ainda para o aprofundamento de nossos estudos a crítica à economia política, pela qual a sociedade é examinada a partir das mediações e contradições que se fazem presentes nas relações entre o capital e o trabalho (MARX, 1980). Concebemos a história como a produção social da existência, cujos pressupostos são, é preciso viver para fazer história, preservar a memória, construir relatos e narrativas, mas, para viver é preciso comer, abrigar-se, reproduzir-se. (Marx; Engels, 1979). Outros conceitos fundamentais ao tema desenvolvido são mundo do trabalho e a relação presente e passado a partir dos conceitos de memória e história.3
O objetivo principal é resgatar estudos da história de trabalho-educação, primeiro, sobre a educação de crianças pobres em instituições correcionais e educativas; segundo, a educação profissional e técnica nos sistemas de ensino.
O MUNDO DO TRABALHO E OS TRABALHADORES4
Lukács (1978) foi o principal filósofo orientador do tema que encaminhou a discussão da polêmica em torno do trabalho como princípio educativo, conceito básico para o estudo das instituições assistenciais educativas e para a análise das relações de trabalho nas escolas e no mercado de trabalho. Já nos anos de 1980, os estudiosos contestavam: se o trabalho é educativo, como entender que seja educativo o trabalho alienado do trabalhador, pela exploração capitalista?
O autor (Lukács, 1978) desenvolve o tema do trabalho em dois sentidos dependentes das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores como pessoas humanas. No primeiro sentido, o trabalho se manifesta em sua forma ontológica,5 fundamental, estruturante de um novo tipo de ser, o homem, ser social, que exercita as atividades de produção e reprodução da vida, a exemplo dos cuidados da casa, dos filhos e dos pais, dos coletivos, das atividades livres de criação e de arte, produzindo valores de uso. A delimitação entre a reprodução estritamente biológica e a produção/reprodução própria dos homens é constituída não apenas pelo produto do trabalho, mas pela consciência, pela capacidade de representar o ser, o produto, de modo ideal, na sua imaginação criadora.
Mas o trabalho também se exerce nas suas formas históricas, penosas, alienantes, desintegradoras dos melhores valores da pessoa humana, no trabalho escravo, servil, no trabalho assalariado pela venda da força de trabalho, na produção e reprodução capitalista. Nas condições de exploração do trabalho pelo sistema capital, o trabalhador é separado dos produtos do trabalho, do conhecimento e da sociabilidade gerada na produção, como bem expressa o fetiche da mercadoria ou valor de troca (Marx, 1980, p. 79-93).
Na primeira e na segunda acepção de trabalho, modificam-se não apenas as condições objetivas da produção, mas os próprios produtores e sua subjetividade. Nestes termos, quando falamos em trabalho-educação, defendemos que o trabalho é princípio educativo libertador, de expansão humanizada de homens e mulheres na primeira opção. Seu caráter, libertador depende das finalidades da ação e das condições em que o trabalho se realiza.
Outra questão diz respeito ao termo Trabalho e Educação e sua alternativa, Trabalho-educação. De nosso ponto de vista, é preciso que se faça o reconhecimento da unidade epistemológica, história e educacional dos dois termos, trabalho e educação (Ciavatta, 2019b). A educação faz parte do mundo do trabalho na medida em que participa do conhecimento gerado pelos processos do trabalho de transformação da natureza e da sociedade.
No sentido historicizado da própria noção, Hobsbawn (1987, p. 79-98) fala em “worlds of labours”, em mundos do trabalho, ao tratar da formação e da evolução da classe trabalhadora6, suas relações com a sociedade e a consciência, os modos de vida e os movimentos que elas geraram, distinto de sua redução a mercado de trabalho. O que significa que mundo do trabalho é uma expressão complexa da realidade do trabalho e dos trabalhadores, contida nas suas formas econômicas e nas relações sociais (culturais, políticas, educacionais etc.) que aí se estabelecem. Estas relações incluem a representação e o reconhecimento do coletivo classe operária ou classe trabalhadora.
MEMÓRIA E HISTÓRIA: A RELAÇÃO PRESENTE E PASSADO7
Autores importantes como Benedetto Croce8, Walter Benjamin,9 consideram que “todo presente carrega em si as condições de cognoscibilidade” (Mastrogregori, 2006, p. 76). A questão da cognoscibilidade se constitui como uma “relação inédita com o passado” no final do século XVIII, criando espaço para questões e problemas historiográficos, para a “memória coletiva”, as memórias e todos os traços visíveis do passado no presente. Para Maurice Halbwachs “as memórias tornam-se possíveis devido às condições sociais do presente” (Mastrogregori, 2006, p. 75-76).
No início do século XX, Marc Bloch (2001)10 reconhece e destaca o papel da memória coletiva na evolução histórica. Seria a memória transmitida das gerações mais velhas às novas gerações que dariam aos grupos sociais a relação do presente com o passado. Não se trata de conservar o passado, mas de reencontrá-lo ou reconstruí-lo partindo do presente. Bloch (2001) propunha uma compreensão histórica do passado. Como historiador, Bloch preocupava-se com a memória jurídica da sociedade, com a memória familiar, dos grupos religiosos e das classes sociais, pensamento que conflui para o conceito de memória coletiva da Halbwachs (2004) e sua importância para a relação passado e presente.
Jorn Rüsen (2009, p.164)11 tem uma vasta produção em teoria da história, em defesa do caráter científico da história e de sua relação com a prática do historiador. Inicia seu ensaio com uma afirmação esclarecedora sobre a relação memória e história, o passado e o presente:
A memória torna o passado significativo, o mantém vivo e o torna uma parte essencial da orientação cultural da vida presente. [...] A história é uma forma elaborada de memória, ela vai além dos limites de uma vida individual. (Rüsen, 2009, p.164).
No campo específico de estudos sobre Trabalho-educação, é básico para os pesquisadores, ir à raiz da exploração do trabalho nas sociedades capitalistas, através da crítica à economia política, e pela história que é a produção social da existência. Pela crítica, alcançamos a contradição capital e trabalho que é a produção e reprodução do capital, da riqueza pela exploração da força de trabalho. Mas ainda são poucos os autores que se dedicam a ir além da teoria, do poder explicativo da crítica à economia política para a aventura documental da história como prevê a concepção de Marx e Engels em “A ideologia alemã” (Marx; Engels, 1979) e todos os historiadores que abriram seus estudos segundo a École des Annales.
