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O Waimea 5000 em revistas californianas (1976-1982)* * Uma versão resumida deste trabalho foi apresentada no 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, em setembro de 2018, e publicada nos anais do evento. Agradeço a um dos pareceristas anônimos desta revista pelas preciosas contribuições para o aprimoramento do texto.

The Waimea 5000 in California magazines, 1976-1982

Resumo

As primeiras sete edições do Circuito Mundial de Surfe Profissional Masculino foram realizadas entre 1976 e 1982. Criado pela organização International Professional Surfers (IPS), o circuito incluiu uma etapa no Brasil desde o início: o Waimea 5000, sediado na cidade do Rio de Janeiro. Este trabalho descreve e analisa a cobertura do evento de surfe em duas revistas publicadas nos Estados Unidos, Surfer e Surfing, e está dividido em três partes. A primeira parte cobre a formação do Circuito Mundial e a organização de excursões para participar nas etapas da África do Sul e do Brasil. A segunda parte concentra-se na cobertura propriamente dita durante a maior parte desse período, que foi bastante escassa de forma geral, e tratou o Brasil como um destino de lazer atraente para o público interessado em surfe. A terceira parte aborda o evento de 1980, na qual saiu vitorioso o californiano Joey Buran. A vitória de Buran foi retratada nas publicações da época e em edições posteriores ao longo dos anos 1980. Com base nesses elementos, o texto debate as possíveis implicações dessas representações considerando o contexto dessa época, que incluía as condições de produção das revistas, o papel periférico do Brasil no mundo do surfe e os estágios iniciais do profissionalismo no esporte. Este artigo faz parte de um projeto de pesquisa que discute como o Rio de Janeiro e o Brasil foram retratados nas revistas de surfe escritas em língua inglesa publicadas no exterior.

Palavras-chave:
história da comunicação; século XX; revista; esporte; mídia

Abstract

The first seven editions of the Men’s Professional World Surfing Circuit were held between 1976 and 1982. Created by the International Professional Surfers (IPS) organization, the circuit included a Brazilian leg from the outset: the Waimea 5000, held in the city of Rio de Janeiro. This report describes and analyzes coverage of the surfing event in two magazines published in the United States: Surfer and Surfing. It is divided into three parts. The first part covers the formation of the World Circuit and the organization of tours to participate in the South African and Brazilian legs. The second part focuses on the coverage itself over most of this period, which was generally scant and treats Brazil as an attractive leisure destination where the public is interested in surfing. The third part addresses the 1980 event, which was won by Californian Joey Buran. Buran's win was featured in the publications at the time and in subsequent issues throughout the 1980s. Based on these elements, the text discusses the possible implications of these representations considering the context of that era, which includes the magazines' production conditions, Brazil's peripheral role in the world of surfing and the early stages of professionalism in the sport. The article is part of a research project discussing how Rio de Janeiro and Brazil were portrayed in English-language surfing magazines published abroad.

Keywords:
communication history; twentieth century; magazine; sport; media

Introdução

Desde os anos 1960, o Rio de Janeiro despontava como a principal cidade do Brasil em termos de visibilidade turística no exterior (ALFONSO, 2006ALFONSO, Louise Prado. Embratur: formadora de imagens da nação brasileira. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2006. Disponível em: <Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?down=vtls000380103 >. Acesso em 25 mai. 2017.
http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/...
). Ela tinha um importante número de adeptos do surfe e sediava lojas que, sobretudo a partir da década seguinte, investiram no esporte por meio do patrocínio de campeonatos - caso da Waimea Surf Shop, localizada em Ipanema e patrocinadora do Waimea 5000, etapa presente desde a primeira edição do Circuito Mundial de surfe profissional masculino. Também havia lojas que formavam equipes (como a Magno) e apoiavam indivíduos. Tais empresas também foram fundamentais para viabilizar a criação da revista Brasil Surf, veículo lançado em 1975 e apontado em diversas fontes como pioneiro a dedicar-se exclusivamente ao surfe no país.

Este artigo, contudo, não trata de revistas brasileiras. Antes de caracterizar Surfer e Surfing, discorro brevemente sobre os papéis que os veículos de comunicação podem desempenhar em relação ao esporte, tema que tem sido abordado por alguns historiadores. 1 1 Os impressos são a fonte mais usada na história do esporte (Melo, 2016; Melo et al., 2013, p. 120). Investigando o Jornal dos Sports entre os anos 1930 e 1950, Couto (2016COUTO, André Alexandre Guimarães. Cronistas esportivos em campo: letras, imprensa e cultura no Jornal dos Sports (1950-1958). 2016. Tese (Doutorado em História) - Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2016.) afirma que um

ponto importante de nossa reflexão era a ideia da capacidade interventora da instituição imprensa no projeto de modernização e ampliação do campo esportivo, não só na função (e, por vezes, tratada na prática como missão) de noticiar os eventos, práticas e modalidades, mas também de interferir neles, organizando e/ou patrocinando algumas competições esportivas (p. 123).

Para o autor, a imprensa não apenas cobria o esporte, mas também desempenhava os papeis de intervir, organizar, promover e inovar (p. 132). Melo (2012MELO, Victor Andrade de. Causa e consequência: esporte e imprensa no Rio de Janeiro do século XIX e década inicial do século XX. In: HOLLANDA, Bernardo Borges Buarque de; MELO, Victor Andrade de (Org.). O esporte na imprensa e a imprensa esportiva no Brasil. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2012, p. 21-51. ) desenvolve o argumento de que, já no século XIX, houve uma relação de retroalimentação entre imprensa e campo esportivo no Rio de Janeiro. Tal historiografia sustenta a ideia de que a exploração comercial e as relações simbióticas entre meios de comunicação e esporte são fenômenos observáveis desde a formação do campo esportivo.2 2 Utilizo “campo esportivo” no sentido definido por Melo (2010) a partir de elaboração de Bourdieu (1983). As pesquisas que conheço sobre o surfe, seja no exterior ou no Brasil, apontam que algo semelhante se deu com esta modalidade, mas por intermédio do cinema e, principalmente, das revistas (BOOTH, 2001BOOTH, Douglas. Australian Beach Cultures: The History of Sun, Sand and Surf. London: Frank Cass, 2001.; FORD, BROWN, 2006FORD, Nick; BROWN, David. Surfing and social theory: experience, embodiment and narrative of the dream glide. London & New York: Routledge, 2006.; FORTES, 2011FORTES, Rafael. O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura. Rio de Janeiro: Apicuri/Faperj, 2011.). Este é um dos motivos pelos quais privilegio este tipo de impresso como fonte e objeto.3 3 Para uma breve discussão das diferenças entre jornais e revistas como fontes para a história do esporte, ver Melo et al. (2013, p. 120-122).

Neste trabalho, busco descrever e analisar de que maneira a realização do Waimea 5000, entre 1976 e 1982 (respectivamente, anos de sua primeira e de sua última edição), propiciou oportunidades para que as duas principais revistas de surfe dos EUA no período voltassem suas atenções para o Rio de Janeiro e o Brasil, bem como para o público presente ao evento, os surfistas brasileiros e outros aspectos. O problema de pesquisa é discutir as representações construídas pelas publicações a respeito do Brasil por ocasião do Circuito Mundial que se formava.

Defendo que, ao fazê-lo, as publicações não apenas produziram representações acerca do país, mas também demarcaram um lugar no processo de esportivização e profissionalização do surfe, para o qual o estabelecimento de um calendário regular de competições era central. A proposta de um circuito com etapas realizadas em distintos países, para coroar um campeão ao final de cada temporada (anual), significava uma ruptura com o formato anterior, vigente até 1972, em que o campeonato mundial era uma competição única realizada em um local específico, a cada dois anos, sem premiação relevante em dinheiro e/ou qualquer estrutura econômica perene que proporcionasse aos participantes a possibilidade de se dedicarem prioritária ou exclusivamente ao esporte. O período em tela engloba os primeiros anos do circuito, sob o jugo da IPS, em que havia uma série de discussões acerca da viabilidade econômica do mesmo. A realização de etapas em países como Brasil e África do Sul, geograficamente distantes das áreas em que residia a maioria dos participantes, requeria estratégias e fomentava debates.

Do ponto de vista da metodologia, adoto os procedimentos propostos por Luca (2005LUCA, Tania Regina de. História do, no e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2005, p. 111-53.) para a pesquisa histórica usando os impressos como fonte e objeto. Foram consultados todos os números de Surfer e Surfing editados dentro do recorte estabelecido. A pesquisa foi realizada nos acervos do setor de Coleções Especiais da biblioteca da San Diego State University (San Diego, EUA) e no arquivo do California Surf Museum (Oceanside, EUA).

Segundo Ford e Brown (2006FORD, Nick; BROWN, David. Surfing and social theory: experience, embodiment and narrative of the dream glide. London & New York: Routledge, 2006.), “certamente é difícil negar que houve uma incrível concatenação de criatividade cultural e estética em torno do surfe no início dos anos 1960, principalmente em partes do Sul da Califórnia” (p. 43).4 4 Todas as traduções da bibliografia e das fontes em inglês foram feitas por mim. Nesse contexto e região floresceram manifestações e produtos como surf music, filmes (hollywoodianos e independentes) e publicações como Surfer e Surfing. De acordo com Booth (2008BOOTH, Douglas. (Re)reading The Surfers’ Bible: The affects of Tracks. Continuum: Journal of Media & Cultural Studies, v. 22, n. 1, p. 17-35, February 2008.), as revistas “Surfer, Surfing e Surfing World5 5 Surfing World é publicada na Austrália desde 1962. definem a cultura mainstream do surfe” (p. 21). Criados na Califórnia em 1960 e 1964, respectivamente, os dois primeiros títulos circulavam em vários países, um dos fatores que lhes conferiram influência mundial. Ormrod (2007ORMROD, Joan. Surf Rhetoric in American and British Surfing Magazines Between 1965 and 1976. Sport in History, v. 27, n. 1, p. 88-109, 2007.) afirma que “Surfer e Surfing eram fontes de informação muito importantes” já na segunda metade dos anos 1960 (p. 92). De acordo com Brandão (2014BRANDÃO, Leonardo. Para além do esporte: uma história do skate no Brasil. Blumenau: Edifurb, 2014.), Surfer e Surfing “eram vendidas em São Paulo nas bancas da Praça da República” (p. 52) por volta de 1974. Ambas foram bastante lidas por surfistas brasileiros nos anos 1970 e início dos 1980 (FORTES, 2011FORTES, Rafael. O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura. Rio de Janeiro: Apicuri/Faperj, 2011.; FRANCO, 2013FRANCO, Bruna Demes Gonçalves. O surfe como prática: cidade, corpo e técnica numa relação entre cultura e natureza em Fortaleza (1972-1986). 2013. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade do Estado do Ceará, Fortaleza, 2013.).

Um necrológio de John Severson, criador de Surfer, afirma que esta foi “o primeiro periódico de surfe do mundo. A venerada revista, que se encontra no 57º ano de publicação, ajudou a lançar a indústria [do surfe] como um todo”.6 6 MAURO, Chris. RIP - Thanks for the Ride, John Severson. World Surf League, 28 mai. 2017. Disponível em: <http://www.worldsurfleague.com/posts/254813/thanks-for-the-ride-john-severson>. Acesso em 28 mai. 2017. É relativamente comum encontrar referências a ela como a “Bíblia do surfe”, principal publicação sobre o tema no mundo e modelo para congêneres criadas em vários países nas décadas de 1960, 1970 e 1980 (FORTES, 2011FORTES, Rafael. O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura. Rio de Janeiro: Apicuri/Faperj, 2011.). Ela abordava distintos aspectos do surfe, do ponto de vista cultural e esportivo. A partir de 1978, passou de bimestral a mensal. Continua em circulação. Já Surfing enfatizava um pouco mais o aspecto competitivo da modalidade. Também mudou algumas vezes de proprietário ao longo das décadas e cresceu bastante em vendas na primeira metade dos anos 1980. Passou de bimestral a mensal em 1979 e deixou de circular em janeiro de 2017.7 7 PIERSON, Dashel. RIP Surfing Magazine (1964-2017). Surfline, 25 jan. 2017. Disponível em <http://www.surfline.com/surf-news/matt-warshaw-weighs-in-on-the-end-of-an-era-rip-surfing-magazine-1974-2017_144865/>. Acesso em 15 jun. 2017.

