RESUMO
O artigo analisa o romance Jeqe, the Bodyservant of Shaka, originalmente publicado sob o título Insila kaShaka (1931), do educador e político sul-africano John Langalibalele Dube, com ênfase na construção de uma identidade nacional zulu no entrelaçamento entre história e literatura. O foco recai sobre as conexões entre a trajetória e a produção literária de Dube e os movimentos culturais e políticos das primeiras décadas do século XX, particularmente no contexto das articulações políticas promovidas por líderes sul-africanos diante do avanço das legislações segregacionistas. Em Jeqe, Dube buscou idealizar um novo tipo de homem zulu e ressignificar a memória coletiva de figuras associadas à fundação e expansão do reino Zulu, como Shaka kaSenzangakhona, explorando o passado como fonte de estratégias para enfrentar as novas realidades políticas do Estado nacional sul-africano.
Palavras-chave:
História e literatura; África do Sul; John Langalibalele Dube
ABSTRACT
The article analyzes the novel Jeqe, the Bodyservant of Shaka, originally published as Insila kaShaka (1931), by the South African educator and politician John Langalibalele Dube, with a focus on the construction of Zulu national identity through the interweaving of History and Literature. Emphasis is placed on the connections between Dube's trajectory and literary production with cultural and political movements in the early decades of the 20th century, particularly in light of the political mobilizations led by South African leaders in response to the rise of segregationist legislation. In Jeqe, Dube sought to idealize a new type of Zulu man and to reframe the collective memory of figures associated with the foundation and expansion of the Zulu kingdom, such as Shaka kaSenzangakhona, looking to the past for strategies to confront the new political realities of the South African nation-state.
Keywords:
History and literature; South Africa; John Langalibalele Dube
O processo de formação do Estado nacional na África do Sul, na primeira década do século XX, foi acompanhado por intensos debates acerca da identidade nacional sul-africana - e, sobretudo, pela definição de critérios de exclusão política de todos aqueles que não incorporavam os elementos que caracterizavam essa identidade. Entre as medidas implementadas nesse período, destaca-se o Natives’ Land Act de 1913, considerado uma das primeiras legislações segregacionistas na África do Sul, e que resultou na marginalização política e socioeconômica de milhões de sul-africanos classificados como nativos. Nesse contexto, diversas organizações e ações políticas surgiram entre as lideranças de populações categorizadas como nativas, com o objetivo de desenvolver estratégias para enfrentar as novas realidades sociopolíticas e, sobretudo, protestar, questionar ou reverter a legislação segregacionista vigente.
Entre os intelectuais envolvidos nas articulações políticas da virada do século XIX para o XX, destaca-se John Langalibalele Dube (1871-1946), um educador, político e romancista de origem zulu e uma das figuras fundadoras do South African Native National Congress (SANNC) em 1912, que mais tarde daria origem ao African National Congress (ANC). Além de seu engajamento no campo educacional, fundamentado em su a crença no autoaprimoramento e na inclusão social da população zulu por meio da educação socioprofissional, Dube também se envolveu com a editoração do Ilanga lase Natal, um dos primeiros jornais publicados na língua isiZulu. Foi, ainda, autor do romance histórico Jeqe, the Bodyservant of Shaka, publicado originalmente sob o título Insila kaShaka, em 1931, em um momento marcado pela aproximação de Dube com organizações políticas e culturais voltadas para a valorização de uma identidade nacional zulu, sobretudo o Inkatha, fundado em meados da década de 1920.
Ambientado entre as décadas de 1820 e 1830, Jeqe narra a história de um guerreiro homônimo que é forçado a abandonar sua terra e reconstruir sua identidade diante de novas circunstâncias políticas. Este artigo busca analisar as relações entre história e literatura em Jeqe, the Bodyservant of Shaka, com foco especial na construção de uma (nova) identidade nacional zulu, particularmente através da idealização do homem zulu como um indivíduo marcado pela bravura e coragem, mas também pelo autoaprimoramento moral e intelectual e pelo autocontrole da violência física. Ao mesmo tempo, o romance promove a recuperação de uma memória em torno de Shaka kaSenzangakhona (c. 1787-1828), valorizando símbolos e rituais relacionados à ideia de uma “nação zulu” como estratégias para enfrentar uma situação política e socioeconômica agravada pelo avanço das legislações segregacionistas nas primeiras décadas do século XX. Compreendendo os processos históricos de construção das identidades culturais, constituídas a partir de experiências históricas comuns e códigos culturais compartilhados (Hall, 2006), bem como nos usos da memória e da história (Pollak, 1992), o artigo busca problematizar os escritos de John Dube a partir de sua reconstrução das histórias zulus e de suas reivindicações políticas em novos tempos marcados pelo segregacionismo.
John Langalibalele Dube, entre a política e a cultura escrita:
Os contextos culturais e políticos nos quais a trajetória de John Langalibalele Dube ganha forma foram marcados pelos avanços das políticas coloniais no sul da África; por esforços das elites coloniais e do colonato branco em controlar as terras e a mão de obra africana, sobretudo para a mineração; e pelo impacto de legislações segregacionistas que, na virada do século XIX ao século XX, buscaram minar os direitos políticos e sociais dos sul-africanos negros. Conforme Antonio Evaldo Barros (2012), John Langalibalele Dube, que nasceu em Inanda (Colônia de Natal, atual África do Sul) em 1871, descendia de comunidades linhageiras de origem amaQadi, que foram marginalmente incorporadas ao centro de poder zulu nas primeiras décadas do século XIX, e passaram a ser identificadas coletivamente, e frequentemente de caráter pejorativo, como amaLala (Hamilton, Wright, 1990). Tudo indica que os pais de John Dube, em decorrência de processos internos de perseguição e violência contra comunidades categorizadas como amaLala em meados das décadas de 1830 a 1840, migraram para a recém-estabelecida Colônia de Natal. A família de Dube, assim como inúmeras comunidades que fizeram essa travessia rumo à Natal, passou por processos de cristianização pela ação missionária na região: seu pai, James Dube, foi um dos primeiros pastores ordenados pela American Zulu Mission em Inanda.
Convém frisar que, principalmente a partir da década de 1840, a administração britânica da Colônia de Natal implementou uma série de políticas voltadas ao controle da população nativa e regulamentação da lei costumeira, e que ficaram conhecidas como “sistema Shepstone”, em referência a um dos seus idealizadores, o administrador colonial Theophilus Shepstone (1817-1893). O “sistema Shepstone” era baseado em um modelo de governo indireto, buscando incorporar as autoridades tradicionais africanas, a exemplo dos chefes, como parte da administração colonial, incumbindo-os de manter a ordem social, coletar os impostos coloniais (a exemplo da hut tax) e fornecer mão de obra para o colonato branco. Como parte deste sistema de administração, as populações categorizadas como nativas foram realocadas em áreas formadas por reservas, estabelecendo-se, portanto, uma distinção entre terras disponíveis para o colonato e as terras destinadas aos nativos. O sistema também se ancorava em certa perspectiva paternalista nas relações entre a população nativa, as chefaturas e o governo colonial, o qual teria, dentro desse sistema, uma função tutelar e protetora. As autoridades tradicionais africanas, embora continuassem a ocupar funções políticas em suas comunidades, eram proibidas de participar nas eleições locais da colônia (Guy, 2018; Ivey, 2008).