Do ponto de vista da pesquisa científica, significa descer aos meandros da empiria, incluindo fontes de arquivos, história oral, iconográfica, mapas e outros documentos, a partir da concepção da história em Marx em A Ideologia alemã (Marx; Engels, 1979) e em todo exercício historiográfico que é o 18 Brumário (Marx, 1978), o Capital (Marx, 1980) e, com outros historiadores, incluindo todos os relatos, citações de documentos, matérias de jornais, notas sobre eventos que dão corpo e forma à argumentação de sua crítica contundente ao sistema capital, à divisão social do trabalho e à luta de classes.
Além da produção dos historiadores, a historiografia implica, também, a análise que os historiadores fazem sobre o próprio fazer historiográfico. Embora a história da educação no Brasil seja uma área de extensa e diversificada produção acadêmica, são mais escassos os estudos historiográficos sobre o fazer do historiador.
É de se salientar a ausência do tema trabalho e do tema educação em estudos de “historiadores de ofício”. Escrevendo sobre a historiografia da classe operária, o historiador Cláudio Batalha (1998, p. 157) observa que um livro (Cardoso; Vainfas, 1997) “que trata dos campos da produção histórica não dedica nenhum capítulo à história do trabalho ou à história operária, ao passo que a história empresarial, a história das paisagens, ou do uso do computador merecem capítulos específicos”. É de se salientar que também a história da educação está ausente do mesmo livro (Ciavatta, 2015). E o historiador Francisco Falcon (2006) chamou a atenção para a escassez de trabalhos de história da educação entre os historiadores.
Ir à raiz do modo de produção capitalista, dos meios de produção da vida no momento presente, implica conhecer também o passado das condições de trabalho e de formação no passado. Foram quatro séculos de escravidão, primeiro, a tentativa de escravizar os índios que foram privados, de suas terras, mas não submetidos; depois, a escravização ampla de negros, homens e mulheres trazidos da África em condições sub-humanas. Com requintes da exploração estruturada em torno de reis e imperadores, interiorizada nos países de origem, submeteram-se, não sem resistências, a todo tipo de apropriação de seus corpos e de suas vidas para o trabalho dito manual (Freyre, 1995). Com trabalhos torturantes e aliciamentos, os escravizados foram para as fileiras e engenhos de cana de açúcar, para os eitos das plantações de café, para garimpo do ouro e de diamantes nas “minas gerais” (Gomes, 2021), extraindo riqueza para a Coroa Portuguesa e para o capitalismo inglês alimentar a Revolução Industrial (Engels, 1985).
A inferioridade do trabalho manual é o pano de fundo da preparação para o trabalho destinado a escravizados e a trabalhadores livres na Colônia, no Império e, subsequentemente, após a Lei da Abolição (1888) e depois da Proclamação da República (1989), à toda a população brasileira pobre, crianças, jovens e adultos. Às vezes explícito, outras disfarçado sob artifícios ideológicos, o tratamento do trabalho manual, como inferior, discrimina a massa trabalhadora e seus filhos, separando-a para as duas orientações principais da educação, a acadêmico-humanista e científica para os filhos das elites, com vistas ao ensino superior e, para os demais, a profissional manual, técnica ou instrumental.
HISTÓRIA DE TRABALHO-EDUCAÇÃO: CRIANÇAS POBRES NAS INSTITUIÇÕES ASSISTENCIAIS E EDUCATIVAS
Os antecedentes das Escolas de Aprendizes Artífices criadas em 1909, a imposição do trabalho e a negação da educação, estão no primeiro volume da trilogia da obra de Luiz Antonio Cunha (2000a). A história de trabalho-educação de crianças pobres nas instituições assistenciais, educativas e correcionais, no âmbito público e privado, tem por base aprendizagem de ofícios artesanais e manufatureiros no Brasil Colônia, juntamente com a criação dos Asilos de Meninos Desvalidos na terceira década do Império.
Diversos autores se dedicaram a estudar esta herança da imposição da aprendizagem do trabalho e da educação negada na sua completude, porque restrita às primeiras letras e sem articulação como os demais níveis dos sistemas de ensino. Um trabalho coletivo de professores da Rede FAETEC (Fundação de Apoio à escola Técnica) do Rio de Janeiro que recupera a memória e história da transformação dessas instituições no Rio de Janeiro que tiveram início nas primeiras décadas do século XX (Centro, 2017): o Complexo de Quintino ou Escola Quinze de Novembro, atual Escola República, a Escola Visconde de Mauá, a Escola Ferreira Vianna, a Escola do Trabalho, depois, Escola Profissional Henrique Lage, Escola Silva Freire.12 Neste texto, vamos nos deter em dois trabalhos: Faria Filho (2001) e Oliveira (2003).
4.1. Luciano Mendes de Faria Filho - Para a história de trabalho-educação de crianças pobres em instituições assistenciais e educativas, o primeiro livro que apresentaremos é “República, trabalho e educação; a experiência do Instituto João Pinheiro (1909-1934) de Luciano Mendes de Faria Filho (2001) e sua releitura por Rosangela Rosa (2019). Faria Filho transcreve a concepção do Instituto, própria à ideologia filantrópica da época:
O socorro oficial à criança abandonada é obra de solidariedade humana, de convicção e de sentimento republicano, de previsão econômica e de prevenção criminal (Regulamento, 1910, p. 6, apudFaria Filho, 2001, p. 15).
A experiência é exemplar do “modelo de serviço público para atenção às crianças desamparadas” baseado na ordem e disciplina que caracterizou os “asilos para crianças desvalidas” no Império. O relato cobre a existência da instituição durante quase três décadas. Trata-se de uma “experiência educativa / formadora / modeladora. Embora fosse instituída como “caridade”, caracterizou-se como ação disciplinadora sob a ótica da burguesia que a idealizou” (Rosa, 2019, p. 99). A República assumia o mesmo modelo educativo do Império: educar o cidadão republicano no trabalho e pelo trabalho.