O artigo se inicia com uma discussão em torno da formação do Circuito Mundial profissional e da realização de excursões que facilitavam o comparecimento de surfistas dos EUA às etapas sul-africanas e brasileiras. Em seguida, aborda a cobertura por meio de pequenas notas, comum nos primeiros anos. A terceira seção trata de 1980, quando a etapa foi vencida por Joey Buran, da Califórnia, acontecimento considerado “histórico” pelas publicações. Por fim, discuto as formas pelas quais o Waimea 5000 foi abordado, tendo em vista a disputa do Circuito, bem como aspectos minimizados na cobertura, mas presentes em outras fontes.

Formação do Circuito Mundial e excursões para África do Sul e Brasil

Encontrei em edições datadas do primeiro semestre de 1977 as primeiras referências à criação do circuito. Nelas há menções à realização de etapas no Brasil. Um artigo intitulado O Grand Prix do $urfe narra conversas na primavera de 1975, no Havaí, voltadas para o estabelecimento de “algum sistema que iria razoavelmente definir um campeão legítimo e dar-lhe o justo reconhecimento”. O texto cita uma festa de lançamento do Circuito em outubro de 1975: “espalhados pelo salão estão australianos, africanos, brasileiros, europeus e muitos residentes do North Shore (...) Ao fim temos mais de 250 assinaturas no livro de presença e a reunião prova ser o maior encontro internacional jamais ocorrido de surfistas profissionais”.8 8 PATERSON, Al. The Grand Prix of Surfing. Surfing, v. 13, n. 2, abr.-mai. 1977, p. 22.

Ao listar parte das etapas e dos países que integrariam o circuito intitulado “First Beachcomber Bills9 9 Nome da empresa patrocinadora. Posteriormente, não houve mais menção à empresa (ou a qualquer outra) no nome do Circuito - provavelmente porque o patrocínio não se efetivou. International Surfing Grand Prix”, o autor afirma: “Recebemos confirmação definitiva de um campeonato no Brasil (provisoriamente intitulado Waimea 5000) e acabamos de saber que pode haver um segundo, realizado um par de semanas após o acima mencionado”.10 10 PATERSON, Al. The Grand Prix of Surfing. Surfing, v. 13, n. 2, abr.-mai. 1977, p. 22.

Ou seja, o Brasil esteve entre os poucos países cuja presença é registrada tanto nos eventos de lançamento quanto na composição do circuito. Em entrevista concedida em 2012, Nelson Machado, patrocinador do evento e proprietário da loja Waimea Surf Shop (localizada no bairro de Ipanema), afirma que ele mesmo viajou para o Havaí para entrar em contato com os dirigentes do surfe e “saber qual era o caminho para trazer um evento de grande porte ao Brasil”.11 11 ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018. Os contatos e relações estabelecidos por surfistas brasileiros em temporadas anteriores no Havaí possivelmente contribuíram para o sucesso da empreitada.

Em 1975, Surfer publicou relato de Randy Rarick, então surfista profissional, a respeito de uma equipe de havaianos reunida por ele para competir no Gunston 500, na África do Sul. Note-se que o campeonato é anterior ao Circuito Mundial. A primeira temporada consistiu de uma combinação de campeonatos já existentes e outros criados devido ao Circuito - entre estes, o Waimea 5000.12 12 O historiador Douglas Booth (2001) afirma que o Circuito Mundial inaugural, em 1976, sequer existiu como tal. Segundo ele, a International Professional Surfing usou a posteriori resultados de campeonatos para elaborar um ranking e declarar um campeão. O vencedor, Peter Townend, sequer recebeu um troféu. Debater a questão extrapola os objetivos deste artigo. O texto narra as dificuldades da iniciativa, como obter patrocínio e organizar a viagem. À participação no campeonato seguiu-se uma viagem para aproveitar a famosa onda de Jeffrey’s Bay. “Após uma semana em Jeffrey’s Bay, todos estavam exaustos e felizes. Com apenas 10 dias restantes em nossas passagens, o time se atirou para o Brasil e depois para casa, Via Rio com Rico,13 13 “Via Rio with Rico” no original. Ao que parece, um jogo de palavras aproveitando a proximidade na grafia e sonoridade entre o nome da cidade e o do surfista brasileiro Rico de Souza, que costumava hospedar surfistas estrangeiros em sua casa. só isso. Mas aí já se trata de uma outra história.”14 14 RARICK, Randy. The Hawaii Team to South Africa: With a Report on the Gunston 500 and Assorted Other Sidetrips. Surfer, v. 16, n. 4, out.-nov. 1975, p. 41.

A viagem parece ter sido o embrião de uma iniciativa que se repetiria nos anos seguintes. Já dirigente da International Professional Surfing (IPS), entidade privada que organizava o circuito mundial, Rarick tornou-se organizador de um pacote de viagem oferecido aos surfistas que desejassem disputar as etapas da África do Sul e do Brasil, sequenciais no calendário. Acredito que tanto a ordem das etapas quanto a excursão tenham sido pensadas para viabilizar economicamente a participação dos atletas e facilitá-la, oferecendo aos que residiam nos EUA as conveniências de viajar integrando um grupo (segurança; deslocamentos e hospedagem previamente arranjados; existência de um guia responsável por tomar certas providências). Conforme argumentei em outro trabalho, tais iniciativas em torno da profissionalização do surfe - no caso de Rarick, paulatinamente deixar a carreira de surfista profissional para tornar-se organizador do Circuito Mundial e de viagens turísticas e empresário - têm como uma das causas o desejo de surfistas de viabilizarem trabalho e renda estáveis sem que necessitassem se afastar do esporte (FORTES, 2011FORTES, Rafael. O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura. Rio de Janeiro: Apicuri/Faperj, 2011.).15 15 Rarick acumulou várias funções durante alguns anos. Por exemplo, ele aparece em 51º. lugar no ranking final de 1977 da IPS. Surfer, v. 19, n. 1, abr.-mai. 1978, p. 87.

Em 1977, uma nota afirmava:

O diretor administrativo da IPS, Randy Rarick, está organizando outra excursão para campeonatos internacionais neste verão, com um itinerário que incluirá paradas na África do Sul (três semanas e meia) para os eventos Gunston e Hang Ten, Brasil (10 dias) para o Waimea 5000 e Flórida (uma semana) para o Florida Pro International.16 16 Surfing, v. 13, n. 3, jun.-jul. 1977, p. 21.

O texto garantia que a viagem do ano anterior fora um sucesso e indicava um contato na Califórnia (Tuzo Jerger, na Kanoa Surf Shop). As pessoas de fora do estado deveriam contatar a própria Surfing.17 17 Surfing, v. 13, n. 3, jun.-jul. 1977, p. 21.

A nota evidencia as imbricações entre estabelecer e viabilizar o circuito profissional. Além de administrar o circuito - e, acredito, também para organizá-lo e torná-lo exequível -, Rarick escrevia a respeito da IPS para a Surfing. Suas notas informavam as novidades, ao mesmo tempo em que buscavam estabelecer a entidade como representante legítima dos interesses dos surfistas profissionais, sendo positiva e benéfica para o surfe como um todo. Organizar uma excursão provavelmente era um meio de Rarick obter recursos financeiros, ajudando a viabilizar seus próprios deslocamentos para os campeonatos, e também de aumentar a quantidade de surfistas dos EUA que participassem neles, o que fortaleceria os eventos, o circuito e a IPS. A centralidade das revistas na estruturação do surfe como campo esportivo, destacada anteriormente, evidencia-se não só pelo teor do que se publicava, mas também pelo funcionamento da redação de Surfing como local de contato para os interessados em informações sobre a excursão.

Na primeira metade dos anos 1980, algumas edições por ano traziam um anúncio da excursão. Intitulada “South Africa/Brazil Surf Tour”, a de 1980 propagandeava preços “começando tão baixo quanto US$ 1795” e saída em 25 de junho.18 18 No caso de Surfing, de acordo com um anúncio na edição anterior (abril de 1980), a seguinte (com data de maio de 1980) estaria nas bancas em 26 de dezembro de 1979. Ou seja, no caso de 1980, afirmo com razoável possibilidade de acerto que as edições datadas de maio com o anúncio da excursão chegaram às bancas cerca de seis meses antes da data prevista para a partida da excursão. Surfer, v. 21, n. 5, mai. 1980, p. 12. Anúncio com texto idêntico apareceu em Surfing:

O tour será conduzido pelo diretor administrativo da Surfe Profissional Internacional,19 19 O nome da IPS já mudara de International Professional Surfers para International Professional Surfing. Randy Rarick. As paradas incluem: Durban, África do Sul, para os eventos reconhecidos pela IPS “Gunston 500” e “Hang Ten International”, Jeffrey’s Bay, Cape St. Francis e reservas de caça africanas. De lá para o Rio de Janiero [sic] para o “Waimea 5000” Brazilian Pro Championships e vida noturna exótica.20 20 Surfing, v. 16, n. 5, mai. 1980, p. 93.

Informava-se uma a data de partida distinta (20 de junho), que as vagas eram limitadas e “apenas consultas sérias” deveriam ser feitas junto à Hawaii Surfing Promotions, empresa de Rarick.

Nos anos seguintes, o texto da peça publicitária permaneceu basicamente o mesmo, como se pode conferir na Figura 1, relativa a 1982:

Figura 1
Anúncio da excursão. Fonte: Surfer, v. 23, n. 6, July 1982, p. 92.

Além dos aspectos destacados nos parágrafos anteriores, chamo a atenção para três pontos. Primeiro, as atrações anunciadas, no surfe e fora dele. Na subcultura do surfe, três competições e dois destinos sul-africanos famosos: Jeffrey’s Bay, tratada como uma das melhores e mais importantes ondas do mundo, e Cape Saint Francis, caracterizada como a onda perfeita no famoso filme The Endless Summer (THOMPSON, 2015THOMPSON, Glen. Surfing, Gender and Politics: Identity and Society in the History of South African Surfing Culture in the Twentieth-Century. 2015. Tese (Doutorado em História) - Stellenbosch University, Stellenbosch, 2015.).21 21 Direção: Bruce Brown. Ano: 1966. Fora do mar, as atrações se relacionam com estereótipos do continente africano e do Brasil, ambos ligados a uma certa noção de exotismo. No primeiro, o safári em reservas em que os animais selvagens ficavam soltos. No último, a vida noturna do Rio de Janeiro.

Segundo, a mercantilização não apenas do surfe profissional, mas dos próprios deslocamentos de uma parte dos integrantes do circuito. Numa época em que telefonemas internacionais custavam caro e a disponibilidade de informações sobre destinos em outros continentes era relativamente escassa, a contratação de uma agência de viagens do próprio país e de um guia que entendia de surfe, tinha experiência com o trajeto em anos anteriores e integrava a direção do próprio circuito conferiam comodidade e confiabilidade à viagem. O anúncio foi publicado na maioria dos anos até 1982.

Terceiro, na foto inferior direita, a presença, na praia, de uma mulher esbelta, com cabelos aloirados e branca (parece ter a pele bronzeada, mas ainda assim enquadrável como branca segundo os padrões vigentes nos EUA). A foto pode ilustrar ambos os países cobertos na excursão, diferentemente da que está à esquerda, que retrata a Praia de Copacabana. A banhista usa biquíni e sorri olhando para a câmera (que emula o olhar do leitor). Isto sugere que a peça publicitária se dirigia sobretudo a surfistas homens heterossexuais, que constituíam também o contingente principal de leitores das revistas de surfe. E evidencia uma certa expectativa de contato com mulheres bonitas presente na oferta de pacotes de viagens para determinados destinos turísticos, entre os quais África do Sul e Brasil. Retorno a este ponto adiante, tratando do caso brasileiro.