Além disso, uma perspectiva “tribal” ganhava espaço, tanto na administração colonial quanto nas ações de missionários europeus e estadunidenses no sul da África. A partir dessa perspectiva, as populações africanas passavam a ser categorizadas em “tribos”, as quais eram vistas como identidades fixas e unidades culturais razoavelmente monolíticas, que se caracterizavam pela utilização de uma língua, sistemas de organização social e práticas de lei costumeira em comum. Além disso, as “tribos” eram vistas por muitos administradores coloniais como formadas por unidade e coesão interna, características que teriam sido preservadas desde o processo de fundação ou formação dessas comunidades “tribais” (Mamdani, 2012). As estações missionárias formadas por estadunidenses, que começaram a se aproximar dos territórios habitados por comunidades falantes da língua isiZulu na segunda metade de 1830, compartilhavam dessas perspectivas, especialmente em seus esforços para cristianizar e educar os “zulus” - termo que passa a ser utilizado com maior frequência e de forma generalizada para se referir a um conjunto vasto de populações que não necessariamente se autoidentificavam como amaZulus. Os impactos do “tribalismo” entre as comunidades falantes de isiZulu tem sido objeto de investigação da historiografia recente, que tem demonstrado um vasto leque de iniciativas que incluíam a formação de grupos nacionalistas/protonacionalistas amparados na noção de uma história em comum compartilhada por todos os “zulus”, a construção de novas identidades políticas, principalmente de chefaturas designadas para exercer o governo das “tribos”, como também a recuperação de outras histórias e memórias que não necessariamente se enquadravam nas categorizações constituídas ou impostas externamente pelos agentes coloniais (Cope, 1990; Lambert, 1995; Silva, 2022).
Foi nesse contexto, marcado pela implementação do sistema Shepstone, difusão do tribalismo e pela disseminação de ações missionárias, principalmente na educação primária, que a trajetória de John Dube ganhou forma a partir das décadas de 1870 e 1880. Em 1881, Dube ingressou no Adams College, em Durban, instituição responsável pela formação de diversos pastores, professores e lideranças religiosas sul-africanas. Sua trajetória, a partir daquele momento, seria marcada por constantes deslocamentos entre o sul da África, os Estados Unidos e a Europa. Em 1887, acompanhando o missionário W. C. Wilcox, Dube viajou aos Estados Unidos, onde permaneceu por aproximadamente cinco anos, estudou no Oberlin College, em Ohio, e retornou para a Colônia de Natal em decorrência de problemas de saúde. Foi por volta desse período que Dube publicou uma de suas primeiras obras, A Familar Talk upon my Native Land and some things found there, em 1891, e que consistia em uma compilação das palestras que Dube apresentou nos Estados Unidos, a partir das suas perspectivas acerca de temas como tradição, civilização e modernidade. Conforme pontua Barros, esses primeiros escritos de John Dube seriam marcados por duas tendências opostas, mas complementares: “de um lado, a legitimação da ideia de civilização e de progresso (identificados com certa herança europeia e branca) […] De outro lado, o reconhecimento de certas diferenças históricas culturais, […] numa perspectiva em que certas práticas comuns aos africanos são tidas como legítimas” (Barros, 2012, p. 44).
A presença de sentimentos e pertencimentos ambivalentes, principalmente entre tradição e modernidade, enquadra-se nas experiências de muitos intelectuais negros cujas trajetórias, assim como a de Dube, se enquadravam na circulação entre diferentes mundos - do sul da África, da Europa e dos Estados Unidos. Além disso, pode-se observar que, em partes, o interesse de Dube por uma noção razoavelmente fixa de tradições culturais entre os zulus deriva de seu contato com os modernismos negros nos Estados Unidos, que frequentemente apealavam à “necessidade de fixar raízes culturais ou étnicas e depois utilizar a ideia de estar em contato com elas como meio de reconfigurar a cartografia da dispersão e do exílio” (Gilroy, 2001, p. 224). Afinal de contas, outra temática que começa a ganhar espaço nas conferências de John Dube, assim como em escritos posteriores, dizia respeito aos valores, costumes e práticas que caracterizam as identidades coletivas zulus. Na perspectiva de Dube, longe de caracterizar os zulus como bárbaros e periculosos, como reiterado em muitos discursos coloniais do período, formariam uma população disciplinada e organizada, caracterizada pela sagacidade e racionalidade na vida social. Dube reiterava imagens contraditórias, mas ao mesmo tempo complementares, sobre os zulus: como um povo civilizado e disciplinado, portanto adequado à incorporação à sociedade colonial, mas ainda assim marcado por um longo histórico de insurreições e agências anticoloniais.
Em Natal, Dube atuou como professor na American Zulu Mission em Amanzimtoti. Mais tarde, em 1897, Dube retornou aos Estados Unidos para estudar na Union Missionary Seminary, em Nova York, momento em que apresentou conferências para garantir seu sustento e visando, ainda, a abertura de uma escola voltada para a educação industrial em Natal. Em seu retorno à América do Norte, Dube esteve acompanhado de sua esposa, Nokutela Mdima, a qual teve participação significativa nos empreendimentos educacionais de Dube em Natal. Após três anos de estudo, Dube foi ordenado sacerdote, em 1899, pela Congregational Church. Por volta do mesmo período, Dube tomou contato com as obras do educador Booker T. Washington, uma das principais lideranças afro-estadunidenses, sobretudo pela sua atuação no campo da educação industrial. Sob inspiração do Tuskegee Normal and Industrial Institute, estabelecido por Booker T. Washington com o objetivo de fornecer formação profissional a jovens afro-estadunidenses, Dube planejou fundar uma instituição semelhante em Natal. Desse modo, após retornar a Natal, envolveu-se na criação do Instituto Ohlange, uma escola profissional em Inanda, em 1901, buscando “oferecer treinamento industrial para jovens ‘pagãos’ e cristãos, para que pudessem ser transformados em cidadãos bons e úteis e se tornar [nas palavras de Dube], ‘verdadeiros líderes das massas de nosso povo que está ainda sentado na escuridão’” (Gasa, 1999, p. XVIII). A instituição, que atendia inicialmente cerca de 200 alunos, ancorava-se na perspectiva de que a educação, sobretudo de caráter profissional, contribuiria para combater a marginalização da população nativa em Natal, proporcionando, ainda, a formação de uma nova geração de líderes sul-africanos.