As fontes documentais para a pesquisa foram documentos institucionais encontradas no Arquivo Público Mineiro, publicações da Direção do Instituto, documentos da Febem (Fundação Estadual de Amparo ao Menor) e outros documentos do arquivo do Instituto, tais como, prontuários de ex-alunos (cerca de 4 mil), fotografias, jornais da época, entrevistas com alunos e professores e o livro “Proteção ao Menor: Leon Renault um pioneiro”. Os diversos documentos, especialmente, os prontuários permitiram analisar o cotidiano dos alunos e dos professores, concluindo que “o Instituto objetivava a formação do trabalhador assalariado e do `cidadão republicano´, tendo um pouco de escola e um pouco de prisão, de formação técnica e de formação disciplinar” (Rosa, 2019, p. 100-101).
Também estava presente a “necessidade” de “instituições de combate à criminalidade” (Faria Filho, 2001, p. 12), um receio das “classes perigosas” apontado por vários autores que estudam as relações entre as elites e os pobres, remanescentes de escravizados abandonados pelo poder público. Para as elites, desde o final do século XIX, tratava-se “de controlar o espaço do negro na sociedade pós-escravidão e, em âmbito maior, das classes populares” (Afonso; Santos, 2020, p. 185).
Faria Filho não se detém na explicitação de categorias teóricas para sua análise, mas são várias as categorias específicas ao longo do texto: a formação dos meninos (de 8 anos e mais), os alunos, os professores, o cotidiano, o trabalhador assalariado, a formação técnica, a formação disciplinar, o “cidadão republicano”, a assistência social, as crianças abandonadas, a mão de obra, o ensino agrícola, a experiência, o delinquente, a questão social, a resistência (Rosa, 2019, p. 102).
A ausência feminina é destacada por Faria Filho (2001, p. 67). No corpo discente, entende-se que, em uma época em que não se praticava a coeducação nas escolas, a opção tenha sido somente acolher meninos. Mas a ausência de documentos sobre mulheres no processo educativo é interpretada pelo autor como uma ausência “produzida”.
Faria Filho (2001, p. 164) conclui que o êxito do Instituto João Pinheiro, tendo à frente Leon Renault, serviu aos desvalidos, mas também a outras crianças cujas famílias, seja por falta de escola, seja “pela dificuldade de ´criar´ os filhos”. Ainda fez-se sentir, primeiro, influenciando a legislação mineira e outras instituições similares no país; segundo,
[...] sua prática e seu discurso iam ao encontro das aspirações e dos interesses da burguesia´ e dos setores médios da sociedade que defendiam uma associação da assistência com o trabalho assalariado, como forma de combate à marginalidade, à desordem, à vadiagem ou, mais simplesmente, à pobreza. (Faria Filho, 2019, p. 164).
Mas registra ainda que:
[...], não obstante toda a vigilância, controle, penas e prêmios, os alunos estavam continuamente a subverter a ordem, a atentar contra o regulamento, a buscar redefinir as práticas a seu favor. (Faria Filho, 2019, p. 164).
Aos olhos do autor não seria resistência ao processo educativo do Instituto, já que, ao saírem de lá, elogiavam a instituição.
De nosso ponto de vista, dois aspectos devem ser introduzidos nesta análise, Primeiro, a memória é uma forma de representação, a consciência subjetiva do que vivemos. As lembranças da infância costumam ser embelezadas pelo tempo. Além disso, a memória é seletiva (Pollack, 1989), não havia somente opressão nas escolas, momentos de folga, de brincadeiras, de amizade e proteção são sempre lembrados. Segundo, o termo resistência é, politicamente, toda ação individual ou coletiva, de oposição a uma norma, a um poder estabelecido, ou “redefinir práticas a seu favor” como disse o autor (Faria Filho, 2019, p. 164).
4.2. Milton Ramon Pires de Oliveira - A assistência educativa e correcional de crianças pobres não ocorreu apenas na cidade com os aprendizados básicos das Escolas de Aprendizes Artífices. Ela se deu também no campo, nos patronatos agrícolas (Oliveira, 2003). É de uma desta instituições de que trata o livro “Formar cidadãos úteis: os patronatos agrícolas e a infância pobre na Primeira República”, que analisamos Ciavatta (2019c).
A presença das oligarquias latifundiária e empresarial é recorrente na história do Brasil, sempre ciosas de manter sua riqueza e privilégios. As precárias condições de vida, a desregulamentação das relações de trabalho, as greves e mobilizações dos trabalhadores das fábricas, a presença nas ruas, de crianças e adolescentes maltrapilhos, pedindo comida, no início do século, foram tratadas como “a questão social”, como culpados da desigualdade das classes sociais, perturbadores da ordem, carentes de educação e disciplina. A resposta das elites foi o assistencialismo religioso e as iniciativas assistenciais e correcionais do Estado republicano.
O livro de Oliveira (2003) traz uma fundamentada análise de sociologia histórica sobre os patronatos agrícolas, criados para formar “cidadãos úteis” no início do século XX. São os patronatos agrícolas, 20 unidades, criadas de 1918 a 1926 (Oliveira, 2003, p. 35-37). Foram subordinados, desde o início, ao Ministério da Agricultura e suas diversas denominações. Mas o autor assinala a presença dos patronatos:
junto a instâncias governamentais que tinham na repressão parte de suas atribuições - Polícia do Distrito Federal, Ministério da Justiça, além da articulação de suas ações a outras instituições nas quais o perfil repressivo ocupava a maior parte, aspectos presentes fortemente nos documentos consultados. (Oliveira, 2003, p. 55).
Fábio Konder Comparato (2017) permite compreender os fatores estruturantes das sociedades, no caso da brasileira, suas oligarquias, são as relações de poder e a consciência social que são aceitas rejeitadas pelos grupos dominantes e suas relações intraclasses, a adesão aos valores e à cultura que praticam. No caso brasileiro, como repetimos ao longo do texto, prevalece a naturalização do trabalho escravo, dos maus tratos aos trabalhadores, da pobreza e suas consequências pela organização colonial de apropriação exclusiva da terra, pela exploração do trabalho, pela visão elitista e preconceituosa do trabalho manual. Tratava-se de conformar a força de trabalho, com a intervenção direta ou com o apoio do Estado a instituições privadas. E a legitimação de juristas, médicos, engenheiros e militares.
Pela ideia de modernidade, as transformações econômicas exigiriam uma nova ordenação do trabalho. As classes dominantes percebiam o mundo dos ex-escravizados como se tivesse havido um nivelamento de todas as classes. A ameaça tinha uma de suas expressões no combate à ociosidade, na inculcação da ordem, no combate aos vícios que “seriam vencidos através da educação, e educar libertos significava criar o hábito do trabalho através da repressão, da obrigatoriedade” (Oliveira, 2003, p. 39-42).