Cobertura por meio de matérias curtas

Os primeiros anos do Waimea 5000 receberam pouco espaço nas publicações. Em alguns casos, sequer houve uma reportagem ou nota a respeito. Havia em cada revista uma seção destinada aos resultados de competições, na qual se informava sobre o circuito da IPS. Nela foram publicadas as notícias sobre a etapa do Brasil, às vezes junto com as imediatamente anteriores e posteriores. Tal foi o caso em 1976-7: Gunston 500 e Hang Ten International (África do Sul), Waimea 5000 (Brasil) e Florida Pro (EUA).22 22 Surfer, v. 17, n. 5, dez.-jan. 1976-1977, p. 106.

Um dos primeiros textos teve autoria de Peter Townend. Campeão mundial em 1976, ele corria o circuito e também o cobria para Surfing:

Que país! Para o campeonato, a praia recebeu de 10 a 12 mil espectadores (!) (...) - revelando o latente entusiasmo do Brasil pelo surfe profissional (...) As finais foram realizadas em esquerdas de dois a quatro pés límpidas sobre bancos de areia na Praia do Quebra-Mar, com a dupla matadora de goofies Daniel Friedman e Pepe Lopes ficando em primeiro e segundo, respectivamente.23 23 TOWNEND, Peter. Getting to the Points. Surfing, v. 13, n. 6, dez-jan. 1977-1978, p. 19.

No ano seguinte, novo relato:

Que país! Fomos brindados com delícias como a Dancing Daze Disco, sob as estrelas e ao lado dos bondinhos, cervejas na calçada na frente do Bar Garota de Ipanema, show de jazz no teatro de 300 lugares na rua de cima, seguido por viagens de elevador no Tourist Tropical Hotel com Mad Kanga no controle e, oh, sim... Acho que houve um campeonato de surfe também, em algum lugar no meio destas excursões de testar a sanidade.

(...) a detonação de pequenas ondas foi o que rolou e, até as finais, houve pouquíssima substância para os surfistas se largarem. Cheyne Horan continuou a ascensão ao topo ganhando seu primeiro grande título e o maior troféu que você jamais verá em sua vida - que eu duvido que ele já tenha descoberto como levá-lo de volta para a Austrália (talvez ele tenha que comprar uma poltrona extra no avião).24 24 TOWNEND, Peter. Waimea Wingding. Surfing, v. 14, n. 6, dez-jan. 1978-1979, p. 19.

Publicados com cerca de um ano de intervalo, os textos apresentam ao menos três similaridades: a frase inicial e as menções ao tamanho das ondas - pequenas para os padrões internacionais de surfe de alto nível - e ao vencedor. No segundo, renova-se a surpresa do surfista-jornalista com o “país” - aqui, o Rio de Janeiro parece ser tomado como se fosse o Brasil. Todos os motivos citados para tanto são atividades de lazer, especialmente a vida noturna.25 25 Parte do primeiro excerto não pode ser lida porque faltava um pedaço da folha do exemplar que consultei no arquivo da San Diego State University - algo no verso da folha pareceu ao leitor interessante o suficiente para levá-lo a recortá-la, ocorrência comum quando se consulta acervos de revistas de surfe em diferentes países), de forma que é possível que o autor também tenha feito alguma menção às atividades realizadas, tal qual no segundo relato.

O segundo texto é mais extenso e aborda ainda a questão do tamanho do troféu - que surgiu noutros momentos, como quando Surfing atestou a repercussão da vitória na terra natal do vencedor: “Cheyne [Horan] atraiu bastante atenção da mídia em seu retorno ao país, incluindo uma grande foto de primeira página no jornal Daily Telegraph, de Sydney, posando com seu troféu do Waimea 5000.”26 26 Surfing, v. 14, n. 3, jun.-jul. 1978, p. 38. A reprodução da capa do jornal permite ver a dimensão do troféu.

O primeiro trecho destaca ainda a quantidade de pessoas assistindo à competição, bem como seu comportamento e empolgação. Um público de tal monta era incomum no cenário mundial das competições de surfe à época. É possível que a empolgação dos espectadores cariocas/brasileiros tampouco fosse trivial - ou, talvez, fosse apenas algo não esperado por Townend. Um perfil de Horan mencionou a tática de competição agressiva dele e de outros australianos e seu bom desempenho em ondas pequenas. Quando dois deles “se enfrentaram numa bateria particularmente pesada”, “arrancaram aplausos e vaias dignas de casas de shows do público presente na praia”. A explicação atribuída a Horan na matéria é que o público não estava acostumado com tal comportamento dos atletas e acabou torcendo por ele e contra o adversário (Critter Byrne): “Quando saí da água, eles vibraram novamente, mas quando Critter saiu, eles vaiaram e atiraram bolas de areia nele. Nunca tinha visto nada parecido”.27 27 JARRATT, Phil. The Bronzed Clones? A profile of Jim Banks and Cheyne Horan. Surfer, v. 20, n. 5, mai. 1979, p. 61-2.

Em 1979, não houve Waimea 5000. Encontrei uma única menção ao(s) motivo(s) para a não realização da etapa:

Sem Carnaval no Rio?

O Waimea 5000, único evento oficial do Brasil, foi para o brejo. Ricardo Bocoa [Bocão] anunciou, durante o evento final no Japão: “O diretor do torneio, Nelson Machado, está mal de saúde e o campeonato não será realizado, mas ano que vem Randy [Rarick], Nelson e eu esperamos ter dois campeonatos de US$ 20.000”. Então marquem nos seus calendários, garotos, ANO QUE VEM! Parece que já ouvi essa em algum lugar antes; como o menor violino do mundo, fica tocando, mas nunca sobe o volume.28 28 TOWNEND, Peter. PT’s Mid-Tour Melange. Surfing, v. 15, n. 8, out 1979, p. 16.

Competidor e responsável pela cobertura do Circuito em Surfing, Townend cita uma fala do surfista Ricardo Bocão atribuindo o cancelamento ao adoecimento do organizador. O trecho também ironiza a afirmação de que poderia haver uma segunda etapa no país - algo que se anunciou na maioria dos anos desde o início do Circuito, mas não chegou a ocorrer durante o período em tela.

O campeonato manteve o nome mesmo após aumentar o valor total da premiação em dinheiro.29 29 Diversas fontes afirmam que o nome Waimea 5000 era uma combinação do nome da surf shop que patrocinava o evento com o valor da premiação (US$ 5.000). Contudo, nenhuma fonte que eu tenha encontrado especifica se os cinco mil dólares eram o total da premiação ou o valor entregue ao vencedor. Acredito que 5 mil dólares tenha sido a premiação total da primeira edição. Houve menções (citadas ao longo deste artigo) ao campeão receber US$ 4 mil e US$ 5 mil em etapas posteriores. Cf. As seis edições do Waimea 5000. Datasurfe, 3 mar. 2009. Disponível em: <http://www.datasurfe.com.br/2009/03/as-seis-edicoes-do-waimea-5000-1976.html>. Acesso em 5 jul. 2018. Em 1978, Horan ganhou US$ 4.000 pela vitória. Na lista de etapas previstas para 1979, que incluía o Waimea 5000, informou-se que a premiação mínima era de US$ 8.000 para os homens.30 30 E US$ 4.000 para as mulheres. Estes eram os valores estipulados por padrão. Contudo, o Waimea 5000 era uma das etapas em que havia apenas o campeonato de homens. Surfer, v. 20, n. 3, mar. 1979, p. 89. Na edição datada de julho de 1979 (que provavelmente circulou alguns meses antes, como o próprio limite de 6 de junho para inscrições atesta),31 31 Três fatores principais determinam o lapso de tempo entre a data de um acontecimento e a data da edição das revistas em que ele será noticiado: 1) a periodicidade (ambas começam bimestrais e depois passam a mensais); 2) o intervalo entre o mês/ano escritos na capa e no expediente de uma edição e o mês/ano em que a mesma edição efetivamente chega às bancas e aos assinantes - uma diferença que, nas revistas e no intervalo de anos em questão, poderia superar 90 dias e até aproximar-se de seis meses; 3) tempo decorrido entre o envio de materiais (textos e filmes fotográficos) pelos repórteres e seu recebimento pela redação, bem como para posterior revelação de filmes, escolha de fotos e demais etapas do processo de edição (não era raro se passarem alguns meses entre a realização de uma etapa e a chegada às bancas da edição com a respectiva cobertura). ainda se trabalhava com a ideia de que haveria o Waimea 5000.32 32 Surfer, v. 20, n. 7, jul. 1979, p. 14. Na edição seguinte, com resultados dos campeonatos na Austrália em março e abril, o “circuito provisório de 1979” continuava com o Waimea 5000 agendado para julho.33 33 Surfer, v. 20, n. 8, ago. 1979, p. 88.

Em 1981, uma nota em Surfer informou sobre a composição da chave (“160 trialistas foram cortados até se chegar aos 12 que se juntaram aos 16 cabeças-de-chave da IPS e a quatro convidados”) e considerou baixa a qualidade das ondas34 34 Em termos de público e visibilidade, o local preferencial era o Arpoador. Contudo, parece-me que a busca de ondas melhores fez com que a competição fosse deslocada para outras praias cariocas, como a Prainha (1981) e o Quebra-Mar da Barra da Tijuca. e bom o desempenho dos brasileiros - quatro entre os oito primeiros na classificação.35 35 Surfer, v. 22, n. 12, dez. 1981, p. 96.

Tal como na maioria dos anos, em 1982 Surfer apenas noticiou o resultado na seção de boletim de competições. Poucas linhas foram dedicadas à descrição do evento: tamanho das ondas, desempenho dos vencedores e lista dos primeiros colocados.36 36 Surfer, v. 24, n. 12, dez. 1982, p. 88.

A vitória “histórica” de Joey Buran

O Waimea 5000 de 1980, vencido por Joey Buran, recebeu a maior cobertura. No número datado de dezembro, Surfing anunciava em pequena nota:

JOEY BURAN CONQUISTA VITÓRIA NO BRASIL Joey Buran, de Carlsbad, conquistou uma vitória unânime sobre Ismael Miranda, do Brasil, no Waimea 5000, tornando-se o primeiro californiano da história a vencer um evento da IPS. Buran voou de volta para casa, na Califórnia, com um troféu gigante e um cheque de US$ 5.000, em cima da hora para competir no Stubbies California Pro Trials, onde ele também apresentou uma performance elogiável. Cheque a revista mês que vem para os detalhes completos de ambas as competições.37 37 BARTHOLOMEW, Wayne. Richards Renders ‘Em Speechless With Whitewash in Africa. Surfing, v. 16, n. 12, dez. 1980, p. 22.

De fato, a edição seguinte trouxe uma página completa da coluna Pro Tour, que tratava das etapas do Circuito, dedicada ao Waimea 5000.38 38 BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19. Penso em três motivos para explicar o destaque incomum: Buran era norte-americano e californiano, e seu título, inédito. Arriscaria especular que o segundo aspecto seja o mais importante, tanto porque confere ineditismo à vitória (havaianos já haviam vencido etapas) quanto porque a sede das revistas - e, calculo, uma parte razoável de seu público - situava-se na Califórnia. Carlsbad está a 41 quilômetros de San Clemente (sede de Surfing)39 39 Surfing, v. 17, n. 5, mai. 1981, p. 6. e 51 de Dana Point (sede de Surfer),40 40 Surfer, v. 22, n. 5, mai. 1981, p. 9. sendo todas importantes cidades para a prática do surfe na Califórnia. Ao mencionar a cidade de onde o atleta é local, a revista não identificou o estado - diferentemente do usual, dadas as dimensões continentais dos EUA -, o que sugere haver expectativa de familiaridade por parte do leitor.