Logo após o fim da Guerra Sul-Africana (1899-1902), Dube também fundou um jornal, o Ilanga Lase Natal, cuja primeira edição circulou em abril de 1903, e que esteve sob sua direção até 1935. Conforme Enoch Gasa (2009), o Ilanga Lase Natal, publicado em língua zulu e parcialmente em inglês, buscava formar a opini ão pública de seus leitores sul-africanos, denunciar os desafios confrontados na sociedade colonial, inclusive por meio de críticas às políticas coloniais, e disseminar valores civilizatórios (Gasa, 2009, p. 100-103). A partir de 1903, em vias de ampliar o público leitor de seu periódico, Dube também passou a publicar artigos escritos em seSotho - e de autoria de Dube e Josiah A. Molise - e notícias da Suazilândia (atual Essuatíni), que, desde aquele ano, se tornou um território em regime de governo colonial indireto (assim como a Basutolândia e a Bechuanalândia, atuais Lesoto e Botsuana). O Ilanga Lase Natal inseria-se num conjunto maior de impressos periódicos fundados, sobretudo a partir das últimas décadas do século XIX, por intelectuais africanos, muitos dos quais formados em escolas missionárias, que ocupavam funções na administração pública ou profissões liberais (como, por exemplo, professores e advogados) e que utilizavam das páginas da imprensa periódica como espaço político de discussão e problematização dos meandros do colonialismo, sobretudo a imposição de políticas fiscais; as condições nos mundos do trabalho colonial; as dificuldades de acesso à escolarização formal e às carreiras profissionais, entre outras temáticas. No sul da África, alguns desses jornais, a exemplo do Indaba, fundado na década de 1860 editado por Tiyo Soga, eram impressos nas editoras localizadas nas estações missionárias, como a Lovedale; em outros casos, tratava-se de periódicos independentes, tais como Imvo Zabantsundu, fundado na década de 1880 por John Tengu Jabavu, ou o Tsala ea Bechuana, editado por Solomon Plaatje no início do século XX (Gomes, 2015; Ndletyana, 2008). A circulação e as redes de interlocução política formada pelos seus editores e jornalistas contribuíram para a consolidação de uma rede transnacional de intelectuais africanos e afrodiaspóricos que colocavam em debate os desafios da segregação e do racismo, ao mesmo tempo em que manifestaram ambivalências e contradições com relação às experiências históricas da modernidade (Gilroy, 2001).
Além das atividades jornalísticas e educacionais, Dube também envolveu-se nas articulações políticas que, nos primeiros decênios do século XX, levaram à formação de grupos políticos que visavam defender os direitos da população categorizada como nativa e o combate à segregação no sul da África. Por volta de 1900, Dube, ao lado de outras lideranças políticas sul-africanas, como Stephen Mini, Saul Msane, J. T. Gumede e Martin Lutuli, formaram o Natal Native Congress, cujo objetivo principal era servir de espaço político para manifestar as insatisfações da população nativa com o governo colonial. No período, outras organizações políticas já estavam em processo de formação, a exemplo da Funamalungelo Society, criada em 1888 por John Kumalo, a partir dos quais manifestavam questionamentos à legislação nativa e, sobretudo, a falta de representatividade política na colônia de Natal. Essas organizações políticas deixavam claro um senso de insatisfação com a elaboração de políticas de tratamento à população nativa, e reuniam principalmente membros da comunidade kholwa (termo em isiZulu que significa “crente”) de Natal. Os amakholwa, isto é, os grupos falantes de isiZulu e letrados, convertidos ao cristianismo pela ação missionária, integravam uma nova camada social que os agentes coloniais objetivavam formar para servir de intermediários entre a sociedade colonial e o restante da população, mas que, desde a década de 1880 e 1890, articulavam-se coletivamente em torno de pautas como a representatividade política nos órgãos de administração do governo da Colônia de Natal (Mokoena, 2005; Ndletyana, 2008).
Posteriormente, em 1909, momento em que se debatia a unificação da África do Sul, Dube participou de reuniões de africanos que eram contrários ao Act of Union, e que, “dentre outras coisas, tornava a África do Sul um domínio independente dentro do Império Britânico, instituía o inglês e o holandês como línguas oficiais, além de criar condições legais para a instituição de práticas segregacionistas” (Barros, 2014, p. 14). Dube também foi convidado a se tornar o primeiro presidente do South African Native National Congress (SANNC) em 1912 - que mais tarde daria origem ao African National Congress (ANC) -, organização política que surgiu a partir das reuniões realizadas dois anos antes, na South African Native Convention, em Bloemfontein. O objetivo era unificar organizações políticas e “congressos nativos” de várias regiões da África do Sul, buscando a cooperação entre as diferentes lideranças sul-africanas e em busca de melhores oportunidades educacionais, socioeconômicas e políticas para a população categorizada como nativa (Gomes, 2015, p. 182-183). Por meio de petições e o envio de uma delegação a Londres, os fundadores do SANNC visavam combater os impactos ou reverter a aprovação de leis segregacionistas que começaram a se multiplicar a partir da unificação do estado sul-africano.
Como se sabe, nos anos finais do século XIX, se intensificaram os debates acerca da identidade nacional sul-africana, principalmente voltada a pensar “quem era, afinal, o sul-africano que se queria para aquela nação”, contudo, a partir de 1910, com a União Sul-Africana, as discussões políticas voltaram-se a “pensar as balizas de inserção destes sul-africanos no território - bem como a exclusão daqueles que não carregavam no fenótipo a imagem da nação que se queria construir” (Gomes, 2015, p. 4). Um dos primeiros passos no processo de exclusão e marginalização da população nativa sul-africana foi a aprovação do Natives’ Land Act em 1913, o qual proibia a comercialização de terras à população nativa, exceto nas “reservas nativas”, o que efetivamente confinava uma população de aproximadamente cinco milhões de pessoas a uma área que correspondia a cerca de 7% de todo o território da União Sul-Africana. Além de criminalizar o arrendamento de terras por parte dos nativos, o Natives’ Land Act tinha profundas implicações políticas, na medida em que excluía efetivamente a população categorizada como nativa de exercer seus direitos políticos, além de impactos socioculturais, sobretudo ao se considerar as relações identitárias estabelecidas por diversas sociedades e culturas no sul da África com os usos da terra.
Além do Natives’ Land Act, o governo sul-africano, outras legislações aprovadas no período, e que visavam o controle da mobilidade e da mão de obra nativa, incluíam o Native Labour Regulation Act (1911), que criminalizava a rescisão de contrato trabalhista por parte do trabalhador, criando relações profundamente assimétricas entre trabalhadores nativos e seus empregadores brancos; e em 1923, a promulgação do Native Urban Area Act, que estabelecia a divisão do território em áreas urbanas e rurais, visando controlar os espaços de moradia e emprego da população nativa, e que teve, como um dos seus efeitos, transformar os centros urbanos em espaços exclusivos da população branca. Outras legislações de caráter segregacionista, aprovadas nos primeiros anos da década de 1920, buscavam regulamentar os mundos do trabalho a partir de classificações raciais estabelecidas pelo estado sul-africano, “aprofundando o abismo laboral entre trabalhadores negros e trabalhadores brancos, já que a estes últimos eram reservados os cargos e as funções considerados mais complexos e para os quais se previa igualmente melhor remuneração” (Borges, 2011, p. 216-217).