A concepção idealizada do campo contraposto à cidade, como suficiente para incorporar práticas e valores, era valorizada para formar “cidadãos úteis”.
Os Patronatos Agrícolas, também criados com a pretensão de constituir uma rede, tenderiam a abrigar os objetivos de assistência, regeneração, educação e ensino profissional [...] (Oliveira, 2003, p. 42).
Representava também, resposta do governo federal à chamada “questão social”.
Sonia Mendonça (1997), historiadora da questão agrária e da agricultura brasileira, citada também por Oliveira (2003), é contundente na sua análise da educação da infância pobre e no preparo do produtor rural:
Agir sobre uma população tida como ignorante, ministrando-lhe conhecimentos práticos a respeito do trato com a agricultura eis o sentido mais amplo atribuído a chamada instrução elementar agrícola no bojo desse debate. (Mendonça, 1997, p. 90)
Marini (1987), refletindo sobre a situação de dependência dos países em desenvolvimento, do capitalismo avançado, permite aprofundar a compreensão das bases do sistema capital no Brasil, conforme analisa Mendonça (1997, p. 89), ao indicar as necessidades da nova etapa do capitalismo no Brasil e do novo projeto de ensino profissional que toma forma a partir dos anos 1930, com o governo Vargas:
Voltada para a construção de uma nova ética do trabalho, regeneradora e disciplinadora de homens inferiores, ela distanciava-se do movimento de difusão do ensino primário obrigatório junto à massa analfabeta, que culminaria nos anos 1920 no denominado “otimismo pedagógico”. A educação técnica e profissionalizante seria sua tônica: aprender vendo ou fazendo, era o critério dessa moderna pedagogia, adequada às vicissitudes do capitalismo mundial, gerador de novas tecnologias agrícolas em vias de difusão. (Mendonça, 1997, p. 89).
A HISTORIOGRAFIA EM TRABALHO-EDUCAÇÃO: A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL
Nos limites deste texto investigativo, dividimos em dois blocos a apresentação de alguns autores que dão sustentação à evidência da imposição do trabalho e a negação da educação: a historiografia em trabalho-educação com foco na educação profissional nas instituições dos sistemas de ensino; e trabalho-educação de crianças pobres nas instituições assistenciais e educativas.
Sobre a educação profissional nas instituições de ensino, são quatro os autores que selecionamos, porque eles escrevem sobre os primórdios e o desenvolvimento da educação profissional: Celso Suckow da Fonseca, Francisco Montojos, Demostenes de Oliveira Dias e Luiz Antonio Cunha.
3.1. Celso Suckow da Fonseca (1905-1966) - O trabalho seminal da história de trabalho-educação, das Escolas de Artes e Ofícios e do Ensino Industrial no Brasil é o livro de Celso Suckow da Fonseca (1961, dois volumes), publicado em cinco volumes pelo SENAI-DN (1986), nossa referência neste texto. 13 Nós três primeiros volumes, o autor trata das questões gerais da educação e de sua evolução de artes manuais para a introdução das máquinas e da energia elétrica.
Nos dois volumes finais, Fonseca (1986) percorre os vários estados brasileiros que implantaram as Escolas de Aprendizes Artífices segundo o Decreto n. 7.566/1909 do Presidente da República, Nilo Peçanha. Destaca-se no seu trabalho de historiador a pesquisa e registro das fontes documentais. Como registram Morais e Ferreira (2019, p. 59 e ss.), Suckow da Fonseca pesquisou durante dez anos, em arquivos públicos (Biblioteca Nacional, Biblioteca Municipal, Arquivo Nacional, Biblioteca da Câmara dos Deputados, Biblioteca da Câmara dos Vereadores e em acervos dos Estados e dos Ministérios). Em todos os volumes, destacam-se fotografias, mapas de localização, relatórios, cópias de documentos, cópia das leis citadas e esclarecedora cronologia dos acontecimentos.14
Outros estudos sobre a obra de Fonseca, com base no materialismo histórico, a exemplo de Ciavatta e Gontijo (1999, p. 137) destacam o conjunto da obra que “representa um notável esforço de registro da memória histórica da origem e da evolução do ensino industrial” para o ensino técnico. Com referenciais de matrizes sociológicas, políticos e ideológicas, Silva e Medeiros Neta (2019, p. 2) também realizam uma análise historiográfica da obra: “Diante de sua atuação em diversos papéis no campo da educação profissional no Brasil, Suckow apresenta indícios de sua escrita engajada”.
A escola de que se ocupa Celso Suckow da Fonseca, “A história do ensino industrial no Brasil” (1986), é a escola tradicional em transformação pelas necessidades do capitalismo, desde a exploração da mão de obra escravizada, aos primórdios da República e ao projeto de desenvolvimento econômico de Getúlio Vargas. Fonseca foi contemporâneo dos êxitos e do autoritarismo do Governo Vargas, da ideologia do progresso e da ordem que teriam na organização do trabalho e da educação as bases para a formação da nacionalidade.
O autor expõe as políticas em curso, de uma sociedade que sempre pretendeu preparar as classes15 populares para o trabalho, separando os futuros dirigentes dos produtores, os que estavam destinados ao conhecimento da natureza, das ciências e das letras, daqueles a quem eram entregues as tarefas de execução.
Este quadro, que tem forte expressão ainda hoje, nas políticas educacionais no Brasil (haja vista a Lei 13.415/2017 em discussão), permeou outros países que nos precederam na sua organização política e social. É o que se apreende do pensamento de Gramsci (Manacorda, 1991, p. 112 e ss.), segundo o qual muitos séculos se passaram até que se recuperasse, pelo menos, teoricamente, a perspectiva unitária da formação do homem político e produtor ao mesmo tempo que, liberado da unilateralidade e restrição de seu ofício particular, se tornasse, de novo, o homem político.16 E isto somente foi possível quando o trabalho produtivo alcançou uma dimensão intelectual, quando essa perspectiva foi se concretizando pelo desenvolvimento das forças produtivas ou seja, do conhecimento, da ciência como uma força produtiva do capital.
Homem do século XX, Fonseca (1986) é contemporâneo da vitória do modelo taylorista-fordista na indústria moderna, em que o trabalhador é posto no interior da produção que foi incorporando a ciência ao mesmo tempo em que, pela simplificação operacional dos processos de trabalho, o reduz a simples operador da máquina. O parcelamento e a fragmentação da atividade fabril não lhe deixam, sequer, o conhecimento gerado em nível dos ofícios da produção artesanal, que pode ser um conhecimento bem menos complexo, mas é global.