O texto informa que “apenas quatro dos dez primeiros da IPS cruzaram o Atlântico” para participar da retomada do Waimea 5000 (após não ter sido realizado no ano anterior), tendo como consequência que, “previsivelmente, os resultados finais não foram inundados com os nomes dos faróis usuais”.41 41 BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19. A matéria prossegue listando os havaianos e os australianos eliminados nas duas primeiras fases em baterias “envoltas em controvérsias”. Ela não diz que houve favorecimento aos brasileiros, mas cita a reclamação de um australiano (derrotado por um brasileiro) e afirma que “a maior parte da glória e do dinheiro foi para os surfistas brasileiros, com nove do time da casa terminando bem colocados no evento principal”.42 42 BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19.

Segundo Townend, o título de Buran

rendeu-lhe não só um bom e gordo cheque de US$ 5.000, mas um lugar nos livros de história como o primeiro californiano a faturar um evento da IPS. A vitória de Buran também deve colocar lenha na fogueira da polêmica a respeito de quando o gigante adormecido Califónia irá erguer sua cabeça nas competições. 43 43 BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19.

A passagem considera o resultado um feito histórico - tal estabelecimento de marcos pioneiros me parece ser comum na cobertura do esporte por veículos de comunicação, ainda que eu desconheça a existência de pesquisas que se dediquem a investigar a questão - e menciona uma discussão corrente, naquele momento, a respeito de uma suposta discrepância entre a centralidade da Califórnia no surfe (em termos culturais, de mídia e de mercado,44 44 A Califórnia era - e continua sendo - o estado mais populoso dos EUA. mas também a quantidade de praias e de adeptos) e os escassos bons resultados dos californianos no surfe competitivo internacional.45 45 Naquele Waimea 5000, o desempenho considerado muito positivo incluiu dois atletas que ficaram em quinto lugar.

Tenho dúvidas se o feito entrou nos livros de história, mas encontrei três ocasiões em que tal previsão realizou-se nas próprias fontes. Surfer realizava uma pesquisa anual entre os leitores para escolher os e as surfistas do ano. Algumas edições traziam encartado um cupom que o leitor deveria destacar, preencher e enviar pelo correio. Na votação de 1981, Joey Buran obteve o nono lugar. As poucas linhas de descrição destacavam que era “o único surfista da Costa Oeste que venceu um campeonato da IPS, o Waimea 5000 de 1981, no Brasil”.46 46 O ano está errado. O correto seria 1980. The 11th Annual Surfer Poll Awards. Surfer, v. 23, n. 5, mai. 1982, p. 32. Em 1984, Surfer publicou longa matéria do ex-surfista profissional e então jornalista e empresário, Mike Tomson, sobre o profissionalismo.

Provavelmente a única outra [além do bicampeonato de Mark Richards] ocorrência digna de nota no circuito profissional de 1980 foi Joey Buran ganhando o Waimea 5000 no Brasil. Isto foi importante porque embora o circuito profissional estivesse em seu quarto ano, foi a primeira vez que um californiano saiu vencedor de uma etapa. A vitória de Joey foi comemorada loucamente em casa e fez maravilhas para a autoestima do surfe da Califórnia. Finalmente alguém havia provado que surfistas daquele estado não eram todos frouxos e que, embora a Califórnia tenha tido um papel pequeno no surfe profissional nos anos setenta, nos oitenta seria diferente.47 47 TOMSON, Mike. 1977-1982 Professionalism. Surfer, v. 20, n. 3, mar. 1984, p. 130.

A afirmação de Tomson é um relato de um informante importante, tanto devido ao conhecimento proporcionado pelas atividades que exerceu quanto porque residia há anos na Califórnia.

Em Surfing, a previsão realizou-se em 1986, quando publicou uma longa matéria sobre os 10 anos do circuito profissional. Ao abordar o ano de 1980, afirmou:

A Costa Oeste finalmente ganha um herói legítimo e as revistas um marco de celebração quando Joey Buran se torna o primeiro californiano a ganhar um evento da IPS e entrar no cobiçado top 16. Pegando dinheiro emprestado com sua mãe, Buran voa para o Rio de Janiero [sic]48 48 Conforme indicado na primeira seção deste artigo, a maioria dos atletas voava para a África do Sul e, de lá, para o Rio. A falta de recursos pode ter levado Buran a se deslocar apenas ao Brasil. e leva o Waimea 5000 (...). Ao voltar para casa, Joey paga de volta à mãe cada centavo que lhe deve, em dinheiro.49 49 “MONEY for nothing and the chicks for free.” Surfing, v. 22, n. 3, mar. 1986, 70.

Como convém à escrita de páginas épicas dos feitos desportivos, o texto inclui um elemento de dificuldade na trajetória do protagonista - algo que não fora mencionado na cobertura do feito, anos antes. A falta de dinheiro, o empréstimo familiar e o pagamento da dívida acentuam o caráter memorável da façanha de Buran, mas também permitem perceber a escassez de recursos que marcava o cotidiano e a carreira dos surfistas profissionais no período - mesmo os que ocupavam o topo do ranking e residiam em países centrais do capitalismo. Isso permite problematizar a noção de profissionalismo, muito presente, mas pouco discutida nos estudos históricos do esporte.50 50 A discussão sobre profissionalismo na historiografia do esporte tende a se concentrar na clivagem com o amadorismo, e não na descrição das condições e características concretas do que se considera um atleta profissional e sobre que condições objetivas sustentam tal classificação. Além disso, boa parte dos trabalhos estão centrados no futebol na primeira metade do século XX, havendo raras abordagens dos demais esportes e períodos históricos (GOMES e PINHEIRO, 2015; MELO, 2015).

O restante do texto cobrindo o campeonato de 1980 abordava aspectos citados nas matérias dos outros anos: tamanho e qualidade das ondas, colocações obtidas por certos atletas e o “público de milhares de espectadores - que, às vezes, ficavam tão excitados que circulavam bem dentro da água, em meio aos competidores”.51 51 Parece-me haver aqui um exemplo do desejo de estar próximo aos atletas, fenômeno presente em diversas modalidades esportivas. Nos esportes praticados ao ar livre e fora de arenas/equipamentos esportivos (ciclismo e automobilismo em estradas, rallies, voo livre, entre outros), o público costuma contar com maior liberdade de circulação. Citando como fonte “o diretor da IPS, Randy Rarick”, destacou a cobertura midiática:

a mídia no Brasil fica excitadíssima a respeito do surfe competitivo. O campeonato recebeu tratamento diário de primeira página nos jornais impressos, junto com ampla exposição em TV e rádio. Ele também parecia confiante que o grande entusiasmo mostrado este ano no Brasil poderia sinalizar novos eventos para o calendário brasileiro em 1981.52 52 Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981.

A virada dos anos 1970 para os 1980 costuma ser caracterizada como um período de relativo refluxo no desenvolvimento do surfe no Brasil (FORTES, 2011FORTES, Rafael. O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura. Rio de Janeiro: Apicuri/Faperj, 2011.). Feita a ressalva de que se trata de uma fala interessada e institucional, as declarações do empresário apontam o interesse da mídia local e nacional a respeito da competição e do esporte - o que não ocorria em todos os países e campeonatos. Tal atenção foi usada como motivo para se aventar, mais uma vez, a possibilidade de realização de mais de uma etapa no ano seguinte. O interesse despertado em distintos veículos de comunicação também é ressaltado por Nelson Machado:

Foi nossa [do surfe] primeira exposição nacional, e saímos em tudo quanto é lugar na imprensa, inclusive no Fantástico, Jornal Nacional, Esporte Espetacular, além de estampar os jornais e ter apoio de O Globo e do Jornal do Brasil. Veio gente de todos os lugares do Brasil para ver o show dos melhores surfistas do mundo. 53 53 ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.

No caso dos dois principais diários cariocas, houve cobertura e apoio ao evento - nova evidência das imbricações entre imprensa e o campo esportivo. Desconheço a existência de pesquisas acadêmicas sobre o Waimea 5000 em inglês, português, francês ou espanhol. Ambas as citações sugerem que tanto o evento quanto sua cobertura pelos meios de comunicação são objetos potencialmente ricos para o avanço da história do esporte.

Por fim, a cobertura avaliou que o desempenho dos californianos no Waimea de 1980 os credenciava a objeto de atenção futura dos interessados pelo Circuito. Surfer e Surfing traziam anualmente matérias com previsões para a temporada de inverno havaiana, as quais combinavam uma série de elementos: avaliações do inverno anterior (o que permitia a publicação de numerosas fotos impactantes, um dos principais - senão o principal - objetivos de uma revista de surfe); previsões a respeito do desempenho fora e dentro das competições; especulações sobre a disputa do título mundial (as possibilidades daqueles que matematicamente ainda tinham chance de conquistá-lo); e palpites sobre como seria a performance de cada um nas ondas em que se realizariam os campeonatos.

Um dos argumentos utilizados para apontar alguém como candidato a uma boa temporada era o desempenho no Circuito ao longo do ano. No final de 1980, as menções a surfistas californianos citaram as colocações obtidas no Waimea 5000 como um dado que os credenciava a integrar o pequeno rol de haoles54 54 Termo havaiano que designa o surfista de fora, ou seja, aquele que não é local, que não freqüenta a praia/pico em questão. A palavra tem ampla utilização no universo do surfe ao redor do mundo. em quem se deveria prestar atenção:

Será muito interessante ficar de olho em Joey Buran nesse inverno; ele é o jovem californiano que vem ganhando mais e mais experiência e atitude no circuito e que se tornou o primeiro californiano a vencer um evento da IPS, quando ele ganhou 1.000 pontos e US$ 5.000 no Waimea 5000, no Brasil. 55 55 HAWAII. Drew Kampion. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 34.

O texto afirma que ele já tivera bom desempenho dois anos antes no Havaí e, naquele ano, poderia novamente conquistar muitos pontos e bons prêmios em dinheiro.56 56 HAWAII. Drew Kampion. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 34. Houve também uma nota sobre Dean Hollingsworth, novato que obtivera resultados relevantes na África do Sul e no Brasil, chegando a “ocupar o vigésimo lugar no ranking da IPS, fazendo dele o segundo californiano, atrás de Joey Buran, que também está tendo o melhor momento de sua carreira”.57 57 AT RANDOM. Surfing, v. 16, n. 12, dez. 1980, p. 28.

Situação distinta do havaiano Hans Hedemann, cujo

relativo anonimato de uma reputação conhecida exclusivamente no North Shore terminou (...) após sua aparição no Waimea 5000. Ele tornou-se subitamente... bem, não uma estrela, mas um dos caras. Na sequência, ele obteve um terceiro lugar no Pipeline Masters de 1978, levando esta revista a nomeá-lo a revelação do ano.58 58 JARRATT, Phil. Profile: Hans Hedemann. Full-Time, Full-On. Surfer, v. 21, n. 6, jun. 1980, p. 79.

Nesse caso, o desempenho na etapa brasileira levou seu nome a ser incluído entre os bons surfistas do Circuito - perspectiva confirmada pela colocação no campeonato mais importante do tour (Pipeline Masters). A cobertura mais extensa de 1980 trouxe novos elementos, assim como a reprodução de outros, presentes nas notas tratando de outros anos. Mas, afinal, é possível avaliar a relevância do campeonato para o surfe profissional e para as próprias publicações, tendo como parâmetro o reduzido espaço dedicado por elas à cobertura do evento? A resposta não é simples. Por um lado, é evidente que as condições e/ou escolhas editoriais que levavam a esta escassez significam que a etapa do Rio não estava entre as prioridades. Outrossim, como sugerem as matérias com as previsões para o inverno havaiano, isto não necessariamente significa que a etapa fosse pouco relevante dentro do Circuito, e que o que nela ocorria não repercutisse - inclusive em termos propriamente esportivos, como discuto no próximo item.