Organizações políticas como a SANNC buscavam lidar com as novas realidades políticas pós-1910, e que resultavam na marginalização política e exclusão social de boa parte da população sul-africana. Dentre as ações promovidas pela SANNC, incluía-se o envio de uma delegação para a Inglaterra, com o objetivo de protestar contra o Natives’ Land Act e convencer o parlamento britânico a reverter tal legislação. John Dube, ao lado de Solomon Plaatje, Thomas Mapike, Walter Rubusana e Saul Msane, formaram essa delegação que, a despeito do insucesso em reverter a lei junto ao parlamento britânico em 1914, aproveitaram do período na Inglaterra para circular suas ideias políticas e redimensionar suas redes de interlocução intelectual e política. No entanto, disputas internas, principalmente com relação às opiniões sobre os princípios da segregação, levaram Dube a se afastar do SANNC e deixar a presidência da organização política em 1917, reforçando, a partir daquele momento, sua aproximação política com o Natal Native Congress e com os movimentos culturais e políticos zulus. Esse período, principalmente a primeira metade da década de 1920, foi marcado pela formação de movimentos nacionalistas zulus, e que buscavam uma recuperação de direitos políticos e econômicos, como pelo acesso a terras, incluindo também a valorização e redefinição de costumes e tradições associadas ao centro de poder zulu.
Conforme Nicholas Cope (1990), esse movimento político foi promovido por intelectuais e líderes amakholwa, os quais formavam uma pequena classe média urbana que, no início da década de 1920, buscava uma aproximação com as autoridades tradicionais zulus nas áreas rurais, principalmente em um contexto marcado pelo surgimento de movimentos operários e sindicais que buscavam outras formas, vistas como mais radicais, de protesto - a exemplo das greves e manifestações públicas. A linhagem dominante zulu, compreendida naquele momento como uma “família real zulu”, passou a ser o epicentro dos investimentos discursivos, simbólicos e políticos do movimento, que observava nos “reis” zulus, a exemplo de Dinuzulu kaCetshwayo (1868-1914) e Solomon kaDinuzulu (1891-1933), os guardiões das tradições e de uma ordem política fraturada pelos avanços coloniais no final do século XIX. Diferentes grupos políticos reivindicavam um passado em comum, marcado pela reelaboração da memória dos amakhosi fundadores do centro de poder zulu, ao exemplo de Shaka kaSenzangakhona, ou pela valorização de símbolos e ritos relacionados às chefaturas zulus, como o Umkhosi Wokweshwama, o “festival dos primeiros frutos”. Além disso, novas vertentes literárias e historiográficas, produzidas em língua isiZulu, buscavam revitalizar a imagem de Shaka e de outras figuras associadas ao passado zulu, para assim justificar ou legitimar a revitalização da unidade da “nação zulu” sob a autoridade da “família real zulu”. O período coincide, por exemplo, com a publicação de Abantu abamnyama lapo bavela ngakona (“O povo preto e de onde veio”) em 1922, por Magema Magwaza Fuze, um intelectual amakholwa e colaborador do Ilanga Lase Natal (Mokoena, 2022).
Esse movimento nacionalista zulu envolvia uma participação significativa de membros do clero, professores, advogados, intérpretes e comerciantes do norte da província de Natal, ao sul do rio Thukela, muitos dos quais já estavam envolvidos, desde as décadas de 1900-1910, em discussões sobre a posse ou arrendamento de terras, buscando também uma aproximação com as elites rurais. Em 1924, um grupo de amakholwa, incluindo John Dube, formou o Zulu National Congress, mais tarde renomeado de Inkatha, uma organização política e cultural que surgiu na confluência de novas possibilidades políticas de autogoverno para os africanos, sobretudo diante do contexto territorial produzido pela segregação. Portanto, longe de ser um movimento “tradicionalista”, tratava-se de “uma força política moderna, construída principalmente pelas elites políticas e sociais zulus nas circunstâncias alteradas na África do Sul industrializada” (Hamilton, 1998, p. 169). Outras influências no movimento eram oriundas do pensamento afro-americano, sobretudo as ideias de Booker T. Washington de aprimoramento educacional e igualdade sociopolítica, mas também de noções advindas do movimento pan-africano, como por exemplo de Marcus Garvey e W. E. B. DuBois - com efeito, os arquivos de DuBois, na University of Massachusetts Amherst salvaguardam correspondências trocadas entre Dube e DuBois, além de registros de seus encontros entre as décadas de 1920 e 1930 (W.E.B. Dubois Papers, 1803-1999). Tais correspondências possibilitam pensar no contato de Dube com os modernismos negros nos Estados Unidos e, principalmente, permitem problematizar algumas das ambivalências observáveis, também, nos escritos do intelectual sul-africano - resultando, por um lado, na valorização das tradições zulus como forma de resistência, mas, paralelamente, compreendendo a modernidade numa tensão entre o desejo de inclusão e a crítica aos seus princípios de exclusão e segregação (Gilroy, 2001).
Além disso, o ambiente sociocultural formado nas estações missionárias, principalmente em contato com ideias europeias sobre nação e identidade nacional, também contribuíram para a educação política e a formação de uma primeira geração de líderes nacionalistas africanos, principalmente na sua insatisfação com os processos de exclusão social perpetuados pelos governos coloniais e segregacionistas (Etherington, 1976). Embora inicialmente a Inkatha tenha sido idealizada como uma organização voltada à questão do acesso da população nativa às terras para agricultura, a organização aproximou-se de Solomon kaDinuzulu, visando reestabelecer a unidade da “nação zulu”, por meio de um projeto de “modernização” da sociedade zulu, sobretudo por meio da educação e trabalho, e pela sedimentação de uma elite amakholwa. A partir daquele momento, a Inkatha passou a reivindicar a função de porta-voz da “nação zulu”, definida naquele momento como formada por todas as populações falantes da língua isiZulu na província de Natal (Cope, 1990, p. 450-451).
Identidade e nação zulu em Jeqe, the bodyservant of Shaka (Insila kaShaka)
Movimentos culturais e políticos como o Inkatha, na primeira metade da década de 1920, e que tiveram expressiva participação de intelectuais e líderes políticos da geração de John Langalibalele Dube, contribuíram para uma redefinição dos elementos culturais constitutivos de uma identidade nacional zulu, especialmente a partir de critérios linguísticos (como, por exemplo, o uso da língua isiZulu ou de dialetos relacionados ao isiZulu), mas também a partir de um passado em comum, idealizado, nesse caso, a partir de uma recuperação ou revitalização de certa memória coletiva em torno de lideranças políticas como Shaka kaSenzangakhona ou Cetshwayo kaMpande. Assim, longe de serem considerados como chefes bárbaros ou tirânicos, conforme reiteravam as representações produzidas pela elite colonial ou pelos colonos brancos (Hamilton, 1998), intelectuais como John Dube passaram a representá-los como fundadores e defensores da nação zulu, ou, ainda, como fulcros de identificação coletiva capazes de legitimar as demandas por terra e os projetos políticos de autogoverno para os zulus - talvez, de forma semelhante ao que ocorrera com a Suazilândia e a Basutolândia que, pelo menos desde 1903, transformaram-se em protetorados ou territórios coloniais com sistemas de governo indireto, amparados na preservação das suas chefaturas e sua colaboração com o governo colonial britânico.