Fonseca é homem de seu tempo que foi de extremo conservadorismo e repressão às ideias socialistas e comunistas, de escassa literatura sobre o capitalismo e sobre a crítica à economia política. Como engenheiro, formou-se dentro de um universo familiar técnico e literário. Fonseca era um humanista que defendia a ideia de uma sociedade onde o trabalho manual fosse reconhecido como um valor e todos tivessem acesso ao conhecimento intelectual e ao reconhecimento das atividades técnico-industriais. É o que expressa em seu último capítulo do 3º. Volume (1986, p. 203), “A evolução da filosofia do ensino industrial” que deveria superar “a mera instrução de ofícios em que a princípio se colocara, passando ao problema mais amplo da formação humana, social e econômica (...)”.
3.2. Francisco Montojos (1900-1981) - Montojos (1949), o segundo autor que selecionamos, foi contemporâneo de Celso Suckow da Fonseca. Engenheiro de formação, trabalhou na indústria de construção, mas suas atividades principais foram no ensino industrial, no Ministério de Educação e Saúde, desde os anos 1920, passando por todos os governos, principalmente, Getúlio Vargas, Juscelino Kubtschek e os governos militares. Como Diretor do Ensino Industrial em diversos períodos, atuou na legislação e na organização do ensino industrial e das escolas técnicas. Além disso, teve cargos importantes na organização da CBAI, no INEP, na CAPES, no SENAI.17
Montojos deixou poucos trabalhos escritos, mas é uma referência reiterada na História do Ensino Industrial no Brasil, de Celso Suckow da Fonseca (1986). Seus escritos, a que que tivemos acesso, constam do Relatório Ensino Industrial (Montojos, 1949), do qual valemo-nos neste texto, juntamente com um verbete para a 3ª. edição do Dicionário do pensamento educacional brasileiro” (Ciavatta; Lima, 2023).
Os termos que Montojos utiliza no Prefácio de seu livro é uma afirmação que demonstra conhecimento da área a que dedicou toda a sua vida:
O caráter e o sentido do ensino e de todo o sistema escolar de uma época encontra explicação em fatores sociais, filosóficos, científicos e, sobretudo, históricos. A história da doutrina, através da literatura pedagógica, da legislação escolar e da educação comparada e dos acontecimentos e realizações no campo da educação é um dos elementos básicos para essa compreensão. (Montojos, 1949, p. 5).
Mas o conteúdo do relatório revela a busca de uma pretensa objetividade dos documentos. O autor explica que o livro está dividido em três partes: documentos sobre questões gerais do ensino industrial; relatórios e documentos sobre sua participação em congressos no exterior; e discursos e artigos publicados no Boletim da CBAI, dirigidos a professores e diretores do Ensino Industrial (Montojos, 1949, p. 6).
Montojos foi contemporâneo da Constituição do Estado Novo em 1937 que, no seu artigo 129, declara “o ensino pré-vocacional e profissional, destinado às classes menos favorecidas, é o primeiro dever do Estado” (Montojos, 1949, p. 78). Era um “industrialista” (Pedrosa; Santos, 2015, p. 05). Suas relações com os industriais alimentaram o ideário da Leis Orgânicas de 1942, do Ensino Industrial e do SENAI.
Conservador, anticomunista em períodos anteriores, mostrou-se um liberal no final dos anos 1950. Contribuiu para a terceira Lei de Equivalência que permitiria o acesso ao Ensino Secundário e aos cursos de Engenharia dos concluintes do ensino secundário técnico. Este foi um passo importante nas lutas pela democratização da educação, que seria completado pela LDBEN, Lei n. 4,024/61 ao dar equivalência plena entre o ensino profissional e o ensino secundário.
3.3. Demóstenes de Oliveira Dias - O terceiro autor que trazemos aqui é o livro do Professor de História, aposentado, Demóstenes de Oliveira Dias (1980), o Estudo -Documentário e Histórico sobre a Escola Técnica Federal Federal “Celso Suckow da Fonseca”, de acordo com a Resolução n. 74, de 13 de julho de 1972, do Conselho de Representantes da Escola. O livro trata do encerramento das atividades da Escola Normal de Artes e Ofícios Wenceslau Brás em 1937, e da demolição de suas instalações, o Palacete Leopoldina, para a edificação da Escola Tecnica Federal, segundo a Lei Orgânica do Ensino Industrial, Decreto-lei n. 4.073/1942.
A demolição se fez sob protestos públicos ao Ministro Gustavo Capanema, em razão da tradição e dos atributos históricos do Palacete. Na Explicação Necessária, sua introdução ao livro, Dias (1980, p. 14) justifica o trabalho diante do:
[...] extravio do acervo documental pertencente ao arquivo das antiga Escola Normal Wenceslau Brás, o qual, além de parcialmente destruído pela ação daninha de parasitos, sofreu mudanças desordenadas e arrumações precaríssimas [...]. (Dias, 1980, p. 14).
O processo de encerramento das atividades da Escola Normal ocorreu em meio a manifestações contrárias pela Congregação dos professores e documentos para as autoridades do MES.18 Mas foi tudo em vão. Dias relata:
Nos últimos meses da gestão Sebastião de Queiroz Couto (1933-1937), derradeiro Diretor da “Wenceslau Brás” era frequente a presença do Engo. Francisco Montojos, espécie de eminência parda da administração superior, encarregado que estava por parte do MES, de observar o equacionamento da Escola. É que o Governo federal cogitava reformular o ensino profissional dando-lhe nova estrutura, inclusive mudando sua denominação, que passaria a ser de Ensino Técnico Profissional; daí serem adotadas algumas providências preliminares. (Dias, 1980, p. 96).
Dias (1980, p. 35) critica o desprezo pelo passado: “Não se guardam, por exemplo, fotografias antigas, diplomas, cartas em geral, tudo que representa valor inestimável para recompor uma vida, uma época”. Ressalva a importância da transição tecnológica e da formação de técnicos para uma sociedade em desenvolvimento - eram os anos 1970, tempo da Ditadura empresarial-militar e do projeto de um “Brasil grande”. Mas, humanista, destaca “a formação, o respeito à pessoa humana, sem que haja a predominância da máquina sobre o homem.”