A etapa brasileira no contexto da disputa do Circuito

Destaco três aspectos para discutir a relação da etapa com o contexto mais amplo do Circuito: os pontos em disputa; a viabilidade do tour; a possibilidade de outra(s) etapa(s) no país. Todos parecem dialogar com a questão: o quanto valia a pena participar do Waimea?

Houve passagens que afirmaram que os pontos distribuídos no campeonato eram relevantes: “Dane [Kealoha] terminou em 20º na classificação de 77, colhendo pontos valiosos com um quinto lugar no Waimea 5000, no Brasil (...)”.59 59 HOLMES, Paul. Profile: Dane Kealoha. Surfing, v. 16, n. 10, out. 1980, p. 61. Um dos responsáveis pelo Circuito juntou as etapas da África do Sul, do Brasil e da Flórida para formar um bloco e as considerava boas oportunidades para atletas de distintas origens e colocações no ranking:60 60 Embora o surfe adote o termo ranking, o mais correto seria simplesmente classificação, pois trata-se da somatória de resultados para apurar o vencedor ao final de uma temporada, após a qual recomeçam todos com zero ponto. O mecanismo é distinto daquele usado por ligas de tênis (Associação de Tenistas Profissionais e Women’s Tennis Association), cuja principal forma de classificação dos atletas é o ranking, que guarda os resultados dos 12 meses anteriores, é atualizado semanalmente e se mantém de uma temporada para outra. Nas ligas de boxe (como Conselho Mundial de Boxe e Organização Mundial de Boxe), o ranqueamento também se mantém de um ano para outro.

A segunda perna do circuito leva os profissionais ao continente africano para o famoso Gunston 500 e o Hang Ten, ambos a serem realizados esse ano em Durban. Com Jeffrey’s Bay na manga, os profissionais viajantes pegarão um avião sobre o Atlântico Sul para o Rio, para o Waimea 5000 Brazilian Pro e um pouco de calor e sol depois das geladas águas da África do Sul. O resultado dos campeonatos na África do Sul e no Brasil deve ser muito importante para aqueles que buscam melhorar sua classificação na IPS ou que buscam manter a liderança estabelecida na Austrália. Além disso, alguns talentos sul-africanos e brasileiros terão uma oportunidade de entrar na lista dos vencedores da IPS. Uma boa participação pode dar a outros 10 ou 12 profissionais a chance de entrar no top 10.

A segunda perna do circuito completa-se com o Waverider Florida Pro International em Sebastian Inlet, de 19 a 30 de agosto. Após uma pausa de dois meses, os profissionais chegarão ao Havaí para o grand finale (...).”61 61 RARICK, Randy. IPS Report. Surfing, v. 13, n. 5, out.-nov. 1977, p. 22.

Ou seja, naqueles primeiros anos, Rarick dividia o Circuito em três pernas. Posteriormente, tal classificação inviabilizou-se devido à inclusão de campeonatos no Japão, na Costa Oeste dos EUA e na Europa.

Conforme mencionei brevemente ao tratar da ideia de profissionalismo, um tema debatido em algumas matérias especiais62 62 Não é objetivo deste artigo discutir a questão do profissionalismo e de sua viabilidade. Contudo, chamo a atenção para a aparição do tema em matérias especiais, e não na cobertura regular do Circuito. foi a exequibilidade do circuito, ou seja, se ele era capaz de propiciar aos atletas que dele participassem condições para viver exclusivamente do surfe.

Em abril de 1979, o jornalista Drew Kampion argumentou que o Circuito era inviável porque os surfistas ganhavam pouco - em certos campeonatos, vinham recebendo menos do que em anos anteriores. Para comprovar isso, tomava como exemplo o então campeão mundial: nem Shaun Tomson conseguira acumular dinheiro (pois para correr o Circuito gastara tudo que recebera). A matéria explicava que, devido ao alto custo das viagens e à relativamente baixa premiação, muitos atletas resolveram pular as etapas da África do Sul, Brasil e Flórida - quatro, ao todo. Era o mesmo número de etapas previstas naquele ano para o Japão - um destino distante e caro para parte dos competidores, mas que permitia participar de quatro campeonatos numa só viagem. O autor propunha a realização de um circuito exclusivamente no Oceano Pacífico, o que excluiria os três destinos mencionados.63 63 KAMPION, Drew. Punk Soul, Glitter Boogie and Disco Sunstroke. Surfing, v. 15, n. 2, abr.-mai. 1979, p. 40, 42.

Desconheço a existência de trabalhos acadêmicos que realizem uma boa caracterização e debate sobre o que era o circuito profissional. De acordo com as fontes, parece-me que a IPS abriu uma possibilidade inédita e o tour, malgrado os problemas, representou um avanço em relação ao momento anterior - ao menos para quem via a profissionalização do surfe como algo desejável.

Contudo, boa parte dos atletas, mesmo entre os tops, não conseguia ganhar acima do que dispendia. A maioria dependia de bons resultados e nem todos obtinham o suficiente para cobrir as despesas, sendo a principal o custo das passagens aéreas, mencionado em vários momentos de 1979 como fator que inviabilizava o modelo de Circuito percorrendo diversos continentes e tornava, na visão de Kampion e outros, particularmente desinteressantes etapas como do Brasil, África do Sul e Europa.64 64 Não sei em que medida a visão que considera interessantes apenas as etapas de Austrália, Havaí e Califórnia (acrescentando-se o Japão por razões comerciais e geográficas) explica-se pelo fato de que a maioria dos surfistas profissionais que disputava a íntegra do tour (ou tinham essa possibilidade/expectativa) residia nesses lugares. Nesse caso, tratar-se-ia de apresentar como absoluto, em termos de circuito, algo que é relativo, valorizando etapas às quais o acesso era mais fácil para estes surfistas e desvalorizando outras realizadas em destinos mais distantes para os mesmos. Exemplificando: para um surfista residente na África do Sul, as etapas do país eram as mais importantes e as com melhor custo-benefício, da mesma forma que o Waimea 5000 no Arpoador para um surfista brasileiro - caso ele morasse em Copacabana ou Ipanema, talvez pudesse dirigir-se a pé para o campeonato. Ao preço das passagens somava-se a rotineira cobrança de excesso de bagagem pelas companhias aéreas, devido ao volume das pranchas.

Mesmo os primeiros colocados não estavam livres de preocupações. Além do transporte do imenso troféu, em uma ocasião, foram citadas as “dificuldades envolvidas em sair com aquele dinheiro [o prêmio de US$ 4.000 do vencedor Cheyne Horan] do país”, o que, segundo o texto, levara o campeão a “torrar [o prêmio] numa tarde, gastando US$ 500 em presentes para os pais na Austrália e o restante num diamante”.65 65 JARRATT, Phil. The Bronzed Clones? A profile of Jim Banks and Cheyne Horan. Surfer, v. 20, n. 5, mai. 1979, p. 61-2. A Receita Federal brasileira estava no horizonte de preocupações dos poucos atletas que conquistassem uma premiação substancial.

Uma das duas menções à ausência, na etapa, de vários atletas que estavam entre os primeiros do circuito refere-se a 1982:66 66 A outra é a já citada reportagem de página inteira sobre a vitória de Joey Buran em 1980.

Dois dias depois, ele disse adeus à África do Sul e dirigiu-se, cruzando o Atlântico, ao Brasil, onde ele reencontrou Cauli Rodriguez [sic], que havia conhecido anteriormente na Austrália. Willy [Morris] estava classificado diretamente para a chave principal no Waimea 5000, no Aproador [sic], porque muitos dos atletas no topo do ranking não compareceram, mas ele acabou perdendo sua bateria na primeira fase, para o brasileiro Roberto Valerio, em pequenas esquerdas buraco. Valerio foi em frente e conquistou o segundo lugar e Willy teve que se contentar com outro décimo-sétimo.67 67 CARTER, Chris. Part III. Surfing, v. 19, n. 1, jan. 1983, p. 50.

Parte de uma reportagem sobre uma viagem que envolveu a participação do surfista Willy Morris em etapas do Circuito, o trecho reitera elementos já citados da cobertura do Waimea 5000. Interessa-me destacar a menção à ausência de “muitos dos atletas no topo do ranking” - uma evidência de que havia distintos pontos de vista a respeito da etapa brasileira e/ou diferentes estratégias de participação no Circuito. A menção ao surfista brasileiro Cauli Rodrigues possivelmente se refere às amizades e relações de reciprocidade desenvolvidas entre os surfistas em geral e, particularmente, entre os que competiam: era comum que os residentes na cidade onde se realizava uma competição buscassem os amigos no aeroporto, os hospedassem em suas casas etc.

Na medida em que a inclusão do Waimea 5000 era contestada e alguns optavam por não participar (outros se ausentavam por falta de recursos, embora desejassem comparecer), a possibilidade de se realizar duas etapas no país foi tratada como uma boa notícia. O calendário provisório de 1979, publicado em Surfer, marcava o Waimea 5000 para 2 a 5 de agosto e programava um “Brazil Pro International” para “São Paulo” entre 12 e 19 do mesmo mês, com a observação de que se tratava de “uma proposta de janela de tempo, sem evento ou patrocinador confirmados”.68 68 Surfer, v. 20, n. 8, ago. 1979, p. 88.

Uma lista de etapas de 1981 divulgada por Surfing novamente incluía duas no Brasil: 1-8 de agosto, Waimea 5000 (Rio de Janeiro); 12-15 de agosto, São Paulo Pro (São Paulo), esta última “não confirmada até o momento”.69 69 Surfing, v. 17, n. 6, jun. 1981, p. 27. No ano seguinte: “O circuito então se encaminha para o Waimea 5000, a ser realizado no Rio de Janeiro, Brasil, de 30 de julho a 12 de agosto. Outro evento da IPS, ainda não confirmado no momento de escrita deste texto, pode acontecer em Saquarema, um pico próximo ao Rio, durante a perna brasileira.”70 70 CARROLL, Nick. IPS Update. Surfing, v. 18, n. 9, set. 1982, p. 26. A modificação dos calendários foi comum no período. Também houve eventos listados como não confirmados em outros países (França, Austrália, África do Sul)71 71 CARROLL, Nick. IPS Update. Surfing, v. 18, n. 9, set. 1982, p. 26. - uns chegaram a ser realizados, outros não. Não disponho de fontes para discutir que elementos efetivamente sustentavam a possibilidade de uma segunda etapa no Brasil. A crítica de Townend citada anteriormente sugere que ele e outros surfistas não levavam a sério as reapresentações da proposta.72 72 Seria o aceno com a possibilidade de duas etapas no Brasil uma iniciativa com o intuito de estimular atletas estrangeiros a virem ao país? Com as fontes de que disponho até o momento, trata-se de mera especulação.

As publicações, especialmente Surfing, atribuíam a si mesmas centralidade na difusão de informações aos interessados: “Surfing te manterá informado de todos os detalhes a respeito do tour e seu itinerário revisado nas próximas edições.”73 73 CARROLL, Nick. IPS Update. Surfing, v. 18, n. 9, set. 1982, p. 26. O papel central das revistas na divulgação do Circuito evidencia-se inclusive pela decisão de patrocinadores e organizadores de nelas publicarem propagandas específicas dos campeonatos antes da realização destes. Isso ocorreu em uma ocasião com o próprio Waimea 5000.74 74 Surfing, v. 23, n. 6, julho 1982, p. 92.

Aspectos silenciados ou minimizados

Antes de concluir, considero importante tratar de três assuntos presentes em outras fontes, mas silenciados ou que pouquíssimo apareceram na cobertura: as brigas, o comportamento dos estrangeiros e o ocaso do Waimea 5000. A única referência que encontrei a brigas está numa retrospectiva publicada em 1986. Ao tratar do ano 1982,75 75 Tratava-se da temporada 1981-1982. afirma:

Cheyne Horan (...) vence o Waimea 5000 no Brasil, eliminando Mark Richards e tomando a liderança da corrida para o título mundial. A perna brasileira do circuito foi dramática de outras formas também: durante uma competição de equipes uma briga estourou na praia lotada e, na frente de competidores estrangeiros horrorizados, um local desarmado, aparentemente, é espancado até a morte. O Brasil ganha o evento por equipes.76 76 “MONEY for nothing and the chicks for free”. Surfing, v. 22, n. 3, mar. 1986, p. 72.