Destarte, convém atenção especial ao papel de intelectuais como John Dube na definição de certa “comunidade imaginada”, composta por indivíduos que, mesmo sem conhecerem-se uns aos outros, compartilham de sentimentos de pertencimento a uma mesma coletividade, baseados em traços culturais em comum e difundidos, por exemplo, pela imprensa ou pela literatura (Anderson, 2008). Além disso, em romances como Jeqe, the bodyservant of Shaka (Insila kaShaka), pode-se observar circunstâncias relacionadas à “invenção das tradições”, em especial na definição de ritos, práticas culturais e símbolos definidores da identidade nacional zulu, sobretudo pela mobilização de práticas costumeiras “inventadas, construídas e formalmente institucionalizadas” (Hobsbawn, 2008, p. 9) e pela “criação, demolição e reestruturação dessas imagens do passado” (Hobsbawn, 2008, p. 22) visando fornecer legitimidade e coesão social a um determinado grupo: todos aqueles que, sob a perspectiva de Dube e de seus contemporâneos, pertenciam à nação zulu.
Alguns desses elementos culturais definidores de uma identidade zulu ficavam evidentes nos escritos de Dube em A Familiar Talk upon my Native Land and some things found there (1891), com base no ciclo de conferências apresentado ao público estadunidense. Desde o texto introdutório, Dube já destacava como seu objetivo “apresentar um vislumbre dos Zulus - algumas das ideias de sua religião e costumes, conforme eles existiam antes de serem tocados pelas influências elevadoras da mais alta civilização cristã” (Dube, 1891, p. 5). Os zulus são descritos por John Dube como “um povo guerreiro”, principalmente marcado por experiências de arregimentação e treinamento de guerreiros desde a infância, visando, principalmente, a difusão de um senso de disciplina, obediência e fidelidade ao rei, o qual “escolhe chefes por todo o território que governa, os quais recebem as suas instruções e obedecem conforme ele manda” (Dube, 1891, p. 8-9).
Ademais, assegurava ao seu público ouvinte/leitor que os zulus são um povo provido de sistemas de leis transmitidos intergeracionalmente de forma costumeira, denotando ainda ter visto muitos “pagãos que tem melhor juízo e vivem suas vidas mais consistentemente que muitos nascidos e criados na civilização” (Dube, 1891, p. 9). Desse modo, Dube enfatiza que, longe de serem caracterizados como selvagens, os zulus definem-se coletivamente pela sua coragem, disciplina e senso de justiça. A cristianização, sobretudo pela ação dos missionários, aprimoraria e desenvolveria as melhores qualidades dos zulus, distanciando-os dos “laços da ignorância e da superstição” (Dube, 1891, p. 26). O entrelace de tradição e modernidade representariam, para John Dube, o ponto de entrada dos zulus entre os povos civilizados, sobretudo por meio da educação cristã e do autoaprimoramento moral e profissional.
Discursos como esses demonstraram as ambivalências presentes nos posicionamentos de Dube, ao contestar as representações estereotipadas dos zulus produzidas pelo discurso colonial e, simultaneamente, observar a possibilidade de inclusão e incorporação dos zulus na modernidade. Adicionalmente, tais discursos contribuíam para uma redefinição da identidade zulu - inclusive pela própria reformulação das trajetórias e histórias familiares de John Dube. Como se sabe, John Dube descendia de comunidades linhageiras de origem amaQadi, originalmente parte de um conjunto maior, os abakwaNgcobo, no vale do rio Thukela - assim como outras chefaturas, a exemplo dos akabwaNyuswa e dos abakwaNgongoma (Hughes, 1995). Conforme a tradição oral, expressa principalmente por meio de poemas de aclamação (izibongo) e genealogias de chefaturas ancestrais, os amaQadi, assim como outros grupos abakwaNgcobo, foram incorporados a uma confederação identificada como abakwaMkhize, a qual, por sua vez, era assujeitada às linhagens dominantes zulus nas primeiras décadas do século XIX. Os amaQadi foram incorporados, por Shaka, ao centro de poder zulu na condição de amaLala, termo pejorativo e utilizado para se referir a grupos que foram marginalmente incorporados aos zulus, com menor participação nas decisões políticas e vistos como outsiders, cujos jovens, ao invés de serem recrutados para os regimentos zulus, eram mobilizados para funções vistas como inferiores - como o cuidado do gado. Após a morte de Shaka em 1828, seu sucessor, Dingane kaSenzangankhona (c. 1795-1840) promoveu ataques a chefaturas anteriormente associadas a Shaka, inclusive aos amaQadi, forçando-os a migrar para o sul do rio Thukela, rumo à região onde, poucos anos depois, se estabeleceria a Colônia de Natal. O avô de John Dube, Dabeka kaDube, foi um dos chefes que liderou parte dessas chefaturas amaQadi (Hughes, 1995, p. 51-77).
No entanto, ao revisitar sua trajetória familiar em A Familiar Talk…, Dube caracteriza seu avô como um “poderoso chefe Zulu, tão poderoso que ele provocou a inveja e ódio do rei” (Dube, 1891, p. 16), e que foi morto, ao lado de muitos membros de sua comunidade, pelos regimentos de guerreiros de Dingane. Desse modo, pode-se perceber que Dube, possivelmente em decorrência de sua formação junto à estação missionária, abandonou outras formas de identificação ou autoidentificação (amaQadi, amaLala ou abakwaNgcobo), representando-se, naquele momento, como parte da nação zulu. Ao mesmo tempo, convém lembrar da existência de registros históricos que atestam a prática de recomposição ou ressignificação das genealogias de ancestrais, especialmente em comunidades que foram assujeitadas (pelos zulus, por exemplo), e passaram a incorporar ancestrais em comum nas suas genealogias (Hamilton, 1985, p. 152-207). Portanto, a ressignificação da trajetória familiar de Dube enquadrava-se nas novas experiências políticas e religiosas nas últimas décadas do século XIX, e sobretudo com um uso cada vez mais generalizado do termo “zulu” para se referir a uma diversidade de comunidades linhageiras (“tribos”) falantes de línguas isiZulu, mas ao mesmo tempo se conecta com práticas mais antigas - isto é, a reelaboração de genealogias de ancestrais como forma de assujeitamento ou assimilação cultural, mas ao mesmo tempo buscando o consentimento e participação ativa de comunidades assujeitadas.
Portanto, as experiências intelectuais e a trajetória literária de John Langalibalele Dube inserem-se num contexto macropolítico marcado por uma redefinição na identidade zulu - a zuluness - que, especialmente a partir dos primeiros decênios do século XX, passou a ser associada a uma diversidade de comunidades falantes de línguas ou dialetos zulus, os quais, por sua vez, também passaram por processos de padronização, especialmente em contato com a cultura missionária ao longo do Oitocentos (Arndt, 2019). Desse modo, o entrecruzamento das políticas de linguagem, das ações da administração colonial (como por exemplo pelo estabelecimento do Departamento de Assuntos Nativos em Natal) e da educação missionária, contribuiu para uma redefinição mais ampla da identidade zulu no contexto histórico em questão. Esta identidade zulu passou a ser adotada/ressignificada por homens e mulheres pertencentes às comunidades amakholwa, muitos dos quais promoviam “enquadramentos da memória” (Pollak, 1992) sobre o reino Zulu e seus “reis” fundadores, a exemplo de Shaka, em contextos de crises políticas e econômicas provocadas pelo crescente segregacionismo na África do Sul, o qual encorajou os amakholwa a organizar formas de protesto e resistência que recorriam a uma identidade nacional zulu e que celebravam símbolos políticos e tradições relacionadas ao passado zulu. No mesmo período, entre as décadas de 1920 e 1930, outros intelectuais, como o linguista e administrador colonial James Stuart, também começaram a publicar materiais didáticos, escritos em língua zulu, e voltados a narrar a história do “reino Zulu” (Wright, 1996). Como resultado dessas novas experiências políticas, o que antes era visto como uma formação política complexa e estratificada, marcada por grupos assujeitados ou incorporados de forma central (e conhecidos coletivamente como amaNtungwa) ou periférica (amaLala) nos primeiros decênios do século XIX, passou a ser suplantado pela noção de um poderoso e centralizado “reino”, fundado por Shaka, cuja autonomia política identificava-se com sua “família real” e com seus símbolos políticos, a exemplo da Inkatha.