O livro está escrito em quatro capítulos: A família Imperial, Recordando, A implantação do Ensino Profissional, A Escola Venceslau Brás / Escola Técnica Nacional. É um trabalho com abundante documentação: transcrição de cartas, atas, relação nominal de professores e de alunos, premiações, inaugurações, visitas ilustres, fotografias de vários ângulos do Palacete e sua demolição, fotos da Escola Técnica Nacional, fotos das das autoridades do Ensino da escola demolida e da nova escola.
Algumas páginas respeitosas são dedicadas ao Patrono da Escola, Celso Suckow da Fonseca. Os dois livros, Fonseca (1986) e Dias (1980), se cruzam nos fatos históricos vividos, e diferem no foco dos relatos: Fonseca é um engenheiro, educador, historiador de todo um sistema de formação profissional; Dias é o historiador dos detalhes dos acontecimentos, apaixonado pelo seu ofício, por seus locais de trabalho, pela docência e pela preservação da memória.
3.4. Luiz Antonio Cunha - Se na área de pesquisa em história da educação, ainda são escassos os trabalhos de história de trabalho-educação, sobre este tema há alguns grandes trabalhos sobre como o de Fonseca (1986) e de Luiz Antonio Cunha (2000a, b, c.). À revelia da quase ausência do tema na história da educação, Cunha tem trabalhos de especial valor elucidativo sobre educação profissional (Cunha, I973), culminando nesta obra em três volumes, onde trata a questão de trabalho-educação (sem utilizar esta terminologia), da Colônia ao início do século XXI.
Cunha inicia citando Antonio Santoni Rugiu (1998) que fala da ausência do trabalho artesanal nos estudos da educação na Itália - o que se aplica ao Brasil -, como se a educação ocorresse somente pelo estudo dos livros e nas universidades e não, também, nas oficinas. Sua análise concorre para nossa hipótese explicativa de que, no Brasil, aos pobres destina-se o trabalho, as atividades manuais, ditas inferiores, e a educação é “o ensino que se destina às elites e ao trabalho intelectual, deixando o trabalho manual em segundo plano” (Cunha, 2000a, p. 1-2). Este “espaço vazio” estaria presente também nos estudos de história da educação (Ciavatta; Reis, 2019, p. 81).
O autor é parcimonioso nas referências teóricas, mas não deixa de fazer a análise crítica. Como Fonseca (1986) e Dias (1980), é discreto na análise política de governos brasileiros, concentrando-se nas políticas de ensino médio, de ensino e de educação profissional, trabalho manual, trabalho artesanal, trabalho escravo, trabalho livre, força de trabalho, ofícios, educação artesanal, educação manufatureira.
Ele não se detém no exame dos governos ditatoriais após a Proclamação da República em 1889, no Estado Novo, dos anos 1937-1945 e na Ditadura empresarial-militar dos anos 1964-1985. Também não se detém, explicitamente, nas imposições do sistema capital e suas consequências nas políticas de Estado, de repressão às liberdades democráticas dos trabalhadores, salvo em alguns aspectos, como veremos no terceiro livro da trilogia (Cunha, 2000c), o que não diminui a importância histórica dos relatos e das análises presentes em sua obra, para a história de trabalho-educação.
Com base em Peter Burke (1980), permitimo-nos denominar o Professor Luiz Antonio Cunha, de sociólogo e historiador. Ele realiza a leitura sincrônica dos acontecimentos, própria da sociologia, e a leitura diacrônica dos historiadores, destacando as diversas temporalidades e os responsáveis pelas políticas e pela implementação da educação profissional. Estuda as características do país no espaço-tempo dos acontecimentos da sociedade brasileira e sua transformação.
Cunha percorre, nos seus termos, “a obra monumental” de Celso Suckow da Fonseca, “referência básica e interlocutor permanente” (Cunha, 2000a, p. 4, apudCiavatta, Reis, 2019, p. 80). Outros arquivos citados pelo autor são o Arquivo Nacional, a Biblioteca Nacional e o IHGB e autores professores da FGV19, Joaquim Faria Góes Filho, Roberto Hermeto Correa da Costa e outros estudiosos como Dermeval Saviani, José Oliveira, Arapiraca, Lea Pinheiro Paixão, Luiz Carlos Soares e Gisélia Lima Azzedino.
Em razão dos limites deste texto, não analisaremos os três volumes em detalhe. O primeiro volume de sua trilogia cobre “O ensino de ofícios artesanais e manufatureiros no Brasil escravocrata” (Cunha, 2000a, p. 145), desde a Colônia, passando pelo Império, no qual “a questão da educação do povo, do ponto de vista dos intelectuais do Império brasileiro não pode ser entendida separadamente da questão da escravidão”. Diante da pressão da Inglaterra pelo fim do tráfico de escravos, coloca-se a questão para as elites, “como fazer os trabalhadores trabalharem?”. As relações escravistas passaram a ser vistas como “empecilho à acumulação do capital”. E passaram a defender “a substituição do trabalho escravo pelo trabalho livre”. Avaliando que os trabalhadores não se submeteriam facilmente, “Eles precisaram ser educados para ver o trabalho como um dever”.
No segundo livro “O ensino de ofícios nos primórdios da industrialização” (Cunha, 2000b), trata do que vai ocorrer nos primeiros tempos da República, onde o autor se estende sobre a presença do Estado, da Igreja e da oficina: as escolas de aprendizes e artífices, a escola do trabalho, a educação técnica secundária e o ensino profissional. Ele expõe os antecedentes das Escolas de Aprendizes Artífices, criadas uma em cada estado, pelo Presidente Nilo Peçanha,20 e nos informa sobre como o Estado brasileiro impôs, desde a infância, o aprendizado do trabalho e a educação restrita ao nível elementar para a população pobre:
Para cumprir e ampliar a formação compulsória da força de trabalho, foram criadas casas de educando artífices por dez governos provinciais de 1840 a 1865, que adotaram como modelo aprendizagem de ofícios em uso no âmbito militar, até mesmo a hierarquia e a disciplina. O mais importante desse tipo, o Asilo dos Meninos Desvalidos, foi criado na cidade do Rio de Janeiro, em 1875. (CUNHA, 2000b, p. 3)
O texto antecipa a introdução aos textos de trabalho-educação que tratam das instituições assistenciais educativas, como veremos adiante:
Os “meninos desvalidos”, eram os que, de idade entre os 6 e 12 anos, fossem encontrados em tal estado de pobreza que, além da falta de roupa para frequentar as escolas comuns, viviam na mendicância. Esses meninos eram encaminhados pela autoridade policial ao asilo onde recebiam instrução primária e aprendiam os ofícios de tipografia, encadernação, alfaiataria, carpintaria, marcenaria, tornearia, entalhe, funilaria, serralheria, courearia ou sapataria. (Cunha, 2000b, p. 3-4).