Na cobertura do evento, contudo, não houve referência a confusões ou brigas. Uma visão muito diferente foi oferecida pelo organizador e patrocinador: “O que você se lembra da última edição do Waimea 5000, há 30 anos? Foi demais! Parte da bateria da Beija-Flor deu uma canja pra gente durante o campeonato. O prefeito do Rio de Janeiro entregava a chave da cidade, então tinha show o tempo todo.”77 77 As atrações musicais durante o evento e tampouco o prefeito aparecem nas revistas. ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.

Houve ainda atritos entre um havaiano que competiu no Waimea 5000 e surfistas e praticantes de jiu-jitsu cariocas.78 78 Sobre o episódio, ver programa do canal de televisão por assinatura Combate. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=nY5HgZrZFqQ>. Acesso em 30 jun. 2018. Outrossim, as escaramuças não aconteceram no campeonato. O havaiano estava hospedado na casa do já citado Rico de Souza, brasileiro que participou dos primeiros anos do Circuito.

Quanto ao comportamento dos surfistas estrangeiros, conforme descrevi, as notas sobre os primeiros anos destacavam os encantos da noite e uma certa dificuldade dos visitantes de se concentrar na competição. A “vida noturna exótica” foi prometida anualmente nos anúncios da excursão de Randy Rarick. O assunto foi abordado na já citada entrevista com o empresário Nelson Machado:

Alguns dizem que muitos gringos vieram para o Waimea 5000 só para ficar doidões. Até que ponto isso é verdade? Como era o comportamento deles no Brasil? Essa de os gringos virem para ficar lo[u]cões é pura invenção, até porque baseado se encontra em qualquer lugar. Eles vinham pela pontuação, porque estava na rota depois de Austrália e África do Sul e porque temos mulheres bonitas. Os gringos eram muito assediados. Tinham gatas que só faltavam sequestrar o Buzzy Kerbox e outros que eram boa-pinta. Quanto a drogas, muitos não usavam, como Shane [Cheyne] Horan, Mark Richards, Shaun Tomson e os Bronzed Aussies. (...) Mas ocorreram alguns episódios engraçados com os gringos doidões, não? No primeiro campeonato rolaram muitas coisas que tive que segurar de qualquer maneira, pois se vazassem ia dar uma confusão do cacete. Por exemplo, um dia durante o evento um gringo ficou doidão no hotel, saiu pelado pela janela andando pela mureta e entrou em um salão de beleza. Imagina a doideira… depois ele foi para o lobby do hotel e o fotógrafo de um jornal local tirou várias fotos. Se saísse isso, ia dar a maior merda. Acabou que o fotógrafo perdeu a máquina com os filmes e eu indenizei o preju dele.79 79 ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.

Destaco quatro pontos neste trecho. Primeiro, a fala do entrevistador, que sugere que as histórias a respeito do comportamento dos estrangeiros perduraram no senso comum do surfe no Brasil. Segundo, a menção às mulheres, que apareciam com frequência de biquínis nas campanhas oficiais do governo brasileiro no exterior (ALFONSO, 2006ALFONSO, Louise Prado. Embratur: formadora de imagens da nação brasileira. 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2006. Disponível em: <Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?down=vtls000380103 >. Acesso em 25 mai. 2017.
http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/...
).80 80 Como se pode ver na Figura 1, há uma mulher de biquíni no anúncio da excursão. Contudo, como há dois países de destino, não posso assegurar que a banhista represente uma brasileira. Em ambos os casos, elas eram vistas como um atrativo.

Terceiro, a negativa categórica do entrevistado a respeito do uso de drogas como motivação para a participação no campeonato - depois matizada duas vezes por sua própria fala: ao contar um “causo” respondendo a segunda pergunta; e ao mencionar que “muitos não usavam”, o que pode ser entendido como uma confirmação de que alguns/poucos o faziam. Não há havaianos e californianos entre os exemplos citados - o que pode, evidentemente, ser uma coincidência. Quarto, a narrativa sobre como o episódio das fotos realizadas no lobby do hotel foi resolvido: parece-me plausível que, talvez, a perda da câmera com os filmes não tenha sido acidental, mas fruto de argumentação e da oferta de “indenização” ao fotógrafo.

O período 1976-1982 compreende parte dos governos dos generais Ernesto Geisel e João Figueiredo. Embora membros da classe dominante e estrangeiros contassem com maior margem de tolerância por parte dos agentes da repressão, surfistas eram vistos com desconfiança pela polícia do Rio de Janeiro, especialmente a Polícia Militar, devido à associação com o uso de drogas (FORTES, 2011FORTES, Rafael. O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura. Rio de Janeiro: Apicuri/Faperj, 2011.; MELO, FORTES, 2009MELO, Victor Andrade de; FORTES, Rafael. O surfe no cinema e a sociedade brasileira na transição dos anos 1970/1980. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, v. 23, n. 3, p. 283-96, 2009.). Dado o conservadorismo e a atenção dedicada pelo regime ditatorial às questões comportamentais, o causo narrado com humor (em retrospectiva) pelo entrevistado gerou bastante preocupação à época - afinal, envolvia nudez em público e abuso de drogas.

Consultando diferentes edições datadas de 1983, não encontrei nada diferente em relação aos anos anteriores: incluíam no calendário a realização do evento naquele ano. A primeira matéria de Surfer sobre Tom Curren e Tom Carroll - atletas cuja rivalidade foi construída e intensamente explorada pela mídia do surfe nos anos 1980 - dizia que o primeiro provavelmente receberia um convite para participar do Waimea 5000.81 81 HOLMES, Paul. Which one will be the Top Cat Next year? Surfer, v. 24, n. 5, mai. 1983, p. 67. No início de 1983, Surfer de novo referia-se à expectativa de duas etapas no Brasil: “ASP Rio Pro”82 82 CARTER, Chris. Summer of 83. Surfing, v. 19, n. 7, jul. 1983, p. 42. e “ASP Waimea 5000”83 83 CARTER, Chris. Summer of 83. Surfing, v. 19, n. 7, jul. 1983, p. 44. , respectivamente, no fim de julho e no início de agosto. Diferentemente de temporadas anteriores, naquela o “Circuito da ASP começa[ria] na África do Sul, com o Gunston 500 - o primeiro evento que conta para a classificação no ano que se inicia, na Bay of Plenty, em 29 de junho”.84 84 CARTER, Chris. Summer of 83. Surfing, v. 19, n. 7, jul. 1983, p. 41.

Dois meses depois, mantinham-se na lista, com datas um pouco diferentes, o “Rio Pro ’83” (31/7 a 7/8) e o Waimea 5000 (10-14/8). O primeiro listado como evento categoria A (a mais importante); e o segundo, como B (menos pontos e menos importância) e com um asterisco que significava: “Todos estes eventos devem ser listados como provisórios neste momento, mas espera-se ter a confirmação da maioria até 30 de junho”.85 85 Ou seja, a edição com data de setembro foi feita, no máximo, no início de junho. Surfer, v. 19, n. 9, set. 1983, p. 36.

O fim do campeonato é atribuído por Nelson Machado a problemas de saúde: “Em 1982 tive que fazer uma cirurgia na vesícula, tive complicações e quase morri. Quando saí do hospital não tinha forças para tocar mais nada, então a edição de 1982 foi a última que realizei”.86 86 ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018. Não encontrei nas revistas qualquer menção ao cancelamento da etapa ou aos motivos para tal.

Considerações finais: o lugar do Brasil nas revistas

Encerro com algumas considerações sobre o lugar do Brasil nas revistas. No período enfocado neste artigo, foram publicadas cartas de leitores reivindicando maior atenção aos surfistas brasileiros - em especial, fotos destes últimos em ação. Numa delas, Pedro Cezar, do Rio de Janeiro, citou a própria realização do Waimea 5000 como um argumento para a solicitação: “Gostaria muito que dessem um pouco mais de atenção ao Brasil e a suas competições e surfistas. O Waimea 5000 atrairá muitos entre os melhores surfistas do mundo - eu gostaria de ver a cobertura disso na revista de vocês”.87 87 Surfing, v. 18, n. 11, nov. 1982. Trata-se do surfista e, posteriormente, cineasta Pedro “Pepê” Cezar. Noutra, um missivista apresentava-se como um californiano do litoral que se encontrava há sete meses fazendo intercâmbio em Belo Horizonte e pedia mais espaço para os surfistas do país. Eis a “resposta do editor”: “Fique de olho em matérias de destaque que serão extraídas de nossa ‘Expedição ao Cone Sul’, atualmente explorando por quatro meses a América do Sul”.88 88 SAUNDERS, Dave. Southern Cone. Surfer, v. 23, n. 7, jul. 1982, p. 12-3. Tais matérias não são analisadas neste artigo por extrapolarem os objetivos. Contudo, registro a impressão de que foram feitas aproveitando a ida de atletas ao Rio de Janeiro para o Waimea, os quais depois se deslocaram para outros estados brasileiros e países sul-americanos.

A resposta revela uma postura, por parte da direção da redação, semelhante à que apontei com relação à Fluir nos anos 1980: quando questionada sobre a necessidade de expor com regularidade o surfe realizado em determinadas partes do país, em geral a revista respondia citando reportagens especiais passadas, em produção ou futuras (FORTES, 2011FORTES, Rafael. O surfe nas ondas da mídia: esporte, juventude e cultura. Rio de Janeiro: Apicuri/Faperj, 2011.). Ora, se o Brasil é um lugar para se visitar em excursões e expedições, isto significa que ele está fora do horizonte de cobertura regular das publicações californianas. O tom das cartas dá a entender que, para os missivistas, a ausência se devia a desconhecimento e/ou falta de aviso. A meu ver, tais fatores provavelmente são parte da explicação, mas uma parte pequena. Afinal, desde 1976 dezenas de surfistas vieram ao Rio praticamente todos os anos participar do Waimea.

Sendo assim, é preciso atentar para possíveis razões econômicas, sociais e culturais para tal enfoque, incluindo as características da época (dificuldade de comunicação; a inexistência no país, até pelo menos o fim dos anos 1980, de acordo com dirigentes da revista Brasil Surf,89 89 Cf. depoimentos no filme Brasil Surf Doc. Direção: Olívio Petit. Ano: 2015. de um laboratório capaz de revelar os slides utilizados pelos fotógrafos da publicação) e o que apontei em relação à Fluir: uma coisa é a revista se propor mundial ou nacionalmente, outra, são as marcas que ela necessariamente traz do local em que é publicada, sobretudo as ênfases da cobertura e a disponibilidade de informação a respeito dos demais lugares.

Outro ponto importante abordado neste texto é a discussão em torno de profissionalismo, profissionalização e comercialização. Parece-me que o caso do surfe é rico para problematizar essas noções em ao menos dois aspectos: quanto aos atletas e aos demais envolvidos no campo esportivo. Primeiro, porque, como visto, declarações dos surfistas de ponta do circuito mundial - inclusive os primeiros campeões - dão conta de que, em geral, o montante recebido com premiações e patrocínios mal dava para cobrir as despesas anuais. Ademais, tais surfistas batalharam para abrir espaço para o surfe e para si mesmos,90 90 Diversas fontes contêm depoimentos com este ponto de vista. Conferir, por exemplo, o filme Bustin’ Down the Door. Direção: Jeremy Gosch. Ano: 2008. de forma a obter - nos meios de comunicação, na publicidade, na moda e em outras esferas do mercado - um status que se aproximasse daquele dos ídolos de outras modalidades esportivas.91 91 O tênis é o esporte mais citado como referência nas fontes. Ainda assim, boa parte de seus ganhos provinha de trabalhos adicionais - como modelo, fotógrafo, shaper, jornalista, pequeno empresário etc.