A reelaboração do passado, visando a definição de uma identidade zulu, pode ainda ser problematizada a partir de Jeqe, the bodyservant of Shaka, romance publicado originalmente em isiZulu como Insila kaShaka em 1931 pela Lovedale Press, e traduzido para a língua inglesa por J. D. Boxwell em 1951. Em linhas muito gerais, o romance ambienta-se entre as décadas de 1820 e 1840, isto é, nos últimos dias da chefatura de Shaka kaSenzagankhona, na ascensão de seu meio-irmão, Dingane, ao poder e nas disputas entre Mpande e Dingane. O protagonista da trama é o heroico Jeqe, um jovem guerreiro que, pela sua bravura em batalha, foi transformado por Shaka em seu insila - expressão em isiZulu utilizada para se referir a uma espécie de assistente pessoal do inkosi. Logo nos primeiros capítulos, Dingane e seus cúmplices assassinam Shaka. Para evitar ter o mesmo destino, e ser executado junto ao rei, Jeqe decide fugir rumo à terra dos amaTonga. Ao longo de sua trajetória, e em constante fuga de Dingane, é acometido por uma terrível febre, e acaba se apaixonando por uma jovem chamada Zaki, a qual havia sido prometida em casamento a outro homem: o filho do chefe Ndlebende. Após quase morrer em disputas com os guerreiros de Ndlebende, Jeqe é salvo por Sitela, a rainha dos amaTonga. Na última parte do romance, Jeqe reencontra Zaki. Juntos, decidem migrar rumo ao território Swazi - onde Jeqe se torna o médico (inyanga) do rei dos Swazi, utilizando-se do nome Mshayikazi Mcunu, para evitar a perseguição de Dingane. Ao final, Dube conclui a trama relatando que Jeqe e Zaki viveram o resultado de suas vidas na terra dos Swazi, onde tiveram filhos e morreram em idade avançada.
Dube dedica parte significativa da trama para descrever a trajetória e as aventuras de Jeqe, caracterizando-o como um guerreiro bravo e corajoso, marcado por certo senso de fidelidade ao chefe da linhagem, mas que se depara com uma circunstância irreversível: a perda de sua identidade e de sua terra natal como consequência de novas circunstâncias políticas, transformando-se em uma espécie de exilado ou pária social. Desse modo, logo nos primeiros capítulos, Dube recupera episódios associados à expansão militar dos zulus liderada por Shaka, indicando que “when Jeqe saw that his King was in great danger, he seized his boy’s spear and shield and shouted ‘Look to my equipment, I am for the fight!’ Then he raced to the battle-field swifter than the wind”1 (Dube, 1951, p. 6). Por sua bravura em batalha, Jeqe é escolhido por Shaka para ocupar a função de insila, dedicando-se às novas funções, ainda que com ressalvas diante dos atos de tirania e crueldade demandados por Shaka. Certo senso de justiça e piedade ficam evidentes em diversos momentos da trama, especialmente quando Shaka ordena a morte de um dos companheiros de Jeqe, por ter invadido o izigodhlo: “Jeqe had a warrior’s heart: he took delight in battle; but to kill a man in cold blood was unbearable […] But to him, the word of the King was law. However dificult it might be, he had to obey”2 (Dube, 1951, p. 17).
Ao longo da trama, Dube apresenta-o como um indivíduo capaz de suplantar a violência descontrolada, distanciando-se, portanto, de um estereótipo frequentemente relacionado aos zulus em discursos europeus do período, sobretudo em decorrência da sua participação na guerra anglo-zulu de 1879 e na rebelião zulu de 1906. Ao final do romance, Jeqe transforma-se em um competente inyanga, adota outro nome, e torna-se capaz de sobreviver e reconstruir sua identidade mesmo desterrado e em fuga - uma realidade certamente vivenciada por milhares de homens e mulheres falantes de isiZulu e que, entre as décadas de 1910 e 1920, perderam suas terras e moradias como consequência do avanço da legislação segregacionista no estado sul-africano. Seu autoaperfeiçoamento e as suas habilidades com o manuseio de ervas medicinais e curas tradicionais são associadas no desfecho com a sobrevivência do reino Swazi, já que seu chefe principal, Sobhuza, afirma que Jeqe “have in your care all the medicine that protects the sovereignty of the land”3 (Dube, 1951, p. 83). Sua nova identidade se constrói a partir da experiência do desterramento e, também, do deslocamento entre diferentes espaços geográficos que passam a ser conectados a partir de experiências históricas em comum - os territórios que deram forma ao reino Zulu, a terra dos amaTonga e os territórios ocupados pelos chefes swazi - em uma região que, naquele período em questão, testemunhava uma mobilidade constante de trabalhadores nativos que se deslocavam rumo à região das minas de ouro e diamantes na África do Sul.
Além disso, convém atentar-se às origens do personagem, enquadrado por Dube em um contexto maior relacionado ao processo de formação do reino Zulu: Jeqe é descrito, desde o início, como “the son of Sikunyana of the Butelezi clan”4 (Dube, 1951, p. 6), e oriundo das linhagens Buthelezi. Uma das primeiras comunidades atacadas por Shaka no processo de expansão do centro de poder foram os Buthelezi, cujas linhagens dominantes eram originalmente liderados pelo inkosi Phungashe, o qual buscou refúgio entre os amaNdwande ao norte do rio Mfolozi; os chefes assujeitados a Phungashe, e que foram incorporados ao poder zulu, passaram a ocupar funções de prestígio - a exemplo de Ngqengelele kaMvulana, que assumiu a chefatura dos Buthelezi (Mbatha, Cebekhulu, 2022). Na guerra civil zulu, na década de 1880, os chefes Buthelezi integraram as forças partidárias de Cetshwayo kaMpande, ao lado dos emGazini e dos uSuthu. Além disso, membros proeminentes da linhagem Buthelezi passaram a ocupar posições de prestígio nos movimentos nacionalistas zulus, considerados como uNdunankulu wesizwe (“primeiros-ministros”). Mais do que narrar uma história de fundação do reino Zulu, Dube retoma certa memória acerca das diversas linhagens e comunidades que foram incorporadas ao centro de poder zulu. Contudo, longe de apresentar as chefaturas Buthelezi como comunidades dominadas violentamente por Shaka, Dube apresenta os Buthelezi como organicamente assimilados à nação zulu, e recompensadas por Shaka pela sua fidelidade com cabeças de gado. Destarte, concentra sua narrativa literária na história de linhagens que ocupavam, no período de publicação do romance, posições proeminentes no âmago das novas experiências políticas ancoradas na perspectiva de uma “nação zulu”.