O último livro da trilogia é “O ensino profissional na irradiação do industrialismo” (Cunha, 2000c). O livro traz uma análise importante sobre como o desenvolvimento industrial, durante o primeiro governo Vargas (1930-1945), traz mudanças econômicas, novas necessidades técnicas do sistema capital e outras ideologias de legitimação do trabalho e da educação restrita ao ensino profissional.
Duas questões que têm, hoje, forte expressão nas políticas educacionais, são a articulação entre as esferas pública e a privada e sua expressão corporativa na presença dos empresários, principalmente o empresariado paulista, pautando as políticas educacionais. Cunha antecipa a questão de sua intervenção no Estado, a partir dos anos 1930. Trata-se das políticas de formação da força de trabalho e do controle das organizações dos trabalhadores.
A análise política desses fatos tem por base Diniz e Boschi (1991, apudCunha, 2000c, p. 3): “a instauração do corporativismo incorporou o patrimonialismo anteriormente preexistente, consagrando uma nova modalidade de interpenetração entre o público e o privado”, no contexto de fechamento político do Estado Novo, deflagrado a partir de 1937. O empresariado se fez presente de forma ativa nos conselhos e comissões consultivas, em “outras organizações civis situadas fora do âmbito oficial, além de manter as antigas federações e criar confederações, o que era negado aos trabalhadores”, atuando no sentido de seus interesses para a implantação do capitalismo industrial.
Para Ângela de Castro Gomes (1991, apudCunha, 2000c, p. 4), “Foi somente após 1942 que os apelos do discurso trabalhista se manifestaram e a organização sindical prevista na legislação se realizou plenamente”. O que coincide com o momento em que “o contexto nacional e internacional apontava a inevitabilidade para o regime liberal-democrático”, depois do final da Segunda Guerra Mundial em 1945 - quando Vargas é deposto.
Deste quadro econômico e político, Cunha (2000c, p. 5) extrai alguns aspectos da interpenetração das esferas pública e privada. Entre eles, nos parece expressivo quando observa que o Estado se torna:
[...] árbitro dos conflitos entre patrões e empregados, seja favorecendo os primeiros na representação e na negociação bipartite, seja prejudicando os últimos na subordinação de suas organizações a um esquema tutelado verticalista (Cunha, 2000c, p. 5).
Em sequência, Cunha (2000c, p.6) analisa os aspectos subjacentes às políticas educacionais e trabalhistas no período. Prevalece a cultura da inferioridade atribuída às atividades manuais exercidas pelos escravizados, ex-escravizados e da incapacidade dos trabalhadores livres atenderem às exigências técnicas da industrialização. Além da imigração de brancos europeus, do final do século XIX ao início do século XX, “Para evitar esses inconvenientes, começou a surgir toda uma ideologia de valorização do trabalho `do elemento nacional´[...]” que passa a ser objeto da “qualificação profissional como algo que dignificava o trabalhador, algo que ele desejasse para seus filhos” [...].
No mesmo sentido dessas análises, identificamos nos anos 1930-1960, algumas mediações históricas de forte conteúdo ideológico nas ações governamentais para uma suposta interiorização do valor do trabalho, na educação dos filhos dos trabalhadores (Ciavatta, 2009, p. 149-389): a criação da “civilização do trabalho”, a ideologia de valorização do trabalho e do trabalhador, a produtividade o trabalho e do trabalhador e a técnica como um novo humanismo
Cunha (2000c) prossegue no seu elucidativo histórico sobre a montagem do ensino técnico industrial em escolas dos estados e do governo federal: as leis orgânicas do ensino industrial e secundário, a criação do SENAI e a disputa de hegemonia no governo; a presença de educadores como Anísio Teixeira e a tentativa da educação integral com disciplinas gerais e atividades manuais; o fracasso da profissionalização obrigatória na reforma do ensino de 1º. e 2º. Graus dos anos 1970; e os avanços do sistema federal de educação profissional e tecnológica.
O autor termina o livro com um substantivo capítulo de 50 páginas, “O ensino profissional na virada do século” (Cunha, 2000c, p. 154-213), com análise das políticas do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 1999-2002). Trata do SENAI, dos Ministério do Trabalho/Sefor e da Educação/Semtec e suas trajetórias institucionais. Uma das últimas seções é sobre “a recomposição da dualidade” no ensino médio que, desde 1997 tem sido alvo de intensa polêmica e de disputa.
Sua análise crítica prossegue nos dois Governos Lula (2003-2006 e 2007-2010) e nos dá elementos para a compreensão do presente onde identificamos o conjunto de preconceitos, interesses econômicos e poder político face à complexificação cientifica e tecnológica dos sistemas produtivos, à privatização dos serviços públicos, à financeirização de economia e à “direitização” política em curso no Ocidente, já identificada nos anos 1980, por Cueva (1987).21
Os termos de Cunha (2000c), sintetizam as forças em disputa no processo permanente de recomposição do dualismo na educação e no trabalho no Brasil:
[...] enquanto uns pretendiam que o Brasil fosse o primeiro país capitalista a adotar a politecnia como princípio educativo no ensino médio e queriam ver os gérmens dessa pedagogia nas escolas técnicas existentes, outros cerravam fileiras na defesa dos sistemas de aprendizagem controlados pelo patronato, rejeitando o controle estatal e/ou a participação dos sindicatos dos trabalhadores em sua gestão (Cunha, 2000c, p. 244).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O plano mais amplo de estudo do contexto e de sua totalidade social tem como mediações permanentes a história do país, a imposição do trabalho e a negação da educação. Contribuem, para seu aprofundamento, estudos já bastante desenvolvidos, especialmente, a crítica à economia política e a história como produção social da existência, a concepção revolucionária de Marx para a história de trabalho-educação.