Segundo, porque obriga a pensar o profissionalismo no esporte como algo que não envolve apenas - ou primordialmente - os atletas. Na verdade, se pensarmos em termos numéricos, os competidores eram minoria entre os que se mobilizaram para viabilizar uma estrutura sólida e perene de surfe profissional. A maioria eram surfistas que desejavam viver do esporte e próximo a ele mas, por um ou outro motivo, não viam nas competições uma opção viável e buscaram alternativas.92 92 Diversas fontes contêm depoimentos com este ponto de vista. Cf., por exemplo, o filme Bustin’ Down the Door. São esses próprios surfistas que supriram boa parte da oferta em torno do estabelecimento de uma indústria do surfe, de um calendário de competições profissionais e também de uma cobertura e promoção regulares por parte de meios de comunicação: campeonatos, circuitos, pranchas, roupas, marcas, calçados, acessórios, equipamentos, revistas especializadas, fotografias, roteiros de viagem, soluções de design, filmes em película ou outros formatos (documentários, especializados, promocionais, cinejornais, reportagens) e realizaram a concepção, fabricação, promoção/marketing, distribuição e comercialização de tudo isso, frequentemente para mercados/públicos espalhados por países específicos em diferentes continentes. Além disso, demandaram a formação de mão de obra especializada para executar tais atividades - e para desenvolver/criar outras específicas do surfe, que pouco podiam contar com o know-how existente nos demais esportes, como formato das competições, sistema de julgamento (atribuição de notas aos atletas), técnicas e equipamentos para captar imagens desde a arrebentação etc.

O estabelecimento de um calendário com temporalidade anual, ainda que dado a modificações e cancelamentos e criticado por vários agentes, foi um avanço importante no sentido de abrir a algumas dezenas de surfistas as possibilidades de viver exclusivamente do esporte ao longo de um ano inteiro e também de anos consecutivos. Do ponto de vista temporal, trata-se de pensar tanto o aspecto cíclico (um circuito que se inicia e se conclui a cada ano, o que corresponde à noção de temporada) quanto o linear: a existência de tal estrutura por anos a fio abriu uma oportunidade para que jovens vislumbrassem e buscassem a ideia de serem surfistas profissionais - algo que, em modalidades como o tênis, já se consolidara nas décadas anteriores. O Circuito Mundial, com a realização, a cada ano, de etapas ao redor do globo com competidores de distintos continentes, foi um passo relevante para que o surfe se tornasse um esporte. O Circuito fortaleceu o surfe como uma prática social relevante e recorrente que criava expectativas coletivas, bem como demandava um conjunto de esforços de grupos, entidades e indivíduos em diferentes países para viabilizar as etapas e o circuito como um todo, em termos financeiros, políticos e sociais.

No período 1976-1982, poucos conseguiram se sustentar, do ponto de vista econômico, atuando exclusivamente como atletas. A maioria exerceu outras funções, inclusive trabalhando para as próprias Surfer e Surfing. Peter Townend, Wayne Bartholomew e Michael Tomson, três dos autores de textos que aparecem como fontes neste artigo, foram competidores de ponta, tendo os dois primeiros sido campeões mundiais em 1976 e 1978, respectivamente.

A análise também permitiu perceber problemas, disputas, avanços e retrocessos no estabelecimento do Circuito Mundial de surfe masculino e na profissionalização da modalidade. Ambos os processos não foram de forma alguma lineares e homogêneos. Em que pese as duas publicações cobrirem o Circuito, Surfing apoiava a iniciativa de forma mais enfática. E, nas duas, encontrei falas ambíguas e vozes dissonantes, o que reforça a perspectiva com a qual trabalho, que compreende os meios de comunicação como sendo, simultaneamente: arenas em que diferentes agentes de manifestam; e, eles mesmos, agentes. As publicações não apenas cobriram o circuito, mas também foram fundamentais em sua promoção e viabilização. Ademais, ao pagarem a surfistas que competiam para produzirem notas, reportagens, colunas e artigos longos de opinião, exemplificam as imbricações entre os indivíduos e os processos de esportivização do surfe e de luta pela manutenção do circuito profissional (criticado frontalmente por alguns agentes e objeto de descrença por parte de outros). Isso sugere que, tal qual noutros países, nos Estados Unidos as revistas de surfe desempenharam um complexo papel a partir dos anos 1960 - aspecto que requer aprofundamento, uma vez que inexistem pesquisas a respeito, mesmo em inglês.

Retomo fala de Nelson Machado em entrevista usada como fonte complementar neste artigo. O empresário destaca, entre as contribuições do Waimea 5000, aspectos econômicos (“criou muitos empregos e novas marcas”); de promoção da cidade (“trouxe um colorido a mais para a cidade maravilhosa”); afirmação de uma geração de surfistas brasileiros no âmbito das competições; e, não menos importante, oportunidade para o surfe brasileiro evoluir no âmbito competitivo (o contato com novos equipamentos, como pranchas e quilhas; a proximidade com atletas de ponta e a possibilidade de enfrentá-los e de vê-los treinar e competir teria contribuído para a evolução do surfe nacional, que, “nos anos 1970 (...) estava bem atrás do que rolava na Austrália e no Hawaii”). Esses aspectos estiveram pouco presentes nas revistas e reforçam a necessidade de pesquisas sobre o campeonato que visem a analisar seu papel histórico em termos culturais, econômicos e políticos. Este trabalho buscou descrever e analisar olhares de periódicos estrangeiros a respeito da competição, de forma a contribuir para preencher parte da lacuna historiográfica no Brasil e no exterior.