A figura de Shaka kaSenzangakhona ocupa um espaço central na primeira parte do romance, cuja representação em Jeqe dialoga com as formas de lembrar o processo de formação do reino Zulu promovidas pelo movimento Inkatha em meados da década de 1920: como uma liderança militar competente, um estatista e diplomata, capaz de construir um poderoso centro de poder político, fortemente centralizado e politicamente autônomo, e garantir o assujeitamento de um vasto número de comunidades linhageiras. Shaka foi representado por John Langalibalele Dube como um epicentro de formação da nação zulu desde as primeiras linhas do romance: “Between the Umvoti and Nonoti Rivers, with the Madundube Hills to the west and the Indian Ocean to the east, Thaka [Shaka] built his royal Dukuza Kraal. It was here that the Zulu nation came together in the presence of its king”5 (Dube, 1951, p. 1). Além disso, “he was far from ruling autocratically as an absolute monarch, especially in foreign affairs. If he persisted, in spite of the oposition of the indunas, the members of the royal house and other ruling chiefs would be summoned to discuss the question exhaustively”6 (Dube, 1951, p. 2). Suas habilidades políticas e capacidade de negociar com as linhagens e chefaturas assujeitadas são relembradas em outros momentos, especialmente pela alusão aos izibongo (poemas de aclamação), que narravam suas expedições de conquista ou captura de gado, já que Shaka “honoured brave men and presented them with gifts of cattle”7 (Dube, 1951, p. 5).
Contudo, Dube também representa o poder político entre os zulus como um espaço de contestação e questionamento, especialmente diante do contínuo estado de guerra promovido por Shaka, resultando em um contexto de crise política e crescimento das forças de oposição. Para homens como Dube, que haviam vivenciado os efeitos da guerra anglo-zulu e da guerra civil, que resultaram na invasão e anexação do território zulu, somado aos impactos da Guerra Sul-Africana de 1899-1902, a memória dos conflitos certamente era associada à experiência da derrota, da crise política e moral, e o agravamento das condições socioeconômicas que marcaram a experiência das comunidades zulus na virada do século. Além disso, para muitos intelectuais zulus da geração de John Dube, a memória de Shaka passou a ser associado a outro aspecto político: sua capacidade de negociar e, ao mesmo tempo, controlar o avanço dos colonos e viajantes brancos que adentravam rumo ao interior do sul da África. Seu assassino e sucessor, Dingane, por sua vez, era retratado em Jeqe como um indivíduo supersticioso, incapaz de preservar o poder político zulu e assombrado pelo fantasma de Shaka, cujas ações “has destroyed the country by cold-blooded murder”8 (Dube, 1951, p. 75). Ao enfatizar a mortandade dos filhos de Senzangakhona, promovida por Dingane para evitar qualquer contestação à sua legitimidade política, Dube caracterizava o sucessor de Shaka como um líder bárbaro e tirânico, refletindo não apenas um discurso recorrente nos discursos promovidos por agentes do colonialismo na região, mas também as histórias e memórias de diversas comunidades forçadas a migrar para o sul do Rio Thukela - tal qual as chefaturas amaQadi - como resultado das perseguições promovidas por Dingane ao longo da década de 1830 (Ndlovu, 2017; Hamilton, 1998).
Por fim, há que se atentar a outro elemento distintivo nas representações da identidade e da nação zulu nos escritos de Dube: a “invenção das tradições” (Hobsbawn, Ranger, 2008), sobretudo por meio da recuperação e ressignificação de costumes zulus considerados, por Dube, como representativos da zuluness. Esse movimento já ficava evidente nas conferências reunidas em A Familiar Talk, nas quais Dube discutia “religiões e costumes” zulus (Dube, 1891, p. 5), como a poligamia e o lobolo, a relação com os espíritos ancestrais, práticas de feitiçaria e divinação, e o sistema de treinamento e arregimentação de guerreiros. Em Jeqe, Dube discute amplamente o “festival dos primeiros frutos” (Umkhosi Wokweshwama), ritual celebrado anualmente, e que, ao longo do século XIX, passou a suplantar outras práticas culturais locais, centralizando as cerimônias e ritos na figura do inkosi. O festival foi proibido pelas autoridades coloniais após a guerra anglo-zulu em 1879, mas recuperado por intelectuais amakholwa da geração de Dube como uma celebração centrada na “família real” zulu. Em Jeqe, Dube transforma o “festival dos primeiros frutos” em um elemento de destaque na ritualística do poder desde os tempos de Shaka, descrevendo os rituais de preparação do inkosi para o festival, incluindo o uso de ervas e poções; a regurgitação ritual, por meio de “most powerful black and white Intelezi medicine” (Dube, 1951, p. 13); os sacrifícios rituais de animais, como um bode negro, leopardos e touros; as canções e hinos de guerra entoados por guerreiros; os rituais de limpeza e purificação nos rios; e, ao final, após as apresentações dos regimentos de guerreiros, “the appearance of the King [who] was greeted by a deafening cry as the royal salute ‘Bayede! Bayede!’ rang from a thousand throats”9 (Dube, 1951, p. 15).
No conjunto, as representações do “festival dos primeiros frutos” em Jeqe buscavam reafirmar a lealdade da “nação zulu” ao inkosi, definindo-se como um ritual ausente de tensões sociais ou políticas, e fortemente relacionado a outros símbolos representativos da identidade zulu, como, por exemplo, a Inkatha original, “the sacred coil” (Dube, 1951, p. 13), considerada pelos intelectuais da geração de Dube como um símbolo da unidade nacional zulu. Rituais, símbolos e festivais como esses foram apropriados pelas chefaturas zulus ao longo do século XIX como parte das suas estratégias políticas para reafirmar relações de assujeitamento e interdependência. Sua realização anual visava “inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição” (Hobsbawn, 2008, p. 9), especialmente para simbolizar os laços de fidelidade à linhagem dominante. Além disso, nas memórias de muitos homens da geração de Dube, e sobretudo das gerações anteriores, possivelmente ainda estava vívida a realização do último “festival dos primeiros frutos”, isto é, em janeiro de 1879, poucos dias antes do início da guerra contra os britânicos, e da batalha de Isandhlawana, que resultou em uma vitória dos regimentos zulus. Portanto, diversas camadas de sentidos relacionavam-se ao “festival dos primeiros frutos” no momento em que Dube recuperou-o para seu romance Jeqe: como um símbolo da identidade nacional zulu; enquanto uma tradição fortemente associada à linhagem dominante; e também lembrado, por muitos de seus contemporâneos, como uma prática associada às resistências zulus diante da invasão colonial britânica entre as décadas de 1870 e 1880, momento marcado pelo esfacelamento do centro de poder zulu, perda de sua autonomia política e agravamento das condições socioeconômicas de comunidades invadidas e incorporadas às posses coloniais britânicas.