Assumimos o trabalho em dois sentidos dependentes das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores como pessoas humanas. No primeiro sentido, o trabalho se manifesta em sua forma ontológica, fundamental, estruturante de um novo tipo de ser, o homem, ser social, que exercita as atividades de produção e reprodução da vida. No segundo sentido, o trabalho também se exerce nas suas formas históricas, penosas, alienantes, desintegradoras dos melhores valores da pessoa humana, no trabalho escravo, servil, no trabalho assalariado pela venda da força de trabalho, na produção e reprodução capitalista
Nos limites deste texto investigativo, dividimos a apresentação de alguns autores em dois blocos: trabalho-educação de crianças pobres nas instituições assistenciais e educativas; e historiografia em trabalho-educação e a educação profissional em instituições de ensino. Os antecedentes das Escolas de Aprendizes Artífices criadas em 1909, para a educação de crianças pobres nas instituições assistenciais, educativas e correcionais, têm por base aprendizagem de ofícios artesanais e manufatureiros no Brasil Colônia, juntamente com a criação dos Asilos de Meninos Desvalidos pelo Imperador Pedro II. Sobre a questão, são exemplares os trabalhos de Luciano Mendes Faria Filho e de Mílton Ramon Pires de Oliveira.
Sobre a história de trabalho-educação e a educação profissional em instituições de ensino, são quatro os autores que nos levam aos primórdios e ao desenvolvimento da educação profissional: Celso Suckow da Fonseca, Francisco Montojos, Demostenes de Oliveira Dias e Luiz Antonio Cunha.
A escola de que se ocupa e os demais autores é a escola tradicional em transformação pelas necessidades do desenvolvimento capitalista, desde a exploração da mão de obra de escravizados, seus descendentes e os trabalhadores livres O estudo dos autores aqui apresentados confirma a hipótese inicial da imposição do trabalho e da negação da educação, primeiro na Colônia e no Império; depois, na República, a continuidade da cultura da discriminação dos trabalhadores manuais e do preconceito contra suas atividades consideradas inferiores. A implantação sistemática do ensino profissional e técnico amplia sua capacidade ordenadora da estrutura desigual e da cultura discriminadora e antirracista da sociedade brasileira. Mas isso não ocorreu sem resistência aos excessos políticos e educacionais, pelo acesso a melhores condições de trabalho e a níveis mais elevados da educação.
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1
Este texto é parte da pesquisa “A fotografia em livros e periódicos especializados - Da história da educação à história de trabalho-educação” (Bolsa Pesquisador Senior CNPq). Das fases anteriores citamos o livro Ciavatta et al; (2019a, 2023) além de artigos em periódicos.
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2
Estudo recente da Fundação Getúlio Vargas mostra que entre “a elite que representa 0,01% da população, o crescimento médio da renda dobrou (96%) entre 2017 e 2022.Enquanto isso, os ganhos da imensa maioria da população adulta (os 95% mais pobres) não avançou mais que 33%” (...) (Fernandes, 2024, p. A13).
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3
O texto recupera questões teóricas de nossos trabalhos anteriores sobre trabalho-educação e sobre a educação profissional e tecnológica, a exemplo da Aula Inaugural do Centro de Memória do Instituto Federal do Rio Grande do Sul. Disponível em https://www.youtube.com/channel/UClJz7zUaYUxMSQel3OHAsrg/featured. Acesso em 17-02-2024.
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4
Esta fundamentação teórica, em seus termos gerais, consta de outros trabalhos nossos, a exemplo de Ciavatta (2015).
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5
O conceito de ontologia aqui empregado difere da tradição da metafísica clássica, assim como das correntes positivistas e neopositivistas que compartilham de uma visão estática e reificada do ser. Utilizamos o termo no sentido marxiano e lukacsiano que tem no trabalho uma categoria central, estruturante de um novo tipo de ser, o homem, e de uma nova concepção da história com base na realidade externa, objetiva.
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6
Entre o fim do século XVIII e meados do século XX, nos países europeus que primeiro se industrializaram, particularmente, a Grã-Bretanha. (Hobsbawn, 1987, p. 13-4).
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7
Esta seção tem por base, CIAVATTA, Maria (2019b).
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8
Benedetto Croce (1866-1952), filósofo, historiador e político italiano, de posições socioliberais.
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9
Walter Benjamin (1892-1940), filósofo, crítico e sociólogo alemão.
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10
Marc Bloch (1866-1944), historiador francês, um dos fundadores da Écoles des Annales.
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11
Jorn Rüsen, historiador e filosofo alemão; investiga, principalmente, teoria e metodologia da história, história da historiografia, metodologia do ensino da história.
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12
As Escolas João Alfredo, Visconde de Mauá e Henrique Lage também são nosso objeto de pesquisa (Ciavatta Franco, 1993). Outras instituições tiveram origem na segunda metade do século XX; e estudos sobre o tema são parte da Coletânea (Centro, 1917).
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13
Esta seção retoma e aprofunda um estudo elaborado sobre Fonseca; Ciavatta (2010).
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Em Ciavatta e Silveira (2010, p. 49-149), estão selecionados textos de “A história do ensino industrial no Brasil” escrita por Celso Suckow da Fonseca, sobre as seguintes questões: Antigos Centros de Aprendizagem; A influência de D. João VI; O ambiente do início do Império; A ação do Governo Imperial; As primeiras providências da República; As consequências da Lei Orgânica do Ensino Industrial; O SENAI; Evolução da Filosofia do Ensino Industrial.
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Ver, entre outros, Hobsbawn, 1987; Thompson, 1998.
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Parte destas reflexões constam de Ciavatta Franco (1993).
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Comissão Brasileiro-Americana de Ensino Industrial (CBAI); Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP); Coordenação de Pessoal do Ensino Superior (CAPES); Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI).
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Ministério de Educação e Saúde.
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Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB); Fundação Getúlio Vargas (FGV).
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Decreto do Presidente Nilo Peçanha7.566, em 23 de setembro de 1909, criando inicialmente, 19 “Escolas de Aprendizes Artífices”.
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Sua culminância foi o golpe político, parlamentar, jurídico e empresarial que depôs a Presidenta Dilma Rousseff (2011-2016). Seguiu-se o direitismo exacerbado do recém-derrotado governo Jair Bolsonaro (2019-2022) e o terceiro mandato do Presidente Lula da Silva iniciado em 2023.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
07 Abr 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
15 Mar 2024 -
Aceito
03 Jan 2025