Referências

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Notas

  • *
    Uma versão resumida deste trabalho foi apresentada no 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, em setembro de 2018, e publicada nos anais do evento. Agradeço a um dos pareceristas anônimos desta revista pelas preciosas contribuições para o aprimoramento do texto.
  • 1
    Os impressos são a fonte mais usada na história do esporte (Melo, 2016MELO, Victor Andrade de. O trato do esporte nos simpósios da Associação Nacional de História (ANPUH). Recorde, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 1-17, jan.-jun. 2016. Disponível em: <Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/Recorde/article/view/3288/2558 >. Acesso em 7 dez. 2019.
    https://revistas.ufrj.br/index.php/Recor...
    ; Melo et al., 2013MELO, Victor Andrade, et al. Pesquisa histórica e história do esporte. Rio de Janeiro: 7Letras/Faperj, 2013., p. 120).
  • 2
    Utilizo “campo esportivo” no sentido definido por Melo (2010MELO, Victor Andrade de. Esporte e lazer: conceitos - uma introdução histórica. Rio de Janeiro: Apicuri, 2010.) a partir de elaboração de Bourdieu (1983BOURDIEU, Pierre. Como é possível ser esportivo? In: BOURDIEU, Pierre. Questões de Sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983, p. 136-163.).
  • 3
    Para uma breve discussão das diferenças entre jornais e revistas como fontes para a história do esporte, ver Melo et al. (2013MELO, Victor Andrade, et al. Pesquisa histórica e história do esporte. Rio de Janeiro: 7Letras/Faperj, 2013., p. 120-122).
  • 4
    Todas as traduções da bibliografia e das fontes em inglês foram feitas por mim.
  • 5
    Surfing World é publicada na Austrália desde 1962.
  • 6
    MAURO, Chris. RIP - Thanks for the Ride, John Severson. World Surf League, 28 mai. 2017. Disponível em: <http://www.worldsurfleague.com/posts/254813/thanks-for-the-ride-john-severson>. Acesso em 28 mai. 2017.
  • 7
    PIERSON, Dashel. RIP Surfing Magazine (1964-2017). Surfline, 25 jan. 2017. Disponível em <http://www.surfline.com/surf-news/matt-warshaw-weighs-in-on-the-end-of-an-era-rip-surfing-magazine-1974-2017_144865/>. Acesso em 15 jun. 2017.
  • 8
    PATERSON, Al. The Grand Prix of Surfing. Surfing, v. 13, n. 2, abr.-mai. 1977, p. 22.
  • 9
    Nome da empresa patrocinadora. Posteriormente, não houve mais menção à empresa (ou a qualquer outra) no nome do Circuito - provavelmente porque o patrocínio não se efetivou.
  • 10
    PATERSON, Al. The Grand Prix of Surfing. Surfing, v. 13, n. 2, abr.-mai. 1977, p. 22.
  • 11
    ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.
  • 12
    O historiador Douglas Booth (2001BOOTH, Douglas. Australian Beach Cultures: The History of Sun, Sand and Surf. London: Frank Cass, 2001.) afirma que o Circuito Mundial inaugural, em 1976, sequer existiu como tal. Segundo ele, a International Professional Surfing usou a posteriori resultados de campeonatos para elaborar um ranking e declarar um campeão. O vencedor, Peter Townend, sequer recebeu um troféu. Debater a questão extrapola os objetivos deste artigo.
  • 13
    “Via Rio with Rico” no original. Ao que parece, um jogo de palavras aproveitando a proximidade na grafia e sonoridade entre o nome da cidade e o do surfista brasileiro Rico de Souza, que costumava hospedar surfistas estrangeiros em sua casa.
  • 14
    RARICK, Randy. The Hawaii Team to South Africa: With a Report on the Gunston 500 and Assorted Other Sidetrips. Surfer, v. 16, n. 4, out.-nov. 1975, p. 41.
  • 15
    Rarick acumulou várias funções durante alguns anos. Por exemplo, ele aparece em 51º. lugar no ranking final de 1977 da IPS. Surfer, v. 19, n. 1, abr.-mai. 1978, p. 87.
  • 16
    Surfing, v. 13, n. 3, jun.-jul. 1977, p. 21.
  • 17
    Surfing, v. 13, n. 3, jun.-jul. 1977, p. 21.
  • 18
    No caso de Surfing, de acordo com um anúncio na edição anterior (abril de 1980), a seguinte (com data de maio de 1980) estaria nas bancas em 26 de dezembro de 1979. Ou seja, no caso de 1980, afirmo com razoável possibilidade de acerto que as edições datadas de maio com o anúncio da excursão chegaram às bancas cerca de seis meses antes da data prevista para a partida da excursão. Surfer, v. 21, n. 5, mai. 1980, p. 12.
  • 19
    O nome da IPS já mudara de International Professional Surfers para International Professional Surfing.
  • 20
    Surfing, v. 16, n. 5, mai. 1980, p. 93.
  • 21
    Direção: Bruce Brown. Ano: 1966.
  • 22
    Surfer, v. 17, n. 5, dez.-jan. 1976-1977, p. 106.
  • 23
    TOWNEND, Peter. Getting to the Points. Surfing, v. 13, n. 6, dez-jan. 1977-1978, p. 19.
  • 24
    TOWNEND, Peter. Waimea Wingding. Surfing, v. 14, n. 6, dez-jan. 1978-1979, p. 19.
  • 25
    Parte do primeiro excerto não pode ser lida porque faltava um pedaço da folha do exemplar que consultei no arquivo da San Diego State University - algo no verso da folha pareceu ao leitor interessante o suficiente para levá-lo a recortá-la, ocorrência comum quando se consulta acervos de revistas de surfe em diferentes países), de forma que é possível que o autor também tenha feito alguma menção às atividades realizadas, tal qual no segundo relato.
  • 26
    Surfing, v. 14, n. 3, jun.-jul. 1978, p. 38.
  • 27
    JARRATT, Phil. The Bronzed Clones? A profile of Jim Banks and Cheyne Horan. Surfer, v. 20, n. 5, mai. 1979, p. 61-2.
  • 28
    TOWNEND, Peter. PT’s Mid-Tour Melange. Surfing, v. 15, n. 8, out 1979, p. 16.
  • 29
    Diversas fontes afirmam que o nome Waimea 5000 era uma combinação do nome da surf shop que patrocinava o evento com o valor da premiação (US$ 5.000). Contudo, nenhuma fonte que eu tenha encontrado especifica se os cinco mil dólares eram o total da premiação ou o valor entregue ao vencedor. Acredito que 5 mil dólares tenha sido a premiação total da primeira edição. Houve menções (citadas ao longo deste artigo) ao campeão receber US$ 4 mil e US$ 5 mil em etapas posteriores. Cf. As seis edições do Waimea 5000. Datasurfe, 3 mar. 2009. Disponível em: <http://www.datasurfe.com.br/2009/03/as-seis-edicoes-do-waimea-5000-1976.html>. Acesso em 5 jul. 2018.
  • 30
    E US$ 4.000 para as mulheres. Estes eram os valores estipulados por padrão. Contudo, o Waimea 5000 era uma das etapas em que havia apenas o campeonato de homens. Surfer, v. 20, n. 3, mar. 1979, p. 89.
  • 31
    Três fatores principais determinam o lapso de tempo entre a data de um acontecimento e a data da edição das revistas em que ele será noticiado: 1) a periodicidade (ambas começam bimestrais e depois passam a mensais); 2) o intervalo entre o mês/ano escritos na capa e no expediente de uma edição e o mês/ano em que a mesma edição efetivamente chega às bancas e aos assinantes - uma diferença que, nas revistas e no intervalo de anos em questão, poderia superar 90 dias e até aproximar-se de seis meses; 3) tempo decorrido entre o envio de materiais (textos e filmes fotográficos) pelos repórteres e seu recebimento pela redação, bem como para posterior revelação de filmes, escolha de fotos e demais etapas do processo de edição (não era raro se passarem alguns meses entre a realização de uma etapa e a chegada às bancas da edição com a respectiva cobertura).
  • 32
    Surfer, v. 20, n. 7, jul. 1979, p. 14.
  • 33
    Surfer, v. 20, n. 8, ago. 1979, p. 88.
  • 34
    Em termos de público e visibilidade, o local preferencial era o Arpoador. Contudo, parece-me que a busca de ondas melhores fez com que a competição fosse deslocada para outras praias cariocas, como a Prainha (1981) e o Quebra-Mar da Barra da Tijuca.
  • 35
    Surfer, v. 22, n. 12, dez. 1981, p. 96.
  • 36
    Surfer, v. 24, n. 12, dez. 1982, p. 88.
  • 37
    BARTHOLOMEW, Wayne. Richards Renders ‘Em Speechless With Whitewash in Africa. Surfing, v. 16, n. 12, dez. 1980, p. 22.
  • 38
    BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19.
  • 39
    Surfing, v. 17, n. 5, mai. 1981, p. 6.
  • 40
    Surfer, v. 22, n. 5, mai. 1981, p. 9.
  • 41
    BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19.
  • 42
    BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19.
  • 43
    BARTHOLOMEW, Wayne. Joey Buran Puts California on the Board with an IPS Victory in Brazil. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 19.
  • 44
    A Califórnia era - e continua sendo - o estado mais populoso dos EUA.
  • 45
    Naquele Waimea 5000, o desempenho considerado muito positivo incluiu dois atletas que ficaram em quinto lugar.
  • 46
    O ano está errado. O correto seria 1980. The 11th Annual Surfer Poll Awards. Surfer, v. 23, n. 5, mai. 1982, p. 32.
  • 47
    TOMSON, Mike. 1977-1982 Professionalism. Surfer, v. 20, n. 3, mar. 1984, p. 130.
  • 48
    Conforme indicado na primeira seção deste artigo, a maioria dos atletas voava para a África do Sul e, de lá, para o Rio. A falta de recursos pode ter levado Buran a se deslocar apenas ao Brasil.
  • 49
    “MONEY for nothing and the chicks for free.” Surfing, v. 22, n. 3, mar. 1986, 70.
  • 50
    A discussão sobre profissionalismo na historiografia do esporte tende a se concentrar na clivagem com o amadorismo, e não na descrição das condições e características concretas do que se considera um atleta profissional e sobre que condições objetivas sustentam tal classificação. Além disso, boa parte dos trabalhos estão centrados no futebol na primeira metade do século XX, havendo raras abordagens dos demais esportes e períodos históricos (GOMES e PINHEIRO, 2015GOMES, Eduardo de Souza; PINHEIRO, Caio Lucas Morais (org.). Olhares para a profissionalização do futebol: Análises plurais. Rio de Janeiro: Multifoco, 2015.; MELO, 2015MELO, Victor Andrade de. Amador ou profissional? Um debate primordial no campo esportivo. In: GOMES, Eduardo de Souza; PINHEIRO, Caio Lucas Morais (org.). Olhares para a profissionalização do futebol: Análises plurais. Rio de Janeiro: Multifoco , 2015, p. 19-44.).
  • 51
    Parece-me haver aqui um exemplo do desejo de estar próximo aos atletas, fenômeno presente em diversas modalidades esportivas. Nos esportes praticados ao ar livre e fora de arenas/equipamentos esportivos (ciclismo e automobilismo em estradas, rallies, voo livre, entre outros), o público costuma contar com maior liberdade de circulação.
  • 52
    Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981.
  • 53
    ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.
  • 54
    Termo havaiano que designa o surfista de fora, ou seja, aquele que não é local, que não freqüenta a praia/pico em questão. A palavra tem ampla utilização no universo do surfe ao redor do mundo.
  • 55
    HAWAII. Drew Kampion. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 34.
  • 56
    HAWAII. Drew Kampion. Surfing, v. 17, n. 1, jan. 1981, p. 34.
  • 57
    AT RANDOM. Surfing, v. 16, n. 12, dez. 1980, p. 28.
  • 58
    JARRATT, Phil. Profile: Hans Hedemann. Full-Time, Full-On. Surfer, v. 21, n. 6, jun. 1980, p. 79.
  • 59
    HOLMES, Paul. Profile: Dane Kealoha. Surfing, v. 16, n. 10, out. 1980, p. 61.
  • 60
    Embora o surfe adote o termo ranking, o mais correto seria simplesmente classificação, pois trata-se da somatória de resultados para apurar o vencedor ao final de uma temporada, após a qual recomeçam todos com zero ponto. O mecanismo é distinto daquele usado por ligas de tênis (Associação de Tenistas Profissionais e Women’s Tennis Association), cuja principal forma de classificação dos atletas é o ranking, que guarda os resultados dos 12 meses anteriores, é atualizado semanalmente e se mantém de uma temporada para outra. Nas ligas de boxe (como Conselho Mundial de Boxe e Organização Mundial de Boxe), o ranqueamento também se mantém de um ano para outro.
  • 61
    RARICK, Randy. IPS Report. Surfing, v. 13, n. 5, out.-nov. 1977, p. 22.
  • 62
    Não é objetivo deste artigo discutir a questão do profissionalismo e de sua viabilidade. Contudo, chamo a atenção para a aparição do tema em matérias especiais, e não na cobertura regular do Circuito.
  • 63
    KAMPION, Drew. Punk Soul, Glitter Boogie and Disco Sunstroke. Surfing, v. 15, n. 2, abr.-mai. 1979, p. 40, 42.
  • 64
    Não sei em que medida a visão que considera interessantes apenas as etapas de Austrália, Havaí e Califórnia (acrescentando-se o Japão por razões comerciais e geográficas) explica-se pelo fato de que a maioria dos surfistas profissionais que disputava a íntegra do tour (ou tinham essa possibilidade/expectativa) residia nesses lugares. Nesse caso, tratar-se-ia de apresentar como absoluto, em termos de circuito, algo que é relativo, valorizando etapas às quais o acesso era mais fácil para estes surfistas e desvalorizando outras realizadas em destinos mais distantes para os mesmos. Exemplificando: para um surfista residente na África do Sul, as etapas do país eram as mais importantes e as com melhor custo-benefício, da mesma forma que o Waimea 5000 no Arpoador para um surfista brasileiro - caso ele morasse em Copacabana ou Ipanema, talvez pudesse dirigir-se a pé para o campeonato.
  • 65
    JARRATT, Phil. The Bronzed Clones? A profile of Jim Banks and Cheyne Horan. Surfer, v. 20, n. 5, mai. 1979, p. 61-2.
  • 66
    A outra é a já citada reportagem de página inteira sobre a vitória de Joey Buran em 1980.
  • 67
    CARTER, Chris. Part III. Surfing, v. 19, n. 1, jan. 1983, p. 50.
  • 68
    Surfer, v. 20, n. 8, ago. 1979, p. 88.
  • 69
    Surfing, v. 17, n. 6, jun. 1981, p. 27.
  • 70
    CARROLL, Nick. IPS Update. Surfing, v. 18, n. 9, set. 1982, p. 26.
  • 71
    CARROLL, Nick. IPS Update. Surfing, v. 18, n. 9, set. 1982, p. 26.
  • 72
    Seria o aceno com a possibilidade de duas etapas no Brasil uma iniciativa com o intuito de estimular atletas estrangeiros a virem ao país? Com as fontes de que disponho até o momento, trata-se de mera especulação.
  • 73
    CARROLL, Nick. IPS Update. Surfing, v. 18, n. 9, set. 1982, p. 26.
  • 74
    Surfing, v. 23, n. 6, julho 1982, p. 92.
  • 75
    Tratava-se da temporada 1981-1982.
  • 76
    “MONEY for nothing and the chicks for free”. Surfing, v. 22, n. 3, mar. 1986, p. 72.
  • 77
    As atrações musicais durante o evento e tampouco o prefeito aparecem nas revistas. ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.
  • 78
    Sobre o episódio, ver programa do canal de televisão por assinatura Combate. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=nY5HgZrZFqQ>. Acesso em 30 jun. 2018.
  • 79
    ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.
  • 80
    Como se pode ver na Figura 1, há uma mulher de biquíni no anúncio da excursão. Contudo, como há dois países de destino, não posso assegurar que a banhista represente uma brasileira.
  • 81
    HOLMES, Paul. Which one will be the Top Cat Next year? Surfer, v. 24, n. 5, mai. 1983, p. 67.
  • 82
    CARTER, Chris. Summer of 83. Surfing, v. 19, n. 7, jul. 1983, p. 42.
  • 83
    CARTER, Chris. Summer of 83. Surfing, v. 19, n. 7, jul. 1983, p. 44.
  • 84
    CARTER, Chris. Summer of 83. Surfing, v. 19, n. 7, jul. 1983, p. 41.
  • 85
    Ou seja, a edição com data de setembro foi feita, no máximo, no início de junho. Surfer, v. 19, n. 9, set. 1983, p. 36.
  • 86
    ASSUNÇÃO, Kevin. 10 Perguntas: Nelson Machado. Hardcore, 2012. Disponível em: <http://hardcore.com.br/18619-10_perguntas_nelson_machado/>. Acesso em 30 jun. 2018.
  • 87
    Surfing, v. 18, n. 11, nov. 1982. Trata-se do surfista e, posteriormente, cineasta Pedro “Pepê” Cezar.
  • 88
    SAUNDERS, Dave. Southern Cone. Surfer, v. 23, n. 7, jul. 1982, p. 12-3.
  • 89
    Cf. depoimentos no filme Brasil Surf Doc. Direção: Olívio Petit. Ano: 2015.
  • 90
    Diversas fontes contêm depoimentos com este ponto de vista. Conferir, por exemplo, o filme Bustin’ Down the Door. Direção: Jeremy Gosch. Ano: 2008.
  • 91
    O tênis é o esporte mais citado como referência nas fontes.
  • 92
    Diversas fontes contêm depoimentos com este ponto de vista. Cf., por exemplo, o filme Bustin’ Down the Door.
  • Declaração de financiamento

    A pesquisa que originou este artigo conta com o apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro/FAPERJ, por meio do edital Jovem Cientista do Nosso Estado (Proc. E-26/203.150/2017) e da Unirio (Edital PQ-Unirio n. 01/2019).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    31 Jul 2018
  • Aceito
    27 Nov 2019
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