Além disso, é necessário questionar: qual é o lugar da história zulu, tal como narrada em Jeqe, dentro das narrativas que construíram a ideia de nação sul-africana entre o final do século XIX e o início do século XX? Nesse período, tanto a historiografia colonialista quanto a “história oficial” promovida pelo Estado segregacionista produziram uma interpretação do passado sul-africano que enfatizava a presença europeia, destacando, sobretudo, o Great Trek da década de 1830 como um evento fundacional da nação sul-africana e da ocupação das terras (Silva, 2019; McClintock, 2010). Em Jeqe, Dube buscou contar uma outra história, resgatando os zulus como agentes e protagonistas de processos políticos que resultaram na formação de centros de poder sem a presença europeia, e na sua experiência histórica compartilhada com outros agrupamentos populacionais em uma vasta região de fronteiras entre a África do Sul, Moçambique e a Suazilândia (atual Essuatíni): zulus, tongas e swazi passam a fazer parte de uma mesma história a partir dos deslocamentos e conexões estabelecidas por Jeqe em sua trajetória. Ainda que o romancista buscasse no passado zulu as razões para o esfacelamento político e a crise da ordem social e política vivenciada nos tempos de segregação, ao contar sua história Dube também visava legitimar as demandas políticas de lideranças zulus, sobretudo daquelas vinculadas ao Inkatha, pelo acesso às terras e, consequentemente, pelos seus direitos políticos.
Considerações Finais
Dube tem sido reconhecido pela historiografia como um dos principais intelectuais sul-africanos nas últimas décadas do século XIX e início do século XX, um período marcado pela expansão colonial e por transformações sociais e econômicas, especialmente resultantes do crescimento da indústria mineradora. Nesse contexto, a elite colonial e o colonato branco empreenderam esforços para controlar as terras e a força de trabalho africana. Simultaneamente, os processos de unificação do Estado nacional sul-africano e os debates sobre sua identidade nacional trouxeram à tona uma série de legislações segregacionistas, como o Natives’ Land Act de 1913, que resultaram na marginalização política e exclusão socioeconômica de uma parcela significativa da população sul-africana, sobretudo aqueles classificados como nativos.
No período em questão, movimentos nacionalistas começaram a tomar forma entre as populações falantes de isiZulu, especialmente entre aqueles conhecidos coletivamente como amakholwa - homens e mulheres cristianizados e educados pela ação missionária e que mantinham, frequentemente, uma relação ambivalente com a estrutura colonial, oscilando entre a crítica e o desejo de assimilação. Muitos desses indivíduos ocupavam cargos liberais, como professores ou jornalistas, ou atuavam na administração pública. Por volta da década de 1920, esses grupos de amakholwa buscaram se aproximar das chefaturas tradicionais zulus, especialmente nas áreas rurais, assim como da “família real” zulu, com o objetivo de consolidar novos espaços de autonomia política e econômica, além de garantir o acesso à terra. A imprensa e a literatura desempenharam um papel crucial na consolidação das experiências políticas desses grupos, como evidenciado pelo papel do Inkatha, particularmente em torno da valorização de uma identidade nacional zulu e da recuperação de símbolos e práticas culturais considerados representativos de sua história e memória. Esses movimentos integravam um conjunto maior de articulações políticas nativas que se intensificaram no início do século XX, muitas das quais, a exemplo do South African Native National Congress e do Natal Native Congress, buscavam soluções ou estratégias para lidar com as novas realidades sociopolíticas e econômicas criadas a partir da legislação segregacionista na África do Sul.
Em Jeqe, the bodyservant of Shaka, publicado originalmente sob o título Insila kaShaka em 1931, Dube deu continuidade a um projeto intelectual e político que remontava aos seus primeiros escritos, ainda na década de 1890: a recuperação de costumes e tradições que, em sua perspectiva, caracterizariam a “nação zulu”. No romance, Dube define um novo tipo ideal de homem zulu, representado pelo protagonista titular, que se distingue por sua bravura e coragem, mas também pela capacidade de superar a violência descontrolada, sobretudo por meio de um processo de autoaprimoramento e, acima de tudo, de sobreviver em um estado constante de fuga e perda de terras. Ademais, Dube resgata a figura de Shaka kaSenzangakhona, retratando-o como o fundador de um poderoso reino africano, embora incapaz de controlar seus impulsos violentos e, em última instância, vulnerável a inimigos e rivais políticos. Jeqe, publicado em um contexto de envolvimento direto de Dube com organizações políticas na região de Natal e Zululândia, reflete um comprometimento com a (re)definição da ideia de “nação zulu”, vinculada à sua elite dominante. Assim, ao revisitar o passado, o romance buscava estratégias para enfrentar as novas condições políticas da África do Sul, marcadas pelo segregacionismo: reafirmar a história da nação zulu, para, assim, legitimar demandas por acesso à terra e direitos políticos.
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W. E. B. Du Bois Papers, 1803-1999. University of Massachusetts Amherst Disponível em: https://credo.library.umass.edu/view/collection/mums312 Acesso em: 07 out. 2024.
» https://credo.library.umass.edu/view/collection/mums312 - WRIGHT, John. Making the James Stuart Archive. History in Africa, v. 23, n. 1, p.333-350, 1996.
Notas
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1
Tradução livre: “Quando Jeqe viu que seu rei estava em grande perigo, ele agarrou a lança e o escudo de um jovem guerreiro e gritou: ‘Cuidem do meu equipamento, eu vou para a batalha!’ Então, correu para o campo de batalha mais rápido que o vento”.
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2
Tradução livre: “Jeqe tinha o coração de um guerreiro: ele se deleitava na batalha; mas matar um homem a sangue frio era insuportável [...] No entanto, para ele, a palavra do rei era lei. Por mais difícil que fosse, ele tinha que obedecer”.
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3
Tradução livre: “tinha em seus cuidados todos os medicamentos que protegem a soberania desta terra”.
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4
Tradução livre: “O filho de Sikunyana, do clã Buthelezi”.
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5
Tradução livre: “Entre os rios Umvoti e Nonoti, com as colinas Madundube a oeste e o Oceano Índico a leste, Thaka [Shaka] construiu seu kraal real, Dukuza. Foi ali que a nação zulu se formou na presença de seu rei”.
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6
Tradução livre: “Ele estava longe de governar de forma autocrática como um monarca absoluto, especialmente nos assuntos externos. Se ele persistisse, apesar da oposição dos indunas, os membros da casa real e outros chefes governantes seriam convocados para discutir a questão de forma exaustiva”.
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7
Tradução livre: “Honrava homens bravos e presenteava-os com gado”.
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8
Tradução livre: “Destruiu esta terra com assassinato a sangue frio”.
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9
Tradução livre: “A aparição do rei, que foi recebido por um grito ensurdecedor quando a saudação real ‘Bayede! Bayede!’ ecoou de milhares de gargantas”.
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Financiamento
A pesquisa que resultou neste artigo contou com fomento financeiro do CESAM (Central and South America) Platform, da Universidade de Ghent (Bélgica).
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Declaração de disponibilidade de dados:
Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
Disponibilidade de dados
Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
01 Dez 2025 -
Data do Fascículo
2025
Histórico
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Recebido
23 Out 2024 -
Aceito
02 Jun 2025
